2014

13J / 2014 – Recurso :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

13J/2014
Recurso

 

Beiersdorf Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

 

COMISSÃO DE APELO

 

 

Proc. n.º 13J/2014

 

Recorrente:
“BEIERSDORF PORTUGAL”

versus:

“UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, LDA.”

 

I- RELATÓRIO

1. A queixosa veio requerer ao Júri de Ética (JE) do Instituto Civil da Autodisciplina da Comunicação Comercial (ICAP) a apreciação da licitude da campanha publicitária da autoria da denunciada, iniciada em Portugal em 23 de Março de 2014, referente ao produto da Unilever “Dove Invisible Dry”, um desodorizante, e ao alegado “efeito” 100 cores, pedindo que:

a) se declare que a mensagem publicitária da Unilever da campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” viola o princípio da veracidade, previsto nos artigos 9.º, n.º 1, alínea a) do Código de Conduta do ICAP e 10.º do Código da Publicidade; constitui publicidade enganosa, especificamente violando os artigos 9.º do Código de Conduta do ICAP e 11.º do Código da Publicidade; constitui prática enganosa proibida pelo Decreto-Lei n.º 57/2008 de 26.03, em concreto identificada no artigo 7.º, n.º 1, alínea b), deste diploma;

b) se ordene a cessação imediata da campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” e a respectiva recolha de todo o material publicitário alusivo à referência 100 cores na promoção do produto Dove Invisible Dry; a alteração dos rotulos de todas as embalagens do produto, com eliminação da referência 100 cores ou qualquer outra no âmbito desta campanha, e a proibição da utilização de expressões 100 cores ou qualquer expressão que indique a eficácia em 100 cores ou diversas cores claras e escuras.

Na denúncia identifica a campanha publicitária e alega que a mesma foi projectada para enfatizar propriedades e acção anti-manchas do produto Dove Invisible Dry de uma forma enganosa, procurando, em especial, incutir a ideia errada de que se trata de um desodorizante com uma acção anti-mancha especificamente eficaz em todos os tipos de manchas, incluindo manchas amarelas (que surgem nos tecidos de cor clara), o que não é verdade, concluindo que a campanha publicitária em causa é ilegítima por constituir publicidade enganosa, nos termos do art.º 11º do Código da Publicidade , por violar o princípio da veracidade previsto no art.º 9º do Código de Conduta do ICAP (CCICAP) e nos art.ºs 10º e 11º do CP e por constituir prática enganosa, proibida pelo art.º 7º nº 1 al. b) do DL 57/2008.

Contestou a denunciada pedindo que se julgue improcedente a queixa apresentada.

Começa por aceitar como boa a distinção feita na queixa quanto ao tipo de manchas provocadas pelos desodorizantes, as manchas brancas, que surgem aquando do contacto da roupa com o desodorizante acabado de aplicar e as manchas amarelas, que surgem gradualmente nas roupas, em resultado da interacção do desodorizante com a transpiração e o detergente utilizado na lavagem da roupa. Alega, depois, que se propõe demonstrar: que a sua campanha e inerentes alegações publicitárias dizem respeito apenas às manchas brancas, provocadas pelo contacto do desodorizante com a roupa imediatamente após a sua aplicação; que as referências constantes das embalagens de Dove Invisible Dry são inequívocas relativamente à mensagem que transmitem para o consumidor quanto à sua acção anti-manchas dizer apenas respeito a manchas brancas; que o produto Dove Invisible Dry foi efectivamente testado em 100 cores, tendo o resultado sido o da inexistência de manchas brancas; que o produto Dove Invisible Dry é igualmente eficaz na acção anti manchas amarelas, provocadas pela interacção do desodorizante com a transpiração e o detergente utilizado na lavagem da roupa; que ainda que o consumidor percepcionasse a campanha ora em causa como abrangendo as chamadas manchas amarelas, não obstante a mesma não seria enganosa, concluindo que a mensagem publicitária em causa é perfeitamente lícita.

2. Prosseguindo os autos os seus regulares termos veio a 1ª Secção do JE do ICAP a deliberar que a “a comunicação comercial da responsabilidade da UJM não viola quaisquer dos dispositivos objecto de queixa.”

