Deliberações

2J / 2015 – Recurso :: Henkel Ibérica Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

2J/2015
Recurso

 

Henkel Ibérica Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

 

COMISSÃO DE APELO

 

Proc. n.º 2J/2015

Recorrente:
“HENKEL IBÉRICA PORTUGAL, UNIP., LDA.”

versus:

“UNILVER JERÓNIMO MARTINS, LDA.”

 

I- RELATÓRIO

HENKEL Ibérica Portugal, Unipessoal, L.da, identificada nos autos, adiante abreviadamente designada por “HENKEL”, parte contrária de UNILEVER Jerónimo Martins, L.da, identificada nos autos, adiante abreviadamente designada por “ULJM”, recorre para esta Comissão de Apelo da Deliberação da 2ª Secção do JE proferida em 19 de Junho de 2015, no âmbito do processo acima referenciado.

1 – Síntese da tramitação deste processo

O processo teve início com uma queixa apresentada pela ULJM, que visando uma campanha publicitária da marca Persil, sobre um produto detergente em cápsulas, denominado Novo Persil Power Mix Caps, da responsabilidade da HENKEL, feita através de suporte televisivo em vários canais, conforme documento junto pela queixosa.

O anúncio em causa utiliza uma criança em posição destacada em imagem, argumento e narração.

Nele se afirma que o produto em causa é o primeiro detergente do mercado que junta gel e pó. E é apresentado como uma “mistura revolucionária”, conotada na sequência duma fantasia a abrir o anúncio, proclamada com entusiasmo pela criança, em jogo informático – uma mãe fictícia, “mãe do futuro”, com “três pernas e quatro braços”, que “pode jogar ao computador o tempo que quiser”

E nele se faz publicidade comparativa, reclamando-se a cápsula publicitada de “melhor cápsula do mercado”, ao mesmo tempo que numa espécie de gráfico de cinco cápsulas, quatro das quais implicitamente identificáveis com produtos concorrentes, em que na coluna do meio se destaca o produto publicitado que evolui por forma tal que essa coluna sobe destacadamente em relação às demais.

A ULJM questiona legalidade da utilização da criança, uma vez que tem dúvidas de que exista relação directa entre o produto anunciado e as crianças.

Sustenta que a afirmação de prioridade no mercado da mistura do gel tira-nódoas com potenciador em pó não corresponde à verdade e tal é um “exagero inadmissível”, porque, segundo ela, não foi a HENKEL quem introduziu internacionalmente no mercado tal tipo de cápsulas e no mercado português elas chegaram ao mesmo tempo que cápsulas Skip, produto dela, ULJM. Tal afirmação seria, por isso, enganosa.

Sustenta também que a superioridade geral, que constitui claim do anúncio do produto em causa, não está provada e deveria sê-lo, numa comparação “com todos os detergentes presentes no mercado português”, “relativamente a todas e quaisquer características do produto e não apenas em algumas circunstâncias”, e que tal vantagem “é muito significativa”. Junta documentos com vista a provar que tal não ocorre no caso vertente e que a HENKEL tem o ónus de provar tais claims.

Termina pedindo que seja mandado «cessar de imediato a campanha publicitária objecto da denúncia, ordenando a interrupção imediata da utilização das alegações publicitárias objecto da mesma, em quaisquer suportes».

A cópia da queixa foi pelo ICAP remetida à HENKEL, por carta registada com aviso de recepção, no dia 2 de junho de 2015. Era dirigida a “Henkel Ibérica, S.A.”, e na linha inferior da desse destinatário figurava a indicação “A/C Dra. Luís Oliveira”. Tal correio foi recepcionado pelos serviços de segurança do edifício onde a HENKEL tem a sua sede, no dia seguinte, que foi uma quarta-feira.

Decorreu o prazo de resposta – cinco dias úteis, que terminava em 11 de junho – sem que a HENKEL haja contestado nem juntado qualquer documento.

Em 15 de junho deu entrada no ICAP um requerimento subscrito pelo ilustre advogado, com procuração, da HENKEL, no qual esta alega, escorada numa declaração dos seus Recursos Humanos, que a referida Dra. Luísa Oliveira, «esteve férias no período entre os dias 4 e 12 de junho de 2015». Mais é afirmado nesse requerimento que, «tendo em conta a forma como a correspondência em causa estava dirigida – a uma pessoa singular específica dentro da empresa -, a mesma não foi aberta por mais ninguém». E que, nesse caso, «devia-se ter procedido, também, necessariamente, à notificação do advogado signatário», que interviera num acto de mediação, munido de procuração, que fora anteriormente efectuada entre as partes relativamente ao litígio que subjaz no presente processo.

Pelo dito requerimento se pretende que seja declarada a nulidade do processo perante o Júri de Ética do ICAP, pela falta de notificação da petição da ULJM e a abertura dum novo prazo de 5 dias para apresentar a contestação.
A Presidente da 2ª Secção do Júri de Ética, em 16 de junho, decidiu, com fundamentação que expôs «que não existem motivos para deferimento do requerido».

Em 17 de junho o mesmo mandatário de HENKEL apresentou em nome desta um conjunto de sete documentos «que se lhe figuram relevantes para a boa decisão da causa». E anunciou que não apresentava contestação porque tal seria um acto inútil, dada a referida decisão da Presidente da 2ª Secção.

A 2ª Secção do JE, pela deliberação que é objecto dos presentes recurso, decidiu, com base nos fundamentos dela constantes:

– não alterar a decisão que a Presidente tomara de indeferir o requerimento apresentado em 15 de junho;
– que os sete referidos documentos apresentados pela HENKEL a 16 de junho não seriam tomados em consideração pelo Júri;
– que a comunicação comercial da responsabilidade da Requerida se encontra em desconformidade com o disposto nos artigos 4º e 17º, nºs 1, do Código de Conduta do ICAP e 14º, nº 2 do Código da Publicidade, pois no caso em apreço «a intervenção principal da menor cabe no conceito de “criança-álibi”, o que determina a ausência do requisito “relação direta” entre aquela e o produto comunicado»;
– que no caso há uma prática de publicidade enganosa por omissão, que abrange a ilegibilidade do disclaimer relativo à alegação “Na melhor cápsula do mercado”, e por os claims visuais da sequência de imagens de um gráfico não habilitarem o destinatário com a perceção do alegado grau de superioridade, nem se conformarem com os requisitos de objetividade e suscetibilidade de comprovação exigíveis na publicidade comparativa.

Concluiu deliberando «no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da HENKEL, em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto nos artigos 4º, nº 1, 9º, nºs. 1 e 2, alínea a) 12º, 15º, nº 2, alíneas a), d), f) e h) e 17º. Nº 1 do Código de Conduta do ICAP, bem como dos artigos 14º, nº 2 e 16º, nº 2, alíneas a) e) e g) do Código da Publicidade e, ainda, 7º, nºa 1, alínea b) e 9º, nº 1, alíneas a) e b) do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE».

Desta deliberação interpôs a HENKEL recurso para esta Comissão de Apelo.

Alegou doutamente e concluiu do seguinte modo:

«1ª
Ao julgar improcedente a arguição de nulidade deduzida pela Henkel com fundamento na falta de notificação da queixa, apresentada pela ULJM, ao advogado já constituído por aquela, o JE interpretou mal e violou o artigo 11.º, n.ºs 1 e 2, do RJE, o artigo 247.º do CPC (que consagra um princípio geral de direito processual), o artigo 61.º, n.º 3, do EOA e o artigo 20.º, n.º 2, da CRP.

Consequentemente, deve a Comissão de Apelo revogar a referida decisão e conceder agora prazo à Henkel, de 5 dias úteis, para que esta apresente a sua contestação.

2.ª

Ao indeferir o requerimento de junção de documentos aos autos, apresentado pela Henkel em 17 de junho de 2015, o JE interpretou mal e violou os artigos 11.º, n.º 3, 12.º e 15.º, n.º 5, do RJE e o artigo 423.º, n.º 2, do CPC. Consequentemente, devem os sete documentos apresentados a 17 de junho de 2015 ser agora admitidos pela Comissão de Apelo e, seguidamente, tidos devidamente em conta, no quadro da nova composição do litígio a que venha a proceder.

Subsidiariamente: o JE esteve especificamente mal quanto aos Docs. n.ºs 4, 5 e 7, juntos pelo requerimento de 17 de junho de 2015, dado que os referidos documentos têm data posterior do término do prazo que foi considerado pelo JE para apresentação de contestação e, por conseguinte, comprovadamente não poderiam ter sido apresentados dentro do referido prazo, pelo que, nos termos conjugados do artigo 15.º, n.º 5, do RJE e do artigo 423.º, n.º 2, última parte, do CPC, deviam ter sido sempre considerados. Não se tendo o JE pronunciado acerca desta questão, deve fazê-lo agora a Comissão de Apelo, no sentido de admitir a junção dos três documentos aqui em causa aos autos.

3.ª

Ao decidir ter-se verificado a prática de publicidade testemunhal em violação do artigo 17.º, n.º 1, do CC, o JE conheceu de questão que não foi suscitada pela ULJM e da qual, por conseguinte, não podia conhecer, tendo feito errada interpretação e aplicação do artigo 13.º do RJE.

Consequentemente, deve a Comissão de Apelo declarar a nulidade da decisão, ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.

Subsidiariamente: ao decidir ter-se verificado a prática de publicidade testemunhal o JE fez errada interpretação e aplicação do artigo 17.º, n.º 1, do CC.

O que deve ser reconhecido por essa Comissão de Apelo, que deverá então proferir nova decisão que interprete e aplique a referida normas em linha com o que aqui se pugna.

4.ª

O JE, ao decidir que a publicidade em apreço violou, pelas razões expostas supra e para as quais expressamente se remete, os artigos 4.º, n.º 1, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 12.º, 15.º, n.º 2, alíneas a), d), f) e h), e 17.º, n.º 1, do CC, bem como os artigos 14.º, n.º 2, e 16.º, n.º 2, alíneas a), e) e g), do CP, bem como ainda os artigos 7.º, n.º 1, alínea b), e 9.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.º 57/2008, fez errada interpretação das referidas disposições e aplicou-as mal.

O que deve ser reconhecido por essa Comissão de Apelo, que deverá então proferir nova decisão que interprete e aplique as referidas normas em linha com o que aqui se pugna.»

Contestou este recurso a ULJM, alegando doutamente e concluindo:

«a) A HENKEL foi devidamente “notificada” da queixa apresentada pela ULJM e não apresentou qualquer contestação;
b) De acordo com as normas aplicáveis, directa ou subsidiariamente, o ICAP não se encontrava obrigado a notificar o mandatário da HENKEL;
c) Como tal, não enferma o presente processo de qualquer ilegalidade processual;
d) A publicidade ora em causa utiliza como interveniente principal um menor;
e) Não existe uma relação directa entre o menor e o produto anunciado;
f) A HENKEL não apresentou comprovação da alegação publicitária que afirma o seu produto como tendo primazia no mercado e sendo inovador;
g) A HENKEL não apresentou comprovação da afirmação segundo a qual o seu produto é significativamente melhor do que os seus concorrentes;
h) A publicidade em causa faz uma comparação entre o produto anunciado e um conjunto de outros produtos concorrentes;
i) Essa comparação apresenta os produtos concorrentes como sendo ineficazes;
j) Razão pela qual a publicidade ora em causa se encontra desconforme com o disposto nos artigos 4.º, n.º 1, 9.º, n.º 1 e 2 alínea a), 12.º e 15.º, n.º 2 alíneas a), d), f) e h) do CCICAP, bem como no artigo 14.º, n.º 2, 16.º, n.º 2 alíneas a), e) e g) do Código da Publicidade e artigo 7.º, n.º 1 alínea b) e 9.º, n.º 1 alíneas a) e b) do Decreto-Lei 57/2008, de 26 de Março.»

Terminou pretendendo que esta Comissão de Apelo deve

«deliberar manter a decisão proferida pela 2ª Secção do JE, sendo confirmada a determinação no sentido de considerar que a campanha em questão viola as supra citadas disposições do Código de Conduta do ICAP, Código da Publicidade e DL 57/2008.»

2 – Questões prévias processuais

Suscitam-se, no caso sub judice três questões processuais que devem ser decididas antes de se passar à apreciação do mérito da causa.

A primeira é a de saber se houve nulidade do processo a partir da rejeição do requerimento da HENKEL apresentado em 15 de junho; a segunda é a de saber se deviam ser juntos aos autos e levados em consideração na deliberação da Secção recorrida os documentos apresentados pela Henkel em 17 de junho; a terceira é a de saber se a deliberação recorrida foi nula por ter conhecido duma questão não suscitada pela ULJM, designadamente a prática irregular de publicidade testemunhal.

Analisemo-las separadamente:

2.1 – O prazo para a Henkel contestar a queixa da ULJM

O processado depois da rejeição do requerimento de prazo feito em 15 de junho seria nulo, na tese da recorrente, porque ainda não estava precludido o prazo para contestar a queixa. Isto porque, segundo o mesmo requerimento, a notificação da Henkel não fora feita em 3 de junho, pois só nesse dia 15 tomara conhecimento da dita queixa.

Importa pois decidir, com base nos factos resultantes do processo, se a dita notificação foi, ou não, regularmente feita.

A recorrente aponta duas irregularidades para o acto de notificação, a saber: a correspondência enviada pelo ICAP foi dirigida a uma pessoa singular específica dentro da empresa – a dirigente do sector de detergentes, Dr.ª Luísa Oliveira – que entre 4 e 14 de junho estava ausente do escritório da Henkel, no gozo de férias; e uma vez que era dirigida a uma pessoa singular, deveria ter sido remetida também para o advogado constituído, que interviera já, com procuração, no acto de mediação a que a questão subjacente a este litígio fora já submetida.

Quanto à primeira não tem razão a recorrente, pois a mencionada correspondência foi efectivamente dirigida à empresa, e não à Dr.ª Luísa Oliveira. É certo que, por baixo da destinatária, que era a pessoa colectiva, figurava a indicação habitualmente usada da abreviatura de “ao cuidado de” – “A/C”. Mas essa indicação não tinha, neste caso, nem tem habitualmente, um sentido de “reservada” ou “restrita”. Destina-se a ajudar a orientar a distribuição rápida para o sector da pessoa colectiva que provavelmente se ocupará do assunto. Tanto assim é que, havendo aviso de recepção, este não é exigido que seja assinado pela tal pessoa singular referida no “ao cuidado de”. O sentido de indicação restritiva a determinada pessoa singular é dado por outros sinais, como “reservado” ou “em mão”. E não foi esse o caso.

Ora é geralmente admitido – mesmo expressamente pela própria lei processual civil, que nestas matérias é formalista e regulamentada – que a citação de pessoas colectivas se faz quando qualquer seu funcionário na sua sede a recebe. Sem prejuízo do princípio geral aflorado no art. 224º do Código Civil, e sem que isso implique uma aplicação analógica ou sequer subsidiária das normas concretas que regem o processo civil, é este o entendimento que deve ser seguido, como regime normal, na notificação da queixa feita pelo ICAP à parte contra quem esta é dirigida, regulada no art. 11º do Regulamento do Júri de Ética do ICAP.

Também não tem razão a recorrente quando invoca a exigência de envio da notificação em causa para o escritório do advogado mandatário. Mesmo sem necessidade de se invocarem quaisquer outros fundamentos, a mediação não é parte do presente processo, mas sim uma série de diligências inteiramente independentes dele. Não pode ser considerada, sequer uma fase preliminar deste; de forma nenhuma se aproxima das tentativas de conciliação que a lei já tem consagrado como formalidades prévias ao processo ordinário. A mediação é uma via alternativa dos processos, como o vertente, suscitados por queixa (art. 19º do RJE do ICAP). Rege-se por normas e princípios inteiramente diversos.

A notificação a que se refere o nº 1 do art. 11º do RJE do ICAP foi portanto regularmente feita e eficaz em 3 de junho de 2015, como, certeiramente, sustentou a recorrida e decidiu a Secção a qua. O prazo para a contestação terminou em 11 de junho. Por aí não houve nulidade alguma no processo.

2.2 – Oportunidade da junção dos documentos de 17 de junho

Uma vez que não contestou, deveriam os sete documentos apresentados em 17 de junho ter sido juntos aos autos e levados em consideração na deliberação ora recorrida?

É de entender que não.

No processo perante o JE do ICAP, a documentação apresentada pelo contestante deve acompanhar a contestação (art. 11º, nº 3, do RJE do ICAP). Esse é o princípio. Só excepcionalmente será de admitir a junção de novos documentos. E a esses casos não se aplicam, se quer subsidiariamente, as normas do processo civil, as quais, sem embargo de deverem ser tidas em consideração quando reflictam princípios gerais, regulam uma realidade muito diferente do processo perante este Júri de Ética emergente da autorregulação.

A tal respeito, a norma deste processo é a de que apenas serão admitidas novas provas – e só na fase de recurso – se comprovadamente não puderem ter sido apresentadas perante a Secção (art. 15º, nº 5). Para essa impossibilidade não releva por si a data do documento. Se a parte interessada fora já eficazmente notificada, o ónus de apresentar oportunamente documentos com a contestação era seu. Se no prazo que se lhe abriu por essa notificação, ela não contestou, não poderá prevalecer-se da data posterior para invocar a dita impossibilidade em relação a quaisquer documentos, mesmo que emitidos posteriormente ao termo desse prazo.

O requerimento da sua junção aos autos e a sua consideração para efeitos da matéria de facto na questão litigada foi, pois, bem indeferido. E pelos mesmos motivos não devem os ditos documentos ser considerados em sede do presente recurso.

2.3 – Nulidade por conhecimento, pelo Júri, de questões não suscitadas na queixa

Pretende a recorrente que, pelo facto de, segundo ela, a 2ª Secção ter conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento provocaria a nulidade da decisão ora recorrida.

A questão não suscitada seria a de ver um testemunho não genuíno nem responsável numa afirmação do menor que intervém no anúncio em causa – a proclamação do produto publicitado como “super poderoso”, o que, segundo a deliberação ora recorrida, contraria o disposto no nº 1 do art. 17º do Código de Conduta do ICAP.

Não pode ser provida tal pretensão.

Ainda que se aceitasse que tal pudesse ser uma questão não suscitada nos autos e que, como tal, não devesse ser objecto de decisão – a retirada de tal fundamento em nada alteraria o sentido da deliberação final. Seria pois algo que vitiatur sed non vitiat. Como tal não há razão alguma para que produzisse um efeito tão grave e desproporcionado como a nulidade do julgado pretendida pela recorrente.

Mesmo que a nulidade da sentença fosse neste caso o efeito num processo regido pelo Código de Processo Civil, maxime por força do seu art. 615º, nº 1, tal regime nunca deveria ser considerado aplicável ao processo perante o JE do ICAP, que se rege por um princípio fundamental de celeridade e do qual a desformalização é o pano de fundo.

A deliberação recorrida não é pois nula pela aludida razão.

3 – Matéria de facto assente relevante para a decisão do recurso

Quanto à questão de meritis, os factos invocados pela queixosa, não tendo sido infirmados pela contestante, e mostrando-se conformes com a prova produzida pela queixosa e com as conclusões da livre apreciação da prova levadas a cado pelo JE, quer na 2ª Secção quer nesta Comissão de Apelo, não conflituando com o que se conhece e é público e notório, devem ser geralmente considerados como provados, nos termos em que o foram pela deliberação ora recorrida.

4 – Apreciação jurídica do objecto da queixa

Tais factos configuram várias violações às normas legais e da autorregulação, a saber:

4.1. – A criança é manifestamente uma interveniente principal do anúncio questionado, até porque a sua intervenção se interliga sintática e semanticamente com os claims invocados sobre o produto. A sua lógica profunda é complementar e acumulada à mensagem fundamental da publicidade, para reforçar a ideia de inovação para maior eficácia, que é leit motif do anúncio.

Mas não há qualquer relação directa entre o menor e o produto anunciado, o que constitui uma infracção ao nº 2 do art. 14º do Código da Publicidade.

4.2. – A superioridade do produto anunciado é apresentada sem restrição a circunstâncias nem critérios. Nessas condições, como não está provada em todas as circunstâncias nem segundo quaisquer critérios, fere o princípio da veracidade (art. 10º, nº 1 do C.P).

4.3. – Também não foi provada neste processo, pela Henkel, como era seu ónus, de que o produto em questão fosse inovador no mercado e que fosse sua a primazia, pelo que o respectivo claim, para efeitos da decisão do processo, também contraria o dito princípio (art. 10º, nº 2 do CP).

4.4. – A publicidade em causa é comparativa. E o modo como é feita infringe as imposições das normas legais e da autorregulação sobre tal forma de publicidade (nomeadamente art. 16º do C.P. e art. 15º do Código de Conduta do ICAP).

Nisso, como em tudo o mais, e ainda em geral quanto aos fundamentos invocados, decidiu bem a 2ª Secção do JE, pelo que se entende que a deliberação recorrida não deve ser revista.

5 – Decisão

Termos em que decidem negar provimento ao recurso, confirmando a deliberação recorrida.».

Lisboa, 14 de Julho de 2015

Augusto Ferreira do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

Francisco Xavier do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

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4J / 2015 :: ANIL vs. FIMA OLÁ – Produtos Alimentares e Unilever Jerónimo Martins

4J/2015

ANIL
vs.
FIMA OLÁ – PRODUTOS ALIMENTARES
E
UNILEVER JERÓNIMO MARTINS

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no décimo terceiro dia do mês de Julho do ano de dois mil e quinze, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 4J/2015 tendo deliberado o seguinte:

Processo nº 4J/2015

1. Objecto dos Autos

A ANIL – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS INDUSTRIAIS DE LACTICÍNIOS (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por ANIL ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a FIMA OLÁ – PRODUTOS ALIMENTARES, SA. e UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, Lda. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por FIMA OLÁ ou Requerida ), relativamente a comunicação comercial ao seu produto “FLORA” – promovida pela última nos suportes rotulagem, televisão, Internet e linear de supermercado – tal, por alegada violação dos artigos 4°, n.ºs 1 a 3, 5.º, 7.º, n.º 1, 9.º n.ºs 1 e 2, aIínea a) e 30.º, todos do Código de Conduta do ICAP, artigo 14.º do Regulamento do JE, artigos 10.°, n.º 1, 11.°, n.º 1 e 16.º do Código da Publicidade, 5.º, 6.º e 7.°, n.º 1, alínea b) do DL 57/2008 de 26 de Março, bem como dos artigos 2.º, 7.º, n.ºs 1, alínea d), 2 e 4, 9.º, 13.º, 18.º, 22.º 26.º e 36.º do Regulamento (UE) nº 1169/2011, 9.º do Regulamento (CE) n.º 1924/2006, artigos 3.º, 7.º, nºs 1 e 2 e 13.º, n.º 2 da Directiva 2000/13/CE, artigo 78.º e Parte III do Anexo VII ao Regulamento (UE) nº 1308/2013, de 17 de Dezembro e, ainda, do disposto no Anexo XII do Regulamento (CE) 1234/2007, de 22 de Outubro de 2007.

1.1. Notificada para o efeito, a FIMA OLÁ apresentou a sua contestação.Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

1.2. Questões prévias

1.2.1. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 9.º do Regulamento do JE, sob a epígrafe “Petição”, “A queixa deverá ser feita por escrito, devendo o queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados, expor os factos e a fundamentação, tão sintética quanto possível, indicar as disposições do Código de Conduta do ICAP, e, ou, outras fontes que considere infringidas e formular com clareza a sua pretensão, salvo quando apresentada por consumidor nos temos definidos na Lei de Defesa do Consumidor”. (Negrito e sublinhado do JE).

Esta é, aliás, uma prática sobre a qual o Júri teve já a oportunidade de se pronunciar, designadamente, no âmbito dos Processos 8J/2009, 17J/2009, 2J/ 2010, 16J/2012 e 4J/2014 do ICAP.

Ora, o articulado da petição (para além de escusadamente extenso) não é claro, quer em termos de listagem e definição de suportes a analisar por referência às alegações publicitárias que integram cada um deles (a título de exemplo, atenda-se aos art.ºs 8.º, 42.º e 45.º da queixa), quer no que tange à separação entre os claims da comunicação comercial ora colocada em crise e os que integravam as campanhas publicitárias que foram objecto dos Processos 4J/2009 e 14J/2014 do ICAP.

Neste tocante, aliás, concorda o JE com a Requerida quanto ao alegado em sede de contestação no sentido de que, “Trata-se, portanto, de uma enorme confusão quando se mistura embalagem com anúncios (filmes), embalagem antiga com a nova e, logo a seguir e no meio disto, ingredientes.” (sic. art.º 14.º da contestação).

Em conformidade, e com o devido respeito, o Júri solicita à ANIL que, em peças processuais futuras observe as mencionadas clareza e síntese, a bem da desejável celeridade em matéria de autoregulação, sendo que esta é igualmente inconsentânea com outra situação que se passará a referir.

1.2.2. Uma embalagem de um produto só consubstancia um suporte publicitário, caso possua alegações que encerrem juízos de valor que caibam no conceito ético-legal de publicidade. Caso contrário, estar-se-á em presença de informação ao consumidor aposta em rotulagem.

Dito de outra forma, entende o JE que tal informação apenas será apta, per se, a propiciar quaisquer juízos de valor promocionais junto do destinatário – e, logo, a ser considerada um disclaimer de uma comunicação comercial caso, cumulativamente:

– Possua um destaque não obrigatório por lei;

– Não consubstanciando em si mesma algo que não seja uma mera informação ao consumidor “resvale” para o conceito de publicidade, por via de uma associação verbal e, ou, visual com claims publicitários.
Com efeito, a averiguação de qualquer alegado incumprimento do princípio do respeito pelos direitos do consumidor em matéria de publicidade implica a existência da última. A assim não ser, estar-se-ia em presença de uma tautologia…

Pelo exposto, esclarece o Júri que somente apreciará o teor de menções apostas na rotulagem da Flora que se possam considerar comunicações comerciais, vulgo publicidade, ou que, não o sendo, emprestem significado a claims publicitários por associação possível por parte do consumidor médio, razoavelmente atento, esclarecido e informado, porquanto tal é o que faz parte da competência material do ICAP, designadamente, nos termos do artigo 4º dos seus Estatutos.

1.2.3. Constitui objecto de denúncia da ANIL, o incumprimento por parte da Fima/Unilever de decisão da Comissão de Apelo proferida no âmbito do Processo nº 4J/2014. Tendo-se verificado que, com a contestação, foi junto um Parecer subscrito por um membro do JE que havia participado na decisão de Secção Ad-Hoc recorrida, o Júri entendeu dever não tomar conhecimento do mesmo Parecer.

1.3. Dos factos

1.3.1. Dos suportes

Através da análise da globalidade do articulado da petição e dos trinta e oito documentos juntos ao processo com a mesma, conclui o Júri que a denúncia se reporta a comunicação comercial ao produto Flora da responsabilidade da Requerida, nos suportes embalagem, televisão, Internet e linear de supermercado.

1.3.2. Das alegações publicitárias ou claims

São objecto de denúncia da ANIL, as alegações publicitárias ou claims (cfr. art.º I. 8.º da petição e DOCS. 1 a 38 juntos) referentes a:

– “Recomposição do ingrediente leite magro reconstituído (15%);- Manutenção da Embalagem da Flora versão “Com leite dos Açores”;

– Reprodução dos anúncios publicitários da Flora “Com leite dos Açores”;

– Veiculação combinada de claims contendo sempre a designação “leite dos Açores” ; e

– Inserção do selo “Agora com mais SABOR” com o formato e a disposição análogos ao selo “Com leite dos Açores”.

2. Enquadramento ético-legal

Nos termos do artigo 4.º do Código de Conduta do ICAP, “Todas as comunicações comerciais devem ser legais, decentes, honestas e verdadeiras” (1.) e “…devem ser concebidas com sentido de responsabilidade social e profissional e devem ser conformes aos princípios da leal concorrência, tal como estes são comummente aceites em assuntos de âmbito comercial.” (2.). Segundo redação do artigo 5.º daquele Código, “A comunicação comercial deve respeitar os valores, direitos e princípios reconhecidos na Constituição e na restante legislação aplicável”.

Por seu turno, nos termos do disposto n.º 1, sob a epígrafe “Honestidade”, “A comunicação comercial deve ser concebida de forma a não abusar da confiança dos consumidores e a não explorar a sua falta de conhecimento ou de experiência”.

De acordo com o artigo 30.º, n.º 3 do mesmo Código de Conduta, sob a epígrafe “Respeito pelas decisões do ICAP”, os sócios deste “…e os membros associados das Associações e outras congéneres filiadas no Instituto, bem como quaisquer entidades, incluindo não membros, que submetam questões à apreciação do JE – Júri de Ética, são obrigados a acatar prontamente, na letra e no espírito, as decisões oriundas, nomeadamente, dos órgãos sociais do ICAP e do JE – Júri de Ética.”.

De onde, à luz da queixa do Requerente, importa averiguar se a comunicação comercial em lide é de molde a ofender o quadro ético-legal dos princípios da veracidade, honestidade, responsabilidade social e da livre e leal concorrência aplicáveis às comunicações comerciais (cfr. artigos 4.º, n.ºs 1 e 2, 5.º, 7.º, n.º 1, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 12.º e 30.º, n.º 3 do Código de Conduta do ICAP, bem como 10.º e 11.º do Código da Publicidade, o último, com a redacção introduzida pelos artigos 4.º e 7.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março).
Em conformidade, cumpre ao Júri atender não só ao disposto no artigo 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do mesmo Código de Conduta, sob a epígrafe “Veracidade”, como ao consignado no n.º 1, alínea b) do artigo 7.º do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março. Ora, segundo a mesma, “É enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo“, sendo que um desses elementos é o das “…características principais do bem ou serviço, tais como a sua (…) a sua composição”.

Acresce que, foi entendido quer pelo legislador português, quer pela União Europeia (cfr. Directivas 84/450/CEE e 97/55/CE) que, como norma de instrução em matérias de observância do princípio da veracidade, se devia instituir uma regra de direito probatório (cfr. actual n.º 3 do artigo 11.º) nos termos da qual se presumem como inexactos os dados referidos pelo anunciante na falta de apresentação de provas ou na insuficiência das mesmas, no que, aliás, o articulado dos artigos 5.º e 12.º do Código de Conduta do ICAP se encontra em consonância, pelo que impende sobre a FIMA OLÁ o ónus da prova das alegações publicitárias em lide.

2.1. Da alegada prática de publicidade enganosa e ofensiva dos princípios da veracidade, honestidade, responsabilidade social e livre e leal concorrência

Alega a ANIL em sede de petição que “Em 28 de Julho de 2014, no âmbito do processo n.º 4J/2014, a Comissão de Apelo do ICAP, reiterando o sentido e alcance da sua decisão de 15 de Maio de 2014, confirmou (i) a proibição de utilização da expressão “COM LEITE DOS AÇORES” em toda a comunicação comercial do creme vegetal Flora da Unilever, então em comercialização; e (ii) a proibição de indução ou associação desse produto à manteiga”. (sic. art.º I.1.º).

A decisão da Comissão de Apelo do ICAP de 28 de Julho de 2014 foi proferida no âmbito do Processo nº 14J/2014 e não do 4J/2014. Contudo, crê o Júri que a lógica dita estar a Requerente a referir-se a este último, não obstante o lapso.

Conclui a ANIL que “A comunicação comercial da Unilever (…), constitui uma violação intencional da decisão da Comissão de Apelo e consubstancia, concomitantemente, o desrespeito grave e censurável das suas obrigações, quer enquanto parte visada no processo nº 4J/2014, quer enquanto membro do ICAP.” (sic. art.º III.32.º).

Permite-se o Júri fazer uma rectificação quanto ao que foi confirmado pela Comissão de Apelo do ICAP acerca do claim “COM LEITE DOS AÇORES”. A conclusão no sentido da respectiva desconformidade com o quadro ético-legal em matéria de princípios da veracidade e de livre e leal concorrência fundou-se no entendimento de que a diminuta quantidade do leite (1%) não era de molde a justiçar tal menção publicitária, sendo que tal percentagem não era comunicada com destaque.

