Mais recentes

15J / 2014 :: Lactogal vs. FIMA

15J/2014

Lactogal, Produtos Alimentares
vs.
FIMA, Produtos Alimentares

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no décimo sétimo dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 15J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 15J/2014

1.   Objecto dos Autos

1.1.   A LACTOGAL – PRODUTOS ALIMENTARES, S.A., (adiante abreviada e indiferentemente designada por LACTOGAL, Requerente ou Queixosa) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a FIMA – PRODUTOS ALIMENTARES, SA. (adiante abreviadamente designada por FIMA) e a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS LDA (adiante abreviadamente designada por designada por ULJM), designadas conjuntamente por Requeridas, relativamente a comunicação comercial do produto “FLORA” difundida através da embalagem do produto e no spot televisivo publicitário por, segunda a queixosa, incumprir deliberação anterior do JE (cf. violação artigo 30º do Código de Conduta) constituir uma prática comercial desleal, sob a forma da ação enganosa (cf. al. a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março) e violar art.º. 6º (decência), art.º. 4º (princípios fundamentais) art.º. 5º (legalidade) e art.º. 9º (veracidade), todos do Código de Conduta do ICAP.

1.2.   Notificadas para o efeito, as Requeridas ULJM e FIMA apresentaram contestação conjunta.

1.3.   Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

1.4.   Síntese das posições das partes

1.4.1.   Na queixa que apresenta, a LACTOGAL ocupa-se em descrever e citar as deliberações anteriores sobre a mesma comunicação comercial.
A essência da fundamentação da queixa pode encontrar-se nas seguintes passagens (art.º. 19º 26º e 27º):
   “(…) compulsados todos os argumentos esgrimidos ao longo da deliberação da Comissão de Apelo, constatamos que esta entende como não admissível a destacada referência “ao leite dos Açores”. “ (sublinhado nosso);   “(…) fácil é de concluir que a Comissão de Apelo não pretendia, apenas e só, cessar a comunicação comercial contida na embalagem do produto “FLORA DERRETE-TE” na parte “Com leite dos Açores” associado à comunicação constante da lateral daquela embalagem “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, “ “Mas sim, fazer igualmente cessar o destaque ao “Leite dos Açores” (por entender que o mesmo não é admissível), ainda que o produto contenha 1% de leite (em pó) e esteja associado, expressamente, ao creme vegetal.”

Refere, depois – sem concretizar -, que: “ (…) tem conhecimento de que tal comunicação comercial não terá sido efetivamente dada sem efeito, designadamente no que respeita à embalagem do produto em causa e ao spot publicitário, uma vez que as menções censuradas pelo ICAP continuam a ser, respectivamente, comercializadas e transmitidas.” (cf. art. 29º, sublinhado nosso).

E adita que:
   Na embalagem “FLORA DERRETE-TE”, no canto superior direito da tampa, consta, de forma bem visível, um círculo em que no seu interior para além da representação gráfica do leite – pinga de leite estilizado –, contém a menção “Com leite dos Açores” (cf. art.º. 30º e documento 3).    (…) no filme publicitário, para além de ouvirmos a seguinte alocução: “Derrete-te com o novo creme vegetal flora, agora com leite dos Açores”, (…) É exibida a embalagem “FLORA DERRETE-TE”, destacando-se o círculo disposto no canto superior direito da mesma, com a representação gráfica do leite – pinga de leite estilizado – e a menção “Com leite dos Açores (cf. art. 31º e 32º e documento n.º 4).

E conclui: “(…) tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, violam a deliberação proferida pela Comissão de Apelo, em 15 de Maio de 2014, no âmbito do processo 4J/2014,” (…) “E violam, ainda, os princípios da legalidade, da veracidade e da proibição de publicidade enganosa, constituindo práticas comerciais desleais, sob a forma de acção enganosa, prevista e punida com contra-ordenação nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei 57/2008 de 26 de Março”  (cf. art. 33º e 34º).