3. É desta decisão que, inconformada, a queixosa vem recorrer, apresentando alegações nas quais requerer que esta Comissão de Apelo (CA) revogue aquela deliberação e declare que a mensagem publicitária em causa viola o referido princípio e disposições legais, ordenando a sua cessação imediata, nos termos requeridos.

4. A denunciada apresentou contestação ao recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

5. Cumpre apreciar e decidir.

II- FUNDAMENTAÇÃO

1. De facto

Analisando a prova constante dos autos, documental e não impugnada, consideram-se provados os seguintes factos:

1. A denunciada está a proceder a uma campanha publicitária, desde 23 de Março de 2014, relativa ao produto Dove Invisible Dry, feita através de spots televisivos, difundidos em vários canais nacionais, na internet no canal You Tube e também mediante menções publicitadas na embalagem do produto e em materiais de pontos de venda;

2. A mencionada campanha de spots televisivos, na sua essência, descreve-se nos seguintes termos:
“Convidámos mulheres a experimentar o novo Dove Invisible Dry em 100 cores”.

Uma narradora pergunta: “Adivinhe que cor escolheu a Bia?”

A Bia refere que o vermelho é a sua cor favorita e diz “…ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é realmente fantástico”.

Segue-se a afirmação “Dove apresenta Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 cores”.

O número “100” aparece na tela cheia, obtido pela sobreposição de uma camada branca, com o número “100” cortada fora dele, num fundo constituído por uma pluralidade de tecidos coloridos. Tecidos com cores claras, como branco/cinza claro, verde-claro, azul claro e rosa claro podem ser vistos, em especial no interior do número “100”.

O anúncio termina com a locutora a ler a frase que ocupa todo o ecrã “Novo Dove Invisible Dry. Invisível em 100 cores”.

3. Numa outra divulgação na internet revela-se uma acção de marketing da Unilever no âmbito da promoção do produto, na qual aparece distintamente a promoção efectuada pela própria Unilever, onde se lê:

“Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco”

4. A mesma menção, “não apenas no preto e no branco”, é publicitada nos supermercados e hipermercados nacionais onde são criados “callers” para os produtos.

5. Na embalagem do produto Dove “Invisible Dry” a frente da embalagem tem um selo circular contendo a expressão “Tested on 100 colours”, onde, aliás e uma vez mais, o número “100” apresenta uma série de riscas verticais coloridas e é ainda possível visualizar na embalagem (rótulo traseiro de superfície) a expressão: “anti white marks” – anti manchas blancas.

2. Jurídica e ética

Perante as alegações da recorrente e nomeadamente as conclusões aí contidas, são três as questões que as mesmas nos convocam a dilucidar e a resolver, e assim sendo, serão apenas três as questões a analisar, o que irá ser feito de seguida.

1ª: A decisão recorrida não atendeu, em concreto, ao conceito de consumidor comum, atento e razoavelmente informado, impondo-se nessa matéria encontrar o público-alvo e analisar as expectativas e o conhecimento que esse público-alvo terá do produto desodorizante, devendo assim ser alterada a deliberação do Júri neste ponto, analisando a campanha “Dove Invisible Dry 100 Cores” à luz desse conceito de consumidor?

A recorrente alega que na sua deliberação o JE se teria alicerçado num conceito de “consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido” sem ter manifestado qual o seu entendimento nesta matéria, tendo no entanto valorado implicitamente esse “consumidor médio, atento e razoavelmente informado” como um consumidor totalmente conhecedor do mercado e diferentes propostas e produtos na área dos desodorizantes.

Porém, na perspectiva da recorrente, tal “consumidor médio”, in casu, deve ser definido como a generalidade da população portuguesa em idade adulta, procurando um produto cujo preço é baixo e que se destina à satisfação de uma necessidade imediata de higiene pessoal, sem um conhecimento específico do sector e características técnicas do produto e confrontado com uma extensíssima gama e oferta de produtos no segmento desodorizante, devendo assim ser alterada a deliberação do Júri neste ponto, analisando a campanha “Dove Invisible Dry 100 Cores” à luz desse conceito de consumidor.

Vejamos.