Importa, pois, averiguar se a campanha publicitária objecto dos presentes autos constitui uma violação da referida decisão da Comissão de Apelo, nos termos e pelos motivos expostos na petição e contestados pela UNILEVER e, ou, se se encontra desconforme com qualquer dos normativos invocados pela ANIL, cuja aplicação se enquadre na competência material do ICAP.

2.1.1. Da comunicação veiculada em suporte televisão e Internet

De acordo com os DOCS. 12., 13 e 14. em “CD-ROM” , em que se reproduzem três spots publicitários (não unitariamente identificados em gravação) e com os DOCS. 1., 3., 17., 18., 19., 20., 21.e 23., todos, da petição, relevam em sede de denúncia, os seguintes claims:

– (i) Imagem de caracol visual feito com o produto;

– (ii) “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora”;

– (iii) “Agora com mais leite dos Açores”;- (iv) “Agora com 15% de leite dos Açores”.

Não é junta prova aos autos por parte da Requerente de que tal imagem de caracol ou rosca só possa ser usada por marcas de manteiga, de acordo com um registo em sede de Propriedade Industrial.

Por outro lado, entende o Júri que a imagem em apreço só seria susceptível de induzir o consumidor em erro e, logo, configurar uma prática de publicidade enganosa, caso não fosse um facto notório, o de que os cremes vegetais permitem a “construção” do dito caracol, não sendo tal característica exclusiva das manteigas. Logo, a mesma imagem, nem sequer se poderá considerar uma alegação publicitária visual, no sentido próprio do termo. O mesmo se diga do pão barrado e de outras imagens semelhantes e de utilização genérica.

Ao contrário do que alega ad nauseum a Requerente na sua petição, a comunicação comercial veiculada em suportes televisão e Internet é sobejamente clara quanto aos factos:

– (i) de estar a ser publicitado um creme vegetal e não, um produto lácteo. Tal, por virtude do destaque que é concedido ao claim “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora”;

– (ii) de não se propiciar qualquer associação num único suporte entre o maior sabor alegado e os claims “Agora com mais leite dos Açores” e “Agora com 15% de leite dos Açores”;

– (iii) de não se gerar qualquer susceptibilidade de confusão entre a Flora e manteigas, a nível de comunicação comercial.

Já quanto às alegações publicitárias “Agora com mais leite dos Açores” e “Agora com 15% de leite dos Açores” per se, constacta o Júri que, no meio do emaranhado de alegações (que decorre da queixa e da contestação, bem como de documentos juntos) acerca de leite e leitelho, matérias gordas de origem animal e vegetal, lípidos provenientes de óleos e gorduras vegetais, qualidade de géneros alimentícios e aditivos alimentares, total de matéria gorda e de ácidos gordos saturados presentes nas manteigas, gordura insaturada, vitaminas A D e E, “VRN’s” acima de 15%, produtos light, perfil de lípidos, natas, tamanhos de embalagens e códigos de barras (algumas das matérias, a extravasar completamente a competência material do ICAP), poderia ser possível perder-se de vista que, ao contrário do alegado pela Requerida a art.º 150.º da sua contestação, o ónus a prova em matéria de práticas de publicidade enganosa recai sobre o anunciante e, logo, sobre as alegações referidas. Em conformidade, competir-lhe-ia juntar prova da veracidade dos claims em causa, em coerência com o alegado na contestação no sentido de que:

– “A receita foi reformulada e passou a contar com mais 50% do ingrediente leite magro reconstituído.” (sic. art.º 48.º);

– “….usou apenas a referência factualmente correcta, “Agora com 15% de leite dos Açores”, “Agora com mais leite dos Açores.” (sic. art.º 50.º);

– “…alteração da receita para 15% de leite dos Açores…” (sic. art.º 54.º);

– “…é que um constituinte presente apenas em 15% do total do produto…” (sic. art.º 70.º);

– “Tem mais leite…” (sic. art.º 73.º);

– “A fórmula anterior tinha menos 50% de leite do que esta, o que significa que o produto está diferente…” (sic. art.º 74.º);

– “… + 15% de leite magro reconstituído + …” (sic. art.º 85.º);

– “Como se disse, LEITE magro reconstituído (15%) é exacto pois refere a quantidade de leite no produto.” (sic. art.º 87.º);

– “E o consumidor não é enganado pois refere-se creme vegetal e leite magro reconstituído (15%), cumprindo-se assim o disposto na legislação. “ (sic. art.º 96.º).

Ora, entende o Júri que apesar de a FIMA OLÁ ter apresentado prova bastante de que utiliza leite em pó magro dos Açores (cfr. DOC. 1 junto à contestação), não logrou comprovar a veracidade dos claims “Agora com mais leite dos Açores” e “Agora com 15% de leite dos Açores”.

Pelo exposto, entende o JE que a comunicação comercial veiculada em suporte televisão e Internet, nas suas várias vertentes, se encontra desconforme com o disposto nos artigos 4.º, n.ºs 1 e 2, 5.º, 7.º, n.º 1, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 12.º e 30.º, n.º 3 do Código de Conduta do ICAP, bem como 10.º e 11.º do Código da Publicidade, o último, com a redacção introduzida pelos artigo 4.º e 7.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março. 2.1.2. Da publicidade veiculada através de suporte embalagem

Colocado perante o articulado da petição, conclui o Júri que a ANIL considera a rotulagem da Flora como recipiente de género alimentício em sede do qual é obrigatória a aposição de informações obrigatórias ao consumidor em matéria de natureza, composição, quantidade, prazo de validade, utilidade e forma de utilização, preço e demais características relevantes dos respectivos bens e serviços, retirando de tal entendimento, a conclusão de que se está aqui em presença de publicidade, o que o Júri veementemente rejeita, tal como já referiu.

Com efeito, entende o JE que, tal como defendeu em sede de Questões prévias, tais informações somente serão aptas a propiciar quaisquer juízos de valor promocionais junto do destinatário – e, logo, a serem consideradas comunicações comercais, caso, cumulativamente:

– Possuam um destaque não obrigatório por lei e, para além dele, o que não acontece in casu, com as menções apostas na rotulagem lateral e de fundo da Flora, conforme DOCS. 2., 7., 9., 10., 11. e 24. juntos à queixa, nestas se incluindo a menção “Creme para barrar a 79%” ;

– Não consubstanciando em si mesmas algo que não seja uma mera informação ao consumidor, “resvalem” para o conceito de publicidade, por via de uma associação verbal e, ou, visual com claims que lhes alterem o significado, o que não acontece com o chamado “selo” aposto na tampa da Flora, onde se lê isoladamente “Agora com mais sabor” em substituição da anterior alegação “Com leite dos Açores”.

Aliás, e sem conceder, diga-se que a FIMA OLÁ logrou comprovar que a alegação nutricional “manteiga/margarina/cremes para barrar” aposta no fundo da embalagem (ou na capa do mesmo fundo de acordo com DOC. 28 da contestação) é lícita, com fundamento no pressuposto legal de pertencerem todos os produtos referidos, à mesma categoria. (Cfr. DOC. 24. junto à mesma contestação).

Assim, por maioria de razão – e continuando a não conceder -, não assiste razão à ANIL quando sustenta em sede de queixa que: “A ideia de comparação alternativa entre a nova Flora e a Manteiga é igualmente induzida pela comunicação comercial ínsita na tabela nutricional comparativa com a “Manteiga” que consta das embalagens da Flora.” (sic. art.º 57.º).

Muito menos se poderá alegar, como o faz a Requerente a pág. 15 da sua petição que, “…ainda que se entendesse (…) que a tabela nutricional da “manteiga” não constitui uma alegação nutricional comparativa, as referências feitas infringem o disposto no artigo 16º do Código da Publicidade, porque a tabela compara características da nova Flora com supostas características da manteiga, um bem único que responde a necessidades e objectivos diferentes e é oferecido por terceiros concorrentes da Unilever”.

Com efeito, a existir uma eventual violação do artigo 16.º do Código da Publicidade, seria necessário, logo à partida, que se tratasse aqui de publicidade…Volta a referir o Júri que, uma menção colocada no fundo de uma embalagem com caracteres iguais aos da restante informação ao consumidor e indissociada de quaisquer claims publicitários – como é o caso – não consubstancia uma prática publicitária. (Cfr. artigo 3.º do Código da Publicidade). Mais, caso assim não fosse (em razão de destaque ou associação), qualquer eventual ofensa do regime jurídico estabelecido no referido artigo 16.º poderia não encontrar fundamento na “satisfação de necessidades e objectivos diferentes” mas sim, muito mais, na comparação entre características não representativas.

Por outro lado ainda, quer o Júri expressar a sua total discordância com o alegado em sede de queixa no sentido de que o claims: “Agora com mais sabor” (actual) e “Com leite dos Açores” (anterior) constituem “semelhanças” que induzem uma referenciação unívoca e coerente (cfr. art.º 44.º):

Agora com mais Sabor ↔ Agora com mais leite dos Açores
e que
Qualquer uma das duas premissas, por via da sua difusão reiterada, alternada ou simultânea, induz a percepção da outra e completa o seu significado, de modo que a repetição de uma remete o consumidor para a memória que retém da outra, reforçada pela continuidade da linha narrativa já presente na comunicação comercial da versão Flora “Com leite dos Açores””. (sic. art.º 45.º).

De facto, a assistir razão à Requerente, poder-se-ia sustentar, no limite, a irrelevância e inutilidade de reformulação de quaisquer comunicações comerciais ilícitas, atenta a fatalidade de existência de uma “memória colectiva”. Por outro lado ainda, diga-se que não assiste qualquer razão à ANIL quanto à conclusão que parece querer ver retirada pelo alegado a art.ºs 13.º e 14.º da petição.

De onde, no que concerne à embalagem da FLORA, entende o Júri não existir qualquer desconformidade com o quadro ético-legal em matéria de comunicações comerciais, vulgo publicidade (âmbito da sua competência material) e, logo, com a decisão da Comissão de Apelo proferida no âmbito do Processo n.º 4J/2014 do ICAP.

2.1.3. Da comunicação veiculada em suporte linear de supermercado

Alega a ANIL na sua petição que “A disposição da Flora entre as diversas manteigas oferecidas para venda em loja é aliás consequência directa (…) de indução enganosa, como um produto análogo à manteiga e uma alternativa equivalente de compra, o que confirma essa indução enganosa – cfr. fotos tiradas na loja do Pingo Doce nos Olivais que se juntam como documentos 35 a 38.”. (sic. art.º I. 56.º).

Contraditando a posição da Requerente, vem a FIMA OLÁ defender que: ”No que diz respeito à colocação de FLORA nas prateleiras destinadas às manteigas, o que é relevante é que a decisão de organização e colocação dos produtos nos lineares é da responsabilidade dos proprietários de cada loja ou retalhista.” (sic. art.º 11.º) e que “… podia também apresentar fotografias de muitos estabelecimentos onde a FLORA não está “nas prateleiras destinadas à venda das manteigas”, mas também nesses casos a decisão é dos responsáveis das lojas ou retalhistas.” (sic. art.º 12.º).

Entende o Júri que um linear de supermercado que possua uma alegação publicitária como “Porquê manteiga?” e disponha as várias unidades de um só creme vegetal (a Flora) juntamente com marcas de manteiga (cfr. DOCS. 35 a 38. juntos à petição) está a comunicar o dito creme vegetal como se de manteiga se tratasse.

Ora, por maioria de razão com o que já se concluiu e, bem assim, com o que foi objecto de decisão da Comissão de Apelo no âmbito do processo n.º 4J/2014 do ICAP, tal configura uma prática de publicidade enganosa.

Acresce que, nos termos do artigo 5.º, alínea a) do Código da Publicidade, anunciante é a pessoa singular ou colectiva no interesse de quem se realiza a comunicação comercial. Ora, no caso vertente, tal entidade é a Requerida. Assim, verificando-se a inversão do ónus da prova em razão de se estar aqui em presença de uma violação do princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, impenderia sobre a FIMA OLÀ a comprovação da sua discordância junto dos supermercados em causa, quanto à forma de “arrumação” em linear do seu produto Flora, bem como ao claim “Porquê manteiga?” associado, ambos os casos chegados ao seu conhecimento, pelo menos, aquando do conhecimento da queixa.

Não tendo sido junta aos autos qualquer prova nesse sentido, entende o JE que a comunicação comercial em linear é da responsabilidade da Requerida, consubstanciando uma prática de publicidade enganosa e, assim, ofensiva dos princípios da veracidade, da honestidade, da responsabilidade social e da livre e leal concorrência, bem como um incumprimento da decisão da Comissão de Apelo no âmbito do processo n.º 4J/2014 do ICAP.

3. Decisão

Termos em que a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da FIMA OLÁ – veiculada nos suportes televisão, Internet e linear de supermercado – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com os artigos 4.º, n.ºs 1 e 2, 5.º, 7.º, n.º 1, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 12.º e 30.º, n.º 3 do Código de Conduta do ICAP, bem como 10.º e 11.º do Código da Publicidade, o último, com a redacção introduzida pelos artigo 4.º e 7.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE.

Auto Regulação4J / 2015 :: ANIL vs. FIMA OLÁ – Produtos Alimentares e Unilever Jerónimo Martins
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3J / 2015 :: DECO vs. Vodafone

3J/2015

DECO
vs.
Vodafone

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no primeiro dia do mês de Julho do ano de dois mil e quinze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 3J/2015 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 3J/2015

1.   Objecto dos autos

1.1.   A DECO – Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, (ou DECO ou “Queixosa”) vem, nos temos do artigo 10.º do Regulamento do Júri de Ética do ICAP (“Regulamento JE”) apresentar queixa contra VODAFONE PORTUGAL, Comunicações Pessoais, S.A. (adiante abreviadamente “VODAFONE” ou denunciada), relativamente a relativamente à campanha publicitária/comunicação comercial efectuada à marca Vodafone, consubstanciada num folheto, por violação do disposto nos artigos n.º 1 do artigo 10.º, 11.º e 12.º do Código da Publicidade e nos artigos 7.º e 9.º da Lei de Defesa do Consumidor, bem como n.º 1 artigo 7.º, na alínea a) e b) do n.º 2 do artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP.

1.2.   Notificada para o efeito, a VODAFONE apresentou a sua contestação.

1.3.   Dão-se por reproduzidas a queixa, a contestação e os documentos apresentados pelas Partes.

1.4.   Síntese da posição da parte queixosa

– A comunicação realizada pelo anunciante aos consumidores visa a promoção de um produto denominado por Vodafone TV NET Voz, i.e., a prestação de serviços de comunicações eletrónicas de televisão, internet e telefone fixo.

– Para o efeito, o anunciante – Vodafone – utiliza como suporte publicitário, entre outros, um folheto em suporte físico, disponível nos seus estabelecimentos, conforme doc. 2 que se junta.

– A mensagem realizada pelo anunciante, referente ao serviço atrás descrito, encontra-se a ser publicitado a um preço de 25,90€.

– Vejamos, pois, detalhadamente os serviços e condições que o anunciante publicita:

a)   Do serviço de televisão:

– Este serviço, conforme anunciado, inclui mais de 100 canais.

– No entanto, pelo preço publicitado, o anunciante disponibiliza mais de 100 canais onde se inclui os canais de rádio e interativos, pelo que os referidos 100 canais não são apenas de televisão.

– De referir ainda que caso o consumidor pretenda usufruir da oferta de €25: €20 videoclue + €5 Karaoke é necessário que alugue ao anunciante um equipamento denominado TvBox, o que acarretará um encargo mensal de 4,50€ ou 5,50€, caso do serviço de televisão ser prestado através da tecnologia de ADSL ou fibra respetivamente.

b)   Do serviço de internet

– O anunciante publicita este serviço como tendo tráfego ilimitado e velocidade até 50 Mbps.

– No que diz respeito à prestação do serviço de internet, muito embora ser aquela a velocidade publicitada, a verdade é que, analisadas as condições contratuais desta operadora, o anunciante não garante a velocidade oferecida para toda e qualquer ligação, a qualquer momento, uma vez que depende do nível de utilização de rede e do servidor.

– Em suma, o preço publicitado de 25,90€ por mês, não corresponde aos serviços publicitados.

– Na medida em que o consumidor que pretenda contratar os serviços de 100 canais publicitadas pelo anunciante e usufruir das referidas oferta, despenderá um montante mensal superior ao preço publicitado relativo ao aluguer da TvBox.

– Assim se conclui que a mensagem publicitada, neste suporte, é suscetíveis de induzir o consumidor em erro, conduzindo-o a contratar aquele serviço, desconhecendo informações essenciais do contrato, nomeadamente o preço final, bem como as funcionalidades e qualidade do serviço contratado. – Ora, a comunicação comercial aqui em crise para além de violar diretamente os artigos atrás indicados, viola também o princípio da veracidade, correspondente ao n.º 1 do artigo 10.º, bem como o direito à informação e à proteção dos interesses económicos dos consumidores previstos nos artigos 7.º e 9.º da Lei de Defesa do Consumidor.

– É enganosa a prática comercial que contenha informações falsas, ou sendo factualmente corretas – que não são, diga-se – pela sua apresentação geral, induza ou seja suscetível de induzir em erro o consumidor em relação aos elementos do contrato, conforme decorre do disposto no n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei nº 57/2008 de 26 de Março, concretizado, a comunicação comercial do anunciante deve ser concebida de forma a não abusar da confiança dos Consumidores e a não explorar a sua falta de conhecimento ou de experiência, conforme o principio da honestidade na publicidade consagrado no n.º 1 artigo 7.º do Código de Conduta do ICAP.

– A mensagem publicitada e aqui em crise omite – enganosamente – requisitos essenciais para uma decisão negocial esclarecida do consumidor, conforme alínea a) e b) do n.º 1 do artigo 9.º do já identificado diploma legal, carecendo de veracidade conforme também estabelecido na alínea a) e b) do n.º 2 do artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP.

1.5.   Síntese da posição da parte denunciada

– Nos termos do artigo 10º do Regulamento do JE, cabe ao queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados, expor os fatos e a fundamentação, indicar as normas alegadamente infringidas e formular com clareza a sua pretensão.

– Ademais, para aferição da conformidade ou desconformidade de uma determinada comunicação comercial é necessário que a mensagem seja analisada no seu todo e não em apenas parte da mesma.

– A reclamante indica que a Vodafone utiliza como suporte publicitário, entre outros, um folheto em suporte físico.

– Ora, atento o plasmado no referido artigo 10º do Regulamento do JE, a presente queixa incide apenas no referido doc. 2, já que foi apenas este suporte junto aos autos e expressamente referido pela reclamante.

– Assim, o suporte em apreço – folheto em suporte físico – é destinado a novos Clientes do serviço da Vodafone prestado na tecnologia FIBRA.

– Este folheto é constituído por várias páginas, nas quais se pode encontrar:

a)   Referência ao âmbito do serviço e à tecnologia em que o mesmo é prestado;

b)   O preço, características e ofertas disponíveis para os dois packs do serviço (“Tv Net Voz” e “Tv Net Voz + Telemóvel”);c)   Funcionalidades disponíveis; d)   Descrição detalhada dos canais para cada um dos packs acima referidos; ee)   Indicação dos contatos onde é possível obter informações adicionais, nomeadamente o site da Vodafone, sito em www.vodafone.pt.

– Identificado o suporte, vejamos então quais os fatos referidos pela reclamante que, na sua opinião, fundamentam a alegada desconformidade da comunicação comercial da Vodafone com os preceitos legais que regulam a atividade publicitária.

– Conforme facilmente a requerida constatou, resulta claro e evidente do suporte em apreço que o serviço da Vodafone disponibiliza mais de 100 canais!

– Aliás, para sermos mais precisos – e porque tal resulta evidente do referido suporte publicitário – o serviço permite o acesso a 108 canais, sendo 88 canais de Tv, 6 canais de Tv interativos e 14 canais de rádio.

– Assim, também conforme facilmente a requerida constatou pela análise da informação disponível no folheto, os 100 canais não são APENAS de televisão.

– Ao contrário do que a reclamante pretende fazer crer, em lado algum do suporte em apreço a Vodafone pretende dar a entender que o cliente terá acesso a mais de 100 canais APENAS de televisão (o que, aliás, ao contrário do que parece ser o entendimento da reclamante, tal não se traduziria numa vantagem mas sim numa ENORME desvantagem competitiva, pois é sabido que os canais alternativos como os de rádio, jogos e interativos são cada vez mais apreciados, principalmente pelos jovens).

– Com efeito, a comunicação comercial em apreço indica “canais” e não “canais de tv” e, ainda, na última página do folheto são indicados TODOS os canais disponíveis, sendo que os mesmos estão CLARAMENTE identificados e devidamente diferenciados por categoria, por côr e por simbologia:

a)   “i” de interativo; b)   “HQ” de High Quality;c)   “HD” de High Definition; ed)   “Fm” de Rádio

– Pelo exposto, o fato supra descrito pela reclamante não constitui qualquer violação das regras que regulam a atividade publicitária já que a afirmação da Vodafone é objetiva e totalmente verdadeira, conforme ficou devidamente evidenciado!

– Aliás, tal como a reclamante não teve qualquer dificuldade em compreender a mensagem comercial veiculada pela Vodafone, também qualquer consumidor médio conseguirá tal resultado, basta para o efeito, ler o panfleto que lhe foi fornecido pela Vodafone – o que aliás, é a sua obrigação.

– Com efeito, tal como a requerente, qualquer consumidor médio é capaz de ler a comunicação da Vodafone e verificar que, efetivamente, os canais indicados não são APENAS canais de Tv.

– Na verdade, qualquer consumidor médio é capaz de ler e interpretar a última página do folheto, onde estão claramente identificados os canais disponíveis e, ao mesmo tempo, compreender que, por exemplo, o canal de trailers de videoclube, o canal de Karaoke, o canal de jogos e o canal da TSF não são canais de Televisão, no sentido de emitirem emissões típicas de um canal de televisão.

– Quanto a este fato, («De referir ainda que caso o consumidor pretenda usufruir da oferta de € 25: € 20 videoclube + € 5 karaoke é necessário que alugue  ao anunciante um equipamento denominado TvBox, o que acarretará um encargo mensal de 4,50€ ou 5,50€, caso do serviço de televisão ser prestado através da tecnologia de ADSL ou Fibra respetivamente.») desde logo se constata que a reclamante volta a alegar algo que NÃO encontra no suporte em apreço.

– Desde logo, a diferenciação do valor da TvBox em nada está relacionado com o fato do serviço ser prestado com a tecnologia ADSL ou Fibra, pois como se disse no artigo 6º e consta da PRIMEIRA página do folheto, esta comunicação comercial destina-se a publicitar o serviço prestado na tecnologia FIBRA e não na tecnologia ADSL!- Aliás, a diferenciação do preço está indicada na segunda página do panfleto, onde se informa o preço das TvBoxes, sendo que a TV Box HD DVR (portanto, com gravador), tem um custo de € 5,50 e a TvBox HD (portanto, sem gravador), tem um custo de € 4,50.

– Ademais, não se compreende o entendimento da reclamante segundo o qual a oferta implica o aluguer de uma TvBox.

– Desde logo, porque conforme se pode verificar na segunda página do folheto em apreço, existem dois packs, um que inclui “telemóvel” e outro que não, sendo que cada um deles pode ser prestado SEM TvBox.

– Além disso, conforme indicado na mesma página do folheto o pack com “telemóvel” tem uma TvBox incluída.

– Acresce que também na mesma folha do folheto se pode verificar que a referida oferta está descrita junto à informação relativa ao pack “TvNetVoz+Telemóvel”, estando os dois packs devidamente separados por uma linha.

– Ainda assim, apesar de ser lógico que a oferta de videoclube e karaoke seja, naturalmente, destinada para quem tem a possibilidade de usar o serviço, (no caso, os subscritores do pack “TvNetVoz+Telemóvel” a Vodafone também atribui tal oferta a quem subscreva o pack “TvNetVoz” e pretenda alugar uma TvBox.

– Além disso, também não corresponde à verdade que a utilização de videoclube esteja restrita à visualização de filmes numa TvBox.

– Com efeito, as tecnologias evoluem e atualmente já é perfeitamente possível (e muito comum) alugar filmes do Videoclube e ver os mesmos em outras plataformas, por exemplo, acedendo através de https://tvnetvoz.vodafone.pt/sempre-consigo/  num computador, ou através de uma APP Vodafone TVNETVOZ através de um Tablet ou até um simples smartphone.

– Pelo que, resulta completamente falso o fato alegado pela reclamante!

– Quanto ao serviço de Internet (…) mais uma vez se constata que a reclamante volta a alegar algo que NÃO encontra no suporte em apreço.

– Na verdade, o suporte em apreço indica velocidade de 50 Mbps e não “até” 50 Mbps.

– Recordamos, novamente, que o folheto em apreço diz respeito à prestação do serviço na tecnologia FIBRA e não ADSL!

– E, é sabido que, as redes fixas de nova geração que disponibilizam acessos de alta velocidade são, actualmente, suportadas em fibra óptica (FTTH/FTTB) e em redes de distribuição de TV por cabo que recorram ao standard EuroDOCSIS 3.0.

– Acresce que as alegadas “condições contratuais” referidas pela reclamante – apesar de as não ter junto aos autos – as quais alertam para as eventuais limitações do serviço dizem respeito, mormente, ao serviço prestado na tecnologia ADSL, pois como é do conhecimento comum, a FIBRA instalada até à casa do Cliente não está sujeita aos mesmos constrangimentos que o ADSL.

– Com efeito, ao contrário do ADSL em que a velocidade pode variar muito e não será superior a 24Mbps, a velocidade na tecnologia Fibra não está condicionada, existindo garantia da velocidade contratada.

– Na verdade, a Vodafone GARANTE um mínimo de velocidade de 50Mbps no serviço FIBRA e é isso que indica na comunicação comercial em apreço.

– Note-se, que a terceira página do folheto indica “velocidade até 1 Gbps”. Aqui sim, podem existir condições que impeçam o alcance de tal velocidade. Por exemplo, não se encontra disponível no mercado computadores que permitam um débito de 1Gbps, dado que as portas de rede (RJ45 GIGA) que acompanham os computadores topo de gama só atingem, na teoria, a velocidade de 1Gbps, situação que não acontece quanto aos referidos 50Mbps.

– Aliás, este fato é reconhecido pelos próprios utilizadores, conforme se pode verificar em diversos fóruns tecnológicos – dos quais destacamos o forum.zwame.pt – fórum tecnológico de referência em que é comummente aceite que a Fibra da Vodafone disponibiliza mais do que a velocidade contratada: (doc. 4 e doc 5).

– Acresce que, embora esta questão não tenha sido suscitada pela reclamante, mas para que não subsista qualquer tipo de duvida, o tráfego é efetivamente ilimitado, sem qualquer politica de restrição de qualidade, velocidade ou priorização de tráfego (exp. Traffic shaping, port blocking ou speedthrottling).

– Do supra exposto resulta, inequivocamente, que TODOS os fatos alegados pela reclamante são completamente infundados, sendo que a comunicação em apreço está conforme as regras e princípios que regulam a atividade publicitária (…) pelo que, não atenta, de forma alguma contra aqueles que são os direitos dos consumidores.

– A comunicação comercial divulgada pela Vodafone não contém qualquer omissão ou ambiguidade que seja passível de confundir ou enganar o destinatário.

– O folheto reúne, detalhadamente e de forma objetiva toda a informação necessária à tomada de decisão de compra informada por parte do consumidor, não induzindo nem sendo suscetível de o induzir em erro.

– Note-se, que para se aferir o impacto de uma mensagem publicitária, e se esta é susceptível de induzir em erro um consumidor, deve tomar-se como referência a presumível expectativa de um consumidor médio (conforme resulta do n.º 2 do artigo 5º do DL 57/2008, de 26 de Março).

– E, no caso vertente, dada a informação disponível no suporte em apreço, qualquer consumidor é capaz de obter as informações de que precisa para contratar de forma consciente.

– Sendo que, no caso vertente, ao contrário do que pretendeu fazer crer a reclamante, não há qualquer margem para eventuais interpretações erróneas transmitidas pela mensagem comercial da Vodafone já que esta é objetiva e verdadeira!

– Desta forma, a comunicação comercial da Vodafone não consubstancia qualquer prática comercial desleal, não viola qualquer norma do Código de Conduta do ICAP, nem qualquer regra do Código da Publicidade.

2.   Enquadramento e fundamentação ético-legal

Concorda-se com a denunciada quando esta afirma que, para aferição da conformidade ou desconformidade de uma determinada comunicação comercial é necessário que a mensagem seja analisada no seu todo e não em apenas parte da mesma.

É com esse espírito e, nomeadamente, pelo facto de se tratar de um folheto – logo passível de ser atentamente lido pelo consumidor – que este Júri analisou a mensagem controvertida.

Incidindo a presente queixa no referido doc. 2, já que foi apenas este suporte junto aos autos e expressamente referido pela reclamante, importa então verificar da legalidade e da conformidade do mesmo com as normas em vigor.

Este folheto destina-se, de acordo com a denunciada, a novos Clientes do serviço da Vodafone prestado na tecnologia FIBRA e contém várias páginas, nas quais se pode encontrar nas quais, na verdade, se podem encontrar dizeres referentes a:

a)   Ao âmbito do serviço e à tecnologia em que o mesmo é prestado;

b)   Ao preço, características e ofertas disponíveis para os dois packs do serviço (“Tv Net Voz” e “Tv Net Voz + Telemóvel”);

c)   Às funcionalidades disponíveis; d)   À descrição detalhada dos canais para cada um dos packs acima referidos; ee)   À indicação dos contatos onde é possível obter informações adicionais, nomeadamente o site da Vodafone, sito em www.vodafone.pt.

Os factos objecto da queixa dizem respeito ao serviço de televisão e à frase a:
«Este serviço, conforme anunciado, inclui mais de 100 canais.
No entanto, pelo preço publicitado, o anunciante disponibiliza mais de 100 canais onde se inclui os canais de rádio e interativos, pelo que os referidos 100 canais não são apenas de televisão.».

Da leitura do folheto constata-se que, na verdade, o serviço da Vodafone disponibiliza mais de 100 canais, sendo 88 canais de Tv, 6 canais de Tv interativos e 14 canais de rádio ou seja, não são apenas canais de televisão pelo que não convence o argumento da queixosa na leitura que o consumidor médio possa fazer relativamente à comunicação em causa.

Também no que tange ao preço (oferta de € 25: € 20 videoclube + € 5 karaoke), igualmente aqui se nos afigura como não assistindo razão à queixosa já que a diferenciação do preço está indicada na segunda página do panfleto, onde se informa o preço das TvBoxes, sendo que a TV Box HD DVR (portanto, com gravador), tem um custo de € 5,50 e a TvBox HD (portanto, sem gravador), tem um custo de € 4,50.

O mesmo se passa, também no que se refere à questão do aluguer de uma TvBox porquanto, igualmente, aqui se pode verificar que existem dois packs, um que inclui “telemóvel” e outro que não, sendo que cada um deles pode ser prestado SEM TvBox.

Não procedem, igualmente, as acusações relativas ao facto da utilização de videoclube estar restrita à visualização de filmes numa TvBox e de condições de serviço de Internet porquanto devidamente esclarecidas no folheto e nos documentos juntos pela denunciada.

3. Decisão

Termos em que a 1ª Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da VODAFONE não viola o disposto nos artigos n.º 1 do artigo 10.º, 11.º e 12.º do Código da Publicidade e nos artigos 7.º e 9.º da Lei de Defesa do Consumidor, bem como n.º 1 artigo 7.º, na alínea a) e b) do n.º 2 do artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP.

O Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação3J / 2015 :: DECO vs. Vodafone
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2J / 2015 :: Unilever Jerónimo Martins vs. Henkel Ibérica Portugal

2J/2015

Unilever Jerónimo Martins
vs.
Henkel Ibérica Portugal

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no décimo nono dia do mês de Junho do ano de dois mil e quinze, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 2J/2015 tendo deliberado o seguinte:

Processo nº 2J/2015

1.   Objecto dos Autos

A UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, Lda., (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por UNILEVER ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a HENKEL IBÉRICA PORTUGAL, UNIPESSOAL LDA., adiante indiscriminada e abreviadamente designada por HENKEL ou Requerida), relativamente a comunicação comercial ao detergente para máquina de lavagem de roupa Persil, promovida pela última em suporte televisão, por alegada violação dos artigos 9.º e 15.º do Código de Conduta do ICAP, bem como dos artigos 14.º, n.º 2 e 16.º, n.º 2, alíneas a) e) e g) do Código da Publicidade e 7.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março.