Termina pedindo: “a) Sejam, tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, declarados ilegais por expressa violação da decisão do ICAP, nos termos do art. 30º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; b) Sejam a alegação “com leite dos Açores” e respectiva representação gráfica declaradas ilegais, por violação expressa do previsto no art. 6º do Código da Publicidade e arts. 4º, 5º e 9º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; c) Seja, consequentemente, ordenado o expurgo daquela alegação e representação gráfica da campanha publicitária através da qual a FIMA vem promovendo a “FLORA DERRETE-TE”, bem como da rotulagem da sua embalagem.

1.4.2.   Na contestação, as Requeridas alegam que a fundamentação da LACTOGAL “(…) é toda ela perfeitamente coincidente, uma vez que não se vislumbra nenhum dado diferente, nenhum enfoque inovador (até pelo contrário, como adiante se referirá) para as questões já suscitadas pela FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A., perante o JE, no âmbito do processo 14J/2014 (…)” (cf. art. 2º) queixa esta relativa ao incumprimento e à comunicação comercial do produto “FLORA.

Afirmam, ainda: “(…) não é exacta a matéria dos artigos 29º a 34º, muito embora seja verdade, como é natural, que ainda existem no mercado embalagens que não estão conformes com a comunicação que em 20 de Maio foi dirigida ao ICAP no âmbito do Processo nº 4J/2014, sendo certo como é que tal como aí se refere, as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho,” e que: “As novas embalagens que, em breve, chegarão ao mercado, têm um selo diferente com a menção “creme vegetal”, alteração que se entendeu efectuar face à Decisão da Comissão de Apelo, e que já aparece no novo filme publicitário, ao contrário do que se refere nos artigos 31º e 32º da denúncia – ver doc. nº 4 junto com a denúncia (pese embora a pouca qualidade da gravação; em alternativa pode ver-se o que está junto ao processo 14J/2014).” (cf. art. 10 e 11º).

Adiantam que: “(…) para que não houvesse qualquer dúvida quanto à natureza do produto FLORA, a FIMA-ULJM foram mesmo para além da Decisão da Comissão de Apelo, uma vez que tendo aquela proibido a comunicação “Com leite dos Açores” associada à que constava da lateral da embalagem, o produto passou a ser claramente enquadrado pela aposição da menção “creme vegetal” junto ao disclaimer “Com leite dos Açores”, indicando de forma expressa, e sem margem para qualquer dúvida, que não se trata de um produto lácteo (o sublinhado é nosso).” (cf. art. 14º)

E acrescentam:
   “A utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” não foi proibida pelas decisões supra transcritas e, sendo assim, como parece evidente, não há incumprimento.” (cf. art. 17º)    “(…) a menção “creme vegetal” foi incluída na embalagem sem que a isso a FIMA-ULJM estivessem obrigadas pelas Decisões, mas por lhes parecer que dessa forma se dissipava qualquer dúvida que pudesse subsistir, deixando ainda mais evidente, por referência ao consumidor médio, que não se tratava de uma manteiga.” (cf. art. 18º);   “(…)“Creme vegetal” é apenas um “fancy name”, de resto, o termo vegetal no Regulamento nº 1308/2013, anexo VII, refere-se à denominação legal e a que está na lei está correctamente incluída, como é obrigatório, numa das faces da embalagem, e não tem que ser repetida nas outras.” (cf. art. 19º).

Sublinham, também, que: “A FIMA e a ULJM estão a comercializar um creme vegetal, e não uma manteiga, com leite dos Açores nos ingredientes, com a indicação da respectiva percentagem na lista, como acontece com qualquer produto alimentar, e em conformidade com a lei, Regulamento nº 1169/2011 artigo 22º, anexo VIII, ponto 3.b).” e que: “(…) a campanha relativas à composição e características do produto FLORA cumprem as Decisões supra citadas e a regulamentação aplicável, sendo a denúncia desprovida de qualquer fundamento” (cf. art.º. 28º e 29º).