Se é verdade que na decisão recorrida se parte da perspectiva de que a campanha dever ser aferida pelo «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido», sem no entanto se definir o que seria, em concreto e in casu esse “consumidor médio”, já não pode aceitar-se a alegação da recorrente de que naquela decisão se fez uma valoração, implícita, desse consumidor como sendo “totalmente conhecedor do mercado e diferentes propostas e produtos na área dos desodorizantes”

Com efeito, o que se fez na decisão recorrida foi uma valoração, ou seja, partindo da perspectiva do «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido» – ainda que não definido – concluir que “a mensagem percepcionada” pelo mesmo em momento algum era a de que os “spots” se referiam “a outras manchas que não aquelas que surgem no momento após a aplicação do desodorizante anunciado”.

Quanto ao acerto, ou não, desta valoração, é questão que irá ser objecto de análise e ponderação no item seguinte.

No âmbito desta 1ª questão importa apenas referir que acompanhamos, no essencial, as considerações teóricas, legais e jurisprudenciais invocadas pela recorrente sobre o conceito de «consumidor comum, razoavelmente atento e informado».

Apenas acrescentaremos que, de alguma forma, o CCICAP já acolhe tais considerações quando nele se estabelece que a avaliação das comunicações pelo possível impacte no “consumidor médio” e “atendendo ainda às características do público-alvo” (art.º 3º nº 2), bem como atendendo aos “conhecimentos, a experiência e a capacidade de discernimento de um consumidor médio, ou aquele a quem especialmente se destina, tendo em conta os factores sociais, culturais e linguísticos” (art.º 3º nº 3), presumindo-se que aquele consumidor médio possui “um grau razoável de experiência, de conhecimento e bom senso, e detenha uma razoável capacidade de observação e prudência” (art.º 3º nº 5).

Assim, não nos repugna aceitar que o exercício que a recorrente faz de definição de “consumidor comum”, para o caso concreto, está no essencial correcto, embora o conceito se possa precisar, como se fará na parte final deste item.

Porém, que daí deva decorrer uma alteração da decisão do JE, neste ponto, é que não nos parece que faça sentido ou tenha fundamento. Desde logo porque não há nenhuma decisão do júri neste aspecto, nem tinha que haver, dado que o que JE tinha que decidir – e decidiu – era a pretensão da queixosa. Isto sem prejuízo de, para assim decidir, a campanha publicitária em causa dever ser analisada à luz ou segundo a perspectiva do tal “consumidor comum ou médio”, colocando-se assim o julgador na posição desse consumidor.

Em conclusão e em resumo, não há qualquer fundamento para alterar a deliberação do JE sobre o conceito de consumidor médio ou comum, atento e razoavelmente informado, até porque nenhuma deliberação foi tomada nesse sentido, sem prejuízo de a campanha publicitária em causa dever ser analisada na perspectiva do tal consumidor comum ou médio. Que, in casu, se considera ser a generalidade da população portuguesa em idade jovem ou adulta, procurando um produto destinado à satisfação de uma necessidade de higiene pessoal, com um preço acessível, sem conhecimento específico do sector e características técnicas do produto desodorizante e confrontado com uma vasta gama e oferta de produtos nesse segmento.
*
2ª: A campanha publicitária em causa, apreciada no conjunto global de todos os suportes e por referência ao consumidor médio antes encontrado, é direccionada a todo o tipo de manchas e não apenas vocacionada para as manchas brancas?

A recorrente insurge-se contra a metodologia adoptada pelo JE de ter feito uma análise da publicidade em vídeo (incluído spots televisivos e suportes de internet) seguida de uma análise à publicidade escrita e teor publicitário das próprias embalagens dos produtos e não ter apreciado a campanha publicitária no conjunto global de todos os suportes indicados e apresentados. Considera ainda que, se o JE assim tivesse procedido, como deveria, e por referência ao consumidor médio antes encontrado, não teria deixado de concluir que se tratava de uma campanha direccionada a todo o tipo de manchas e não, como pretende fazer crer a recorrida, apenas vocacionada para as manchas brancas.
Analisada a argumentação da recorrente, afigura-se-nos que não lhe assiste razão.