Notificada para o efeito, a HENKEL não apresentou contestação.

Dão-se por reproduzidas a queixa e os documentos apresentados pela Requerente.

1.1. Questão prévia

1.1.1. Em requerimento da HENKEL datado de dia 15 de junho de 2015, e dirigido à Presidente do Júri, invoca-se o alegado dever de:

-a) se “…declarar a nulidade decorrente da falta de notificação da petição apresentada pela Unilever também na pessoa do mandatário constituído pela Henkel e; em todo o caso,

-b) conceder à Henkel prazo de 5 dias úteis para apresentar a sua contestação, a partir do (…) primeiro dia útil seguinte após o dia no qual a Henkel e o seu mandatário constituído tiveram conhecimento da petição…”.  (sic.), tal, com fundamento nos motivos que se resumem:

– (i) Apesar de “…segundo o aviso de receção (…) ter sido remetida no dia 2 de junho de 2015 e ter sido rececionada pelos serviços de segurança do edifício onde a Henkel tem a sua sede no dia 3 de junho de 2015, só (…) dia 15 de junho de 2015, a Henkel teve conhecimento da petição apresentada pela ‘Unilever Jerónimo Martins, Lda.’” (sic. ponto 1.) “…nos termos da carta (enviada em envelope com “janela”), para: “Henkel Ibérica, SA A/C Dra. Luísa Oliveira” (sic. ponto 3.) que “…esteve ausente do escritório de 4 a 14 de junho de 2015 – v. o Doc. n.º 1” (sic. ponto 4.);

– (ii) “…tendo em conta a forma como a correspondência em causa estava dirigida – a uma pessoa singular específica dentro da empresa -, a mesma não foi aberta por mais ninguém” (sic. ponto 5.) e “…a optar-se por esta solução (notificação dirigida à pessoa singular concretamente responsável pelo assunto, nos termos previamente indicados no quadro da mediação), então devia-se ter procedido, também, necessariamente, à notificação do advogado signatário” (sic. ponto 10.) “Que interveio no referido ato de mediação e que, logo no início da diligência, entregou, em mão, uma procuração.” (sic. ponto 11.);

– (iii) “…pela leitura do artigo 11.º, n.ºs 1 e 2, do Regulamento do Júri de Ética é inequívoco que a parte contra quem a queixa é dirigida é chamada a defender-se por via de notificação (e não de citação)” (sic. ponto 12.) e, “… quando a parte já tenha constituído mandatário, as notificações devem ser dirigidas ou só a este ou também a este” (sic. ponto 13.) dado que “É este um princípio geral de direito processual que tem, de resto, acolhimento expresso no artigo 247.º do Código de Processo Civil (o qual, na falta de regra específica sobre a matéria, contida no acima referido RJE, tem de se considerar aplicável in casu).” (sic. ponto 14.);

– (iv) “Assim sendo, a falta de notificação dirigida ao advogado signatário constitui omissão de uma formalidade essencial (notificação da petição também na pessoa do mandatário já constituído), sendo que a irregularidade cometida pode influir no exame ou na decisão da causa  (…) de facto, desde o dia 3 de junho de 2015 decorreu já o prazo de 5 dias úteis de que a Henkel disporia para se defender, pelo que, nos termos do artigo 11.º, n.º 1, do RJE, a defesa que apresentasse agora poderia ser desconsiderada, o que naturalmente é passível de distorcer o sentido de uma decisão final que viesse a ser (ilegalmente) proferida e que assentaria com grande grau de probabilidade numa perspetiva estritamente unilateral do caso.” (sic. ponto 16.) e “Desta forma, a omissão em causa gera nulidade, a qual expressamente e para todos os efeitos se argui.” (sic. ponto 17.).

1.1.2. O requerido pela HENKEL foi indeferido pelas razões que foram objeto de conhecimento pela Requerida em resposta de 16 de Junho de 2015 ao seu requerimento, e que nesta sede se resumem:

– (i) Está-se, aqui, no âmbito da autoregulação. Ora, esta possui um processo próprio o qual, entre outros fundamentos, se encontra em coerência com um nível de celeridade processual que não faça resvalar o nome da dita, para uma contradição de termos;

– (ii) Com efeito, normas existem e terminologia é encontrada no Regulamento do JE, que não correspondem às que constam do Código de Processo Civil: verifica-se a desformalização e a simplificação, fazendo-se jus ao referido princípio da celeridade;

– (iii) Por maioria de razão, e para o efeito que ora é relevante, consigna-se no artigo 11.º do Regulamento um regime próprio,  não equivalendo o termo notificação ao que se encontra no seio do Código de Processo Civil. Logo, não se aplica subsidiariamente o respetivo artigo 247.º;

– (iv) Aliás, em sede de autoregulação, só se justificará a aplicação subsidiária invocada pela HENKEL em casos circunscritos e ao jeito de “última subsidariedade”, se se verificar a total impossibilidade de preenchimento de lacunas através das normas que orientam a primeira, o que ora não se verifica;

– (v) O que leva à conclusão de que o facto de ter existido uma mediação em data anterior não pressupõe a inaplicabilidade do artigo 11.º, n.ºs 1 e 2 do Regulamento do JE ou, sequer, a presunção de existência de uma lacuna que justifique o chamamento das normas de processo civil ao caso;

– (vi) Assim, nos termos do referido preceito – sobre a epígrafe “Contestação” – dispõe-se somente que a Parte ou as Partes devem ser notificadas, e tal foi o que aconteceu no caso presente: a HENKEL recebeu a notificação para contestar a 3 de junho do corrente;- (vii) De onde, com o devido respeito, a notificação do Advogado presente na mediação que antecedeu a interposição da queixa 2J/2015 por parte da Unilever não configura um imperativo de natureza processual no âmbito da autoregulação;

– (viii) Mais, ao contrário do que se alega a ponto 10. do requerimento da HENKEL, o ICAP não optou pela “…solução (notificação dirigida à pessoa singular concretamente responsável pelo assunto, nos termos previamente indicados no quadro da mediação)” e, logo, não devia “…ter procedido, também, necessariamente, à notificação do advogado signatário”. (sic);

– (ix) Na realidade (tal como se refere a pontos 2. e 3. do requerimento) o secretariado do ICAP remeteu a carta à pessoa coletiva HENKEL, de acordo com o disposto no artigo 11.º, n.º 1 do Regulamento do JE, e ao cuidado da Responsável pela sua divisão de detergentes o que, de acordo com o que tem sido largamente considerado pela jurisprudência, deve ser entendido como tendo sido a mesma pessoa coletiva HENKEL a recebê-la;

– (x) Assim, a carta contendo a petição da UNILEVER não foi enviada a uma pessoa singular específica, pelo que deveria ter sido aberta por “alguém” da HENKEL, diversamente do que se sustenta a pontos 5. e 6. do requerimento;

– (xi) Acresce que, a carta em apreço foi recebida na HENKEL a 3 de junho (segundo site dos CTT, muito provavelmente antes das 15h00m) e as férias da Responsável pela respetiva divisão de detergentes foram iniciadas a 4, ou seja, no dia seguinte.

1.1.3. Apesar do teor da resposta ao requerimento de arguição de nulidade interposto pela HENKEL, nos termos expostos, a última, a 16 de Junho, veio requerer ao Júri que tome em consideração sete documentos apresentados na mesma data, o que entende poder “inequivocamente” fazer (cfr. ponto 6. do novo requerimento) acrescentando que, “se a ratio do regime (…) é garantir um elevado “nível de celeridade processual”, então a apresentação de documentos, nesta fase, não contradizendo esse objetivo, tem de ser aceite…” (sic. ponto 12.) e argumentando ainda, em síntese, que:

– (i) “…de facto, os documentos são apresentados hoje, dia 16 de junho de 2015, e, segundo informação obtida junto desse ICAP, a queixa só deverá ser decidida no dia 17 de junho (ou mesmo em data posterior).” (sic. ponto 12., negrito e sublinhado do Júri);

– (ii) “Ou seja, a apresentação dos documentos não bule com a tomada de decisão e com a desejada celeridade do processo.” (sic. ponto 13.);

– (iii) “…é esta interpretação, que aqui se expõe, a única que está em linha com o artigo 15.º, n.º 5, do Regulamento, onde se diz que “[a]penas serão admitidas novas provas se comprovadamente não puderam ter sido apresentadas perante a Secção.” (sic. ponto 14.);

– (iv) “O Regulamento do JE e, concretamente o seu artigo 11.º, é omisso quanto a prazos de entrega de documentos sem contestação.” (Cfr. pontos 6. a 10.);

– (v) “Nada se dizendo, não existe motivo válido para não se aceitar documentos apresentados em momento posterior ao termo do prazo para apresentação de contestação, quando esta é omissa, desde logo porque isso seria coartar um direito de defesa sem norma expressa a prevê-lo, o que naturalmente colide com os mais elementares princípios do direito” (sic. ponto 11.);

– (vi) “…é ainda manifesto que se o artigo 12.º do Regulamento admite a realização de diligências complementares, então tem também de admitir a hipótese de poderem ser juntos documentos em qualquer altura do processo de primeira instância, seja ou não a requerimento das partes (e, à cautela, para o caso de se entender que essa junção aos autos tem de ser requerida, fica aqui e por esta via expressamente formulado o respetivo requerimento.” (sic. ponto 18.).

1.1.4. A este segundo requerimento da HENKEL de 16 de junho de 2015, o Júri pouco terá a acrescentar ao que consubstanciou a resposta ao primeiro:

– (i) Não se concorda com a interpretação que a Requerida faz do artigo 11.º do Regulamento do JE, sendo o disposto no respetivo n.º 3 suficientemente claro sobre o prazo de apresentação de documentos probatórios: com a contestação;

– (ii) O disposto no artigo 15.º, n.º 5, do Regulamento refere-se a provas que, comprovadamente não puderam ter sido apresentadas perante a Secção, o que não é o caso, tal como já se tinha referido na resposta de indeferimento dada ao primeiro requerimento da HENKEL;

– (iii) Não é de forma alguma “…manifesto que se o artigo 12.º do Regulamento admite a realização de diligências complementares, então tem também de admitir a hipótese de poderem ser juntos documentos em qualquer altura do processo de primeira instância” (sic. ponto 18.), já que tais diligências têm que ser solicitadas pelo Júri em casos circunscritos –  os quais, por razões de economia, a HENKEL, dispensará o JE de elencar –  mas que, creia a Requerida, não se prendem sequer remotamente com o presente.
De onde, o Júri não tomará em consideração os sete documentos apresentados pela HENKEL a 16 de Junho de 2015, ou seja, três dias úteis após o termo do prazo para contestar.

1.1.5. Ao exposto, não quer o JE deixar de acrescentar três reparos.

Não obstante os já aludidos objetivos de desformalização e de simplificação pugnados em sede de autoregulação, o Regulamento do JE estará concebido com um mínimo de proficiência, não sendo provável que a sua redação permita fazer entrar por inúmeras janelas o que, nos termos da norma expressa do respetivo artigo 11.º, não poderá entrar pela porta sem prejuízo algum do exercício do contraditório e, antes, em prol deste.

Por maioria de razão, mal se entende a afirmação feita pela HENKEL no sentido de que a aplicação do mesmo por parte do Júri “…. seria coartar um direito de defesa sem norma expressa a prevê-lo, o que naturalmente colide com os mais elementares princípios do direito”. (Cfr. ponto 11. do requerimento de 16 de junho de 2015).

Em terceiro lugar – e não configurando claramente um fundamento do que ficou exposto e concluído – , tendo em conta o disposto no n.º 1 referido artigo 11.º do Regulamento do JE, e a bem da boa fé processual e do respeito pelas Partes, que é muito, permite-se o Júri discordar da HENKEL acerca da sua tão apurada evidência de ser este obrigado a aceitar documentos na véspera ou na ante-véspera de tomada de decisões em reunião por um coletivo (cfr. pontos 12. e 13. do requerimento de 16 de Junho), quando é sabido que aquele delibera sobre uma proposta com prazo definido, ponderadamente redigida por um relator, e remetida ao ICAP bem como aos restantes membros da secção, em tempo.

Com efeito, também por esta razão, discorda veementemente o Júri da afirmação de que “se a ratio do regime (…) é garantir um elevado “nível de celeridade processual”, então a apresentação de documentos, nesta fase, não contradizendo esse objetivo, tem de ser aceite…” (sic. ponto 12. do requerimento da HENKEL de 16 de junho).

1.2. Dos factos

A HENKEL é responsável pela divulgação através de canais televisivos generalistas e por cabo, de um spot publicitário que visa a comunicação do seu produto Persil, detergente para máquina de lavagem de roupa. (Cfr. art.ºs 1.º e 2.º da queixa e DOC. 1 da mesma).

1.2.1. Das alegações publicitárias ou claims

Resulta da análise das peças processuais e dos documentos juntos pelas Partes, serem as seguintes, as alegações publicitárias ou claims sequenciais, objecto da questão controvertida (cfr. DOC. 1 em CD-ROM) junto à queixa:

– (i) Primeiro claim verbal de criança interveniente: “Esta é a minha mãe.”;

– (ii) Segundo claim verbal de criança interveniente: “Ela é do futuro!”;

– (iii) Terceiro claim verbal de criança interveniente: “Ela tem três pernas e quatro braços.”;

– (iv) Quarto claim verbal de criança interveniente: “Ela pode jogar ao computador o tempo que quiser.”;

– (v) Quinto claim verbal de criança interveniente: “Ela tem um robot para fazer umas misturas esquisitas.”;

– (vi) Primeiro claim verbal de adulto interveniente: “Neste caso a minha escolha também é uma mistura revolucionária.”;

– (vii) Primeiro claim verbal de locutor em voz off: “Novo Persil Power Mix Caps”;

– (viii) Segundo claim verbal de locutor em voz off: “Pela primeira vez, uma combinação de gel tira nódoas com potenciador em pó”;

– (ix) Terceiro claim verbal de locutor em voz off: “Na melhor cápsula do mercado” associado a duas alegações publicitárias e a um disclaimer:   – (ix. i) Primeira alegação publicitária visual consubstanciada por legenda simultânea: “Na melhor cápsula do mercado”;-  (ix. ii) Segunda alegação publicitária visual traduzida por sequência de imagens de um gráfico com diversas cápsulas de detergentes concorrentes do produto Persil, entre os quais se encontra a de Skip (primeira da esquerda), comercializado pela UNILEVER (cfr. art.º 3.º da queixa), gráfico esse que é apresentado de forma progressiva, partindo todas as cápsulas concorrentes da mesma base e  evoluindo apenas a cápsula de Persil, de forma significativamente destacada relativamente às demais;-  (ix. iii) Disclaimer  “teste relativo à eficácia de lavagem nas nódoas” ;- (x) Segundo claim verbal de adulto interveniente: “Super limpo, super brilhante”;

– (xi) Sexto claim verbal de criança interveniente: “Super poderoso”;

– (xii) Terceiro claim verbal de adulto interveniente: “Novo Persil, a minha escolha moderna contra as nódoas”.

1.3. Das alegações da Requerente

Considera a UNILEVER em sede de queixa que a comunicação comercial da responsabilidade da HENKEL, para além de traduzir uma prática de publicidade comparativa ilícita, ofende os normativos ético-legais em vigor relativos ao princípio da veracidade e à publicidade que utiliza menores, pelas razões que, em síntese, se aduzem:

– (i) “São três as questões que a ULJM pretende submeter à apreciação do JE (…) a) utilização de crianças como protagonistas da comunicação comercial; b) A afirmação que pressupõe que PERSIL é o primeiro detergente do mercado que junta gel e pó (Pela primeira vez, uma combinação de gel tira nódoas com potenciador em pó); c) A comparação, com superioridade absoluta de PERSIL, com todos os seus concorrentes do mercado.” (sic. art.º 10.º);

– (ii) “O (…) Skip em cápsulas foi colocado em comercialização no dia 1 de Abril de 2015…” (sic. art.º 21.º), “Nessa altura, que a ULJM tenha conhecimento, não se encontravam no mercado cápsulas de Persil” (sic. art.º 22.º), “Mas ainda que nessa data existissem já (…) e que, como tal, se demonstre a precedência deste em relação a Skip, tal precedência não poderá remontar a mais do que um ou dois dias” (sic. art.º 23.º), “O que significa que, na prática, as ditas marcas chegaram ao mercado ao mesmo tempo, sendo como tal abusivo anunciar, com destaque, uma suposta precedência como uma qualidade distintiva do produto Persil.” (sic. art.º 24.º);

– (iii) “…a referência ao melhor detergente é complementada com um asterisco que remete para um texto de difícil leitura, onde se faz referência a um “teste relativo à eficácia de lavagem nas nódoas”, donde se pode presumir que a alegação publicitária diz apenas ou exclusivamente respeito a esse parâmetro…” (sic. art.º 47.º) mas, “…ainda que a HENKEL dispusesse de testes científicos que comprovassem uma eficácia substancialmente superior na remoção de nódoas (…) outros parâmetros de conceito de “melhor” teriam de ser comprovados, tais como o perfume, a suavidade da roupa, a facilidade de engomar, a manutenção das cores, a inexistência de resíduos de detergente na roupa, os efeitos na durabilidade da roupa ou outros” (sic. 48.º) e “…ainda que nos centremos apenas no parâmetro da eficácia na remoção das nódoas, não pode deixar de se considerar a comparação utilizada no anúncio de Persil como enganosa” (sic. art.º 49.º) porque “De acordo com os estudos levados a cabo (…) o produto Persil cápsulas anunciado não tem uma eficácia na remoção de nódoas significativamente superior à de Skip cápsulas, seu concorrente. (50.º);

– (iv) “…relativamente a esta categoria de produtos, o usual (…) é a utilização de alegações de paridade (como “imbatível”)” (sic. 52.º) já que, “O detergente Persil em cápsulas remove determinadas nódoas específicas de forma mais eficaz do que Skip em cápsulas, estando noutros tipos de nódoas a vantagem do lado de Skip”, (sic. art.º 55.º) e “É o que demonstram os testes realizados pela Unilever.” (sic. art.º 56.º).

2.   Enquadramento ético-legal

2.1. Da alegada violação das normas ético-legais em matéria de utilização de menores na mensagem publicitária

Refere a Requerente em sede de contestação que, “O anúncio ora em causa utiliza uma criança” (sic. art.º 11.º) a qual “… assume uma posição destacada, quer em termos de imagem, quer em termos de argumento, quer na narração do anúncio” (sic. art.º 12.º) e “Pretende (…) que o JE se pronuncie quanto à legalidade da utilização (…) ao abrigo do disposto no artigo 14.º, n.º 2 do Código da Publicidade” (sic. art.º 13.º).

De acordo com o disposto no citado n.º 2 do art.º 14º do Código da Publicidade, os menores só podem ser intervenientes principais nas mensagens publicitárias em que se verifique existir uma relação directa entre eles e o produto ou serviço veiculado.

2.1.1. Do conceito de interveniente principal

Antes de mais, cumpre ao Júri concluir sobre se a intervenção da menor interveniente na comunicação comercial em análise pode ser considerada como principal, dado que, em caso negativo, a mesma comunicação não se subsume no dispositivo em causa, -, sendo certo que não se está em presença de uma noção pertencente ao foro estritamente jurídico.
Interpretando a norma do n.º 2 do artigo 14.º do Código da Publicidade, à luz da respectiva ratio legis, crê o Júri que o conceito de “intervenção principal” na mensagem publicitária se apura de acordo com critérios de “quantidade”, e não, de “qualidade da intervenção”.

Com efeito, é hoje pacífico o entendimento de que uma criação publicitária, desde que original e exteriorizada – excepcionando-se os casos que se reportem à common law – é tida como obra, para efeitos da respectiva protecção jus-autoral. De onde, às criações publicitárias que reúnam tais requisitos positivos – mormente as televisivas – para além de se dever aplicar o quadro legal vigente em matéria de Direito de Autor, rejam, igualmente, as normas e critérios subjacentes a uma linguagem televisiva praticamente universal, a qual constitui, hoje, uma área de conhecimento científico a não menosprezar. Logo, em qualquer representação cénica ou encenação inserida na respectiva obra, quer teatral, quer audiovisual (neste último género se incluindo as cinematográficas e as televisivas, tanto de natureza editorial como publicitária), os conceitos de “interveniente principal”, de “interveniente secundário”, de “figurante” e de “figurante especial”, encontram-se definidos no seio das áreas de estudo que ficaram referidas.

Assim, quer o JE salientar que, um interveniente numa encenação não se torna “principal” porque não existam outros ou porque só exista mais um: ele é principal de acordo com a existência ou não de actuação suportada por uma caracterização física e psicológica – mínima que seja e, na publicidade, é-o geralmente -, em ordem a representar uma “personagem actuante”.

No que tange ao caso vertente, está o Júri perante a análise dos elementos de uma encenação, objecto, talvez, de story board e de shooting board prévios, na qual a participação de uma criança que aparenta possuir entre nove a onze anos de idade, à luz do exposto, terá que ser classificada como “intervenção principal”. Dito de outra forma, não se está em presença de uma “intervenção secundária”, de uma mera “figuração” ou mesmo, de uma “figuração especial”, na aceção de uma linguagem ou semântica teatral, cinematográfica ou televisiva.

Assim, entende o Júri que, a criança interveniente na campanha publicitária televisiva em apreço assume a qualidade de interveniente principal, porquanto representa um “tipo simbólico”, cuja imprescindibilidade assenta no facto de o pequeno “enredo” não ser possível sem aquela. (Cfr. DOC. 1 da petição).

Militando no sentido de tal conclusão, atenda-se ao conteúdo aos claims verbais que constituem as seis falas da criança em apreço, e vertidos a ponto 1.2.1.: (i) “Esta é a minha mãe.”; (ii) “Ela é do futuro!”; (iii) “Ela tem três pernas e quatro braços”; (iv) “Ela pode jogar ao computador o tempo que quiser”; (v) “Ela tem um robot para fazer umas misturas esquisitas” e (vi) “Super poderoso” associados a toda uma simbologia visual de admiração e carinho por uma mãe, para cuja “espetacularidade” a dita criança se torna o álibi.

2.1.2. Do conceito de relação directa entre o menor e o produto publicitado

O assaz genérico e subjetivo conceito de “relação direta” utilizado no n.º 2 do artigo 14.º do Código da Publicidade coloca problemas de índole técnico-jurídica. Tem constituído entendimento do Júri que, a intervenção de menores na publicidade deve ser permitida ainda que os produtos ou serviços anunciados não lhes sejam “especialmente destinados”, caso se possa estabelecer uma “ligação directa” (não necessariamente exclusiva), entre o produto, bem ou serviço publicitado e os mesmos menores, estabelecimento esse, que variará conforme:

– (i) a faixa etária que estiver em causa;

– (ii) o elo de ligação passível de ser estabelecido entre benefícios a retirar da utilização do produto, bem ou serviço comunicado para a faixa etária a que pertence o interveniente principal menor.

A criança média, normalmente informada e razoavelmente atenta e advertida de nove a onze anos, demonstra interesse em não vestir roupa com nódoas. Contudo, nesta faixa etária, e até sensivelmente aos doze anos, as crianças entendem sobretudo a publicidade como uma forma de entretenimento, e não crê o Júri que as mesmas dêem atenção às marcas ou aos tipos de detergentes que, em termos de supremacia e comparativamente, atingem o objetivo de “descanso e disponibilidade” das “assim super” mães, como acontece no caso em análise. Com efeito, não se aperceberão de que a capsula Persil propicia mais disponibilidade à progenitora para outras tarefas do que as outras cápsulas concorrentes, ou de que a sua roupa não possui nódoas por virtude do uso das cápsulas Persil, em detrimento das marcas concorrentes…Um e outro, os objetivos da comunicação em análise em que a menor, que aparenta ter entre nove a onze anos e idade, é interveniente simbólica indispensável.  Pelo exposto, e de par com o que se estabeleceu no ponto anterior acerca da associação entre claims verbais e signos de natureza visual representativos de admiração e carinho por uma mãe que “escolhe a cápsula de detergente certa para a roupa em prol da sua disponibilidade”, entende o Júri que a intervenção principal da menor cabe no conceito de “criança-álibi”, o que determina a ausência do requisito “relação direta” entre aquela e o produto comunicado.

2.1.3. Da prática de publicidade testemunhal por menor de idade sem o estabelecimento do requisito de relação direta

Reforçando o que se concluiu no ponto anterior, entende o JE que constitui um caso de publicidade testemunhal, o sexto claim verbal proferido pela menor interveniente na comunicação comercial da responsabilidade da HENKEL. Refere-se o Júri ao depoimento “Super poderoso” este, associado a sequência em que se visualizam “filha e mãe” em atitude de deslumbramento pelos alegados resultados de Persil numa peça de roupa.

Nos termos do artigo 17.º, n.º 1 do Código de Conduta do ICAP, sob a epígrafe “Testemunhos”, “A comunicação comercial não deve reproduzir (…) qualquer testemunho que não seja genuíno, responsável, verificável e pertinente…”.

Ora, por maioria de razão do que se expendeu nos pontos anteriores, o depoimento da criança, interveniente principal no spot publicitário, feito no sentido de ser o Persil “Super poderoso”, configura um testemunho despersonalizado que prima pela ausência de genuinidade e pertinência.

2.1.4. Conclusão

Em coerência com as conclusões retiradas até aqui, entende o Júri que a comunicação comercial da responsabilidade da Requerida se encontra em desconformidade com o disposto nos artigos 4.º e 17.º, n.ºs 1, do Código de Conduta do ICAP e 14.º, n.º 2 do Código da Publicidade.

2.2. Da alegada prática de publicidade enganosa

Em conformidade com o artigo 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do Código de Conduta do ICAP, sob a epígrafe “Veracidade”, “A comunicação comercial deve ser verdadeira e não enganosa” (n.º 1) e deve proscrever qualquer declaração ou tratamento auditivo ou visual que seja de natureza a, directa ou indirectamente, mediante omissões, ambiguidades ou exageros, induzir, ou ser susceptível de induzir, em erro o consumidor, designadamente no que respeita a: (2) características essenciais do produto ou que sejam determinantes para influenciar a escolha do consumidor, como por exemplo, (…) eficácia e desempenho…” (a)).

Esta norma ética encontra-se em consonância com o disposto no artigo 10.º do Código da Publicidade, segundo o qual a publicidade “…deve respeitar a verdade, não deformando os factos” (cfr. n.º1), devendo as “…afirmações relativas à origem, natureza, composição e condições de aquisição dos bens ou serviços publicitados…” ser “…exactas e passíveis de prova, a todo o momento, perante as instâncias competentes” (cfr. n.º 2.), considerando-se publicidade enganosa em sede do n.º 1 do artigo 11.º daquele diploma legal, aquela que o seja ”…nos termos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março, relativo às práticas comerciais desleais das empresas nas relações com os consumidores.”

De acordo com o n.º 1, alínea b) do artigo 7.º do Decreto-Lei referido supra, “É enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo…”, tais como as características principais do bem ou serviço, designadamente as suas vantagens, a sua eficácia e os resultados que podem ser esperados da sua utilização, preceito legal que encontra correspondência no artigo 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do Código de Conduta do ICAP.

Por seu turno, nos termos do disposto no artigo 12.º do mesmo Código de Conduta, “As descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser susceptíveis de comprovação”. (1) e “Esta comprovação deve estar disponível de maneira que a prova possa ser prontamente apresentada por mera solicitação do ICAP”. (2).

Por outro lado, nos termos da conjugação dos artigos art.ºs 2.º, alínea b), 3.º, n.ºs 2, 3 e 5 , 5.º, 9.º, n.ºs 1 e 2 e 12.º do Código de Conduta do ICAP e 10.º, e 11.º, n.ºs 1 e 3 do Código da publicidade, não só o entendimento que o consumidor médio é susceptível de fazer em relação a uma comunicação comercial é susceptível de comprovação, como à Requerente assiste o direito de inversão do ónus da prova.

Analisada a comunicação comercial da Requerida, conclui o JE que assiste razão à Requerente quanto ao afirmado em sede de contestação, no sentido de que: “Tal comprovação deverá abranger toda a extensão da alegação publicitária em causa, isto é: a. Deve comprovar que se comparou com todos os detergentes em cápsulas presentes no mercado português, pois só assim pode fundamentar a comparação de superioridade absoluta; b. Deve comprovar que é melhor relativamente a todas e quaisquer características do produto e não apenas em algumas circunstâncias, porquanto o anúncio em causa afirma sem margem para dúvidas tratar-se da melhor cápsula do mercado; c. Deve comprovar que a vantagem do detergente Persil em cápsulas em todas as referidas circunstâncias é muito significativa, porquanto essa é a mensagem transmitida pelo gráfico que é apresentado aos consumidores.” (sic. art.º 43.º).

Tal entendimento não fica prejudicado pelo facto de considerar o Júri que os DOCS. 3 e 4, juntos à petição pela Requerente, não permitem comprovar qualquer paridade entre os produtos da UNILEVER e da HENKEL que se encontram em causa porquanto, para além de os estudos de laboratório a que se reportam não terem sido efetuados por uma entidade independente, carecem de relatório. De qualquer forma, não é sobre a Requerente que impende o ónus da prova e sim, sobre a Requerida.

Ora, em coerência, entende o Júri que, por ausência de contestação por parte da HENKEL esta, por referência aos parâmetros que se passarão a expor, não logrou comprovar a veracidade de toda a extensão de significado das seguintes alegações publicitárias (cfr. 1.2.1. e DOC 1. junto à petição):

– “Novo Persil Power Mix Caps”; “Pela primeira vez, uma combinação de gel tira nódoas com potenciador em pó”;

– “Na melhor cápsula do mercado”.

Com efeito, os claims “Novo Persil Power Mix Caps”; “Pela primeira vez, uma combinação de gel tira nódoas com potenciador em pó” são de molde a criar a convicção junto do consumidor médio, razoavelmente atento esclarecido e informado, “…de que o produto anunciado é inovador, na medida em que foi o primeiro produto que combina o detergente em gel com o detergente em pó” (cfr. art.º 17.º da petição), não só antes do equivalente da UNILEVER – que, comprovadamente, foi colocado em comercialização no dia 1 de Abril de 2015 (Cfr. DOC. 2 junto à queixa)  – como, pelos da restante concorrência, o que carece de comprovação. Tal, através de uma amostra significativa que teria que abarcar todas as marcas cujos sinais distintivos se possam confundir com os elementos e claims visuais constantes do gráfico que pretende comunicar a alegada superioridade da cápsula Persil. (Cfr. DOC. 1 junto à queixa). Isto, já que a comunicação comercial tem que ser analisada como um todo.

Por outro lado, atenda-se ao facto de estarmos em presença de uma prática de publicidade comparativa explícita de tom exclusivo , no que tange ao claim, “Na melhor cápsula do mercado”. Independentemente da questão da ausência de prova – que deveria incidir sobre a alegada supremacia exclusiva em relação à totalidade da concorrência, nos mesmos termos e pelas razões que o Júri referiu quanto às alegações “Novo Persil Power Mix Caps”; “Pela primeira vez, uma combinação de gel tira nódoas com potenciador em pó” -, verifica-se, em qualquer circunstância, uma desconformidade com o disposto no artigo 9.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Decreto-lei n.º 57/2008.