E concluem: “(…) não há qualquer hipótese de o consumidor considerar que está perante algo que não seja um creme vegetal para barrar, com a menção “creme vegetal” ainda menos.” (cf. art.º. 20º) “(…) tudo o que é afirmado expressamente ou através de claims visuais, corresponde à verdade e não é susceptível de induzir em erro o consumidor médio relativamente a qualquer dos elementos do produto FLORA. “ (cf. art.º. 26º).

Terminam, pedindo que a queixa seja julgada improcedente e negado provimento ao pedido de cessação da publicidade do creme para barrar FLORA.

2.   Enquadramento ético-legal

2.1.   Da qualificação da queixa
Como acima se sintetizou, a comunicação comercial objecto da presente queixa traz à colação os processos 4J/2014, 7J/2014 e 14J/2014 já decididos pelo júri, bem como a decisão da Comissão de Apelo que incidiu sobre o recurso no processo 4J/2014.

As Partes utilizam e parcialmente suportam as suas posições nestas deliberações anteriores, delas extraindo passagens que avaliam pertinentes.

O Júri recorda que Código de Conduta do ICAP dispõe, no seu artigo 30º, sob a epígrafe “Respeito pelas decisões do ICAP”, que:

“1. Todo e qualquer comerciante/anunciante, profissional da comunicação, agência de publicidade, editor, proprietário dos Meios ou contratante, deve abster-se de participar na publicação ou distribuição de um anúncio ou outra qualquer comunicação comercial que tenha sido julgada inaceitável pelo ICAP. 2. Todas as partes envolvidas são encorajadas a incluir e, sendo sociedades, a fazerem os seus melhores esforços por que as sociedades com elas coligadas incluam nos respectivos contratos ou outros acordos relativos a publicidade e outras comunicações comerciais, uma declaração vinculando os signatários a submeterem-se às normas auto-reguladoras aplicáveis e a respeitarem as decisões e regras ditadas pelo ICAP. 3. Os sócios do ICAP e os membros associados das Associações e outras congéneres filiadas no Instituto, bem como quaisquer entidades, incluindo não membros, que submetam questões à apreciação do JE – Júri de Ética, são obrigados a acatar prontamente, na letra e no espírito, as decisões oriundas, nomeadamente, dos órgãos sociais do ICAP e do JE – Júri de Ética. (…)

Em conformidade com este dispositivo, o Regulamento do JE prevê, no nº 1 do seu artigo 7º, que as Secções do Júri são competentes para dirimir as queixas em matéria de comunicação comercial:
a) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, contra associados ou terceiros; b) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, sobre comunicações comerciais decorrentes de alterações naquelas que tenham sido objecto de deliberações proferidas pelo JE; c) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas sobre comunicações comerciais veiculadas posteriormente noutros suportes que não tenham sido identificados na queixa. (sublinhado nosso).

No contexto da auto-regulação o objecto da queixa é relevante, entre outros, para a determinação do prazo e conteúdo da contestação (Cf. art. 10º do Regulamento do JE “2. O prazo (…) no que respeita ao artigo 7º, alíneas b) e c) é de dois dias úteis, contados a partir do primeiro dia útil seguinte ao da notificação da queixa, inclusive. (…) 5. A contestação prevista no artigo 7º, alíneas b) e c), apenas carece da apresentação dos factos e fundamentação do alegado cumprimento.”).

No caso em apreço, estão em causa, concretamente, dois suportes – as embalagens e o spot televisivo – e um único claim, a saber, o claim “com leite dos Açores”.

O claim em questão foi objecto de queixas anteriores (processos 4J/2014 e decisão da Comissão de Apelo e 7J/2014).

Os suportes agora identificados, são os mesmos já apreciados.