Desde logo quanto à crítica à metodologia do JE.

Admitindo com efeito que, em certas circunstâncias , o juízo sobre a licitude ou não da campanha publicitária se tenha de fazer numa perspectiva do conjunto global da campanha em causa, essa necessidade não se justifica na campanha publicitária da recorrida, ora em análise.

Ou seja, in casu, qualquer um dos suportes publicitários ao produto em causa transmite uma mensagem completa sobre o produto publicitado, pelo que a sua eventual ilicitude pode, e deve, ser aferida em relação a cada um dos suportes. Aliás, compreende-se que normalmente assim seja pois os veículos publicitários procuram atingir vários tipos de consumidores e estes farão normalmente a sua opção de consumo apenas com base num dos veículos publicitários, ou pelo menos sem necessariamente os terem visualizado a todos.

Neste sentido pode invocar-se o nº 2 do art.º 3º do CCICAP no sentido de que “dadas as particulares características dos diversos meios, a comunicação aceitável num suporte não o é necessariamente noutro”, devendo assim as comunicações ser avaliadas atendendo ao “meio utilizado”. Daqui decorre também que, em abstracto e perante uma análise dessa natureza, a campanha publicitária em causa pode ser lícita em determinado suporte publicitário e não o ser noutro, no pressuposto claro que são diferentes os termos ou menções usados em ambos os suportes.

Mas também não cremos que assista razão à recorrente quando pretexta que o JE, tendo por referência o consumidor médio antes encontrado, não poderia deixar de concluir que se tratava de uma campanha direccionada a todo o tipo de manchas e não apenas vocacionada para as manchas brancas.

Na verdade, em face dos spots televisivos (quer imagens, quer acção dos intervenientes quer texto que os acompanham) cremos que a mensagem normalmente percepcionada pelo referido consumidor médio é a de que produto é destinado a evitar a visibilidade das manchas brancas que surgem na roupa após a aplicação do desodorizante. A circunstância de não termos nenhuma acção, imagem ou texto, escrito ou oral, que sugira ou transmita ideia diferente, nomeadamente acção ou imagem de lavagem da roupa e constatação da inexistência de mancha, após essa lavagem, ou texto a indicar a eficácia do produto em relação a todas as manchas ou independentemente das vezes em que foi usada a mesma peça de roupa, não pode permitir a conclusão de que o consumidor médio ficou com a percepção de que o produto evita o aparecimento de manchas amarelas ou que o produto se destina a evitar o aparecimento de todo o tipo de manchas.

Por outro lado, dos demais suportes publicitários, embalagem do produto e as menções constantes dos postos de venda, também não cremos que o consumidor médio conclua que se trata de uma campanha direccionada a todo o tipo de manchas e não apenas vocacionada para as manchas brancas.

Aliás, em face da embalagem do produto, afigura-se-nos mesmo difícil que tal conclusão se possa extrair pois o mesmo tem aposto, ainda que na parte de trás, mas de forma bem visível, e aliás até em letras maiores do que o resto do texto aí inserido, as expressões “anti white marks” e “anti-manchas blancas”. Por outro lado, essas embalagens são as que estão nos postos de venda pelo que essa característica do produto, destinado a evitar manchas brancas, é facilmente perceptível para o consumidor medianamente atento e não lhe passará despercebida.

A recorrente, embora sem o afirmar expressamente, parece procurar fundar o carácter enganoso da publicidade em causa numa atitude da recorrida de procurar confundir o consumidor, com a ligação entre a menção da “invisibilidade” do produto em “100 cores” ou de “não deixar marcas em 100 cores” e a outra menção “não é apenas no preto e no branco”.

Mas afigura-se-nos que também sem fundamento.

Atente-se que, na verdade e nos termos da factualidade provada, esta menção “não é apenas no preto e no branco” apenas surge nos postos de venda e numa divulgação na internet, sendo certo que naqueles postos de venda está também o produto publicitado e neste está aposta a menção da sua eficácia “anti white marks” e “anti-manchas blancas”. Logo, perante esta realidade e o facto de os spots televisivos não terem aquela menção, não pode considerar-se que estamos perante uma estratégia global de engano, que afectasse toda a campanha publicitária em relação a todos os veículos publicitários. Apenas se poderia colocar em causa a eventual ilicitude da publicidade naqueles suportes publicitários em que aparecesse aquela menção ligada ao preto e ao branco.