Dito de outra forma, conclui Júri pela existência de uma prática de publicidade enganosa por omissão que abrange:

– (i) a ilegibilidade do disclaimer relativo à alegação “Na melhor cápsula do mercado” identificado através de um asterisco que remete para um texto onde se faz referência a um “teste relativo à eficácia de lavagem nas nódoas” (cfr. art.º 47.º da petição), o que fará com que o destinatário da comunicação creia que a alegada superioridade de Persil se reporta, não só ao parâmetro remoção de nódoas mas, igualmente, a outros parâmetros de conceito de “melhor”, tais como a alegada inovação, o perfume, a suavidade da roupa, a facilidade de engomar, a manutenção das cores, a inexistência de resíduos de detergente na roupa, os efeitos na durabilidade da roupa ou outros, todos, a carecerem de comprovação (cfr. art.º 48.º da queixa) e, não se aplicando aqui, a exceção prevista no n.º 2 do artigo 9.º do Decreto-lei n.º 57/2008;

– (ii) os claims visuais traduzidos por sequência de imagens de um gráfico com diversas cápsulas de detergentes concorrentes do produto Persil, entre os quais se encontra a de Skip (primeira da esquerda), comercializada pela UNILEVER (cfr. art.º 3.º da queixa), gráfico esse apresentado de forma progressiva – partindo todas as cápsulas concorrentes da mesma base e evoluindo apenas a cápsula de Persil, de forma significativamente destacada relativamente às demais (cfr. DOC. 1 da petição) – e “parando com medidas” que, a olho nu, permitem crer que o produto da HENKEL é, em mais de 50%, superior ao da UNILEVER. Tal, sem qualquer escala ou ordem de valores percentuais aposta nos vários elementos figurativos que representam a concorrência – e com a qual a Persil se compara explicitamente  – utilizando uma espécie de fantasia gráfica com tamanhos que parecem aleatórios, a qual não se coaduna com a obrigação de habilitar o destinatário com à perceção do alegado grau de superioridade das cápsulas Persil. Mais, tão pouco, se conforma com os requisitos de objetividade e suscetibilidade de comprovação exigíveis em sede de princípio da veracidade e de práticas de publicidade comparativa.

Pelo exposto, entende o Júri que a comunicação comercial da responsabilidade da HENKEL configura um caso de publicidade enganosa, por desconformidade com o disposto nos artigos nos artigos 4.º, n.º 1, 9.º, n. ºs 1 e 2, alínea a) e 12.º do Código de Conduta do ICAP, bem como nos artigos 7.º, n.º 1, alínea b) e 9.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março.

2.3. Da alegada prática de publicidade comparativa ilícita

Nos termos do artigo 15.º do Código de Conduta do ICAP, sob a epígrafe ”Comparações”, “É comparativa a comunicação comercial que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente” (n.º1) e a mesma não deve (2) (…) ser enganosa (a)) enganosa; (…) desrespeitar os princípios da leal concorrência; (d)) desacreditar ou depreciar marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens, serviços, actividades ou situação de um concorrente; (f))  retirar partido indevido do renome de uma marca, designação comercial ou outro sinal distintivo de um concorrente ou da denominação de origem de produtos concorrentes (h))”, normas que se encontram em consonância com o artigo 16.º n.º 2, alíneas a) e) e g), do Código da Publicidade, invocado pela UNILEVER.

Por maioria de razão do que se concluiu no ponto anterior, verifica-se a desconformidade da peça publicitária em lide com o disposto nas alíneas a) dos n.ºs 2 dos preceitos citados, com fundamento em prática de publicidade enganosa relativamente à comunicação de inovação e de superioridade em todos os parâmetros subsumíveis no significado de “melhor cápsula” para o consumidor médio.

Ora, é esta enganosidade com os contornos que ficaram definidos que, no entender do JE, é suscetível de determinar não só a desacreditação dos produtos e marcas da concorrência e, concretamente, da UNILEVER mas, igualmente (porque aqui se trata de publicidade comparativa explícita), a conclusão no sentido de que se retira partido indevido do respetivo renome marca, designação comercial e sinal distintivo e, logo, de que se ofende o princípio da livre e leal concorrência, por desconformidade com o disposto nas alíneas d), f) e h) do n.º 2 do artigo 15.º do Código de Conduta do ICAP.Com efeito, não se comunica somente a supremacia das cápsulas Persil ao nível de todos os parâmetros possíveis de serem entendidos pelo claim “Na melhor cápsula do mercado” e “gráfico” associado. Comunica-se, igualmente, a ineficácia generalizada da concorrência explicitamente identificada:
3.   Decisão

Termos em que, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da HENKEL, em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto nos artigos 4.º, n.º 1, 9.º, n. ºs 1 e 2, alínea a) 12.º, 15.º, n.º 2, alíneas a), d), f) e h) e 17.º, n.º 1 do Código de Conduta do ICAP, bem como dos artigos 14.º, n.º 2 e 16.º, n.º 2, alíneas a) e) e g) do Código da Publicidade e, ainda, 7.º, n.º 1, alínea b) e 9.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais – caso se mantenham os tipo de ilícito apurados pelo JE.

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP

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1J / 2015 :: Sociedade Água do Luso vs. Unicer Bebidas de Portugal

1J/2015

Sociedade Agua do Luso
vs.
Unicer Bebidas de Portugal

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no quinto dia do mês de Junho do ano de dois mil e quinze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 1J/2015 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 1J/2015

1.   Objecto dos autos

1.1.   A SOCIEDADE DA ÁGUA DE LUSO, S.A., (“LUSO” ou “Queixosa vem, nos temos do artigo 10.º do Regulamento do Júri de Ética do ICAP (“Regulamento JE”) apresentar queixa contra VMPS – ÁGUAS E TURISMO, S.A., (adiante abreviadamente “VIDAGO” ou denunciada), relativamente a relativamente à campanha publicitária/comunicação comercial efectuada à marca “Água das Pedras”, consubstanciada em diversos anúncios veiculados na internet e materiais publicitários diversos, por violação do disposto nos artigos 9º, 12º, 15º e 16º do Código de Conduta do ICAP, nos artigos 4º e 7º, nº 1, alínea b) do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março (de ora em diante, “Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais”), nos artigos 10º, 11º, 12º, e 16º do Código da Publicidade, bem como nos artigos 4º, 6º, 8º e 10º do Regulamento (CE) nº 1924/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de Dezembro de 2006 (de ora em diante, o “Regulamento (CE) nº 1924/2006”).

1.2.   Notificada para o efeito, a Unicer Bebidas de Portugal, SGPS S.A apresentou a sua contestação.

1.3.   Dão-se por reproduzidas a queixa, a contestação e os documentos apresentados pelas Partes.

1.4.   Síntese da posição da parte queixosa

As posições da Queixosa podem ser sintetizadas como segue:
– A Unicer lançou uma campanha publicitária à marca “Água das Pedras” cujo mote é “Porquê beber Pedras e não uma água com gás qualquer?” e slogan “Cuidado com as aparências. Pedras é Pedras. Tudo o resto é só água com gás.”;

– A campanha publicitária em causa, nos moldes em que é realizada, consubstancia publicidade comparativa ilícita e publicidade enganosa, com violação dos normativos legais que consagram os princípios da veracidade e do respeito aos direitos do consumidor, através da utilização de alegações publicitárias visuais, orais e escritas, no que se incluem alegações de saúde, ilegais;

– Os vários spots (pelo menos três) a que a Queixosa teve acesso estão a ser veiculados nas páginas de internet e do Facebook, no âmbito da qual estão também a ser realizadas alegações publicitárias, nutricionais e de saúde de natureza variada, alusivas seja aos nutrientes que fazem parte da composição química de Água das Pedras, quanto ao produto em si;

– Os três spots correspondem, em termos gerais, a um cenário no qual duas mulheres, representadas provavelmente pela mesma actriz (por terem a mesma aparência física), se encontram em pé, com uma bancada à sua frente, cada uma com uma garrafa verde diante delas, e posicionadas, cada uma, de um lado do ecrã:

– A publicidade é realizada de maneira a induzir o consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, às conclusões – falsas e enganosas, como adiante se demonstrará – de que este obterá resultados positivos e superiores se consumir Água das Pedras, do que os resultados obtidos por força do consumo de qualquer outra água com gás;

– Conforme resulta dos spots publicitários que a Queixosa ora identifica, torna-se claro não só que a Unicer declara que, no mercado das águas com gás, pelo menos a Luso com Gás tenta imitar o sabor de Água das Pedras, como também comunica aos destinatários através do mote e slogan que utiliza, que Pedras é superior às demais água com gás, factos que se requer, sejam provados pela Unicer;

– Acresce que, a Unicer, ao caricaturar a voz da actriz após a ingestão da água com gás não identificada, fazendo referência à adição de gás – que se demonstra pela voz aguda utilizada, a qual é geralmente associada à ingestão de gás hélio – desacredita, denigre e deprecia todas as restantes marcas de águas com gás, e especialmente Luso com Gás ali representada pela sua garrafa, em violação à alínea f) do número 2.º do artigo 15º e do artigo 16º do Código do ICAP e alínea e) do número 2 do artigo 16º do Código da Publicidade;

– Além disso, através das alegações publicitárias utilizadas, a Unicer apresenta, ainda que indirectamente, todos os restantes produtos da categoria das águas com gás e Luso com Gás em específico, como uma tentativa de imitação e/ou reprodução do sabor/produto Água das Pedras (i.e. “Esta pode querer passar por igual àquela”, referência ao “sabor inimitável”, “Cuidado com as aparências”, “Pedras é Pedras. Tudo o resto é só água com gás” e “Porquê beber Pedras e não uma água com gás qualquer? destacados nosso);

– Realizando ainda, publicidade comparativa de tom excludente, cuja legalidade requer-se seja comprovada pela Unicer, pois com as frases “Só Pedras é Pedras. Tudo o resto é só água com gás.” e “Porquê beber Pedras e não uma água com gás qualquer?” coloca-se, indirecta mas propositadamente, numa situação de superioridade comparativa face às demais águas com gás (…) não restando, pois, a menor dúvida sobre o carácter comparativo ilícito e enganoso das mensagens comunicadas;

– Em relação às alegações de saúde (…) da análise conjunta dos spots publicitários e do conteúdo disseminado na página internet referida, é forçoso concluir que a Unicer comunica de forma ilegal, directa e indirectamente que, por força única e exclusiva do consumo de Água das Pedras, as actrizes conseguiram efeitos benéficos à saúde, de natureza diversa (i.e. ao nível da pele, na redução e regulação do colesterol, entre outros);

– A Unicer nos spots publicitários e na página internet referida apresenta alegações ilegais, de duas maneiras distintas (…) em relação à primeira forma, o consumidor médio, depreende que apenas por força do consumo de uma garrafa de “Água das Pedras” de 250ml (tal como a que se visualiza no spot) obterá, por exemplo, a facilitação do processo digestivo, a prevenção de oxidação e envelhecimento das células, o proporcionar de uma sensação de bem-estar, a ajuda na recuperação de excessos (i.e. do álcool) e a existência de um benefício na redução e regulação do colesterol, o que não se pode dizer corresponder à realidade e tão pouco à legalidade, afirma a queixosa.

– Salvo prova em contrário pela Unicer, todas estas alegações de saúde que directamente referem efeitos obtidos pelo consumo de Água das Pedras deverão considerar-se como ilegais e enganosas devendo, consequentemente, ser imediatamente retiradas de todos os suportes publicitários de Água das Pedras;

– A Unicer destaca várias vezes na página internet referida, os efeitos benéficos do bicarbonato de sódio (“Água das Pedras combina bicarbonato e sais minerais”, “O bicarbonato e outros minerais naturais presentes na Água das Pedras, como o cálcio e os sais,” e “A Água das Pedras é uma água mineral gasocarbónica rica em bicarbonato”), que é supostamente um elemento químico que compõe a Água das Pedras;

– Porém, este elemento químico não consta de nenhuma alegação de saúde aprovada na lista anexa ao Regulamento (UE) nº 432/2012 e, por esse motivo;

– Também todas as alegações de saúde e referências ao bicarbonato de sódio realizadas nas comunicações comerciais da Água das Pedras deverão ser retiradas, em conformidade, por ilícitas e enganosas (i.e. “elementos que facilitam o processo digestivo e asseguram que a uma boa refeição se segue uma digestão tranquila.”, “permitem incrementar o grau de ph oral e preservar a sua saúde dentária” e “o que lhe atribui características benéficas na redução e regulação do colesterol.”);

– Já em relação aos elementos químicos cujas alegações a Unicer refere e que de facto estão incluídos na lista anexa ao Regulamento (UE) nº 432/2012, a saber, os sais minerais magnésio e cloreto, também estas alegações de saúde são ilegalmente realizadas nos spots e na página internet referida e faltam para com a verdade (…);

– Salvo prova em contrário, a Unicer não apresenta nem a quantidade de Água das Pedras que é necessário consumir para que se obtenha tais benefícios alegados, tão pouco o modo de consumo, realizando, uma vez mais, publicidade ilegal;

– A campanha publicitária da Unicer comporta uma violação clara dos princípios legais e de auto-regulação em que é permitida e aceite realizar publicidade em Portugal;

– Resulta claro (…) que a Unicer, ao referir que a água com gás da marca não identificada tenta passar por igual à Água das Pedras, apresentando Luso com Gás como uma imitação ou tentativa de reprodução, viola o disposto na alínea i) do n.º 2 do artigo 15º do Código de Conduta do ICAP bem como a alínea h) do n.º 2 do artigo 16º do Código da Publicidade;

– A Unicer procura ainda, através da utilização da referência indirecta ao gás hélio, expor todas as águas com gás que não sejam Água das Pedras ao ridículo, desrespeitando-as de forma clara, tentando desacreditá-las e denegri-las junto do consumidor, violando assim a alínea f) do n.º 2 do artigo 15º do Código de Conduta do ICAP e do artigo 16º do mesmo código bem como a alínea e) do n.º 2 do artigo 16º do Código da Publicidade;

– Quanto às várias alegações de saúde feitas pela Unicer de forma ilícita e que, face à aparente falta de sustentação científica, se revelam enganosas porque induzem o consumidor médio em erro, verifica-se existir violação dos artigos 4º, 6º, 8º e 10º do Regulamento nº 1924/2006, que estabelecem em que condições podem ser feitas as alegações nutricionais e de saúde;

– Resulta ainda claro que a Unicer, ao não ter uma base que comprove as alegações de saúde que faz acerca do produto Água das Pedras e/ou dos minerais que a compõem, está a induzir em erro o consumidor médio em relação aos resultados que este pode esperar ao utilizar o produto Água das Pedras, violando assim os artigos 4º e 7º, n.º 1, b), do Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais.

1.5.   Síntese da posição da parte denunciada

– A SAL bem sabe ou devia saber, a marca Pedras (entre outras veja-se a marca nacional 408852) e a marca Água das Pedras (entre outras veja-se a marca nacional 326829), pertencem à VMPS, empresa que se dedica à captação e engarrafamento da água em questão (…) sendo a comercialização da marca Pedras efectuada pela UNICER BEBIDAS;

– A Queixa a que ora se responde tem por objecto uma campanha publicitária efectuada com a marca “Água das Pedras”, consubstanciada em diversos anúncios veiculados na internet e materiais publicitários diversos por, alegadamente, violar várias normas do Código de Conduta do ICAP, do DL 57/2008, do Código da Publicidade e do Regulamento CE n.º 1924/2006;

– Ora, salvo o devido respeito, as alegações contidas na queixa apresentada pela SAL carecem de oportunidade e até de falta de fundamento, de facto ou de Direito (…), já que, afirma, “a Queixosa faz uma análise fora de tempo e descontextualizada da campanha em apreço, esquecendo que uma apreciação séria da licitude de qualquer campanha publicitária não poderá deixar de ter em atenção a globalidade dos elementos que a compõem, bem como o seu significado no conjunto da mensagem publicitária;

– Ao contrário do alegado pela Queixosa (…) a campanha publicitária objecto do presente processo não pretendem desrespeitar normas ou princípios ético-publicitários;

– A campanha publicitária em causa deixou de ser difundida no dia 2 de Abril do corrente ano, ou seja, mais de um mês e meio antes da apresentação da queixa sub judice por parte da SAL;

– Alguns conteúdos estiveram ainda activos através das hiperligações dos sites dado que, tecnicamente, não foi possível a alteração imediata e simultânea em todas as plataformas;

– Ainda assim os sites da marca Pedras foram revistos e não difundem as informações, alegações ou conteúdos referidas na queixa desde 15 de Maio, ou seja, ainda antes da entrada da queixa da SAL;

– Face ao exposto, está prejudicado o pedido vertido na aludida queixa, pela sua inoportunidade e intempestividade, dado que a queixa foi apresentada bastante tempo depois de ter terminado a campanha;

– Os sites da UNICER não difundem ou divulgam as informações, alegações ou conteúdos que constam da queixa apresentada pela SAL (…) O que sucede, pelo menos, desde 15 de Maio pp.;

– Ora, não estando a campanha em vigor há quase dois meses e não sendo feitas pela UNICER desde momento anterior à entrada da queixa da SAL quaisquer das alegações referidas na queixa, inexiste fundamento para qualquer interdição (…) pelo que deverá ser julgada improcedente a queixa formulada pela SAL, devendo, em consequência, esse Júri abster-se de deliberar no sentido requerido pela Queixosa;

– Acrescendo que, face à abstenção de deliberação, também não se aplicará ao presente caso o disposto no artigo 18º do Regulamento do JE, dado que não havendo deliberação também não existirá publicação da mesma;

– A UNICER não violou ou desrespeitou o princípio da veracidade (art. 9º do Código de Conduta do ICAP), pois não enganou os consumidores de Pedras nem o público em geral assim como não faltou à verdade na sua comunicação;

– Também não existe qualquer comparação com um concorrente na campanha em causa. Na verdade, para além de não existir qualquer comparação com produtos concorrentes, ainda mais difícil se torna de perceber como se enquadra nesse conceito de produto concorrente a Luso com Gás;

– Não pretende, naturalmente, a campanha em causa, denegrir nada nem ninguém mas somente salientar ou destacar as características únicas de um produto e as suas reconhecidas e públicas virtudes que permitem a sua distinção;

– Em nenhum momento a UNICER pretendeu com a sua campanha identificar a marca Luso com Gás, quer por não fazer qualquer sentido dirigir qualquer campanha especificamente só para um produto ou marca quer ainda por a campanha em causa não pretender identificar qualquer produto ou marca concorrente;

– Sempre se acrescentará que a palavra “concorrente” que a SAL utiliza para designar a sua marca Luso com Gás (face a Pedras) chega a ser pretensiosa, pois a marca em causa não designa qualquer água mineral natural gasocarbónica, segmento natural da marca Pedras;

– Ainda assim se repete que a UNICER unicamente pretendeu com a campanha destacar e enaltecer as diferenças e a naturalidade de Pedras e não denegrir ou desacreditar qualquer concorrente, muito menos por comparação;

– Quanto às invocadas alegações de saúde – que segundo a Queixosa eram feitas por remissão -, repete-se que não existiam no momento da queixa, nem existem presentemente, dado que, desde momento anterior à entrada da queixa da SAL no ICAP que não estão presentes nos sites da UNICER que fazem publicidade às suas marcas Pedras e Água das Pedras quaisquer conteúdos ou informações que pudessem ser confundíveis com alegações de saúde (…) sendo, pois, inoportuno, discutir, neste momento e neste fórum, a necessidade ou não de sustentação cientifica das mesmas;

– Sempre se acrescentando que as alegações ou informações não induzem em erro os consumidores de Pedras nem os consumidores médios e que foram no passado objecto de estudos e pareceres técnicos que confirmaram as mesmas (…) não sendo a campanha e publicidade em causa, pois, enganosas;

– A postura da Queixosa é surpreendente, pelos argumentos aduzidos e pela forma agressiva com que os mesmos são apresentados, parecendo mais preocupada em atacar e esconder algo do que alertar para potenciais ou eventuais erros ou lapsos de um concorrente;

– (…) Naturalmente, a Luso com Gás, não é uma “água mineral natural” !!! (…) Embora tal facto não seja percepcionado pelo consumidor médio que é assim enganado;

– Sendo, pois, a publicidade à marca Luso com Gás claramente enganosa alicerçando a rotulagem e campanhas do produto e marca em questão em argumentos enganadores para o consumidor médio;

– A queixa apresentada pela SAL é extemporânea e carece de oportunidade falhando ainda na fundamentação factual e jurídica (…) é ainda descontextualizada da campanha em apreço;

– A campanha publicitária, objecto desta querela e os elementos, alegações ou informações que são imputados à UNICER não eram difundidos, nem divulgados ou tão pouco existiam, no momento em que a queixa foi apresentada;

– A campanha objecto do presente processo não pretendeu desrespeitar quaisquer normas ou princípios ético-publicitários;

– Inexiste fundamento para a interdição de utilização das alegações e informações difundidas ou divulgadas pela UNICER nos seus sites, dado que as mesmas não existiam no momento em que foi apresentada a queixa;

– A UNICER não pretendeu desrespeitar normas ou princípios ético-publicitários, nem tão pouco enganar os consumidores, assim como não faltou à verdade na sua comunicação;

– A publicidade da UNICER não é enganosa.

2.   Enquadramento e fundamentação ético-legal

2.1. Questão prévia Cumpre em primeiro lugar esclarecer a matéria atinente à questão prévia levantada pela Denunciada no ponto III da sua contestação referente à parte dos “pedidos efectuados na queixa”.

Estes reportam-se a:

a)   suspensão imediata da campanha e b) interdição da utilização das alegações

Alega esta que campanha publicitária em causa deixou de ser difundida no dia 2 de Abril do corrente ano, ou seja, mais de um mês e meio antes da apresentação da queixa sub judice, sendo que “alguns conteúdos estiveram ainda activos através das hiperligações dos sites dado que, tecnicamente, não foi possível a alteração imediata e simultânea em todas as plataformas.”Assim sendo, afirma, e “ainda assim os sites da marca Pedras foram revistos e não difundem as informações, alegações ou conteúdos referidas na queixa desde 15 de Maio, ou seja, ainda antes da entrada da queixa da SAL.”.

Isto para alegar que, no seu entender, está prejudicado o pedido vertido na aludida queixa, pela sua inoportunidade e intempestividade, dado que a queixa foi apresentada bastante tempo depois de ter terminado a campanha.

No segundo caso, o do pedido de interdição da utilização das alegações, defende a denunciada que “os sites da UNICER não difundem ou divulgam as informações, alegações ou conteúdos que constam da queixa apresentada pela SAL”. O que sucederá, afirma, pelo menos, desde 15 de Maio pp. Para com isto pretender dizer que, não estando a campanha em vigor há quase dois meses e não sendo feitas pela UNICER desde momento anterior à entrada da queixa da SAL quaisquer das alegações referidas na queixa, inexiste fundamento para qualquer interdição.

Pelo que, defende, deverá ser julgada improcedente a queixa formulada pela SAL, devendo, em consequência, esse Júri abster-se de deliberar no sentido requerido pela Queixosa.

Mais defende que, face à abstenção de deliberação, também não se aplicará ao presente caso o disposto no artigo 18º do Regulamento do JE, dado que não havendo deliberação também não existirá publicação da mesma.

Não tem, no entender deste Júri, razão a Denunciada. E isto por duas ordens de razões: a primeira prende-se com o facto de devermos ter sempre em linha de conta os objectivos inerentes à autodisciplina da publicidade e que se encontram presentes no Código de Conduta do ICAP.

Na verdade, o que está em causa, em primeiro lugar, é o fomentar da auto-regulação e das boas práticas junto dos vários agentes envolvidos, reforçando a componente ética nas várias vertentes da Comunicação Comercial sem prejuízo da componente jurídica.

Significa isto que as deliberações do Júri de Ética têm, sobretudo, um efeito que se pretende profiláctico e no sentido de assegurar as boas práticas no âmbito da comunicação comercial. O que sucederá tanto nos casos da apreciação de campanhas em curso como, também, no efeito útil que tal apreciação tem para o enquadramento dos anunciantes em situações vindouras.

Esta questão prende-se com a alegação da denunciada de que se deveria considerar como prejudicado o pedido vertido na queixa, pela sua inoportunidade e intempestividade, dado que a queixa foi, afirma, apresentada bastante tempo depois de ter terminado a campanha.

Uma parte queixosa tem, na verdade, a expectativa de poder ver a sua queixa apreciada, consideração esta que o Júri subscreve, salvo casos manifestos de inutilidade superveniente da lide o que, no nosso entender, não sucede nos presentes autos.

Na verdade, não tem o JE garantias de que, apesar de decorrido mais de um mês e meio, e sendo que alguns conteúdos estiveram ainda activos através das hiperligações dos sites a que a Denunciada alude, esses mesmos conteúdos não possam, de alguma forma, ser ainda visualizados na Internet, o que, a acontecer, não deixaria de significar a existência de mensagens publicitárias que seriam passíveis de chegar aos consumidores, sendo que a revisão dos sites da marca Pedras não, só por si, suficiente para poder afastar essa possibilidade.E isto para concluir que o JE entende não dever abster-se de deliberar pelo que, havendo deliberação, há, evidentemente, necessidade de publicação da mesma e isto independente da análise de fundo da campanha que mais à frente se fará.

2.2. Quanto a esta sempre se dirá que é nosso entendimento que as afirmações “Porquê beber Pedras e não uma água com gás qualquer?” e “Cuidado com as aparências. Pedras é Pedras. Tudo o resto é só água com gás.”, se podem configurar como consubstanciando, desde logo, mas não exclusivamente, publicidade comparativa implícita, a par da existência de alegações publicitárias, nutricionais e de saúde de natureza variada, alusivas, seja aos nutrientes que fazem parte da composição química de Água das Pedras, como, também, ao produto em si.

Quanto aos três spots, é entendimento do JE que, do seu visionamento, se retira ser possível de identificar o produto da ora Queixosa denominado “Luso com Gás”.

Concorda-se, também, com a Queixosa quando esta faz alusão ao conteúdo da deliberação do JE deliberou no âmbito do processo nº 40J/2007: “Entende o Júri que a apreciação individual de cada um dos claims da campanha publicitária (…) em apreço, desligados do respectivo contexto (…) é susceptível de não expressar de forma cabal a representação que do conjunto da mesma é feita na mente do consumidor médio”., sendo que, em consequência, as alegações publicitárias realizadas nos três filmes publicitários deverão ser analisadas pelo seu todo, ou seja, um conjunto de elementos que integra as alegações publicitárias e as de saúde constantes na página internet na qual estão disponibilizadas, e, ainda, pela mensagem única e final transmitida aos consumidores.

Mas, a par de publicidade comparativa, existe também a vinculação de publicidade de tono excluyente, ou de tom excludente, visível, nomeadamente, na afirmação “Só Pedras tem gás cem porcento natural.

É captada de fontes intocadas na zona preservada do vale de Pedras Salgadas e engarrafada tal como sai da fonte.” Ouvindo-se, imediatamente de seguida, o mote da campanha “Cuidado com as aparências. Pedras é pedras. Tudo o resto é só água com gás”.
Importa, assim, conferir, desde logo, da licitude da utilização de tais figuras no âmbito da comunicação comercial veiculada no âmbito dos três spots, a saber “Sabias que as águas com gás não são todas iguais?”; “Umas são gaseificadas, ou seja, têm o gás adicionado artificialmente”; “Pedras é única. Naturalmente gasosa com gás carbónico cem por cento natural que vem directamente da fonte”; “Cuidado com as aparências. Pedras é pedras. Tudo o resto é só água com gás”; “Esta água pode querer passar por igual àquela”. “Mas se a provarmos, descobrimos que são muito diferentes”.

Não está qui em causa no nosso entender, nem podia estar, a qualidade intrínseca da Água das Pedras mas, tão somente, o de se saber se tais afirmações se coadunam com as regras ético-legais em vigor face ao conteúdo que resulta das mensagens veiculadas que, pretensamente, traduz a existência de uma comparação com as outras águas concorrentes, e com a da Queixosa em particular e, em segundo lugar, afirma a superioridade a mesma face a toda a concorrência com factos que, evidentemente, carecem de prova.

A que acresce a eventual prática de denegrição e depreciação de marcas de águas com gás, e especialmente Luso com Gás ali representada pela sua garrafa, isto tanto nos filmes como na comunicação veiculada através de Internet.Ora a verdade é que, apesar de se tratar de uma questão relacionada com o sabor, não é despicienda a questão do gaz hélio que, pretensamente, é associado ao produto da queixosa, ao invés do da Anunciante.

Resulta para o JE como evidente que, através da utilização, com características negativas e sem qualquer prova nos autos, da referência indirecta ao gás hélio, há na verdade a exposição de todas as águas com gás que não sejam Água das Pedras, uma situação de depreciação e desrespeito junto do consumidor, violando-se assim a alínea f) do n.º 2 do artigo 15º do Código de Conduta do ICAP e do artigo 16º do mesmo código bem como a alínea e) do n.º 2 do artigo 16º do Código da Publicidade.

Em relação às alegações de saúde veiculadas caberia à ora denunciada provar a capacidade alegada das águas das Pedras de, em resultado do seu consumo exclusivo, as actrizes em causa conseguirem efeitos benéficos à saúde, de natureza diversa, o que a Denunciada não logrou fazer ao não juntar qualquer tipo de prova aos autos e em sede de aprovação de alguma alegação de saúde que permitisse à Unicer realizar legalmente as alegações de saúde que veiculou, dessa foram violando o regime legal estabelecido pelo Regulamento (CE) nº 1924/2006, sendo pois que tais alegações, face à ausência de prova, se deverão considerar como enganosas.

A este facto acresce que, também, no que respeita aos efeitos benéficos do bicarbonato de sódio (“Água das Pedras combina bicarbonato e sais minerais”, “O bicarbonato e outros minerais naturais presentes na Água das Pedras, como o cálcio e os sais,” e “A Água das Pedras é uma água mineral gasocarbónica rica em bicarbonato”), também não ter sido feita prova nos autos de que este elemento químico conste de alguma alegação de saúde aprovada na lista anexa ao Regulamento (UE) nº 432/2012.

O mesmo se passa, igualmente, no que tange à comprovação em sede de afirmações como “Contribui para uma pele mais jovem” e “Contribui para prevenção de cãibras e fadiga”, as quais carecem de validação nos termos dos artigos 15º a 18º do Regulamento (CE) nº 1924/2006, do artigo 12º do Código de Conduta do ICAP e do artigo 10º, nº 2, do Código da Publicidade.

3. Decisão

Termos em que a 1ª Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da VMPS viola o disposto nos artigos 9º, 12º, 15º e 16º do Código de Conduta do ICAP, os artigos 4º e 7º, nº 1, alínea b) do Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais, dos artigos 10º, 11º, 12º, e 16º do Código da Publicidade, bem como dos artigos 4º, 6º, 8º e 10º do Regulamento nº 1924/2006, de 20 de Dezembro de 2006, devendo cessar de imediato caso tal não tenha ainda sucedido e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais – caso se mantenham os tipos de ilícito apurado pelo JE.».

O Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação1J / 2015 :: Sociedade Água do Luso vs. Unicer Bebidas de Portugal
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13J / 2014 – Recurso :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

13J/2014
Recurso

 

Beiersdorf Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

 

COMISSÃO DE APELO

 

 

Proc. n.º 13J/2014

 

Recorrente:
“BEIERSDORF PORTUGAL”

versus:

“UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, LDA.”

 

I- RELATÓRIO

1. A queixosa veio requerer ao Júri de Ética (JE) do Instituto Civil da Autodisciplina da Comunicação Comercial (ICAP) a apreciação da licitude da campanha publicitária da autoria da denunciada, iniciada em Portugal em 23 de Março de 2014, referente ao produto da Unilever “Dove Invisible Dry”, um desodorizante, e ao alegado “efeito” 100 cores, pedindo que:

a) se declare que a mensagem publicitária da Unilever da campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” viola o princípio da veracidade, previsto nos artigos 9.º, n.º 1, alínea a) do Código de Conduta do ICAP e 10.º do Código da Publicidade; constitui publicidade enganosa, especificamente violando os artigos 9.º do Código de Conduta do ICAP e 11.º do Código da Publicidade; constitui prática enganosa proibida pelo Decreto-Lei n.º 57/2008 de 26.03, em concreto identificada no artigo 7.º, n.º 1, alínea b), deste diploma;

b) se ordene a cessação imediata da campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” e a respectiva recolha de todo o material publicitário alusivo à referência 100 cores na promoção do produto Dove Invisible Dry; a alteração dos rotulos de todas as embalagens do produto, com eliminação da referência 100 cores ou qualquer outra no âmbito desta campanha, e a proibição da utilização de expressões 100 cores ou qualquer expressão que indique a eficácia em 100 cores ou diversas cores claras e escuras.