Pese embora a queixa não seja totalmente clara quando, simultaneamente pede “a) Sejam, tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, declarados ilegais por expressa violação da decisão do ICAP, nos termos do art. 30º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; b) Sejam a alegação “com leite dos Açores” e respectiva representação gráfica declaradas ilegais, por violação expressa do previsto no art. 6º do Código da Publicidade e arts. 4º, 5º e 9º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; (…)”, o Júri considera que, perante os factos invocados e fundamentos da mesma, deve ser inequivocamente qualificada como uma queixa por incumprimento ao abrigo do art.º. 7º nº 1 alínea b).

Com efeito, para uma nova queixa, faleceriam tanto factos como fundamentos e, naturalmente, defesa.

Refira-se que o JE não pode, nem deve, proceder à reapreciação de factos que foram objecto dos processos anteriores, corrigi-los ou rectifica-los, nem tampouco elaborar deliberações com o intuito de interpretar, estender ou restringir decisões anteriores.

Diga-se, aliás, que uma reapreciação de factos objecto de análise em processo anterior, ou, uma apreciação de matéria nova no âmbito de uma queixa por incumprimento, não se compadeceria com o direito de defesa que deve ser garantido e que, manifestamente, não seria possível exercer no prazo reduzido para dois dias que é concedido para contestar, o que resulta numa tendencial insusceptibilidade de cumulação duma queixa com vista à verificação do incumprimento, com uma que pretenda a apreciação de comunicação comercial.

E embora o Júri pudesse, em teoria, discorrer sobre se estaria ou não perante uma nova queixa.

2.2.   Da verificação do incumprimento

Para efeitos de incumprimento a queixosa, sustentando-se nas decisões do JE acima citadas e na decisão da Comissão de Apelo, procura defender não ser admissível, relativamente ao produto em causa – o creme vegetal – que as Requeridas façam qualquer referência a leite dos Açores.
Na parte que aqui importa, a Comissão de Apelo, no “RELATÓRIO” da sua decisão de 15 de Maio de 2014 – onde circunscreve o objecto do recurso “(..) à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (cf. ponto 5.) – entendeu que:
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem, bem como a sua representação gráfica, não cumpriam os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia, uma vez que estava associada à outra comunicação constante da mesma embalagem produzida no sentido de que “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, pelo que se teria de concluir que a mesma não serviria apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo, o que é bastante diverso do “per se” invocado pela Requerente, quanto ao primeiro claim;
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem é enganosa quanto às características do produto FLORA, por associação, devido “à omissão de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público…” (cf. decisão da Comissão de Apelo).

Considera o Júri conveniente transcrever os fundamentos expostos pela Comissão, quanto à embalagem do produto FLORA:
“Afigura-se-nos, ressalvada melhor opinião naturalmente, que a comunicação comercial contida na embalagem do produto em causa não pode restringir-se à descrita no nº 2 da f.f., como aparentemente se fez na decisão recorrida, devendo qualificar-se como tal também a comunicação contida na lateral daquela embalagem, descrita no nº 3 da f.f. (…)
Ora, considerando que estamos perante um produto que é caracterizado por ser “um creme vegetal” – em cuja composição os ingredientes principais são o óleo de girassol e matérias gordas vegetais – e não perante uma “manteiga” – cujos ingredientes principais são produtos lácteos – já seria muito duvidoso que, por si só, o destaque dado na embalagem ao disclaimer “Com leite dos Açores” – no topo e numa lateral – , destaque também resultante da sua apresentação gráfica (inserido num círculo e com pingo de leite estilizado), associado à omissão naqueles locais de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público, o qual só tem acesso a essa informação se pegar na embalagem e olhar para a sua parte de baixo, o que não é procedimento comum, em termos de normalidade para o consumidor médio) e ao facto de a percentagem de leite (e em pó) ser de apenas 1%, já seria muito duvidoso dizíamos, que tal comunicação comercial fosse compatível com os mencionados princípios da honestidade e veracidade, acolhidos nos citados dispositivos do CCICAP e preceitos legais. (negrito e sublinhado do Júri) (…)
Mas, além disso, ou seja, analisando a comunicação comercial em causa, no seu conjunto, nomeadamente considerando o disclaimer referido no nº 2 da f.f. e a mensagem contida numa lateral da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), em que se procura induzir, quando não expressar uma associação entre o produto em causa e a manteiga, ao comparar-se a gordura saturada de Flora e a gordura saturada da manteiga standard, afigura-se-nos que foram realmente ultrapassados os limites das honestidade e veracidade da comunicação comercial. (negrito e sublinhado do júri).
Na verdade, nestas circunstâncias, o consumidor médio, ainda que normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, é não só susceptível de ser induzido em erro sobre as características essenciais do produto em causa (ser constituído essencialmente por produtos lácteos e não produtos vegetais), como pode ser determinado e influenciado na escolha do produto, considerando como relevante na sua composição o “leite dos Açores”, quando na verdade a integração do leite naquele produto é muito reduzida.  (…)