Mas nem isso acontece, a nosso ver. Com efeito, das menções a “100 cores” e “não é apenas no preto e no branco”, não pode extrair-se que o consumidor médio, atento e normalmente informado, percepciona que o produto em causa é eficaz contra todo o tipo de manchas. Na verdade, não sabendo o consumidor médio qual a concreta causa de cada tipo de mancha, amarela ou branca, como a própria recorrente admite, não é pelo facto de se fazer referência à eficiência de um produto em 100 cores, incluindo nestas o preto e o branco, que isso o vai a levar a concluir que o produto publicitado é eficaz contra aqueles dois tipos de manchas ou todo o tipo de manchas.

Aliás não pode deixar de se salientar que há aqui alguma incongruência na argumentação da recorrente pois, segundo esta, para este consumidor médio, razoavelmente atento e informado, “não é, seguramente, consabido que as manchas amarelas são produzidas pelo decurso do tempo e a interacção do desodorizante com o suor e outros agentes químicos” (cfr. nº 36 das alegações de recurso) e que as “manchas amarelas … aparecem gradualmente na roupa, independentemente da sua cor” (nº 8 da sua queixa).

Numa perspectiva de análise exaustiva da questão, não pode deixar de se admitir que a referência “não apenas no preto e no branco” e a circunstância de nos produtos da concorrência, nomeadamente da recorrente (cfr. docs nºs 9 a 14 juntos com as alegações de recurso), aparecerem desenhadas peças de roupa preta e branca, isso possa levar alguns consumidores a associar – indirectamente – o produto publicitado pela recorrida como equivalente pelo menos, em termos de eficiência anti-manchas, ao produto da recorrente e a fazerem a sua opção de compra, nessa base. Mas esse, seguramente, não será um “consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento», nos termos atrás explicitados. Atento não é, com certeza, pois não atentou que no produto da recorrente apenas aparece desenhada uma peça de roupa preta e também não é normalmente informado, pois então não leu as características dos produtos, já que o produto da recorrida se anuncia apenas “anti white marks” e “anti-manchas blancas”, ao contrário do da recorrente que se anuncia como “anti-manchas brancas” e “anti-manchas amarelas” (cfr. docs. juntos com a contestação da recorrida).

Em conclusão, não cremos que tenha fundamento a argumentação da recorrente de que a campanha publicitária em causa é direccionada a todo o tipo de manchas, nomeadamente as manchas amarelas e que, por isso, constitua uma prática enganosa ou publicidade enganosa, violadora do princípio da veracidade, nos termos das disposições legais acima citadas e do referido preceito do CCICAP.
*
3ª: Houve errada avaliação da prova documental, devendo o estudo da sociedade italiana GNResearch, apresentado pela queixosa, ser considerado uma pesquisa de consumidor em relação à campanha concreta?

A recorrente argumenta que na decisão do JE se fez uma opção de valorar o estudo apresentado pela recorrida (da Blue Yonder) com base num critério, o de ser um “estudo nacional”, que não se verifica, pois tanto esse estudo como o apresentado pela recorrente (da GNReserach) são estudos realizados no estrangeiro, devendo assim considerar-se como determinante o estudo apresentado pela recorrente e, bem assim, a decisão do Júri do Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária, quanto a publicidade semelhante levada a cabo em Itália.

Não deixando de se assinalar que o pressuposto considerado na decisão do JE, o de que o estudo apresentado pela recorrida se referia “em concreto ao mercado português”, não se afigura correcto, daí não podem retirar-se as consequências que a recorrente pretexta, até pela natureza e finalidades dos estudos em causa.