Na denúncia identifica a campanha publicitária e alega que a mesma foi projectada para enfatizar propriedades e acção anti-manchas do produto Dove Invisible Dry de uma forma enganosa, procurando, em especial, incutir a ideia errada de que se trata de um desodorizante com uma acção anti-mancha especificamente eficaz em todos os tipos de manchas, incluindo manchas amarelas (que surgem nos tecidos de cor clara), o que não é verdade, concluindo que a campanha publicitária em causa é ilegítima por constituir publicidade enganosa, nos termos do art.º 11º do Código da Publicidade , por violar o princípio da veracidade previsto no art.º 9º do Código de Conduta do ICAP (CCICAP) e nos art.ºs 10º e 11º do CP e por constituir prática enganosa, proibida pelo art.º 7º nº 1 al. b) do DL 57/2008.

Contestou a denunciada pedindo que se julgue improcedente a queixa apresentada.

Começa por aceitar como boa a distinção feita na queixa quanto ao tipo de manchas provocadas pelos desodorizantes, as manchas brancas, que surgem aquando do contacto da roupa com o desodorizante acabado de aplicar e as manchas amarelas, que surgem gradualmente nas roupas, em resultado da interacção do desodorizante com a transpiração e o detergente utilizado na lavagem da roupa. Alega, depois, que se propõe demonstrar: que a sua campanha e inerentes alegações publicitárias dizem respeito apenas às manchas brancas, provocadas pelo contacto do desodorizante com a roupa imediatamente após a sua aplicação; que as referências constantes das embalagens de Dove Invisible Dry são inequívocas relativamente à mensagem que transmitem para o consumidor quanto à sua acção anti-manchas dizer apenas respeito a manchas brancas; que o produto Dove Invisible Dry foi efectivamente testado em 100 cores, tendo o resultado sido o da inexistência de manchas brancas; que o produto Dove Invisible Dry é igualmente eficaz na acção anti manchas amarelas, provocadas pela interacção do desodorizante com a transpiração e o detergente utilizado na lavagem da roupa; que ainda que o consumidor percepcionasse a campanha ora em causa como abrangendo as chamadas manchas amarelas, não obstante a mesma não seria enganosa, concluindo que a mensagem publicitária em causa é perfeitamente lícita.

2. Prosseguindo os autos os seus regulares termos veio a 1ª Secção do JE do ICAP a deliberar que a “a comunicação comercial da responsabilidade da UJM não viola quaisquer dos dispositivos objecto de queixa.”

3. É desta decisão que, inconformada, a queixosa vem recorrer, apresentando alegações nas quais requerer que esta Comissão de Apelo (CA) revogue aquela deliberação e declare que a mensagem publicitária em causa viola o referido princípio e disposições legais, ordenando a sua cessação imediata, nos termos requeridos.

4. A denunciada apresentou contestação ao recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

5. Cumpre apreciar e decidir.

II- FUNDAMENTAÇÃO

1. De facto

Analisando a prova constante dos autos, documental e não impugnada, consideram-se provados os seguintes factos:

1. A denunciada está a proceder a uma campanha publicitária, desde 23 de Março de 2014, relativa ao produto Dove Invisible Dry, feita através de spots televisivos, difundidos em vários canais nacionais, na internet no canal You Tube e também mediante menções publicitadas na embalagem do produto e em materiais de pontos de venda;

2. A mencionada campanha de spots televisivos, na sua essência, descreve-se nos seguintes termos:
“Convidámos mulheres a experimentar o novo Dove Invisible Dry em 100 cores”.

Uma narradora pergunta: “Adivinhe que cor escolheu a Bia?”

A Bia refere que o vermelho é a sua cor favorita e diz “…ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é realmente fantástico”.

Segue-se a afirmação “Dove apresenta Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 cores”.

O número “100” aparece na tela cheia, obtido pela sobreposição de uma camada branca, com o número “100” cortada fora dele, num fundo constituído por uma pluralidade de tecidos coloridos. Tecidos com cores claras, como branco/cinza claro, verde-claro, azul claro e rosa claro podem ser vistos, em especial no interior do número “100”.

O anúncio termina com a locutora a ler a frase que ocupa todo o ecrã “Novo Dove Invisible Dry. Invisível em 100 cores”.

3. Numa outra divulgação na internet revela-se uma acção de marketing da Unilever no âmbito da promoção do produto, na qual aparece distintamente a promoção efectuada pela própria Unilever, onde se lê:

“Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco”

4. A mesma menção, “não apenas no preto e no branco”, é publicitada nos supermercados e hipermercados nacionais onde são criados “callers” para os produtos.

5. Na embalagem do produto Dove “Invisible Dry” a frente da embalagem tem um selo circular contendo a expressão “Tested on 100 colours”, onde, aliás e uma vez mais, o número “100” apresenta uma série de riscas verticais coloridas e é ainda possível visualizar na embalagem (rótulo traseiro de superfície) a expressão: “anti white marks” – anti manchas blancas.

2. Jurídica e ética

Perante as alegações da recorrente e nomeadamente as conclusões aí contidas, são três as questões que as mesmas nos convocam a dilucidar e a resolver, e assim sendo, serão apenas três as questões a analisar, o que irá ser feito de seguida.

1ª: A decisão recorrida não atendeu, em concreto, ao conceito de consumidor comum, atento e razoavelmente informado, impondo-se nessa matéria encontrar o público-alvo e analisar as expectativas e o conhecimento que esse público-alvo terá do produto desodorizante, devendo assim ser alterada a deliberação do Júri neste ponto, analisando a campanha “Dove Invisible Dry 100 Cores” à luz desse conceito de consumidor?

A recorrente alega que na sua deliberação o JE se teria alicerçado num conceito de “consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido” sem ter manifestado qual o seu entendimento nesta matéria, tendo no entanto valorado implicitamente esse “consumidor médio, atento e razoavelmente informado” como um consumidor totalmente conhecedor do mercado e diferentes propostas e produtos na área dos desodorizantes.

Porém, na perspectiva da recorrente, tal “consumidor médio”, in casu, deve ser definido como a generalidade da população portuguesa em idade adulta, procurando um produto cujo preço é baixo e que se destina à satisfação de uma necessidade imediata de higiene pessoal, sem um conhecimento específico do sector e características técnicas do produto e confrontado com uma extensíssima gama e oferta de produtos no segmento desodorizante, devendo assim ser alterada a deliberação do Júri neste ponto, analisando a campanha “Dove Invisible Dry 100 Cores” à luz desse conceito de consumidor.

Vejamos.

Se é verdade que na decisão recorrida se parte da perspectiva de que a campanha dever ser aferida pelo «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido», sem no entanto se definir o que seria, em concreto e in casu esse “consumidor médio”, já não pode aceitar-se a alegação da recorrente de que naquela decisão se fez uma valoração, implícita, desse consumidor como sendo “totalmente conhecedor do mercado e diferentes propostas e produtos na área dos desodorizantes”

Com efeito, o que se fez na decisão recorrida foi uma valoração, ou seja, partindo da perspectiva do «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido» – ainda que não definido – concluir que “a mensagem percepcionada” pelo mesmo em momento algum era a de que os “spots” se referiam “a outras manchas que não aquelas que surgem no momento após a aplicação do desodorizante anunciado”.

Quanto ao acerto, ou não, desta valoração, é questão que irá ser objecto de análise e ponderação no item seguinte.

No âmbito desta 1ª questão importa apenas referir que acompanhamos, no essencial, as considerações teóricas, legais e jurisprudenciais invocadas pela recorrente sobre o conceito de «consumidor comum, razoavelmente atento e informado».

Apenas acrescentaremos que, de alguma forma, o CCICAP já acolhe tais considerações quando nele se estabelece que a avaliação das comunicações pelo possível impacte no “consumidor médio” e “atendendo ainda às características do público-alvo” (art.º 3º nº 2), bem como atendendo aos “conhecimentos, a experiência e a capacidade de discernimento de um consumidor médio, ou aquele a quem especialmente se destina, tendo em conta os factores sociais, culturais e linguísticos” (art.º 3º nº 3), presumindo-se que aquele consumidor médio possui “um grau razoável de experiência, de conhecimento e bom senso, e detenha uma razoável capacidade de observação e prudência” (art.º 3º nº 5).

Assim, não nos repugna aceitar que o exercício que a recorrente faz de definição de “consumidor comum”, para o caso concreto, está no essencial correcto, embora o conceito se possa precisar, como se fará na parte final deste item.

Porém, que daí deva decorrer uma alteração da decisão do JE, neste ponto, é que não nos parece que faça sentido ou tenha fundamento. Desde logo porque não há nenhuma decisão do júri neste aspecto, nem tinha que haver, dado que o que JE tinha que decidir – e decidiu – era a pretensão da queixosa. Isto sem prejuízo de, para assim decidir, a campanha publicitária em causa dever ser analisada à luz ou segundo a perspectiva do tal “consumidor comum ou médio”, colocando-se assim o julgador na posição desse consumidor.

Em conclusão e em resumo, não há qualquer fundamento para alterar a deliberação do JE sobre o conceito de consumidor médio ou comum, atento e razoavelmente informado, até porque nenhuma deliberação foi tomada nesse sentido, sem prejuízo de a campanha publicitária em causa dever ser analisada na perspectiva do tal consumidor comum ou médio. Que, in casu, se considera ser a generalidade da população portuguesa em idade jovem ou adulta, procurando um produto destinado à satisfação de uma necessidade de higiene pessoal, com um preço acessível, sem conhecimento específico do sector e características técnicas do produto desodorizante e confrontado com uma vasta gama e oferta de produtos nesse segmento.
*
2ª: A campanha publicitária em causa, apreciada no conjunto global de todos os suportes e por referência ao consumidor médio antes encontrado, é direccionada a todo o tipo de manchas e não apenas vocacionada para as manchas brancas?

A recorrente insurge-se contra a metodologia adoptada pelo JE de ter feito uma análise da publicidade em vídeo (incluído spots televisivos e suportes de internet) seguida de uma análise à publicidade escrita e teor publicitário das próprias embalagens dos produtos e não ter apreciado a campanha publicitária no conjunto global de todos os suportes indicados e apresentados. Considera ainda que, se o JE assim tivesse procedido, como deveria, e por referência ao consumidor médio antes encontrado, não teria deixado de concluir que se tratava de uma campanha direccionada a todo o tipo de manchas e não, como pretende fazer crer a recorrida, apenas vocacionada para as manchas brancas.
Analisada a argumentação da recorrente, afigura-se-nos que não lhe assiste razão.

Desde logo quanto à crítica à metodologia do JE.

Admitindo com efeito que, em certas circunstâncias , o juízo sobre a licitude ou não da campanha publicitária se tenha de fazer numa perspectiva do conjunto global da campanha em causa, essa necessidade não se justifica na campanha publicitária da recorrida, ora em análise.

Ou seja, in casu, qualquer um dos suportes publicitários ao produto em causa transmite uma mensagem completa sobre o produto publicitado, pelo que a sua eventual ilicitude pode, e deve, ser aferida em relação a cada um dos suportes. Aliás, compreende-se que normalmente assim seja pois os veículos publicitários procuram atingir vários tipos de consumidores e estes farão normalmente a sua opção de consumo apenas com base num dos veículos publicitários, ou pelo menos sem necessariamente os terem visualizado a todos.

Neste sentido pode invocar-se o nº 2 do art.º 3º do CCICAP no sentido de que “dadas as particulares características dos diversos meios, a comunicação aceitável num suporte não o é necessariamente noutro”, devendo assim as comunicações ser avaliadas atendendo ao “meio utilizado”. Daqui decorre também que, em abstracto e perante uma análise dessa natureza, a campanha publicitária em causa pode ser lícita em determinado suporte publicitário e não o ser noutro, no pressuposto claro que são diferentes os termos ou menções usados em ambos os suportes.

Mas também não cremos que assista razão à recorrente quando pretexta que o JE, tendo por referência o consumidor médio antes encontrado, não poderia deixar de concluir que se tratava de uma campanha direccionada a todo o tipo de manchas e não apenas vocacionada para as manchas brancas.

Na verdade, em face dos spots televisivos (quer imagens, quer acção dos intervenientes quer texto que os acompanham) cremos que a mensagem normalmente percepcionada pelo referido consumidor médio é a de que produto é destinado a evitar a visibilidade das manchas brancas que surgem na roupa após a aplicação do desodorizante. A circunstância de não termos nenhuma acção, imagem ou texto, escrito ou oral, que sugira ou transmita ideia diferente, nomeadamente acção ou imagem de lavagem da roupa e constatação da inexistência de mancha, após essa lavagem, ou texto a indicar a eficácia do produto em relação a todas as manchas ou independentemente das vezes em que foi usada a mesma peça de roupa, não pode permitir a conclusão de que o consumidor médio ficou com a percepção de que o produto evita o aparecimento de manchas amarelas ou que o produto se destina a evitar o aparecimento de todo o tipo de manchas.

Por outro lado, dos demais suportes publicitários, embalagem do produto e as menções constantes dos postos de venda, também não cremos que o consumidor médio conclua que se trata de uma campanha direccionada a todo o tipo de manchas e não apenas vocacionada para as manchas brancas.

Aliás, em face da embalagem do produto, afigura-se-nos mesmo difícil que tal conclusão se possa extrair pois o mesmo tem aposto, ainda que na parte de trás, mas de forma bem visível, e aliás até em letras maiores do que o resto do texto aí inserido, as expressões “anti white marks” e “anti-manchas blancas”. Por outro lado, essas embalagens são as que estão nos postos de venda pelo que essa característica do produto, destinado a evitar manchas brancas, é facilmente perceptível para o consumidor medianamente atento e não lhe passará despercebida.

A recorrente, embora sem o afirmar expressamente, parece procurar fundar o carácter enganoso da publicidade em causa numa atitude da recorrida de procurar confundir o consumidor, com a ligação entre a menção da “invisibilidade” do produto em “100 cores” ou de “não deixar marcas em 100 cores” e a outra menção “não é apenas no preto e no branco”.

Mas afigura-se-nos que também sem fundamento.

Atente-se que, na verdade e nos termos da factualidade provada, esta menção “não é apenas no preto e no branco” apenas surge nos postos de venda e numa divulgação na internet, sendo certo que naqueles postos de venda está também o produto publicitado e neste está aposta a menção da sua eficácia “anti white marks” e “anti-manchas blancas”. Logo, perante esta realidade e o facto de os spots televisivos não terem aquela menção, não pode considerar-se que estamos perante uma estratégia global de engano, que afectasse toda a campanha publicitária em relação a todos os veículos publicitários. Apenas se poderia colocar em causa a eventual ilicitude da publicidade naqueles suportes publicitários em que aparecesse aquela menção ligada ao preto e ao branco.

Mas nem isso acontece, a nosso ver. Com efeito, das menções a “100 cores” e “não é apenas no preto e no branco”, não pode extrair-se que o consumidor médio, atento e normalmente informado, percepciona que o produto em causa é eficaz contra todo o tipo de manchas. Na verdade, não sabendo o consumidor médio qual a concreta causa de cada tipo de mancha, amarela ou branca, como a própria recorrente admite, não é pelo facto de se fazer referência à eficiência de um produto em 100 cores, incluindo nestas o preto e o branco, que isso o vai a levar a concluir que o produto publicitado é eficaz contra aqueles dois tipos de manchas ou todo o tipo de manchas.

Aliás não pode deixar de se salientar que há aqui alguma incongruência na argumentação da recorrente pois, segundo esta, para este consumidor médio, razoavelmente atento e informado, “não é, seguramente, consabido que as manchas amarelas são produzidas pelo decurso do tempo e a interacção do desodorizante com o suor e outros agentes químicos” (cfr. nº 36 das alegações de recurso) e que as “manchas amarelas … aparecem gradualmente na roupa, independentemente da sua cor” (nº 8 da sua queixa).

Numa perspectiva de análise exaustiva da questão, não pode deixar de se admitir que a referência “não apenas no preto e no branco” e a circunstância de nos produtos da concorrência, nomeadamente da recorrente (cfr. docs nºs 9 a 14 juntos com as alegações de recurso), aparecerem desenhadas peças de roupa preta e branca, isso possa levar alguns consumidores a associar – indirectamente – o produto publicitado pela recorrida como equivalente pelo menos, em termos de eficiência anti-manchas, ao produto da recorrente e a fazerem a sua opção de compra, nessa base. Mas esse, seguramente, não será um “consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento», nos termos atrás explicitados. Atento não é, com certeza, pois não atentou que no produto da recorrente apenas aparece desenhada uma peça de roupa preta e também não é normalmente informado, pois então não leu as características dos produtos, já que o produto da recorrida se anuncia apenas “anti white marks” e “anti-manchas blancas”, ao contrário do da recorrente que se anuncia como “anti-manchas brancas” e “anti-manchas amarelas” (cfr. docs. juntos com a contestação da recorrida).

Em conclusão, não cremos que tenha fundamento a argumentação da recorrente de que a campanha publicitária em causa é direccionada a todo o tipo de manchas, nomeadamente as manchas amarelas e que, por isso, constitua uma prática enganosa ou publicidade enganosa, violadora do princípio da veracidade, nos termos das disposições legais acima citadas e do referido preceito do CCICAP.
*
3ª: Houve errada avaliação da prova documental, devendo o estudo da sociedade italiana GNResearch, apresentado pela queixosa, ser considerado uma pesquisa de consumidor em relação à campanha concreta?

A recorrente argumenta que na decisão do JE se fez uma opção de valorar o estudo apresentado pela recorrida (da Blue Yonder) com base num critério, o de ser um “estudo nacional”, que não se verifica, pois tanto esse estudo como o apresentado pela recorrente (da GNReserach) são estudos realizados no estrangeiro, devendo assim considerar-se como determinante o estudo apresentado pela recorrente e, bem assim, a decisão do Júri do Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária, quanto a publicidade semelhante levada a cabo em Itália.

Não deixando de se assinalar que o pressuposto considerado na decisão do JE, o de que o estudo apresentado pela recorrida se referia “em concreto ao mercado português”, não se afigura correcto, daí não podem retirar-se as consequências que a recorrente pretexta, até pela natureza e finalidades dos estudos em causa.

O documento junto pela recorrida corresponde a um estudo de mercado da autoria de uma entidade externa independente, a Blue Yonder, cujas conclusões não foram colocadas em causa pela recorrente, apenas procurando a mesma salientar que tais conclusões apenas se podem referir às manchas brancas. Esse estudo, realizado num universo de 120 mulheres, consistia na aplicação do produto Dove Invisible Dry e, seguidamente, envergarem t-Shirts de 120 cores diferentes, após o que era seguido de respostas a um conjunto de questões relacionadas com a invisibilidade do dito produto após 5 a 7 horas. As respostas obtidas (cfr. fls 7 desse estudo) são concludentes e permitem a ilação de que o produto em causa foi efectivamente testado em 100 cores, sendo verdadeira a afirmação segundo a qual o produto, após aplicado, não provocou manchas em 100 cores.

Nesta medida estamos perante um estudo que comprova as menções constantes dos suportes publicitários da recorrida, nomeadamente a de que o produto é invisível em 100 cores e não deixa marcas em 100 cores. Com este estudo e desta forma o que a recorrida fez foi dar cumprimento ao ónus da prova que sobre si impendia, nos termos do art.º 12º nº 1 do CCICAP, onde se prevê que “as descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser susceptíveis de comprovação”.

Ora, para efeitos desta comprovação, não pode deixar de se considerar que é irrelevante, quer o local onde o estudo é realizado (no estrangeiro ou em Portugal), quer a nacionalidade das mulheres que responderam às questões. Uma e outra circunstância não tinham influência nos resultados, pois se crê que a observação das mulheres em causa no estudo, sobre a existência ou não de manchas na roupa usada, não seria diferente da observação de mulheres portuguesas (sendo certo que é indiferente para o efeito em causa o odor corporal).

Já o estudo junto pela recorrente procura determinar a percepção que o consumidor italiano terá tido da campanha publicitária feita naquele país ao produto “Dove Invisible Dry”.

Ora, sendo seguramente certo que o “consumidor italiano” não é o “consumidor português” – aliás a recorrente não deveria olvidar que nos termos da jurisprudência comunitária que invocou a aferição do consumidor médio deve fazer-se tomando em linha de conta “factores sociais, culturais ou linguísticos” e a “presumível expectativa do referido consumidor” (nacional) – e não estando minimamente demonstrado que a campanha publicitária levada a cabo em Itália seja igual à que está em causa nestes autos, torna-se claro que a pretensão da recorrente de que o estudo por ela apresentado seja “determinante” e possa ser considerado uma pesquisa de consumidor em relação à campanha aqui em causa não tem qualquer fundamento, por falta de pressupostos, o mesmo consumidor e a mesma campanha publicitária. Igualmente, por esta razão, a decisão do Júri do Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária invocada pela recorrente não pode ser considerada como jurisprudência que esteja em contraposição à deliberação do JE.

Assim, atenta a natureza e finalidades dos estudos em causa, não pode deixar de se concluir que a recorrida fez prova ou comprovou as menções constantes dos suportes publicitários, quanto a uma realidade, o produto publicitado não deixar marcas em 100 cores e que o estudo de percepção do consumidor italiano sobre a publicidade levada a cabo naquele país, em relação ao mesmo produto, não é susceptível de ser considerado como válido e relevante para aferir da percepção do consumidor português quanto à campanha publicitária em causa nestes autos.

Uma última nota para referir que, não havendo elementos para se concluir que o consumidor médio tenha a percepção de que a campanha publicitária em causa é dirigida também à eficácia do produto perante as chamadas manchas amarelas, não há que proceder à análise do valor do estudo (Doc. 4 junto com a contestação, da Universidade Federal de São Carlos) junto pela recorrida sobre a eventual eficácia do produto face a tais manchas.
*
Em conclusão e como acima já se procurou fundamentar, pese embora não se subscrevam integralmente os argumentos da decisão recorrida, improcedem na sua essência as alegações do recurso, pois não vislumbramos que a comunicação comercial em causa constitua uma prática enganosa ou seja publicidade enganosa e ofenda o princípio da veracidade, nos termos da citada disposição legal do DL 57/2008 e dos indicados preceitos do CP e do CCICAP.

Impõe-se assim confirmar a decisão recorrida e julgar improcedente o recurso.

III- DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.

Lisboa, 28 de Julho de 2014

António Francisco Martins
Presidente da Comissão Apelo

Augusto Ferreira do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

Francisco Xavier do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

Auto Regulação13J / 2014 – Recurso :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins
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15J / 2014 :: Lactogal vs. FIMA

15J/2014

Lactogal, Produtos Alimentares
vs.
FIMA, Produtos Alimentares

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no décimo sétimo dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 15J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 15J/2014

1.   Objecto dos Autos

1.1.   A LACTOGAL – PRODUTOS ALIMENTARES, S.A., (adiante abreviada e indiferentemente designada por LACTOGAL, Requerente ou Queixosa) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a FIMA – PRODUTOS ALIMENTARES, SA. (adiante abreviadamente designada por FIMA) e a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS LDA (adiante abreviadamente designada por designada por ULJM), designadas conjuntamente por Requeridas, relativamente a comunicação comercial do produto “FLORA” difundida através da embalagem do produto e no spot televisivo publicitário por, segunda a queixosa, incumprir deliberação anterior do JE (cf. violação artigo 30º do Código de Conduta) constituir uma prática comercial desleal, sob a forma da ação enganosa (cf. al. a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março) e violar art.º. 6º (decência), art.º. 4º (princípios fundamentais) art.º. 5º (legalidade) e art.º. 9º (veracidade), todos do Código de Conduta do ICAP.

1.2.   Notificadas para o efeito, as Requeridas ULJM e FIMA apresentaram contestação conjunta.

1.3.   Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

1.4.   Síntese das posições das partes

1.4.1.   Na queixa que apresenta, a LACTOGAL ocupa-se em descrever e citar as deliberações anteriores sobre a mesma comunicação comercial.
A essência da fundamentação da queixa pode encontrar-se nas seguintes passagens (art.º. 19º 26º e 27º):
   “(…) compulsados todos os argumentos esgrimidos ao longo da deliberação da Comissão de Apelo, constatamos que esta entende como não admissível a destacada referência “ao leite dos Açores”. “ (sublinhado nosso);   “(…) fácil é de concluir que a Comissão de Apelo não pretendia, apenas e só, cessar a comunicação comercial contida na embalagem do produto “FLORA DERRETE-TE” na parte “Com leite dos Açores” associado à comunicação constante da lateral daquela embalagem “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, “ “Mas sim, fazer igualmente cessar o destaque ao “Leite dos Açores” (por entender que o mesmo não é admissível), ainda que o produto contenha 1% de leite (em pó) e esteja associado, expressamente, ao creme vegetal.”

Refere, depois – sem concretizar -, que: “ (…) tem conhecimento de que tal comunicação comercial não terá sido efetivamente dada sem efeito, designadamente no que respeita à embalagem do produto em causa e ao spot publicitário, uma vez que as menções censuradas pelo ICAP continuam a ser, respectivamente, comercializadas e transmitidas.” (cf. art. 29º, sublinhado nosso).

E adita que:
   Na embalagem “FLORA DERRETE-TE”, no canto superior direito da tampa, consta, de forma bem visível, um círculo em que no seu interior para além da representação gráfica do leite – pinga de leite estilizado –, contém a menção “Com leite dos Açores” (cf. art.º. 30º e documento 3).    (…) no filme publicitário, para além de ouvirmos a seguinte alocução: “Derrete-te com o novo creme vegetal flora, agora com leite dos Açores”, (…) É exibida a embalagem “FLORA DERRETE-TE”, destacando-se o círculo disposto no canto superior direito da mesma, com a representação gráfica do leite – pinga de leite estilizado – e a menção “Com leite dos Açores (cf. art. 31º e 32º e documento n.º 4).

E conclui: “(…) tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, violam a deliberação proferida pela Comissão de Apelo, em 15 de Maio de 2014, no âmbito do processo 4J/2014,” (…) “E violam, ainda, os princípios da legalidade, da veracidade e da proibição de publicidade enganosa, constituindo práticas comerciais desleais, sob a forma de acção enganosa, prevista e punida com contra-ordenação nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei 57/2008 de 26 de Março”  (cf. art. 33º e 34º).

Termina pedindo: “a) Sejam, tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, declarados ilegais por expressa violação da decisão do ICAP, nos termos do art. 30º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; b) Sejam a alegação “com leite dos Açores” e respectiva representação gráfica declaradas ilegais, por violação expressa do previsto no art. 6º do Código da Publicidade e arts. 4º, 5º e 9º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; c) Seja, consequentemente, ordenado o expurgo daquela alegação e representação gráfica da campanha publicitária através da qual a FIMA vem promovendo a “FLORA DERRETE-TE”, bem como da rotulagem da sua embalagem.

1.4.2.   Na contestação, as Requeridas alegam que a fundamentação da LACTOGAL “(…) é toda ela perfeitamente coincidente, uma vez que não se vislumbra nenhum dado diferente, nenhum enfoque inovador (até pelo contrário, como adiante se referirá) para as questões já suscitadas pela FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A., perante o JE, no âmbito do processo 14J/2014 (…)” (cf. art. 2º) queixa esta relativa ao incumprimento e à comunicação comercial do produto “FLORA.

Afirmam, ainda: “(…) não é exacta a matéria dos artigos 29º a 34º, muito embora seja verdade, como é natural, que ainda existem no mercado embalagens que não estão conformes com a comunicação que em 20 de Maio foi dirigida ao ICAP no âmbito do Processo nº 4J/2014, sendo certo como é que tal como aí se refere, as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho,” e que: “As novas embalagens que, em breve, chegarão ao mercado, têm um selo diferente com a menção “creme vegetal”, alteração que se entendeu efectuar face à Decisão da Comissão de Apelo, e que já aparece no novo filme publicitário, ao contrário do que se refere nos artigos 31º e 32º da denúncia – ver doc. nº 4 junto com a denúncia (pese embora a pouca qualidade da gravação; em alternativa pode ver-se o que está junto ao processo 14J/2014).” (cf. art. 10 e 11º).

Adiantam que: “(…) para que não houvesse qualquer dúvida quanto à natureza do produto FLORA, a FIMA-ULJM foram mesmo para além da Decisão da Comissão de Apelo, uma vez que tendo aquela proibido a comunicação “Com leite dos Açores” associada à que constava da lateral da embalagem, o produto passou a ser claramente enquadrado pela aposição da menção “creme vegetal” junto ao disclaimer “Com leite dos Açores”, indicando de forma expressa, e sem margem para qualquer dúvida, que não se trata de um produto lácteo (o sublinhado é nosso).” (cf. art. 14º)

E acrescentam:
   “A utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” não foi proibida pelas decisões supra transcritas e, sendo assim, como parece evidente, não há incumprimento.” (cf. art. 17º)    “(…) a menção “creme vegetal” foi incluída na embalagem sem que a isso a FIMA-ULJM estivessem obrigadas pelas Decisões, mas por lhes parecer que dessa forma se dissipava qualquer dúvida que pudesse subsistir, deixando ainda mais evidente, por referência ao consumidor médio, que não se tratava de uma manteiga.” (cf. art. 18º);   “(…)“Creme vegetal” é apenas um “fancy name”, de resto, o termo vegetal no Regulamento nº 1308/2013, anexo VII, refere-se à denominação legal e a que está na lei está correctamente incluída, como é obrigatório, numa das faces da embalagem, e não tem que ser repetida nas outras.” (cf. art. 19º).

Sublinham, também, que: “A FIMA e a ULJM estão a comercializar um creme vegetal, e não uma manteiga, com leite dos Açores nos ingredientes, com a indicação da respectiva percentagem na lista, como acontece com qualquer produto alimentar, e em conformidade com a lei, Regulamento nº 1169/2011 artigo 22º, anexo VIII, ponto 3.b).” e que: “(…) a campanha relativas à composição e características do produto FLORA cumprem as Decisões supra citadas e a regulamentação aplicável, sendo a denúncia desprovida de qualquer fundamento” (cf. art.º. 28º e 29º).

E concluem: “(…) não há qualquer hipótese de o consumidor considerar que está perante algo que não seja um creme vegetal para barrar, com a menção “creme vegetal” ainda menos.” (cf. art.º. 20º) “(…) tudo o que é afirmado expressamente ou através de claims visuais, corresponde à verdade e não é susceptível de induzir em erro o consumidor médio relativamente a qualquer dos elementos do produto FLORA. “ (cf. art.º. 26º).

Terminam, pedindo que a queixa seja julgada improcedente e negado provimento ao pedido de cessação da publicidade do creme para barrar FLORA.

2.   Enquadramento ético-legal

2.1.   Da qualificação da queixa
Como acima se sintetizou, a comunicação comercial objecto da presente queixa traz à colação os processos 4J/2014, 7J/2014 e 14J/2014 já decididos pelo júri, bem como a decisão da Comissão de Apelo que incidiu sobre o recurso no processo 4J/2014.

As Partes utilizam e parcialmente suportam as suas posições nestas deliberações anteriores, delas extraindo passagens que avaliam pertinentes.