Ora, uma vez que a comunicação “com leite dos Açores” está associada à outra comunicação constante da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), teremos de concluir que a mesma não serve apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo. Nesta medida pode também considerar-se que as denominações constantes do produto em causa não estão conformes ao art.º 78º do Regulamento (EU) 1 308/2013 de 17.12.” (carregado e sublinhado nosso).
O JE constata que, nas comunicações comerciais em causa, permanece a referência “com leite dos Açores”, com a apresentação gráfica descrita, indicando-se agora de modo diferente a natureza de creme vegetal e omitindo associações à manteiga, produto lácteo relativamente ao qual a menção à origem, dos Açores, se traduz numa mais valia.
Mas a queixosa pretenderá, sustentando-se para isso na decisão da Comissão de Apelo – ou melhor, na interpretação que faz daquela decisão – que seja verificado o incumprimento, logo, fique integralmente vedada a utilização do claim “com leite dos Açores” num produto como o creme vegetal.

Sucede que, tal claim “com leite dos Açores” já foi objecto de apreciação, no âmbito dos processos mencionados e a sua proibição foi determinada quando e se associado a outros claims e omissões, porquanto sugeria que o produto em causa era um produto lácteo.

A susceptibilidade de confusão com um produto lácteo era gerada, pelo conjunto das menções escritas, respectivos destaques e localização, bem como pelas omissões da comunicação comercial.

As deliberações não proibiram a utilização do claim, per se, isoladamente.
Proibiram-no, sim, quando utilizado de modo tal que, aquela referência a um componente (assaz diminuto, aliás, na composição global do produto), pudesse ter como efeito a descaracterização da essência do próprio produto i.e., quando um creme vegetal pudesse ser confundido com manteiga.

A questão colocada na presente queixa é, de facto, uma única: se a utilização do claim “com leite dos Açores”, mantida nas embalagens e no spot televisivo, expurgada das associações ou omissões que conduziram à decisão de cessação anterior, constitui, ou não, um incumprimento das deliberações anteriores do JE.

Considera o Júri, contrariamente ao que pretende a queixosa, que as deliberações anteriores não proibiram a utilização do claim “com leite dos Açores” em cremes vegetais, criando uma espécie de exclusividade de uso para produtos lácteos, nem determinaram qualquer tipo de valor percentual a partir ou abaixo do qual pode, ou não, ser feita menção ou destaque a um componente de um produto (recorde-se, aliás, que foi utilizado apenas como lugar paralelo o exemplo das bebidas alcoólicas e as percentagens legalmente estabelecidas para qualificação “com” ou “sem” álcool). Donde, a resposta do Júri é negativa.

3. Decisão

Termos em que a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido da não verificação do incumprimento e, consequentemente, pela improcedência da queixa.».

A Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação15J / 2014 :: Lactogal vs. FIMA