O documento junto pela recorrida corresponde a um estudo de mercado da autoria de uma entidade externa independente, a Blue Yonder, cujas conclusões não foram colocadas em causa pela recorrente, apenas procurando a mesma salientar que tais conclusões apenas se podem referir às manchas brancas. Esse estudo, realizado num universo de 120 mulheres, consistia na aplicação do produto Dove Invisible Dry e, seguidamente, envergarem t-Shirts de 120 cores diferentes, após o que era seguido de respostas a um conjunto de questões relacionadas com a invisibilidade do dito produto após 5 a 7 horas. As respostas obtidas (cfr. fls 7 desse estudo) são concludentes e permitem a ilação de que o produto em causa foi efectivamente testado em 100 cores, sendo verdadeira a afirmação segundo a qual o produto, após aplicado, não provocou manchas em 100 cores.

Nesta medida estamos perante um estudo que comprova as menções constantes dos suportes publicitários da recorrida, nomeadamente a de que o produto é invisível em 100 cores e não deixa marcas em 100 cores. Com este estudo e desta forma o que a recorrida fez foi dar cumprimento ao ónus da prova que sobre si impendia, nos termos do art.º 12º nº 1 do CCICAP, onde se prevê que “as descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser susceptíveis de comprovação”.

Ora, para efeitos desta comprovação, não pode deixar de se considerar que é irrelevante, quer o local onde o estudo é realizado (no estrangeiro ou em Portugal), quer a nacionalidade das mulheres que responderam às questões. Uma e outra circunstância não tinham influência nos resultados, pois se crê que a observação das mulheres em causa no estudo, sobre a existência ou não de manchas na roupa usada, não seria diferente da observação de mulheres portuguesas (sendo certo que é indiferente para o efeito em causa o odor corporal).

Já o estudo junto pela recorrente procura determinar a percepção que o consumidor italiano terá tido da campanha publicitária feita naquele país ao produto “Dove Invisible Dry”.

Ora, sendo seguramente certo que o “consumidor italiano” não é o “consumidor português” – aliás a recorrente não deveria olvidar que nos termos da jurisprudência comunitária que invocou a aferição do consumidor médio deve fazer-se tomando em linha de conta “factores sociais, culturais ou linguísticos” e a “presumível expectativa do referido consumidor” (nacional) – e não estando minimamente demonstrado que a campanha publicitária levada a cabo em Itália seja igual à que está em causa nestes autos, torna-se claro que a pretensão da recorrente de que o estudo por ela apresentado seja “determinante” e possa ser considerado uma pesquisa de consumidor em relação à campanha aqui em causa não tem qualquer fundamento, por falta de pressupostos, o mesmo consumidor e a mesma campanha publicitária. Igualmente, por esta razão, a decisão do Júri do Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária invocada pela recorrente não pode ser considerada como jurisprudência que esteja em contraposição à deliberação do JE.

Assim, atenta a natureza e finalidades dos estudos em causa, não pode deixar de se concluir que a recorrida fez prova ou comprovou as menções constantes dos suportes publicitários, quanto a uma realidade, o produto publicitado não deixar marcas em 100 cores e que o estudo de percepção do consumidor italiano sobre a publicidade levada a cabo naquele país, em relação ao mesmo produto, não é susceptível de ser considerado como válido e relevante para aferir da percepção do consumidor português quanto à campanha publicitária em causa nestes autos.

Uma última nota para referir que, não havendo elementos para se concluir que o consumidor médio tenha a percepção de que a campanha publicitária em causa é dirigida também à eficácia do produto perante as chamadas manchas amarelas, não há que proceder à análise do valor do estudo (Doc. 4 junto com a contestação, da Universidade Federal de São Carlos) junto pela recorrida sobre a eventual eficácia do produto face a tais manchas.
*
Em conclusão e como acima já se procurou fundamentar, pese embora não se subscrevam integralmente os argumentos da decisão recorrida, improcedem na sua essência as alegações do recurso, pois não vislumbramos que a comunicação comercial em causa constitua uma prática enganosa ou seja publicidade enganosa e ofenda o princípio da veracidade, nos termos da citada disposição legal do DL 57/2008 e dos indicados preceitos do CP e do CCICAP.

Impõe-se assim confirmar a decisão recorrida e julgar improcedente o recurso.

III- DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.