O Júri recorda que Código de Conduta do ICAP dispõe, no seu artigo 30º, sob a epígrafe “Respeito pelas decisões do ICAP”, que:

“1. Todo e qualquer comerciante/anunciante, profissional da comunicação, agência de publicidade, editor, proprietário dos Meios ou contratante, deve abster-se de participar na publicação ou distribuição de um anúncio ou outra qualquer comunicação comercial que tenha sido julgada inaceitável pelo ICAP. 2. Todas as partes envolvidas são encorajadas a incluir e, sendo sociedades, a fazerem os seus melhores esforços por que as sociedades com elas coligadas incluam nos respectivos contratos ou outros acordos relativos a publicidade e outras comunicações comerciais, uma declaração vinculando os signatários a submeterem-se às normas auto-reguladoras aplicáveis e a respeitarem as decisões e regras ditadas pelo ICAP. 3. Os sócios do ICAP e os membros associados das Associações e outras congéneres filiadas no Instituto, bem como quaisquer entidades, incluindo não membros, que submetam questões à apreciação do JE – Júri de Ética, são obrigados a acatar prontamente, na letra e no espírito, as decisões oriundas, nomeadamente, dos órgãos sociais do ICAP e do JE – Júri de Ética. (…)

Em conformidade com este dispositivo, o Regulamento do JE prevê, no nº 1 do seu artigo 7º, que as Secções do Júri são competentes para dirimir as queixas em matéria de comunicação comercial:
a) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, contra associados ou terceiros; b) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, sobre comunicações comerciais decorrentes de alterações naquelas que tenham sido objecto de deliberações proferidas pelo JE; c) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas sobre comunicações comerciais veiculadas posteriormente noutros suportes que não tenham sido identificados na queixa. (sublinhado nosso).

No contexto da auto-regulação o objecto da queixa é relevante, entre outros, para a determinação do prazo e conteúdo da contestação (Cf. art. 10º do Regulamento do JE “2. O prazo (…) no que respeita ao artigo 7º, alíneas b) e c) é de dois dias úteis, contados a partir do primeiro dia útil seguinte ao da notificação da queixa, inclusive. (…) 5. A contestação prevista no artigo 7º, alíneas b) e c), apenas carece da apresentação dos factos e fundamentação do alegado cumprimento.”).

No caso em apreço, estão em causa, concretamente, dois suportes – as embalagens e o spot televisivo – e um único claim, a saber, o claim “com leite dos Açores”.

O claim em questão foi objecto de queixas anteriores (processos 4J/2014 e decisão da Comissão de Apelo e 7J/2014).

Os suportes agora identificados, são os mesmos já apreciados.

Pese embora a queixa não seja totalmente clara quando, simultaneamente pede “a) Sejam, tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, declarados ilegais por expressa violação da decisão do ICAP, nos termos do art. 30º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; b) Sejam a alegação “com leite dos Açores” e respectiva representação gráfica declaradas ilegais, por violação expressa do previsto no art. 6º do Código da Publicidade e arts. 4º, 5º e 9º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; (…)”, o Júri considera que, perante os factos invocados e fundamentos da mesma, deve ser inequivocamente qualificada como uma queixa por incumprimento ao abrigo do art.º. 7º nº 1 alínea b).

Com efeito, para uma nova queixa, faleceriam tanto factos como fundamentos e, naturalmente, defesa.

Refira-se que o JE não pode, nem deve, proceder à reapreciação de factos que foram objecto dos processos anteriores, corrigi-los ou rectifica-los, nem tampouco elaborar deliberações com o intuito de interpretar, estender ou restringir decisões anteriores.

Diga-se, aliás, que uma reapreciação de factos objecto de análise em processo anterior, ou, uma apreciação de matéria nova no âmbito de uma queixa por incumprimento, não se compadeceria com o direito de defesa que deve ser garantido e que, manifestamente, não seria possível exercer no prazo reduzido para dois dias que é concedido para contestar, o que resulta numa tendencial insusceptibilidade de cumulação duma queixa com vista à verificação do incumprimento, com uma que pretenda a apreciação de comunicação comercial.

E embora o Júri pudesse, em teoria, discorrer sobre se estaria ou não perante uma nova queixa.

2.2.   Da verificação do incumprimento

Para efeitos de incumprimento a queixosa, sustentando-se nas decisões do JE acima citadas e na decisão da Comissão de Apelo, procura defender não ser admissível, relativamente ao produto em causa – o creme vegetal – que as Requeridas façam qualquer referência a leite dos Açores.
Na parte que aqui importa, a Comissão de Apelo, no “RELATÓRIO” da sua decisão de 15 de Maio de 2014 – onde circunscreve o objecto do recurso “(..) à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (cf. ponto 5.) – entendeu que:
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem, bem como a sua representação gráfica, não cumpriam os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia, uma vez que estava associada à outra comunicação constante da mesma embalagem produzida no sentido de que “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, pelo que se teria de concluir que a mesma não serviria apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo, o que é bastante diverso do “per se” invocado pela Requerente, quanto ao primeiro claim;
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem é enganosa quanto às características do produto FLORA, por associação, devido “à omissão de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público…” (cf. decisão da Comissão de Apelo).

Considera o Júri conveniente transcrever os fundamentos expostos pela Comissão, quanto à embalagem do produto FLORA:
“Afigura-se-nos, ressalvada melhor opinião naturalmente, que a comunicação comercial contida na embalagem do produto em causa não pode restringir-se à descrita no nº 2 da f.f., como aparentemente se fez na decisão recorrida, devendo qualificar-se como tal também a comunicação contida na lateral daquela embalagem, descrita no nº 3 da f.f. (…)
Ora, considerando que estamos perante um produto que é caracterizado por ser “um creme vegetal” – em cuja composição os ingredientes principais são o óleo de girassol e matérias gordas vegetais – e não perante uma “manteiga” – cujos ingredientes principais são produtos lácteos – já seria muito duvidoso que, por si só, o destaque dado na embalagem ao disclaimer “Com leite dos Açores” – no topo e numa lateral – , destaque também resultante da sua apresentação gráfica (inserido num círculo e com pingo de leite estilizado), associado à omissão naqueles locais de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público, o qual só tem acesso a essa informação se pegar na embalagem e olhar para a sua parte de baixo, o que não é procedimento comum, em termos de normalidade para o consumidor médio) e ao facto de a percentagem de leite (e em pó) ser de apenas 1%, já seria muito duvidoso dizíamos, que tal comunicação comercial fosse compatível com os mencionados princípios da honestidade e veracidade, acolhidos nos citados dispositivos do CCICAP e preceitos legais. (negrito e sublinhado do Júri) (…)
Mas, além disso, ou seja, analisando a comunicação comercial em causa, no seu conjunto, nomeadamente considerando o disclaimer referido no nº 2 da f.f. e a mensagem contida numa lateral da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), em que se procura induzir, quando não expressar uma associação entre o produto em causa e a manteiga, ao comparar-se a gordura saturada de Flora e a gordura saturada da manteiga standard, afigura-se-nos que foram realmente ultrapassados os limites das honestidade e veracidade da comunicação comercial. (negrito e sublinhado do júri).
Na verdade, nestas circunstâncias, o consumidor médio, ainda que normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, é não só susceptível de ser induzido em erro sobre as características essenciais do produto em causa (ser constituído essencialmente por produtos lácteos e não produtos vegetais), como pode ser determinado e influenciado na escolha do produto, considerando como relevante na sua composição o “leite dos Açores”, quando na verdade a integração do leite naquele produto é muito reduzida.  (…)

Ora, uma vez que a comunicação “com leite dos Açores” está associada à outra comunicação constante da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), teremos de concluir que a mesma não serve apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo. Nesta medida pode também considerar-se que as denominações constantes do produto em causa não estão conformes ao art.º 78º do Regulamento (EU) 1 308/2013 de 17.12.” (carregado e sublinhado nosso).
O JE constata que, nas comunicações comerciais em causa, permanece a referência “com leite dos Açores”, com a apresentação gráfica descrita, indicando-se agora de modo diferente a natureza de creme vegetal e omitindo associações à manteiga, produto lácteo relativamente ao qual a menção à origem, dos Açores, se traduz numa mais valia.
Mas a queixosa pretenderá, sustentando-se para isso na decisão da Comissão de Apelo – ou melhor, na interpretação que faz daquela decisão – que seja verificado o incumprimento, logo, fique integralmente vedada a utilização do claim “com leite dos Açores” num produto como o creme vegetal.

Sucede que, tal claim “com leite dos Açores” já foi objecto de apreciação, no âmbito dos processos mencionados e a sua proibição foi determinada quando e se associado a outros claims e omissões, porquanto sugeria que o produto em causa era um produto lácteo.

A susceptibilidade de confusão com um produto lácteo era gerada, pelo conjunto das menções escritas, respectivos destaques e localização, bem como pelas omissões da comunicação comercial.

As deliberações não proibiram a utilização do claim, per se, isoladamente.
Proibiram-no, sim, quando utilizado de modo tal que, aquela referência a um componente (assaz diminuto, aliás, na composição global do produto), pudesse ter como efeito a descaracterização da essência do próprio produto i.e., quando um creme vegetal pudesse ser confundido com manteiga.

A questão colocada na presente queixa é, de facto, uma única: se a utilização do claim “com leite dos Açores”, mantida nas embalagens e no spot televisivo, expurgada das associações ou omissões que conduziram à decisão de cessação anterior, constitui, ou não, um incumprimento das deliberações anteriores do JE.

Considera o Júri, contrariamente ao que pretende a queixosa, que as deliberações anteriores não proibiram a utilização do claim “com leite dos Açores” em cremes vegetais, criando uma espécie de exclusividade de uso para produtos lácteos, nem determinaram qualquer tipo de valor percentual a partir ou abaixo do qual pode, ou não, ser feita menção ou destaque a um componente de um produto (recorde-se, aliás, que foi utilizado apenas como lugar paralelo o exemplo das bebidas alcoólicas e as percentagens legalmente estabelecidas para qualificação “com” ou “sem” álcool). Donde, a resposta do Júri é negativa.

3. Decisão

Termos em que a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido da não verificação do incumprimento e, consequentemente, pela improcedência da queixa.».

A Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação15J / 2014 :: Lactogal vs. FIMA
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14J / 2014 :: Fromageries Bel Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

14J/2014

Fromageries Bel Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no sétimo dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, ao abrigo do disposto no artigo 3º, nº 2 do Regulamento do JE, a Secção Ad-hoc do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 14J/2014 tendo deliberado o seguinte:
«Processo nº 14J/2014
1.  Objecto dos Autos
1.1.  A FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A. – COMUNICAÇÕES PESSOAIS, S.A, (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por FROMAGERIES ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS, Lda. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por ULJM ou Requerida), relativamente a invocado incumprimento da decisão da Comissão de Apelo relativa ao processo 4J/2014 do ICAP, cujo objecto foi a comunicação do produto “FLORA” comercializado pela Requerida – e promovida nos suportes embalagem, televisão, Internet, MUPI, folheto, bem como gôndola e, ou, linear de supermercados – para tal, alegando a violação dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta, 14.º do Regulamento do JE e 8º, alínea h) dos Estatutos, todos do ICAP.
1.2.  Notificada para o efeito, a ULJM apresentou a sua contestação.
Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.
1.3.  Questões prévias
1.3.1.  Da exposição de factos pela Requerente
Constituiu entendimento da Comissão de Apelo no “RELATÓRIO” da sua decisão de 15 de Maio de 2014 que, “Cumpre apreciar e decidir, salientando-se desde já que o objecto do recurso é restrito à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (sic. ponto 5., negrito e sublinhado do Júri).
De onde se mantém a decisão da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, no que tange à comunicação comercial do produto FLORA veiculada:
– (i) nos suportes Internet, MUPI, folheto e lineares ou gôndolas de supermercado, em que se considerou que o disclaimer “Com Leite dos Açores” – atenta a respectiva percentagem provada pela ULJM – configuraria uma prática de publicidade enganosa, nos casos (e só nos casos) em que se encontrasse associado a claims suscetíveis de criar junto do consumidor médio, a convicção de que Flora “com leite dos Açores”, por este facto alegado, e de acordo com um nexo de causalidade:
         – tem um delicioso sabor;
e, ou,
– de que o mesmo sabor é o de manteiga;
 e, ou,
– de que pode satisfazer os apreciadores desta, como se de manteiga se tratasse;
– (ii) Nos suportes televisão e Internet, a alegação publicitária “Com leite dos Açores e tão saborosa só podia ser Flora” a qual, no entender do Júri, consubstanciava uma prática de publicidade enganosa por induzir o consumidor médio em erro quanto ao nexo de causalidade entre o leite dos Açores e o sinal forte da marca Flora, o qual nunca foi, nem é, o de um creme vegetal com leite dos Açores. Logo, ao possui-lo (seja qual for a percentagem em que o possua), nunca poderia ser Flora.
A Comissão de Apelo por seu turno – e em conformidade com o entendimento no sentido de que, “o objecto do recurso é restrito à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (sic. ponto 5., negrito e sublinhado do Júri) – vem a decidir que, “Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar procedente o recurso e, em consequência, determinam a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA, quanto à comunicação “Com leite dos Açores”, associada à comunicação constante da lateral daquela embalagem: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, devendo a sua divulgação cessar de imediato e não ser resposta.” (sic.III – DECISÃO, negrito e sublinhado do Júri).
Pelo exposto, considera o Júri constituir uma descontextualização do que foram os fundamentos e a decisão da Comissão de Apelo, no âmbito do recurso da deliberação do JE 4J/2014, o ora alegado por parte  da FROMAGERIES em sede de queixa, no sentido de que constituem “FACTOS”, esta sua interpretação:
“A Comissão de Apelo expôs o tema decidendi nos seguintes termos : “Perante as conclusões das alegações da recorrente é essencialmente uma a questão que as mesmas nos convocam a dilucidar e a resolver, a qual pode equacionar-se da seguinte forma: A comunicação comercial incluída na embalagem do produto FLORA viola o princípio da veracidade e consubstancia uma acção publicitária enganosa, não cumprindo igualmente os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos no Direito da União Europeia vigente?”.
A Comissão de Apelo respondeu afirmativamente à questão colocada (“afigura-se-nos que lhe assiste razão” ), tendo decidido em conformidade que “… impõe-se julgar procedente o recurso e determinar a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA.” ” (cfr. II. 2, da queixa).
Aliás, se de outra forma não se revelasse possível, sempre restariam as próprias notas de rodapé através das quais a FROMAGERIES procede à identificação de partes transcritas e escolhidas de um todo contextualizado da decisão da Comissão de Apelo – o qual não foi transcrito –, e redigidas como se de um todo se tratassem, o que não se terá devido a razões de economia:
– “ Vide segundo parágrafo da página 6 da decisão da CA de 15 de Maio de 2014;
– 2 Vide primeiro parágrafo in fine da página 7 da decisão da CA de 15 de Maio de 2014.
– 3 Vide último parágrafo in fine da página 11 da decisão da CA de 15 de Maio de 2014.” (sic).
Constata o Júri que, tal descontextualização ou ginástica gramatical vai “ao encontro” do que vem a FROMAGERIES “relembrar” na queixa, no sentido de que:

“1. A Comissão de Apelo apreciou já a matéria de fundo objecto da presente queixa no âmbito do proc. n.º 4J/2014; no seu recurso para a Comissão de Apelo, a Bel Portugal formulou, em síntese, as seguintes conclusões:

1.1.  A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, bem como a sua representação gráfica, não cumprem os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia;
1.2.  A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, é uma indicação / alegação distorcida e enganosa quanto às características do produto FLORA, nomeadamente no que se refere à sua natureza, identidade e local de proveniência; e
1.3.  A alegação “sabor a manteiga” e “manteiga” que consta de diversa comunicação comercial, incluindo da embalagem do produto FLORA, é igualmente ilícita.” (sic. ponto I).
Ora, o que foi entendido pela Comissão de Apelo foi que:
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem, bem como a sua representação gráfica, não cumpriam os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia, uma vez que estava associada à outra comunicação constante da mesma embalagem produzida no sentido de que “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, pelo que se teria de concluir que a mesma não serviria, apenas, para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo, o que é bastante diverso do “per se” invocado pela Requerente, quanto ao primeiro claim;
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem é enganosa quanto às características do produto FLORA, por associação, devido “à omissão de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público…” (sic. decisão da Comissão de Apelo).
Neste tocante assiste razão à ULJM, quando refere a art.º 19.º da sua contestação que: “A verdade é que se não fosse assim, a BEL não se teria alongado em considerações de facto, e de direito, em particular de Direito Comunitário, sem fundamento para o fazer, uma vez que bastaria indicar ou transcrever a parte de uma daquelas decisões que proibisse a utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” para não precisar de alegar mais nada no sentido de demonstrar o alegado incumprimento.”
De onde, considera o Júri como conveniente transcrever o que foram os fundamentos expostos pela Comissão, quanto à embalagem do produto FLORA:
“Afigura-se-nos, ressalvada melhor opinião naturalmente, que a comunicação comercial contida na embalagem do produto em causa não pode restringir-se à descrita no nº 2 da f.f., como aparentemente se fez na decisão recorrida, devendo qualificar-se como tal também a comunicação contida na lateral daquela embalagem, descrita no nº 3 da f.f.
(…)
Ora, considerando que estamos perante um produto que é caracterizado por ser “um creme vegetal” – em cuja composição os ingredientes principais são o óleo de girassol e matérias gordas vegetais – e não perante uma “manteiga” – cujos ingredientes principais são produtos lácteos – já seria muito duvidoso que, por si só, o destaque dado na embalagem ao disclaimer “Com leite dos Açores” – no topo e numa lateral – , destaque também resultante da sua apresentação gráfica (inserido num círculo e com pingo de leite estilizado), associado à omissão naqueles locais de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público, o qual só tem acesso a essa informação se pegar na embalagem e olhar para a sua parte de baixo, o que não é procedimento comum, em termos de normalidade para o consumidor médio) e ao facto de a percentagem de leite (e em pó) ser de apenas 1%, já seria muito duvidoso dizíamos, que tal comunicação comercial fosse compatível com os mencionados princípios da honestidade e veracidade, acolhidos nos citados dispositivos do CCICAP e preceitos legais. (negrito e sublinhado do Júri)
(…)
Mas, além disso, ou seja, analisando a comunicação comercial em causa, no seu conjunto, nomeadamente considerando o disclaimer referido no nº 2 da f.f. e a mensagem contida numa lateral da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), em que se procura induzir, quando não expressar uma associação entre o produto em causa e a manteiga, ao comparar-se a gordura saturada de Flora e a gordura saturada da manteiga standard, afigura-se-nos que foram realmente ultrapassados os limites das honestidade e veracidade da comunicação comercial. (negrito e sublinhado do júri).
Na verdade, nestas circunstâncias, o consumidor médio, ainda que normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, é não só susceptível de ser induzido em erro sobre as características essenciais do produto em causa (ser constituído essencialmente por produtos lácteos e não produtos vegetais), como pode ser determinado e influenciado na escolha do produto, considerando como relevante na sua composição o “leite dos Açores”, quando na verdade a integração do leite naquele produto é muito reduzida.
 (…)
Ora, uma vez que a comunicação “com leite dos Açores” está associada à outra comunicação constante da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), teremos de concluir que a mesma não serve apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo. Nesta medida pode também considerar-se que as denominações constantes do produto em causa não estão conformes ao art.º 78º do Regulamento (EU) 1 308/2013 de 17.12.” (Negrito e sublinhado do JE).
Termos em que, no que concerne aos presentes autos apreciar-se-á, tão somente, a alegada desconformidade da actual campanha publicitária ao produto FLORA, da responsabilidade da ULJM, com as decisões da Comissão de Apelo e da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, de acordo com a interpretação que ficou exposta pelo Júri, as quais não permitem corroborar, em toda a sua extensão, o alegado pela FROMAGERIES a parágrafo primeiro do ponto II.1 da queixa, no sentido de que, “A Unilever mantém o destaque impressivo da menção “COM LEITE DOS AÇORES”, quer na embalagem do produto Flora, quer nos demais suportes da sua comunicação comercial, o que foi censurado pela decisão da Comissão de Apelo, nos termos da lei .”.
1.3.2. Da desejável celeridade em matéria de autoregulação
Não pode o Júri esquivar-se a deixar aqui uma nota sobre esta questão, já que o que se encontra em lide nos presentes autos diz respeito a alegado incumprimento de comunicação comercial que foi objecto de deliberações do JE (cfr. artigo 7.º, n.º 1, alínea b, do respectivo Regulamento), para cuja decisão milita com maior força, a necessária celeridade em matéria de autoregulação. Aliás, esta é a razão pela qual, nestes casos, não só o prazo para contestar é de apenas dois dias úteis, como somente se exige em termos petição, a apresentação dos factos e a fundamentação do alegado incumprimento pela outra parte, bem como a junção da comunicação comercial (cfr. artigo 10.º, n.º 4) e, em sede de contestação, a apresentação dos factos e fundamentação do alegado cumprimento. (Cfr. artigo 11.º, n.º 5).
Por outro lado, em bom rigor, deveria igualmente o Júri conseguir pronunciar-se sobre tais eventuais incumprimentos de deliberações, com maior rapidez.
Ora, colocado perante a queixa da Requerente, na qual se intercalam alegações sobre factos novos com articulados que denunciam o incumprimento das deliberações respeitantes ao processo 4J/2014 (cfr. parágrafos décimo a décimo segundo do ponto II.2. sobre a invocada ilicitude de “adição da menção “creme vegetal” encimando o selo da embalagem”) e, ainda, com outros sobre matéria conclusiva e de direito cuja análise implicaria uma reapreciação dos factos que foram objeto daquele processo, circunstâncias a que acresce a descontextualização das conclusões da Comissão de Apelo no mesmo vertidas, entende o JE que a litigância da Requerente não é compatível com a referida celeridade em matéria de autoregulação.
De facto, constata o JE a profusa alegação em sede de queixa, de:
– nova matéria conclusiva ou de direito sobre factos já apreciados em sede do processo 4J/2014 do ICAP, num total de vinte e dois parágrafos no ponto  II.1., sobre o claim “Com Leite dos Açores”, de mais treze parágrafos (do décimo sexto ao vigésimo oitavo) no ponto II.2. sobre a invocada ilicitude de “adição da menção “creme vegetal” encimando o selo da embalagem”, de outros quatro parágrafos (do primeiro ao quarto), a propósito do ponto II.3. acerca da “manutenção concomitante da comunicação comercial visada” e, finalmente, de três parágrafos de “Conclusões” (do primeiro ao terceiro, do ponto III) todos eles não numerados e, num total de quarenta e dois;
– matéria de facto nova, por não apreciada no âmbito do processo 4J/2014 e não abrangida na letra ou no espírito das decisões da Comissão de Apelo e do Júri – cuja articulação é inconsentânea com o prazo de dois dias concedido para contestar, mais reduzido em atenção à finalidade a que se destina – tal, a parágrafos de um a nono e vigésimo nono no ponto II.2. sobre a invocada ilicitude de “adição da menção “creme vegetal” encimando o selo da embalagem”, bem como de quinto, do ponto II.3. acerca da “manutenção concomitante da comunicação comercial visada” e, finalmente, a parágrafos quarto e quinto do ponto “III. Conclusões”, todos os parágrafos não numerados, num total de treze…
1.3.3. Da matéria que não cumpre ao Júri apreciar no âmbito dos presentes autos
Todos os referidos cinquenta e cinco parágrafos não numerados como articulados que pretendem ser, encontram-se precedidos da declaração de intenção por parte da FROMAGERIES feita no sentido de que: “A comunicação comercial da Unilever acima descrita constitui uma violação intencional da decisão da Comissão de Apelo e consubstancia, concomitantemente, o desrespeito grave e censurável das suas obrigações, quer enquanto parte requerida no processo nº 4J/2014, quer enquanto membro do ICAP, como se irá seguidamente demonstrar.” (sic. parágrafo quinto do ponto II. “FUNDAMENTAÇÃO” da queixa).
Contudo, na parte em que tal “demonstração” se refira à tentativa de reapreciação de factos que foram objecto de análise em sede do processo 4J/2014 do ICAP – de acordo com o aduzido a 1.3.1. – e/ou, à apreciação de matéria nova que – para além de se não compadecer com o já referido prazo de dois dias concedido para contestar – justifica a organização de um novo processo, segundo o que se concluiu a 1.3.2., não será tida em conta pelo Júri em sede dos presentes autos.
4. Dos factos
Nos termos do 8º da contestação, a requerida aceita o alegado pela FROMAGERIES “…nos nºs 4 (impugna-se “alegado”) a 8 e 14 (com a explicação infra – 13º), da Exposição dos Factos” constante da queixa da Requerente.
Em conformidade, e no que é relevante para a economia da presente decisão, consideraram-se provados os seguintes factos que não se mostram impugnados, e alegados na petição:
– (i) Em 20 de Maio de 2014, a ULJM comunicou ao ICAP o cumprimento da decisão da Comissão de Apelo (anexo 1), nos seguintes termos: Embalagem Flora “Proposta de alterações: – no selo “Com Leite dos Açores”, colocar sempre “creme vegetal”, ficando assim “creme vegetal com leite dos Açores” (imagem).
Timing de implementação: Início da produção das novas embalagens – 1ª quinzena de Julho. Início das entregas aos Clientes – última semana de Julho.”;
– (ii) Campanha TV
“Proposta de alterações: – alterar voz-off para “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora, agora com leite dos Açores”; retirar frase “Com leite dos Açores” que está escrita no packshot final.
Timings de implementação: próxima vaga da campanha já irá para o ar nestas condições.” (Cfr. art.º 4.º);
 – (iii) Desde pelo menos o dia 6 de Junho de 2014, a ULJM publica e divulga no Youtube diversa comunicação comercial alusiva ao produto FLORA – incluindo filmes publicitários e imagens da embalagem – das quais constam os seguintes claims:
– “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora… agora com LEITE DOS AÇORES”
– “Experimenta o novo creme vegetal Flora, agora com LEITE DOS AÇORES!” (Cfr. art.º 5.º).
A imagem principal da embalagem no topo da referida comunicação mantém o selo “COM LEITE DOS AÇORES”. (Cfr. art.º 6.º e Doc.2 junto à petição);
– (iv) A UIJM é igualmente responsável pela emissão em televisão do spot publicitário constante de Doc. 3 junto à queixa, do qual constam os seguintes claims:
– “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora… agora com LEITE DOS AÇORES” (Cfr. art.º 7.º).
Entre os dias 31 de Maio de 2014 e 10 de Junho de 2014, o referido anúncio foi emitido pelo menos 212 vezes, incluindo 38 vezes na SIC, 29 vezes na TVI e 35 vezes na RTP 1, conforme documento que se junta (anexo 4). (Cfr. art.º 8.º);
– (v) Concomitantemente, no dia 1 de Junho de 2014, foi publicada na revista Zen Energy, a seguinte comunicação comercial:
-“MANTEIGA FLORA
NOVA RECEITA COM LEITE DOS AÇORES
Ainda mais saborosa, a nova Flora apresenta-se aos portugueses com uma nova embalagem, dois novos formatos e com um intenso sabor a manteiga, resultante da nova receita com Leite dos Açores. […]. O seu novo e delicioso sabor proveniente do Leite dos Açores vai conquistar todos os apreciadores deste ritual, quer seja ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que apetecer. […].” (Cfr. art.º 9.º, e Doc. 5 junto);
– (vi) No dia 4 de Julho de 2014, a ULJM continuava a comunicar o claim “Delicioso sabor, com leite dos Açores” com o selo “COM LEITE DOS AÇORES”, conforme resulta das fotografias tiradas na loja Continente de Leiria. (Cfr. art.º 10.º e Doc. 6 anexo à queixa);
– (vii) Ainda no mesmo dia 4 de Julho de 2014, a ULJM publicitava o seu produto FLORA através dos claims “Delicioso sabor, com leite dos Açores” e do selo “COM LEITE DOS AÇORES”, conforme resulta das fotografias tiradas na loja Continente de Leiria que junta à queixa. (Cfr. art.º 10.º e Doc. 7 anexo);
– (viii) No dia 14 de Junho de 2014, a ULJM continuava a comercializar o produto FLORA, através da utilização de uma embalagem contendo a menção  “COM LEITE DOS AÇORES” (selo), conforme resulta da fotografia tirada na loja Pingo Doce do Centro Comercial Spazio (Olivais), em Lisboa, e de factura de compra de uma embalagem. (Cfr. art.º 11.º e Docs. 8 e 9 juntos à petição);
– (ix) A ULJM continua a realizar nas lojas uma campanha publicitária através da qual oferece descontos no produto FLORA, usando para o efeito suportes de comunicação comercial como folhetos, cupões e similares, contendo a imagem da embalagem da respectiva embalagem com o selo “COM LEITE DOS AÇORES”, sob a imagem de um pingo de leite estilizado. (Cfr. art.ºs 12.º e 13.º e Docs 10 a 14 anexos à queixa);
– (x) A ULJM continuava a transmitir na data de 20 de Junho de 2014, no seu site institucional da Internet, a seguinte comunicação comercial:
– “A marca Flora foi relançada com uma receita digna dos verdadeiros apreciadores de manteiga: um sabor intenso, com leite dos Açores, irresistível num bom pão quentinho acabado de sair do forno.
A receita de Flora, para além de deliciosamente apetitosa, tem a vantagem de ter menos gordura saturada que a manteiga standard*, o que faz dela a escolha certa para um consumo diário ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que te apetecer.
Flora é um creme vegetal com o delicioso sabor a manteiga, disponível nos formatos 250g e 500g.
*Mais precisamente, – 32% gordura saturada vs manteiga standard a 82% de gordura. Teste realizado em laboratório independente em Outubro de 2013.” (Cfr. art.º 14.º e Doc. 15 junto à petição).
5. Das alegações das Partes
5.1. Defende a FROMAGERIES como “FUNDAMENTAÇÃO” em sede de queixa que:
– (i) “Os regulamentos do ICAP obrigam as partes intervenientes a acatar prontamente, “na letra e no espírito”, as decisões do ICAP (artigo 30º, nº 3 do Código de Conduta), dispondo do “prazo de máximo de 2 dias úteis” para comprovar a cessação imediata da comunicação visada pela decisão (artigo 14º do Regulamento do JE)”;
– (ii) “A Unilever, enquanto associado do ICAP, obrigou-se igualmente a cumprir os normativos do ICAP e as decisões dos seus órgãos (artigo 8º, alínea h) dos Estatutos do ICAP)”;
– (iii) “Todavia, nem quanto à letra e ao espírito da decisão do CA, nem quanto ao prazo de cumprimento, a Unilever cumpriu o que quer que fosse.”;
– (iv) “A comunicação comercial da Unilever acima descrita constitui uma violação intencional da decisão da Comissão de Apelo e consubstancia, concomitantemente, o desrespeito grave e censurável das suas obrigações, quer enquanto parte requerida no processo nº 4J/2014, quer enquanto membro do ICAP, como se irá seguidamente demonstrar.” (sic).
5.2. Contraditando a denúncia da FROMAGERIES, vem a ULJM impugnar o seu teor na generalidade, alegando, em síntese, que:
– (i) “…tudo o que é afirmado (…) corresponde à verdade e não é susceptível de induzir em erro o consumidor médio relativamente a qualquer dos elementos do produto FLORA.” (sic. art.º 32.º), acrescentando que “Aquela que já era a percepção do consumidor médio (…) está agora ainda mais clara” (sic. art.º 28.º) e que”…é natural que existam ainda no mercado embalagens que não estejam conformes com a comunicação de 20 de Maio dirigida ao ICAP, sendo certo que (…) as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho, e é possível que um ou outro folheto, também desconforme, tenha ficado pelos pontos de venda, pois é muito difícil que assim não aconteça.” (sic. art.º 10.º);
– (ii) “…os materiais de ponto de venda ainda não têm o novo selo com a menção “creme vegetal”, pois esta alteração decorre da Decisão da Comissão de Apelo que tem por objecto unicamente a embalagem, e aqueles já tinham tido uma primeira alteração referente à frase “Delicioso sabor, com leite dos Açores”, decorrente da Decisão do JE.” (sic art.º 11.º), sendo que “Os materiais de ponto de venda em produção, e em processo de substituição, terão já o novo selo incorporado, tal como vai estar na embalagem.” (sic. art.º 12.º);
– (iii) “…o filme que tem sido emitido em televisão e no youtube está exactamente como consta da citada comunicação de 20 de Maio p.p., e nem a BEL refere o contrário” (sic. art.º 14.º) e, “…para que não houvesse qualquer dúvida quanto à natureza do produto FLORA, a ULJM foi mesmo para além da Decisão da Comissão de Apelo, uma vez que tendo aquela proibido a comunicação “Com leite dos Açores” associada à que constava da lateral da embalagem, o produto passou a ser claramente enquadrado pela aposição da menção “creme vegetal” junto ao disclaimer “Com leite dos Açores”, indicando de forma expressa, e sem margem para qualquer dúvida, que não se trata de um produto lácteo (o sublinhado é nosso).” (sic. art.º 16.º);
– (iv) “A utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” não foi proibida pelas decisões…” (sic. art.º 20.º), acrescentando que “…a menção “creme vegetal” foi incluída na embalagem sem que a isso a ULJM estivesse obrigada pelas Decisões, mas por lhe parecer que dessa forma se dissipava qualquer dúvida que pudesse subsistir, deixando ainda mais evidente (…) que não se tratava de uma manteiga” (sic. art.º 21.º) e que “…de acordo com o entendimento expresso pelo JE na Decisão que proferiu, se não há qualquer hipótese de o consumidor considerar que está perante algo que não seja um creme vegetal para barrar, com a menção “creme vegetal” ainda menos.” (sic. art.º 24.º).
2. Análise dos factos alegadamente desconformes com deliberações do JE
De acordo com os fundamentos e conclusões do Júri a pontos de 1.3.1. a 1.3.3. supra, no sentido de que no que concerne aos presentes autos apreciar-se-á, tão somente, a alegada desconformidade da actual campanha publicitária ao produto FLORA, da responsabilidade da ULJM, com as decisões do JE, concretamente, da Comissão de Apelo de 15 de Maio de 2014 e da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, de acordo com a interpretação que ficou exposta, o JE não se debruçará sobre a alegada ilegalidade:
– da menção “com leite dos Açores”, por impossibilidade de reapreciação do facto,
– da menção “creme vegetal”, a qual se considera como matéria nova.
Dito de outra forma, cumpre agora averiguar da alegada desconformidade dos “factos” elencados a 1.4. com:
– a decisão da Comissão de Apelo de 15 de Maio de 2014, segundo a qual “Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar procedente o recurso e, em consequência, determinam a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA, quanto à comunicação “Com leite dos Açores”, associada à comunicação constante da lateral daquela embalagem: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, devendo a sua divulgação cessar de imediato e não ser resposta.” (sic.III – DECISÃO, negrito e sublinhado do Júri);
– a decisão da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, no que tange à comunicação comercial do produto FLORA (veiculada nos suportes Internet, MUPI, folheto e lineares ou gôndolas de supermercado) em que se considerou que o disclaimer “Com Leite dos Açores” – atenta a respectiva percentagem provada pela ULJM – configuraria uma prática de publicidade enganosa, nos casos (e só nos casos) em que se encontrasse associado a claims susceptíveis de criar junto do consumidor médio, a convicção de que Flora “com leite dos Açores”, por este facto alegado, e de acordo com um nexo de causalidade tem um delicioso sabor; e, ou, de que o mesmo sabor é o de manteiga e, ou, de que pode satisfazer os apreciadores desta, como se de manteiga se tratasse.
2.1. Factos que não cumpre ao Júri apreciar
Em conformidade com o que ficou exposto, analisados os “factos” definidos a 1.4. supra, entende o Júri que se encontram na categoria daqueles que não lhe cumpre apreciar, os seguintes:
 – “1.4. (iii)”, “1.4. (vi)”, “1.4. (viii)” e “1.4. (ix)”, por virtude se afigurar pretendida uma reapreciação da referência “ com leite dos Açores”, (cfr., e respectivamente, Docs. 2, 6, 8 e 9 e 10 a 14 juntos à petição);
– “1.4. (iv)” em razão de se preconizar uma reapreciação da referência  “com leite dos Açores” (cf. Docs. 3 e 4 anexos à queixa) e, na medida em que é a própria Requerente a admitir o cumprimento por parte da ULJM do alegado a “1.4. (i)” e “1.4. (ii)” em matéria de “campanha na TV”, (cfr. parágrafo vigésimo nono do ponto II.2. da petição).
2.2. Factos cuja alegada desconformidade com as deliberações do JE cumpre ao Júri apreciar
2.2.1. Da comunicação comercial através de site institucional da ULJM
Segundo o ponto “1.4. (x)” supra, a ULJM continuava a transmitir na data de 20 de Junho de 2014, no seu site institucional da Internet, a seguinte comunicação comercial:
– “A marca Flora foi relançada com uma receita digna dos verdadeiros apreciadores de manteiga: um sabor intenso, com leite dos Açores, irresistível num bom pão quentinho acabado de sair do forno.
A receita de Flora, para além de deliciosamente apetitosa, tem a vantagem de ter menos gordura saturada que a manteiga standard*, o que faz dela a escolha certa para um consumo diário ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que te apetecer.
Flora é um creme vegetal com o delicioso sabor a manteiga, disponível nos formatos 250g e 500g.
*Mais precisamente, – 32% gordura saturada vs manteiga standard a 82% de gordura. Teste realizado em laboratório independente em Outubro de 2013.” (Cfr. art.º 14.º e Doc. 15 junto à petição).
Esclarece a ULJM na sua contestação que: “Em relação ao site corporativo, que era o único elemento que não tinha sido alterado de acordo com o comunicado pela ULJM ao ICAP, devido a problemas técnicos, está já em conformidade com essa comunicação” (sic. art.º 13.º), juntando comprovação aos autos através de documento anexo à mesma contestação de que já procedeu à necessária alteração, em ordem a cumprir o disposto nos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º, do Regulamento do JE, todos do ICAP.
2.2.2. Da comunicação comercial publicada na revista Zen Energy
De acordo com “1.4. (v)” supra, no dia 1 de Junho de 2014, foi publicada na revista Zen Energy, a seguinte comunicação comercial:
-“MANTEIGA FLORA
NOVA RECEITA COM LEITE DOS AÇORES
Ainda mais saborosa, a nova Flora apresenta-se aos portugueses com uma nova embalagem, dois novos formatos e com um intenso sabor a manteiga, resultante da nova receita com Leite dos Açores. […]. O seu novo e delicioso sabor proveniente do Leite dos Açores vai conquistar todos os apreciadores deste ritual, quer seja ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que apetecer. […].” (Cfr. art.º 9.º, e Doc. 5 junto).
A propósito, vem alegar a ULJM em sede de contestação que, “…ainda que seja exacto o alegado no nº 9, a verdade é que se trata de uma notícia, elaborada por um jornalista, com base num press realese que a ULJM distribuiu em Março, na altura do lançamento do produto, pelo que nenhuma responsabilidade pode ser assacada à contestante que não é a autora, não a “encomendou”, nem pode interferir na liberdade de criação do jornalista e na publicação do que aquele entender, a não ser a posteriori.” (sic. art.º 9.º).
O JE discorda deste entendimento da Requerida, porquanto, nos termos do artigo 5.º, n.º 1, alínea a) do Código da Publicidade, sob a epígrafe “Anunciante, profissional, agência de publicidade, suporte publicitário e destinatário” – aplicável por via do artigo 4º, n.º 1 do Código de Conduta do ICAP – considera-se anunciante, “…a pessoa singular ou colectiva no interesse de quem se realiza a publicidade”. (Negrito e sublinhado do Júri).
Em conformidade, não tendo a ULJM juntado à sua contestação qualquer tipo de prova que permita retirar conclusão inversa, entende o Júri ser a Requerida, a pessoa colectiva que tem interesse em que o produto FLORA, por si comercializado, seja comunicado, in casu, através do que o Júri entende tratar-se de um caso de “publi-reportagem” (não identificada como tal), atenta a ausência dos contornos subjacentes a uma notícia de interesse público…
De onde, considera o JE que se está aqui em presença de alegações publicitárias ao produto FLORA e não, de informação, entendida esta no sentido próprio do termo.
Acontece que o meio considerado, o de imprensa escrita, não faz parte dos suportes que foram objecto de apreciação por parte do Júri no âmbito do processo 4J/2014.
Contudo, tem-se por bom o entendimento segundo o qual toda a deliberação final do JE deve ser entendida como aplicável apenas à comunicação comercial veiculada pelos suportes e meios visados no respectivo processo, se o contrário dela própria não resultar.
Ora, entende-se que da deliberação da Segunda Secção – na parte que não constituiu objecto de recurso –  resulta claramente que, quaisquer alegações publicitárias que, ao jeito de brand management, visem inculcar na mente do consumidor médio a convicção de que a percentagem de leite dos Açores contida no produto FLORA é apta a gerar “um intenso sabor manteiga” constitui uma prática de publicidade enganosa.
Por outro lado, o conteúdo de claims julgado contrário a uma deliberação transitada do JE abrange e é extensível a quaisquer textos cujo sentido possa claramente ser considerado, para um consumidor médio, igual ou nele incluído.
Entende o Júri ser o caso.
Com efeito, considerou o JE em sede da referida deliberação que, algo muito semelhante – divulgado em suporte Internet – configurava, igualmente, uma ofensa ao princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, a lembrar, por transcrição:
– “(iii) comunicação de marca por “Hipersuper” (cfr. Doc. 10):
Disclaimer (S1) “Com leite dos Açores” associado a
Claims: ”…Na prova decisiva que é em casa dos consumidores, acreditamos que o intenso sabor a manteiga de Flora, resultante da nova receita com Leite dos Açores, vai conquistar os mais exigentes apreciadores”, explica Luís Gomes, Flora Brand Manager”.”.
Por maioria de razão do que expôs, entende o Júri que a comunicação comercial veiculada através da revista Zen Energy, apta a gerar a convicção de que FLORA “com leite dos Açores”, por este facto alegado, e de acordo com um nexo de causalidade tem um delicioso sabor; e/ou, de que o mesmo sabor é o de manteiga; e/ou, de que pode satisfazer os apreciadores desta – como se de manteiga se tratasse -, configura uma violação dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º, do Regulamento do JE, todos do ICAP.
2.2.3. Da comunicação comercial através de folheto
Segundo se referiu a ponto “1.4. (vii)”, “Ainda no mesmo dia 4 de Julho de 2014, a ULJM publicitava o seu produto FLORA através dos claims Delicioso sabor, com leite dos Açores”, bem como a publicitar e vender o mesmo produto com o selo “COM LEITE DOS AÇORES”, conforme resulta das fotografias tiradas na loja Continente de Leiria juntas à petição. (Cfr. art.º 10.º e Doc. 7 anexo)”.
À primeira vista, tais alegações seriam susceptíveis de serem consideradas como um facto já apreciado e não considerado desconforme com a moldura ético-legal em matéria de princípio da veracidade (pelos fundamentos e à semelhança do que se expôs em 2.1. supra), não fosse a situação constatada pelo JE de se poder extrair, neste caso específico, um nexo de causalidade entre o sabor da nova FLORA e o leite dos Açores o que, como se referiu ad nauseum no âmbito do processo 4J72014, se trata de uma prática de publicidade enganosa.
Assim, muito embora sejam compreensíveis para o Júri, as razões elencadas pela ULJM a art.º 10.º da contestação no sentido de ser “…natural que existam ainda no mercado embalagens que não estejam conformes com a comunicação de 20 de Maio dirigida ao ICAP, sendo certo que (…) as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho, e é possível que um ou outro folheto, também desconforme, tenha ficado pelos pontos de venda, pois é muito difícil que assim não aconteça” (sic.), o certo é que o JE não se pode estribar na razoabilidade das mesmas, para o efeito de não considerar que se verifica uma desconformidade entre divulgação das alegações publicitárias ora em causa – através de suporte folheto – e a observância, por parte da Requerida, dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º e do Regulamento do JE, todos do ICAP.

3. Decisão
Termos em que a Secção ad-hoc do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da ULJM – veiculada nos suportes imprensa escrita [1.4. (v)] e folheto [1.4. (vii)] – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com os artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º, do Regulamento do JE, todos do ICAP, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE no âmbito das deliberações do processo 4J/2014 do ICAP.
A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP
Auto Regulação14J / 2014 :: Fromageries Bel Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins
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13J / 2014 :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

13J/2014

Beiersdorf Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no primeiro dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 13J/2014 tendo deliberado o seguinte:
Processo n.º 13J/2014
1.  Objecto dos autos
1.1.  A BEIERSDORF PORTUGAL, LDA., (“Beiersdorf” ou “Queixosa”) vem, nos temos do artigo 10.º do Regulamento do Júri de Ética do ICAP (“Regulamento JE”) apresentar queixa contra UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, LDA. (adiante abreviadamente UJM ou denunciada), relativamente a comunicação comercial iniciada em Portugal em 23 de Março de 2014 referente ao produto da Unilever “Dove Invisible Dry”, um desodorizante e ao alegado “efeito” 100 cor, veiculada através de televisão, Internet e rotulagem, por violação dos artigos 9.º, n.º 1, alínea a) do Código de Conduta do ICAP e 10.º do Código da Publicidade; artigos 9.º do Código de Conduta do ICAP e 11.º do Código da Publicidade e do Decreto-Lei n.º 57/2008, no seu artigo 7.º, n.º 1, alínea b).
1.2.  Notificada para o efeito, a UJM apresentou a sua contestação.
1.3.  Dão-se por reproduzidas a queixa, a contestação e os documentos apresentados pelas Partes.
1.4.  Síntese da posição da parte queixosa
As posições da Queixosa podem ser sintetizadas como segue:
– A Unilever lançou uma campanha publicitária relativa ao produto Dove Invisible Dry.
– A referida campanha “Dove Invisible Dry 100 colors”, foi projectada para enfatizar propriedades e acção anti-manchas do produto Dove Invisible Dry de uma forma enganosa, procurando, em especial, incutir a ideia errada de que se trata de um desodorizante com uma acção anti-mancha especificamente eficaz em todos os tipos de manchas, incluindo manchas amarelas (que surgem nos tecidos de cor clara), o que não é verdade.
– Além disso, esta alegação foi comunicada num contexto em que o produto Dove surge como sendo o “primeiro” desodorizante no segmento de anti-manchas – atente-se na afirmação “o primeiro desodorizante”-, gerando, assim, uma comparação com os seus concorrentes com base em falsas premissas, o que agrava o carácter ilícito da campanha publicitária da Unilever, ao promover entre o consumidor uma inevitável comparação com os concorrentes partindo do falso pressuposto de que este se trata do primeiro anti-manchas do mercado.
– Na campanha publicitária objecto da presente queixa, estão em causa as mensagens publicitárias referentes à eficácia anti-manchas em 100 cores, eficácia essa atribuída pela Unilever ao seu produto “Dove Invisible Dry”, incluindo eficiência na roupa de cor preta e de cor branca, bem como as referências, ainda que indirectas, a produtos de outras marcas.
– Em suma, estão em causa as seguintes afirmações:
•  “Ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é fantástico”.
•  “Apresentamos o novo Dove Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 Cores.”
•  “Novo Dove Invisible Dry, Invisível em 100 Cores, incluindo nas que mais gosta.”
•  “Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco.
•  “Tested on 100 colours”
– Sempre que a acção anti-mancha de um desodorizante é limitada a apenas um dos dois tipos de mancha indicado acima, a publicidade a esse produto, pretendendo evidenciar o poder anti-mancha, deve indicar o tipo de mancha que o produto evita, de forma muito precisa e clara.
– Sucede que, a Unilever, na sua campanha publicitária ao produto Dove Invisible Dry fez, exactamente, o oposto.
– De facto, as afirmações como “Invisível em 100 cores” ou “Tested in 100 colours” apenas pode ser entendido pelo consumidor médio, como sendo referente a uma eficácia anti-manchas ilimitada, ou pelo menos eficaz em 100 cores.
– Este conceito “anti-mancha ilimitado” sai ainda mais reforçado no anúncio de televisão, que afirma expressamente “(…) ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favorito é realmente fantástico”.
– Porém a publicidade ao produto vai ainda mais longe e para que não haja incertezas, é ainda afirmado que o produto é “Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco”, ou seja não restam dúvidas que na campanha publicitária em causa, a Unilever pretendeu claramente afirmar que o produto é eficaz em todas as cores, incluindo a cor branca e as cores pálidas.
– Cabe ao anunciante demonstrar as afirmações feitas no âmbito da mensagem publicitária, designadamente comprovar as afirmações sobre o produto promovido.
– A afirmação de que o produto é invisível em 100 cores, e não apenas no preto e no branco, é uma alegação de um facto verificável e como tal, deve ser objecto de comprovação pela Unilever.
– O ónus da prova a este respeito é da responsabilidade do anunciante conforme resulta do n.º 2 do artigo 12.º do Código de Conduta do ICAP e ainda do artigo 11.º do Código da Publicidade.
– A Unilever terá, portanto, de provar que:
a)  Testou o produto em 100 cores (uma vez que especificamente afirma a sua eficácia em 100 cores na publicidade em questão);
b)  Que a eficácia anti-mancha foi demonstrada nessas 100 cores;
c)  O produto Dove Invisible Dry impede a formação de manchas brancas, e de manchas ou marcas amarelas.
– E nem se diga que a Unilever procurou informar o consumidor médio ao colocar no rótulo traseiro das embalagens a menção “anti white stains”, pois tal como já foi explanado e resulta da experiência comum, por um lado o efeito anti-manchas brancas reflecte-se na roupa escura, mas não na roupa clara.
– E, por outro, o efeito antimancha amarela não resulta de um produto com composição apenas anti-mancha branca, pois trata-se de efeitos químicos diferentes.
– Na verdade a mancha branca é imediata e surge por contacto directo do desodorizante anterior à sua secagem e a mancha amarela surge apenas depois de alguma utilização e pela reacção do tecido a outros agentes (o suor e os detergentes utilizados nas lavagens).
– Acresce que, a mensagem “anti white stains” não é suficiente de per se para excluir a eficácia do produto relativamente a outros tipos de manchas, como as amarelas, sendo certo que essa afirmação nunca será assim interpretada pelo consumidor médio que desconhece as diferentes causas das manchas brancas e amarelas.
– Aliás, o consumidor médio não está, sequer, alerta para esta diferença, já que toda a promoção é direccionada, precisamente, no sentido de o produto da Unilever ser eficaz em todas as manchas, chegando até a afirmar “Não apenas no preto e no branco.”
– A este respeito diga-se que o Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária, em Itália, decidiu já queixa em tudo semelhante à ora apresentada, tendo concluído que a campanha publicitária da Unilever enquadra o conceito de publicidade enganosa previsto no artigo 2.º do Codice di Autodisciplina della Comunicazione Commerciale que dispõe:
“ Comunicação Empresarial enganosa”
A Comunicação Comercial deve evitar qualquer declaração ou representação susceptível de induzir em erro os consumidores, mesmo por omissão, ambiguidade ou afirmações exageradas, especialmente no que concerne às características e os efeitos do produto, preço, gratuidade, condições de venda, distribuição, identidade das pessoas representadas (…).
– Ao avaliar a comunicação comercial enganosa é tomado como referência o consumidor médio do grupo de referência.
– Aliás, nesse processo, a Unilever apresentou testes de mercado alegando que os mesmos comprovariam a eficácia do produto em 100 cores.
– Os referidos testes foram impugnados pela Beiersdorf Itália no que concerne, nomeadamente, à metodologia utilizada por um lado e, por outro, quanto às conclusões dos consumidores relativamente à eficácia directa nas manchas amarelas, já que todas as questões alegadamente colocadas ao consumidor estão orientadas para a produção/não produção de manchas brancas, sendo certo que os testes no Brasil se reportam exclusivamente às manchas brancas.
– Ainda no que concerne ao tipo de manchas, da informação colocada no contra-rótulo das embalagens, junto às indicações da composição do produto e em letra de tamanho claramente inferior, resulta que é a própria Unilever que admite que o produto apenas é eficaz nas manchas brancas, donde a eficácia nas manchas amarelas em cores claras e na cor branca não estará, de forma alguma, garantida.
– Tal admissão, que se aceita, não pode, em qualquer caso, ser vista como uma rectificação ao conteúdo da mensagem publicitária, porquanto:
•  Não existe qualquer menção/ reserva na mensagem publicitária propriamente dita, como, por exemplo: “Tested on 100 colours”, seguido de asterisco com mensagem explicativa, e
•  A informação está escondida entre as informações sobre a composição do produto que aparece na parte de trás do rótulo, em letra substancialmente inferior.
– Em qualquer caso, faz-se notar que a proibição de utilização de uma mensagem publicitária enganosa não é mitigada por alusões ou eventuais rectificações que não afastem em absoluto a eficácia da mensagem enganosa, em especial quando a mensagem enganosa constitui o centro ou o foco principal da mensagem publicitária, como é, claramente aqui o caso.
– Assim, devem as mensagens publicitárias da Unilever supra identificadas e integrantes da campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” serem declaradas como publicidade enganosa, especificamente violando o artigo 11.º do Código da Publicidade, mais devendo ser declarada a mensagem publicitária subjacente à Campanha 100 Cores como uma prática enganosa proibida pelo Decreto-Lei n.º 57/2008, e em concreto identificada no artigo 7.º, n.º 1, alínea b), do referido diploma.
– A campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” deve, igualmente, ser declarada desconforme ao princípio da verdade nos termos dos artigos 10.º do Código da Publicidade e 9.º do Código de Conduta do ICAP,
1.5.  Síntese da posição da parte denunciada
– A campanha publicitária ora em causa diz respeito, essencialmente, às mensagens constantes do filme utilizado em televisão e Internet, na própria embalagem e nos materiais de ponto de venda alusivos ao produto Dove Invisible Dry.
– No que ao filme diz respeito, este começa por descrever que foram convidadas mulheres a utilizar o produto em 100 cores e que a protagonista do TVC terá escolhido a cor vermelha.
– Nas imagens, surge a referida protagonista a aplicar o desodorizante Dove Invisible Dry e a mostrar a sua axila em direcção à câmara, demonstrando, a final, que o vestido que enverga não contém qualquer mancha, afirmando “Veja, sem marcas!”.
– Antes da mencionada demonstração da protagonista, é apresentada uma outra, que consiste na aplicação do aerossol de Dove Invisible Dry num conjunto de tecidos de diversas cores, no intuito de demonstrar que os mesmos ficam sem manchas após essa aplicação.
– É um facto que, entre os tecidos no qual é aplicado o aerossol de Dove Invisible Dry se encontram tecidos de cores escuras e claras, o que apenas reforça a alegação de que o desodorizante foi efectivamente testado num largo espectro de cores, sem que se verificasse o surgimento de qualquer mancha.
– As execuções do spot televisivo de 15 segundos e de 5 segundos, também juntos à queixa da BDF, centram-se exactamente nas mesmas imagens e alegações, isto é, na aplicação do desodorizante e demonstração da inexistência de manchas.
– Crê a ULJM ser por demais evidente que o spot televisivo ora em análise (nas suas diferentes extensões) é direccionado exclusivamente para as manchas normalmente produzidas pelos desodorizantes aquando da sua aplicação (a que vimos chamando de manchas brancas) e não às manchas que, a longo prazo e com a utilização e lavagem, podem surgir na roupa.
– Não compreende a ULJM como se pode extrair do dito anúncio que a mensagem percepcionada pelo «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido» é a de que a publicidade diga respeito a outras manchas que não aquelas que surgem no momento após a aplicação do desodorizante anunciado.
– Pretende a BDF defender a tese de que a embalagem de Dove Invisible Dry induz o consumidor médio ao entendimento de que o desodorizante em causa impede o aparecimento de manchas amarelas nas roupas que, como se disse, podem surgir a longo prazo nas roupas claras.
– Da imagem colorida com a indicação “tested on 100 colours” não pode retirar-se qualquer conclusão no sentido de se aplicar a umas ou outras manchas.
– Simplesmente se pode concluir que o produto foi testado em 100 cores.
– Sendo certo que nenhuma das cores que preenchem o número 100 é uma cor clara, ou seja, uma cor onde fosse possível verificar-se o aparecimento das manchas amarelas.
– Por debaixo da mencionada imagem colorida com o número 100, surge a imagem de um vestido preto.
– Com a colocação desta imagem na embalagem, pretendeu-se, precisamente, evidenciar o efeito do produto nas roupas escuras.
– Ora, as manchas amarelas que surgem nas roupas ao longo do tempo, decorrentes da sua utilização e lavagem frequentes, apenas são visíveis, como repetidamente afirma a BDF na sua queixa e agora corrobora a ULJM, nas roupas claras.
– Donde, nenhuma dúvida existe de que as manchas em que o produto se anuncia na embalagem como sendo eficaz são precisamente aquelas que sobressaem em vestidos negros, isto é, as manchas brancas.
– A terceira referência a manchas que se pode encontrar nas embalagens é, como se disse, a frase, a negrito, no verso da embalagem onde se pode ler “anti-white marks/anti-manchas brancas”.
– Apesar da BDF qualificar esta referência da embalagem como irrelevante para o consumidor, a verdade é que a mesma se encontra bem visível na parte posterior da embalagem (é a primeira), em negrito, e em tamanho superior ao restante texto.
– Mas, acima de tudo, é coerente com as restantes referências visuais à questão das manchas.
– Tudo na embalagem aponta para a eficácia contra o aparecimento de manchas brancas após aplicação do produto.
– Finalmente, no que respeita à embalagem e não obstante as referências da BDF ao litígio ocorrido em Itália, deve ficar claro que nenhuma decisão em Itália obrigou a qualquer alteração das embalagens, cuja comunicação é similar àquela que consta das embalagens portuguesas.
– Para além do filme televisivo e da comunicação da embalagem, centra a BDF a sua queixa nos materiais de comunicação colocados nos pontos de venda e algumas acções de marketing, onde a ULJM utiliza, para além das imagens e alegações constantes do filme e das embalagens, a alegação publicitária “Invisível em todas as cores. Não apenas no Preto e Branco”.
– Segundo a BDF esta alegação publicitária constitui uma expressa referência à acção anti-manchas, não só contra as manchas brancas, como também contra as manchas amarelas.
– A ULJM discorda deste entendimento (…) Desde logo, porque nenhuma referência é feita a qualquer acção contra as manchas amarelas.
– Em segundo lugar porque, como se verá, o teste feito ao Dove Invisible Dry em mais de 100 cores.
– E de entre as 100 cores encontram-se o preto e o branco. Não só, mas também. (…) O que significa que a alegação é verdadeira.
– Resta demonstrar se, apesar de verdadeira, induz ou não os consumidores em erro quanto aos efeitos do produto.
– A este respeito convém ter presente que, até à data do lançamento do Dove Invisible Dry, todos os desodorizantes com ingredientes destinados a actuar sobre o surgimento de manchas amarelas, que se anunciaram no mercado especificamente como tal.
– Por outras palavras, sempre que um determinado produto se pretende afirmar como tendo uma acção anti-manchas amarelas, anuncia-o de forma expressa em toda a comunicação que apresenta aos consumidores.
– O que significa que, ao contrário do que a BDF pretende fazer crer, os consumidores que procuram desodorizantes que evitem o aparecimento de manchas amarelas a longo prazo nas suas roupas, procuram especificamente produtos que se anunciem como sendo eficazes nessas manchas.
– E a verdade é que Dove Invisible Dry não se anuncia como tendo eficácia contra manchas amarelas.
– Quanto ao inquérito junto pela BDF à sua queixa, trata-se de um estudo feito com consumidores do mercado italiano, nas circunstâncias desse mesmo mercado, que certamente tem em conta as circunstâncias daquele mercado, designadamente a publicidade que as marcas de diferentes desodorizantes difundem no mesmo.
– Trata-se, pois, de um estudo sem qualquer credibilidade para a avaliação do comportamento do consumidor português que, sabemos, é diariamente confrontado com comunicação de desodorizantes que se anunciam expressamente como se destinando a evitar o aparecimento de marcas amarelas.
– Como forma de sustentar as alegações publicitárias agora em causa, a ULJM solicitou a uma entidade externa independente a realização de um estudo de mercado, a Blue Yonder, documento que se junta como DOC 3.
– O mencionado estudo consistiu (como aliás é descrito no spot televisivo) em recrutar um conjunto de 120 mulheres, com vista a utilizar o seu novo produto Dove Invisible Dry e, seguidamente, envergar T-Shirts de 120 cores diferentes.
– As referidas mulheres aplicaram o dito produto sob monitorização da empresa de estudos de mercado e, entre 5 e 7 horas depois, foram questionadas sobre os efeitos do dito produto nas T-Shirts que envergaram.
– Os resultados foram inequívocos (…):
a.  Relativamente a 119 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “fica invisível”;
b.  Relativamente a 117 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “é invisível”;
c.  Relativamente a 114 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “é invisível nas minhas roupas”;
d.  Relativamente a 115 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “posso dizer adeus às manchas brancas”;
e.  Relativamente a 110 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “não preciso de me preocupar com manchas brancas nas roupas”;
f.  Relativamente a 109 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “o produto não deixou quaisquer manchas”;
g.  Relativamente a 113 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “estaria confiante em utilizar este produto com tecidos diferentes e tops de cores”;
h.  Relativamente a 109 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “proporciona protecção não detectável”;
i.  Relativamente a 109 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “o produto não é detectável”.
– Não resta, pois, qualquer dúvida de que o produto Dove Invisible Dry foi efectivamente testado em 100 cores, sendo verdadeira a afirmação constante dos diferentes suportes ora em causa.
– Por outro lado, é igualmente verdadeira a afirmação segundo a qual o produto, após aplicado, não provocou manchas em 100 cores.
– É esse o resultado do teste efectuado.
– Através dos mencionados testes, a ULJM obteve a demonstração de que o produto Dove Invisible Dry é, de facto, invisível em 100 cores.
– As consumidoras recrutadas para realização dos testes confirmaram, efectivamente, que após a aplicação do produto Dove Invisible Dry, não detectavam (não visualizavam) qualquer mancha em mais de 100 cores.
– Em suma, que o produto era invisível (…) Fica, pois, demonstrada a eficácia do produto quanto à (in)visibilidade das manchas por ele provocadas nas roupas, após a sua aplicação (a que vimos chamando de manchas brancas).
– Que se conheça, nenhum outro desodorizante presente no mercado português foi, alguma vez, testado em 100 cores.
– Razão pela qual se afigura como legítima a alegação publicitária segundo a qual se trata do primeiro desodorizante invisível em 100 cores.
– Como acima ficou explanado, o produto Dove Invisible Dry não é publicitado pela ULJM como tendo eficácia no não aparecimento de manchas amarelas, isto é, de manchas ocorridas a longo prazo, após repetidas utilizações e lavagens do tecido, fruto da interacção do produto com a transpiração e com o detergente de lavagem de roupa.
– A ULJM não publicita o produto como tendo essa eficácia, nem o consumidor percepciona os elementos de comunicação utilizados tal.
– Pelo contrário, dos elementos de comunicação utilizados pela ULJM, o consumidor percepciona que o desodorizante em causa não provoca manchas nos tecidos após a sua aplicação.
– Essa é a mensagem transmitida e essa será a mensagem percepcionada.
– No que se refere ao spot televisivo, como ficou dito, toda a acção, imagens e texto se direccionam no sentido de ser feita referência às manchas que surgem na roupa após a aplicação do desodorizante.
– Nenhuma imagem, texto escrito ou mensagem oral sugere ou pode transmitir a ideia de que as referências à invisibilidade do produto diz respeito a manchas que não aquelas que normalmente surgem após a sua aplicação.
– O produto Dove Invisible Dry é eficaz também no não aparecimento das manchas amarelas.
– É aliás mais eficaz do que o produto Nivea for Black & White, que expressamente é anunciado pela BDF como sendo anti-manchas amarelas.
– É igualmente mais eficaz do que o produto Narta 5 Protection, que igualmente se anuncia como sendo anti-manchas amarelas:
– O teste científico independente realizado pela Universidade Federal de São Paulo, que se junta como DOC 4, demonstra que Dove Invisible Dry (identificado como Dove Prism), evita o aparecimento de manchas amarelas na roupa de forma mais eficaz do que os produtos Nivea for Black & White e Narta 5 Protection.
– Face ao que agora fica exposto, verifica-se que a mensagem transmitida para os consumidores não se encontra inquinada de qualquer falsidade ou engano, desde logo pelo facto do consumidor percepcionar a mensagem de que o produto em causa se destina a evitar o aparecimento de manchas na roupa imediatamente após a sua aplicação – o que ficou comprovado ser verdade.
– (…) Inexiste qualquer violação do disposto nos artigos 9.º do CCICAP ou 10.º e 11.º do Código da Publicidade, pelo facto de a ULJM ter apresentado a comprovação das suas alegações e de inexistir qualquer mensagem susceptível de induzir em erro o consumidor.
2. Enquadramento e fundamentação ético-legal
Cinjamo-nos, em primeiro lugar, à questão dos spots televisivos e de Internet (pela coincidência dos seus conteúdos).
No spot publicitário objecto de queixa, nas suas três versões, é possível descortinar no respectivo guião os seguintes dizeres:
“Convidámos mulheres a experimentar o novo Dove Invisible Dry em 100 cores”.
Uma narradora pergunta: “Adivinhe que cor escolheu a Bia?”
A Bia refere que o vermelho é a sua cor favorita e diz “…ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é realmente fantástico”.
Segue-se a afirmação “Dove apresenta Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 cores”.
A par, o número “100” aparece na tela cheia, obtido pela sobreposição de uma camada branca, com o número “100” cortada fora dele, num fundo constituído por uma pluralidade de tecidos coloridos. Tecidos com cores claras, como branco / cinza claro, verde-claro, azul claro e rosa claro podem ser vistos, em especial no interior do número “100”.
O referido anúncio termina com a locutora a ler a frase que ocupa todo o ecrã “Novo Dove Invisible Dry. Invisível em 100 cores”.
O mesmo se passa na Internet onde, através do YouTube, se constata, na página da Dove Portugal, que o referido video está a ser difundido na mesma, a par de uma outra divulgação na internet onde se lê:
“Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco”, (vídeo constante de documento n.º 10 e print screen retirado da internet junto como documento n.º 11.), bem assim como os print screens da campanha realizada quer no website da Revista Caras, quer no website sapo mulher, conforme documentos n.ºs 12 e 13, respectivamente, juntos pela queixosa.
Importa neste âmbito, e na realidade, perceber qual a percepção que o consumidor médio tem relativamente à veracidade dos conteúdos das mensagens comerciais objecto de divulgação por parte da UNILEVER.
E, nomeadamente, como bem afirma a Queixosa, saber se nestes autos foi, ou não feita prova por parte do anunciante relativamente a:
a)  Existência, ou não, de um teste referente ao produto em 100 cores, de acordo com uma das suas alegações;
b)  Demonstração da eficácia anti-mancha nessas 100 cores.
Não acompanha este Júri, todavia, o entendimento da BDF quanto à questão da necessidade de prova relativamente ao facto de o produto “Dove Invisible Dry” impedir a formação de manchas brancas, e de manchas ou marcas amarelas.
E isto porque, aqui se dando razão à UJM, em momento algum dos spots se pode, na realidade, extrair dos referidos anúncios que a mensagem percepcionada pelo «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido», é a de que a publicidade se refira a outras manchas que não aquelas que surgem no momento após a aplicação do desodorizante anunciado.
Ou seja, e em abono da verdade, a percepção que o consumidor médio tem é que nos spots não há qualquer referência a manchas amarelas, a lavagens ou mesmo a manchas que possam surgir a longo prazo mas, tão só,a alusão ao facto do desodorizante não deixar marcas em 100 cores, a par da demonstração da aplicação do referido produto.
Assim, necessário se torna apurar da existência, ou não, nos autos, das provas bastantes para comprovar da veracidade da existência de um teste referente ao produto em 100 cores e da eficácia anti-mancha nessas 100 cores.
E é aqui que entram os documentos carreados pelas Partes. Apresenta a Queixosa um estudo de mercado feito por uma empresa italiana independente e especializada em produtos de consumo, a GNResearch S.p.A. onde se concluiu, citamos “ (…) que mais de 70% dos consumidores, após visionarem o spot televisivo, estavam convictos que o produto da Unilever não deixa as manchas brancas e manchas amarelas em 100 cores”, “subindo a percentagem para os 90% quando confrontados com uma questão quanto à eficácia nas cores preta e branca, tudo conforme resultados do estudo (vide última pág. “conclusões”)”.
Ao mesmo tempo, a BDF fez chegar aos autos a decisão tomada no âmbito do Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária, em Itália, onde se terá concluído, cita-se, “que a campanha publicitária da Unilever enquadra o conceito de publicidade enganosa previsto no artigo 2.º do Codice di Autodisciplina della Comunicazione Commerciale que dispõe:
“Comunicação Empresarial enganosa”
A Comunicação Comercial deve evitar qualquer declaração ou representação susceptível de induzir em erro os consumidores, mesmo por omissão, ambiguidade ou afirmações exageradas, especialmente no que concerne às características e os efeitos do produto, preço, gratuidade, condições de venda, distribuição, identidade das pessoas representadas (…).
O teste supra referido é desvalorizado pela UJM porque, afirma, se trata de um estudo feito com consumidores do mercado italiano, nas circunstâncias desse mesmo mercado, que certamente tem em conta as circunstâncias daquele mercado, designadamente a publicidade que as marcas de diferentes desodorizantes difundem no mesmo e que a mesma considera sem credibilidade para a avaliação do comportamento do consumidor português.
Paralelamente, e como forma de comprovar as alegações publicitárias em causa, a UJM juntou um estudo de mercado de autoria de uma entidade externa independente, a Blue Yonder, no qual se pode ler  que as mulheres dele constantes aplicaram o dito produto sob monitorização da empresa de estudos de mercado e, entre 5 e 7 horas depois, foram questionadas sobre os efeitos do dito produto nas T-Shirts que envergaram, sendo que os resultados apurados terão sido foram inequívocos, já que uma esmagadora maioria das mesmas terá concordado  com a matéria da invisibilidade da aplicação do referido produto nas roupas e que o mesmo não terá deixado quaisquer manchas.
Ou seja, que o produto Dove Invisible Dry foi testado em 100 cores e, após aplicado, não provocou manchas em 100 cores, sendo pois invisível.
Confrontando-se o JE com a existência de dois estudos, com conclusões opostas, importa saber qual deles entende o Júri valorizar, sem que tal ponha em causa a idoneidade das entidades neles envolvida.
Opta o JE, pelo facto de o estudo se referir em concreto ao mercado português e, com detalhe à comunicação comercial objecto destes autos, pela valorização das conclusões explanadas no estudo da Denunciada, motivo que leva o Júri a considerar como legítima a alegação publicitária segundo a qual se trata do primeiro desodorizante invisível em 100 cores.
Vejamos, agora, o que se refere às embalagens estão em causa, as seguintes afirmações:
•  “Ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é fantástico”.
•  “Apresentamos o novo Dove Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 Cores.”
•  “Novo Dove Invisible Dry, Invisível em 100 Cores, incluindo nas que mais gosta.”
•  “Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco.
•  “Tested on 100 colours”
Alega a Queixosa que existe violação do princípio da veracidade – artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP e artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade já que, afirma “Sempre que a acção anti-mancha de um desodorizante é limitada a apenas um dos dois tipos de mancha indicado acima, a publicidade a esse produto, pretendendo evidenciar o poder anti-mancha, deve indicar o tipo de mancha que o produto evita, de forma muito precisa e clara.”
E mais afirma a BDF que a Unilever, na sua campanha publicitária ao produto Dove Invisible Dry fez exactamente o oposto sendo que, no seu entendimento, as afirmações como “Invisível em 100 cores” ou “Tested in 100 colours” apenas podem ser entendidos pelo consumidor médio, como sendo referentes a uma eficácia anti-manchas ilimitada, ou pelo menos eficaz em 100 cores.
A alegação feita pela UJM neste caso, ao invés do que sucedia nos anúncios televisivos e de Internet é já mais específica uma vez que alude, em termos comparativos, não só ao preto e branco mas, sim, a mais cores, ainda que de forma indistinta.
Logo, e concordando o JE com a queixosa, a Unilever pretendeu claramente afirmar que o produto é eficaz em todas as cores, nestas se incluindo, entre outras, a cor branca.
Só que, quanto a esta, resulta do estudo acima identificado a comprovação da invisibilidade do produto quanto às manchas brancas, razão pelo qual não se dá razão à Queixosa.
Importa, por último, aludir no que tange às manchas amarelas objecto de referência pela BDF.
Ora, a verdade é que, em local algum da embalagem, se pode descortinar a existência de referência específica a esta cor.
Isto porque, como se constata, o produto Dove Invisible Dry não é, na verdade, publicitado pela UJM como tendo eficácia no não aparecimento de manchas amarelas, ou seja, aquelas que ocorrem, como é consabido, a longo prazo, após repetidas utilizações e lavagens do tecido, conjugada esta questão com outros factores como sejam a transpiração e o detergente de lavagem de roupa.
E, não sendo publicitado, o consumidor médio não pode, evidentemente, ter a percepção dessa eficácia específica no que às manchas amarelas diz respeito.
E isto para além de quaisquer considerações específicas ao estudo científico que a UJM apresenta e que demonstra, também, a reacção dos tecidos face às manchas amarelas, ao qual o JE, pelos motivos atrás explanados, não necessita de aludir de forma mais desenvolvida.
3. Decisão
Termos em que a 1ª Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da UJM não viola quaisquer dos dispositivos objecto de queixa.».
O Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP
Auto Regulação13J / 2014 :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins
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12J / 2014 :: Olivedesportos vs. Pingo Doce, Distribuição Alimentar