Lisboa, 28 de Julho de 2014

António Francisco Martins
Presidente da Comissão Apelo

Augusto Ferreira do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

Francisco Xavier do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

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15J / 2014 :: Lactogal vs. FIMA

15J/2014

Lactogal, Produtos Alimentares
vs.
FIMA, Produtos Alimentares

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no décimo sétimo dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 15J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 15J/2014

1.   Objecto dos Autos

1.1.   A LACTOGAL – PRODUTOS ALIMENTARES, S.A., (adiante abreviada e indiferentemente designada por LACTOGAL, Requerente ou Queixosa) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a FIMA – PRODUTOS ALIMENTARES, SA. (adiante abreviadamente designada por FIMA) e a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS LDA (adiante abreviadamente designada por designada por ULJM), designadas conjuntamente por Requeridas, relativamente a comunicação comercial do produto “FLORA” difundida através da embalagem do produto e no spot televisivo publicitário por, segunda a queixosa, incumprir deliberação anterior do JE (cf. violação artigo 30º do Código de Conduta) constituir uma prática comercial desleal, sob a forma da ação enganosa (cf. al. a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março) e violar art.º. 6º (decência), art.º. 4º (princípios fundamentais) art.º. 5º (legalidade) e art.º. 9º (veracidade), todos do Código de Conduta do ICAP.

1.2.   Notificadas para o efeito, as Requeridas ULJM e FIMA apresentaram contestação conjunta.

1.3.   Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

1.4.   Síntese das posições das partes

1.4.1.   Na queixa que apresenta, a LACTOGAL ocupa-se em descrever e citar as deliberações anteriores sobre a mesma comunicação comercial.
A essência da fundamentação da queixa pode encontrar-se nas seguintes passagens (art.º. 19º 26º e 27º):
   “(…) compulsados todos os argumentos esgrimidos ao longo da deliberação da Comissão de Apelo, constatamos que esta entende como não admissível a destacada referência “ao leite dos Açores”. “ (sublinhado nosso);   “(…) fácil é de concluir que a Comissão de Apelo não pretendia, apenas e só, cessar a comunicação comercial contida na embalagem do produto “FLORA DERRETE-TE” na parte “Com leite dos Açores” associado à comunicação constante da lateral daquela embalagem “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, “ “Mas sim, fazer igualmente cessar o destaque ao “Leite dos Açores” (por entender que o mesmo não é admissível), ainda que o produto contenha 1% de leite (em pó) e esteja associado, expressamente, ao creme vegetal.”

Refere, depois – sem concretizar -, que: “ (…) tem conhecimento de que tal comunicação comercial não terá sido efetivamente dada sem efeito, designadamente no que respeita à embalagem do produto em causa e ao spot publicitário, uma vez que as menções censuradas pelo ICAP continuam a ser, respectivamente, comercializadas e transmitidas.” (cf. art. 29º, sublinhado nosso).

E adita que:
   Na embalagem “FLORA DERRETE-TE”, no canto superior direito da tampa, consta, de forma bem visível, um círculo em que no seu interior para além da representação gráfica do leite – pinga de leite estilizado –, contém a menção “Com leite dos Açores” (cf. art.º. 30º e documento 3).    (…) no filme publicitário, para além de ouvirmos a seguinte alocução: “Derrete-te com o novo creme vegetal flora, agora com leite dos Açores”, (…) É exibida a embalagem “FLORA DERRETE-TE”, destacando-se o círculo disposto no canto superior direito da mesma, com a representação gráfica do leite – pinga de leite estilizado – e a menção “Com leite dos Açores (cf. art. 31º e 32º e documento n.º 4).

E conclui: “(…) tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, violam a deliberação proferida pela Comissão de Apelo, em 15 de Maio de 2014, no âmbito do processo 4J/2014,” (…) “E violam, ainda, os princípios da legalidade, da veracidade e da proibição de publicidade enganosa, constituindo práticas comerciais desleais, sob a forma de acção enganosa, prevista e punida com contra-ordenação nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei 57/2008 de 26 de Março”  (cf. art. 33º e 34º).

Termina pedindo: “a) Sejam, tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, declarados ilegais por expressa violação da decisão do ICAP, nos termos do art. 30º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; b) Sejam a alegação “com leite dos Açores” e respectiva representação gráfica declaradas ilegais, por violação expressa do previsto no art. 6º do Código da Publicidade e arts. 4º, 5º e 9º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; c) Seja, consequentemente, ordenado o expurgo daquela alegação e representação gráfica da campanha publicitária através da qual a FIMA vem promovendo a “FLORA DERRETE-TE”, bem como da rotulagem da sua embalagem.