12J/2014

Olivedesportos
vs.
Pingo Doce, Distribuição Alimentar

EXTRACTO DE ACTA

 

Reunida no vigésimo quinto dia do mês de Junho do ano de dois mil e catorze, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 12J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 12J/2014

1. Objecto dos autos

1.1. A OLIVEDESPORTOS – PUBLICIDADE, TELEVISÃO E MÉDIA, S.A. (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por OLIVEDESPORTOS ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por Júri ou JE) apresentar queixa contra JERÓNIMO MARTINS, SGPS, S.A. e PINGO DOCE – DISTRIBUIÇÃO alimentar, S.A., (adiante abreviada e indiscriminadamente designadas, e respectivamente, por JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE ou Requeridas), relativamente a comunicação comercial sob o lema “Venha a jogo com Portugal e Ganhe Sempre!” – e veiculada através dos suportes rádio, imprensa escrita, Internet e folheto – tal, por alegada violação dos artigos 4º, 5º e 27º do Capítulo I da Parte II, artigos A-1, alínea e) do artigo B-II e B2 do Capítulo II da Parte II, todos do Código de Conduta do ICAP, artigos 4.º e 7.º n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março (“Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais”) e artigo 317º do Código da Propriedade Industrial.

1.2. Questão Prévia

Notificadas a PINGO DOCE e a JERÓNIMO MARTINS, SGPS; S.A. para contestar, foi o ICAP informado por carta da última, de 6 de Junho p.p., de que teria havido um equívoco na interpelação “… porque tratando-se de uma empresa cotada, que gere participações em várias sociedades, a Jerónimo Martins, SGPS, SA., não possui quaisquer estabelecimentos comerciais e não efectua, nem lança campanhas publicitárias.”, pelo que passaria a devolver toda a documentação remetida. (Cfr. carta da JERÓNIMO MARTINS SGPS, S.A. junta aos autos).

Dado que, por e-mail de 5 de Junho p.p., a OLIVEDESPORTOS comunicou ao ICAP a sua vontade de ser a queixa apresentada contra as duas entidades – Jerónimo Martins SGPS, SA. e Pingo Doce – a deliberação do Júri entendê-las-á como Requeridas. (Cfr. e. mail junto aos autos).

1.3. Notificada para o efeito, a PINGO DOCE não apresentou contestação.

1.4. Dão-se por reproduzidos 7 (sete) documentos juntos pela OLIVEDESPORTOS, a saber:

– (i) Doc. 1: cópia em cd-rom de primeiro spot publicitário radiofónico;
– (ii) Doc. 2: cópia em cd-rom de segundo spot publicitário radiofónico;
– (iii) Doc. 3: cópia de comunicação comercial feita através de imprensa escrita;
– (iv) Doc. 4: cópia de comunicação comercial feita através de Internet;
– (v) Doc. 5. cópia de folheto promocional do PINGO DOCE;
– (vi) Doc. 6: cópia de Regulamento de Concurso “REGRAS DO JOGO”;
– (vii) Doc. 7: cópia de TERCEIRO ADITAMENTO AO CONTRATO de 21 DE MAIO DE 2002 FPF/OLIVEDESPORTOS”.

1.5. Dos factos

A Requerente alega na sua petição – e as Requeridas não contraditam – que foi lançada “…recentemente uma campanha publicitária e promocional à cadeia de supermercados e hipermercados Pingo Doce designada “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”, destinada a promover a adesão ao cartão Poupa Mais e as vendas…” (sic art.º 1) naqueles estabelecimentos e “…amplamente divulgada em diversos anúncios veiculados (…) através da rádio (…) imprensa escrita …), internet e folhetos…” (sic. art.º 2), sendo que se encontra em causa “…uma promoção que oferece descontos baseados no desempenho e classificação da Selecção Nacional A de futebol no Campeonato Mundial de Futebol a realizar no Brasil, a COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014…” (sic. art.º 3) de ora em diante designado por “Mundial 2014”.

1.5.1. Das alegações publicitárias ou claims

Encontram-se colocadas em crise, as seguintes alegações publicitárias ou claims (cfr. documentos 1 a 5 da queixa):

– (i) “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”;
– (ii) “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se
Se Portugal passar aos oitavos de final”;
– (iii) “Se Portugal não passar poupe 25%”;
– (iv) “ÍconeTaça da FIFA”;
– (v) “Cores da Selecção Nacional de Futebol”;
– (vi) “Chuteiras”.

1.6. Das alegações da OLIVEDESPORTOS

Sustenta a OLIVEDESPORTOS na sua queixa, e em síntese, que a campanha publicitária da responsabilidade das JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE – com inclusão da sua promoção de vendas – configura uma prática de publicidade enganosa, desonesta e de concorrência desleal, bem como um embuste de um bem sob patrocínio e, ainda, uma promoção de vendas ilícita, por virtude de:

– (i) “No exercício da sua actividade, a Olivedesportos adquiriu à Federação Portuguesa de Futebol (doravante simplesmente FPF), por contrato (…) com carácter de exclusividade, os direitos televisivos, de publicidade, de patrocínio, de “sponsorização” e de imagem das Selecções Nacionais de Futebol e da própria FPF” (sic. art.º 20), acrescentando que, “…é, como tal, a única e exclusiva titular dos direitos comerciais e de propriedade intelectual relativos às Selecções Nacionais de Futebol, no que se inclui, sem limitar, os direitos de imagem e patrocínio das Selecções Nacionais de Futebol e da própria Federação Portuguesa de Futebol, incluindo todos os direitos de utilização e exploração comercial de símbolos, emblemas, logótipos oficiais ou imagens colectivas das Selecções Nacionais de Futebol” (sic. art.º 21);

– (ii) “…a utilização das referências a “Venha a jogo com Portugal”, “Se Portugal passar aos oitavos de final”, no contexto específico da aproximação do evento desportivo denominado “COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014” (de ora em diante o “Mundial de Futebol”), acompanhada das cores da Selecção Nacional de Futebol e de ícones tais como a Taça da FIFA e chuteiras, cria, na campanha publicitária em causa, uma associação clara, porém ilícita, da JERÓNIMO MARTINS à Selecção Nacional de Futebol.” (sic. art.º 8), acrescentando que “…a conjugação de todos estes elementos cria indiscutivelmente no consumidor médio uma evidente associação entre a marca “Pingo Doce” e a imagem das Selecções Nacionais de futebol em termos que visam promover comercialmente as referidas marcas e os estabelecimentos comerciais do Grupo Jerónimo Martins” (sic. art.º 9);

– (iii) “A JERÓNIMO MARTINS propõe a todos os clientes dos supermercados Pingo Doce que utilizem, entre 27 de Maio e 23 de Junho, o cartão Poupa Mais nas lojas Pingo Doce, a acumulação em cartão do valor gasto na compra de todos os produtos das marcas identificadas no folheto promocional, valor este que acumula para um total e que será o valor de compra dos produtos das marcas indicadas no folheto deduzido de todos os descontos aplicados” (sic. art.º 13), sendo que “A Promoção em causa e a campanha que a publicita é um exemplo parasitário de uma estratégia de marketing e publicidade de “emboscada” ou parasitária, nos termos da qual a JERÓNIMO MARTINS procura buscar uma vantagem comercial ilícita, à custa da imagem das Selecções Nacionais sem ter adquiridos os respectivos direitos de patrocínio e em violação evidente e clara dos direitos dos legítimos patrocinadores (sendo um dos quais, notoriamente, um dos seus mais directos concorrentes)”. (sic. art.º 14).

2. Enquadramento ético-legal

2.1. Da alegada prática de publicidade enganosa

Alega a OLIVEDESPORTOS em sede de queixa que, “…a campanha em questão capitaliza a esperança generalizada de uma boa prestação da Selecção Nacional no Mundial de 2014, aliciando os consumidores com a possibilidade de acumulação de um desconto em compras cujo valor pode ir até 50% do valor despendido, caso a Selecção Nacional A passe aos oitavos de final do Mundial de 2014, ou que, em qualquer situação e independentemente da prestação da mesma, será sempre de 25% desse mesmo valor.” (sic. art.º 47), acrescentando que, “…ao oferecer aos consumidores a possibilidade de acumular uma determinada percentagem do valor gasto em compras variável em função do desempenho da Selecção Nacional no Mundial 2014, a JERÓNIMO MARTINS “conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor médio a tomar uma decisão de compra que este não teria tomado de outro modo”. (sic. art.º 48).

Constata o Júri que a OLIVEDESPORTOS, ao referir-se ao disposto no artigo 7.º, alínea c) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março (e em relação ao qual o artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP se encontra em consonância), omite um elemento essencial para que se possa estabelecer qualquer prática de publicidade enganosa: o da indução, ou susceptibilidade de indução do consumidor médio1 em erro.

Com efeito, será esta indução ou susceptibilidade de indução erro que poderá conduzir o mesmo consumidor a tomar uma decisão de compra que este não teria tomado de outro modo e não, como parece pretender a Requerente, a circunstância de se “oferecer aos consumidores a possibilidade de acumular uma determinada percentagem do valor gasto em compras variável em função do desempenho da Selecção Nacional no Mundial 2014”. (Cfr. art.º 48 da petição). Isto, na medida em que a OLIVEDESPORTOS não sustenta que tal oferta consubstancie uma inverdade.

Por outro lado, entende o Júri que não existe, igualmente, indução ou susceptibilidade de indução em erro do consumidor médio quanto ao “conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pelo profissional, a motivação da prática comercial e a natureza do processo de venda, bem como a utilização de qualquer afirmação ou símbolo indicativos de que o profissional, o bem ou o serviço beneficiam, directa ou indirectamente, de patrocínio ou de apoio” (cfr. artigo 7.º, alínea c) do Decreto-lei n.º 57/2008) enquanto factor determinante de uma transação.

De facto, a utilização não autorizada através de suporte folheto de um símbolo semelhante ao do troféu oficial do Campeonato do Mundo, sem que lhe conferido um destaque particular (cf. Doc. 5 da queixa) afigura-se, no entendimento do Júri, insuficiente para induzir em erro o consumidor médio quanto à qualidade do anunciante, enquanto determinante de uma decisão de transação.

Acresce que, muito embora “…a utilização das referências a “Venha a jogo com Portugal”, “Se Portugal passar aos oitavos de final”, no contexto específico da (…) “COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014” (de ora em diante o “Mundial de Futebol”), acompanhada das cores da Selecção Nacional de Futebol e de ícones tais como a Taça da FIFA e chuteiras implique uma associação clara, das Requeridas à Selecção Nacional de Futebol (cfr. art.º 8.º da queixa) não crê o JE que a mesma seja de molde a criar na mente do consumidor médio, a convicção de que as JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE possuem o estatuto de patrocinadoras oficiais do evento em apreço.

Dito de outra forma, aquele consumidor não é susceptível de ser induzido em erro quanto à qualidade do anunciante, até porque perceberá que a expressão “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional ” não consta de qualquer suporte da campanha e promoção de vendas associada.

N realidade, defende o JE que, não será por via da violação do princípio da veracidade que a comunicação comercial em lide, entendida no seu todo, poderá consubstanciar uma prática de publicidade ilícita.

2.1.1. Do invocado embuste do objecto de patrocínio

Qualquer embuste de um bem sob patrocínio, in casu, o campeonato mundial de futebol, quando praticado através de publicidade, constituirá sempre um caso de violação do princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, por indução do destinatário em erro, quanto à qualidade do anunciante.

De facto, dispõe-se no artigo B2, Capítulo II da Parte II do Código de Conduta do ICAP sob a epígrafe “Embuste do objecto de patrocínio” que, “Nenhuma parte deve procurar dar a entender que patrocina um qualquer acontecimento ou a transmissão ou comunicação do mesmo nos Meios, seja ele patrocinado ou não, se não for, de facto, patrocinador de um bem ou dessa transmissão ou comunicação.” (Negrito e sublinhado do JE).

A referida intencionalidade “de dar a entender que patrocina” não resulta, manifestamente, da comunicação comercial em apreço. Com efeito, é o estabelecimento de uma eventual prática de publicidade enganosa que determinará a conclusão sobre a existência de um embuste de um bem sob patrocínio e não é a verificação deste último, a premissa para se considerar que se violou o princípio da veracidade em matéria de promoção de vendas ou se praticou publicidade desleal e ofensiva da livre e leal concorrência.

Ora, concluiu o Júri no ponto anterior, pela inexistência de uma prática de publicidade e de promoção de vendas enganosa quanto à qualidade do anunciante pelo que, forçosamente, terá que sustentar que a comunicação comercial da responsabilidade das Requeridas, entendida no seu todo – de acordo com o disposto no artigo 27.º, n.º 3, do Código de Conduta do ICAP – não consubstancia um embuste de um bem sob patrocínio.

Sem prejuízo das conclusões a que chegou o JE, as JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE estão, contudo, a associar-se a um evento que não patrocinam, aproveitando a sua realização para promover a venda de bens que comercializam. De onde ocorre questionar se, mesmo quando se encontra estabelecido que não há susceptibilidade de confusão ou de engano dever-se-á, ainda assim, considerar uma outra fronteira: a da associação parasitária a uma forma de publicidade reservada a terceiros.

2.2. Da alegada prática de publicidade parasitária ou da exploração da reputação

Entende o Júri que, em ordem a responder à questão colocada, importa apurar o que, no âmbito concreto dos presentes autos, deve ser considerado como “forma de publicidade reservada a terceiros ”, análise que terá que incidir sobre os claims colocados em crise nos quais assenta a promoção de vendas, e que são:

– (i) “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”;
– (ii) “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se Portugal passar aos oitavos de final”;
– (iii) “Se Portugal não passar poupe 25%”;

tal, por referência ao quadro normativo do Código de Conduta do ICAP e, concretamente, o constante dos artigos:

– 19.º, n.º 2, do Capítulo |, Parte II, sob a epígrafe “Exploração da reputação”, segundo o qual “A comunicação comercial não deve, em caso algum, retirar indevidamente proveito da reputação ligada ao nome, marcas ou a qualquer outro elemento de propriedade intelectual relativo a uma outra empresa, pessoa ou instituição (…).”;

– A3, do Capítulo II, Parte II, sob a epígrafe “Apresentação”, em que se dispõe que, “(…)Toda a comunicação comercial relativa a promoção de vendas, aqui incluídas as actividades nos pontos de venda, deve estar em estrita conformidade com a Parte I e II – I Capítulo.”,

– B, alínea e) do capítulo II, Parte II que define “Patrocínio” como “…todo e qualquer acordo comercial pelo qual o patrocinador, para benefício mútuo, seu e do patrocinado, oferece contratualmente apoio financeiro ou outro, visando estabelecer uma associação entre a imagem, marcas, bens, ou serviços do patrocinador e o objecto patrocinado (…) /ou para garantir determinados benefícios, directos ou indirectos, que tenham sido objecto de acordo.

Analisada a campanha promocional nos seus vários suportes, constitui opinião do Júri que os claims “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”; “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se Portugal passar aos oitavos de final”; e “Se Portugal não passar poupe 25%” (cfr. documentos 1 a 6 da queixa) se encontram “demasiadamente perto” do que se pode considerar uma aposta desportiva, ao jeito de “totobola” ou “totogolo”. Com efeito, ao invés do que constituiu o objecto da lide no caso de promoção de vendas objeto do processo 10J/2012 do ICAP (em que o Júri considerou que a respectiva campanha publicitária não era susceptível de induzir o chamado consumidor médio a tomar uma decisão de transação com base em alusões ao evento desportivo), no caso ora em apreciação, o mesmo consumidor tomará tal decisão respondendo a um repto sugestivo de algo semelhante a uma aposta, a efectuar através da utilização do cartão “Poupa Mais” nas lojas Pingo Doce (cfr. ponto 1. do Regulamento constante de Doc. 6 junto à petição).

Tal em virtude de, como muito bem ilustra o lema da promoção de vendas, ter o referido consumidor que decidir “se vai a jogo” de 27 de Maio a 23 de Junho arriscando gastar naquelas lojas 200 euros em compras dos produtos indicados no regulamento, e só nestes, em menos de um mês (cfr. pontos 2 e 6) com base numa expectativa interiorizada, em jeito de aposta, de vir a poupar o valor pecuniário de 50% numa compra posterior a efectuar entre 27 de Junho e 2 de Julho, ou seja em 5 dias (cfr. ponto 7), a qual, presume-se, não poderá, ser inferior a 100 euros, caso Portugal passe aos “oitavos final”, representando na sua mente, à laia de “almofada”, a possibilidade de sempre vir a poupar 25% daquele valor, caso Portugal não venha a passar. (Cfr. ponto 7).

Sem que cumpra ao Júri imiscuir-se na legitimidade duvidosa de tal promoção de vendas noutras sedes normativas, que não a da autoregulação das comunicações comerciais, sempre se dirá que Portugal passará ou não à fase “oitavos final”, de acordo com o desempenho da Selecção Portuguesa de Futebol e não – com o devido respeito –, com base numa estrita relação qualidade/ preço dos produtos a adquirir nas lojas Pingo Doce, desempenho esse que, a servir de aliciante à compra de produtos comercializados em supermercados (a metade ou a um quarto do preço tabelado), deveria ser objecto de autorização prévia da Federação Portuguesa de Futebol. Isto, já que até a OLIVEDESPORTOS, a tal tem que proceder – apesar do seu estatuto de detentora de direitos limitados de imagem das selecções nacionais e de merchandising para exploração comercial em regime de exclusividade – de molde a cumprir uma obrigação inerente à salvaguarda do bom nome e reputação da Federação Portuguesa de Futebol. (Cfr. Doc. 7, considerando A, cláusulas 1. ª, n.º 2 e 2.ª, n.º 4.).

De onde, por maioria de razão, não sendo as Requeridas patrocinadoras oficiais do evento em causa, entende o Júri que a comunicação comercial da sua responsabilidade, com inclusão da promoção de vendas efectuada nos moldes que ficaram expostos, consubstancia uma exploração da reputação do nome da FPF e da Selecção Nacional, desconforme com o disposto no artigo 19.º, n.º 2 do Código de Conduta do ICAP e, logo, uma promoção de vendas ilícita, nos termos do artigo A3, do Capítulo II, Parte II do mesmo Código.

Apesar de ter concluído pela não verificação de um embuste de objeto patrocinado, à luz do disposto no artigo B2, Capítulo II, Parte II do Código de Conduta do ICAP (por ausência do elemento intencionalidade de se fazerem as Requeridas passar por patrocinadoras oficiais do Mundial de Futebol, bem como da percepção por parte do consumidor médio de tal estatuto), o certo é que, na opinião do Júri, qualquer promoção de vendas cuja eficácia em termos de receitas dependa do desempenho da Selecção Nacional – como é o caso em lide – é susceptível de constituir um benefício indirecto típico de um acordo de patrocínio, à luz do disposto no atrás citado artigo B, alínea e) do capítulo II, Parte II do Código de Conduta do ICAP.

Com efeito, as Requeridas não se fazem passar por patrocinadoras oficiais do Mundial de Futebol mas, pretendem usufruir dos benefícios indirectos de natureza comercial que adviriam dessa qualidade, os quais carecem de autorização expressa da Federação Portuguesa de Futebol e, ou, da OLIVEDESPORTOS. (Cfr. Doc. 7 junto à petição).

Mais, para tal conclusão não tem que militar qualquer fonte contratual que disponha que o aproveitamento do desempenho da Selecção Nacional para efeitos comerciais integra o leque de direitos da Federação Portuguesa de Futebol sobre a imagem colectiva da mesma.

De facto, estamos no âmbito da ética aplicável às comunicações comerciais, de que as promoções de vendas constituem uma das formas possíveis. Em conformidade, bastará atender-se à óbvia possibilidade de o consumidor médio representar na sua mente que os claims “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se Portugal passar aos oitavos de final”; e “Se Portugal não passar poupe 25%” possuem o mesmo significado que as expressões ““Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se a Selecção chegar aos oitavos de final”; e “Se a Selecção não chegar poupe 25%”.

Dito de outra forma, entende o Júri que, in casu, as expressões “Portugal” e “Selecção” equivalem-se em termos semânticos. Ora, se a primeira é insusceptível de apropriação individual (tal como o são as imagens genéricas de chuteiras ou das cores da bandeira portuguesa), já o mesmo não se poderá alegar em relação à segunda e este, sim, configura um facto público e notório.

2.3. Conclusão

Improcedendo as razões invocadas pela OLIVEDESPORTOS quanto à confundibilidade da anunciante com um patrocinador da Selecção Nacional, bem como à susceptibilidade de indução dos consumidores em erro quanto a esse mesmo aspecto, entende o Júri existirem indícios de desconformidade da comunicação comercial, entendida no seu todo, com o quadro ético-legal em matéria de exploração da reputação de um nome.

Não obstante, o Júri não quer deixar de vincar que o cerne da apreciação da campanha publicitária objeto dos autos é o da ética publicitária, o que não prejudica a possibilidade de as Partes suscitarem e discutirem eventuais danos e, ou, prejuízos contratuais junto das competentes instâncias judiciais.

3. Decisão

Termos em que o Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial e promoção de vendas da responsabilidade das JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE – veiculadas nos suportes rádio, imprensa escrita, Internet e folheto – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto no artigo 19.º, n.º 2 do Capítulo I e A3 do Capítulo II, todos da Parte II do Código de Conduta do ICAP, pelo que deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta em termos parciais, caso qualquer dos tipos de ilícito apurados pelo JE se mantenham.

Declaração de Voto Vencido

Votaram vencidos os Senhores Doutor Rui Estrela e Dr. João Veiga Gomes, que formularam a seguinte declaração de voto:

“Não votámos a favor da Deliberação supra, em virtude das dúvidas que nos levanta a tese de que a comunicação comercial em questão consubstancia uma exploração da reputação do nome da Federação Portuguesa de Futebol.

Não nos parece que as Requeridas pretendam “ usufruir dos benefícios indirectos” de qualquer patrocínio, o que não está em causa, uma vez que “não se fazem passar por Patrocinadoras oficiais do Mundial do Futebol”.

Não vemos como é que as Requeridas possam parasitar “formas de publicidade reservada” a Instituições reguladoras do Futebol, a nível nacional ou internacional, quando se trata apenas de promover a venda de alimentos ou bebidas, nos supermercados.

Também não vemos como é que as Requeridas podem beneficiar do crédito ou da reputação, do nome, estabelecimento ou marcas da FIFA ou da Federação Portuguesa de Futebol, dado que estas não são suas concorrentes no mercado, nem existe qualquer afinidade entre as actividades próprias daquelas instituições e as actividades comerciais das Requeridas.

Quanto às empresas que concorrem realmente com as Requeridas, exercendo actividades análogas, é de notar que nenhuma delas se queixou, embora certamente também tenham ponderado a possibilidade de associar a promoção dos seus produtos ao Mundial de Futebol / 2014. (cf. A1, nº. 4,”Princípios aplicáveis à promoção de vendas”, no Cap. II, Parte II, do Cód. de Conduta do ICAP).”

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP

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