1.4.2.   Na contestação, as Requeridas alegam que a fundamentação da LACTOGAL “(…) é toda ela perfeitamente coincidente, uma vez que não se vislumbra nenhum dado diferente, nenhum enfoque inovador (até pelo contrário, como adiante se referirá) para as questões já suscitadas pela FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A., perante o JE, no âmbito do processo 14J/2014 (…)” (cf. art. 2º) queixa esta relativa ao incumprimento e à comunicação comercial do produto “FLORA.

Afirmam, ainda: “(…) não é exacta a matéria dos artigos 29º a 34º, muito embora seja verdade, como é natural, que ainda existem no mercado embalagens que não estão conformes com a comunicação que em 20 de Maio foi dirigida ao ICAP no âmbito do Processo nº 4J/2014, sendo certo como é que tal como aí se refere, as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho,” e que: “As novas embalagens que, em breve, chegarão ao mercado, têm um selo diferente com a menção “creme vegetal”, alteração que se entendeu efectuar face à Decisão da Comissão de Apelo, e que já aparece no novo filme publicitário, ao contrário do que se refere nos artigos 31º e 32º da denúncia – ver doc. nº 4 junto com a denúncia (pese embora a pouca qualidade da gravação; em alternativa pode ver-se o que está junto ao processo 14J/2014).” (cf. art. 10 e 11º).

Adiantam que: “(…) para que não houvesse qualquer dúvida quanto à natureza do produto FLORA, a FIMA-ULJM foram mesmo para além da Decisão da Comissão de Apelo, uma vez que tendo aquela proibido a comunicação “Com leite dos Açores” associada à que constava da lateral da embalagem, o produto passou a ser claramente enquadrado pela aposição da menção “creme vegetal” junto ao disclaimer “Com leite dos Açores”, indicando de forma expressa, e sem margem para qualquer dúvida, que não se trata de um produto lácteo (o sublinhado é nosso).” (cf. art. 14º)

E acrescentam:
   “A utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” não foi proibida pelas decisões supra transcritas e, sendo assim, como parece evidente, não há incumprimento.” (cf. art. 17º)    “(…) a menção “creme vegetal” foi incluída na embalagem sem que a isso a FIMA-ULJM estivessem obrigadas pelas Decisões, mas por lhes parecer que dessa forma se dissipava qualquer dúvida que pudesse subsistir, deixando ainda mais evidente, por referência ao consumidor médio, que não se tratava de uma manteiga.” (cf. art. 18º);   “(…)“Creme vegetal” é apenas um “fancy name”, de resto, o termo vegetal no Regulamento nº 1308/2013, anexo VII, refere-se à denominação legal e a que está na lei está correctamente incluída, como é obrigatório, numa das faces da embalagem, e não tem que ser repetida nas outras.” (cf. art. 19º).

Sublinham, também, que: “A FIMA e a ULJM estão a comercializar um creme vegetal, e não uma manteiga, com leite dos Açores nos ingredientes, com a indicação da respectiva percentagem na lista, como acontece com qualquer produto alimentar, e em conformidade com a lei, Regulamento nº 1169/2011 artigo 22º, anexo VIII, ponto 3.b).” e que: “(…) a campanha relativas à composição e características do produto FLORA cumprem as Decisões supra citadas e a regulamentação aplicável, sendo a denúncia desprovida de qualquer fundamento” (cf. art.º. 28º e 29º).

E concluem: “(…) não há qualquer hipótese de o consumidor considerar que está perante algo que não seja um creme vegetal para barrar, com a menção “creme vegetal” ainda menos.” (cf. art.º. 20º) “(…) tudo o que é afirmado expressamente ou através de claims visuais, corresponde à verdade e não é susceptível de induzir em erro o consumidor médio relativamente a qualquer dos elementos do produto FLORA. “ (cf. art.º. 26º).

Terminam, pedindo que a queixa seja julgada improcedente e negado provimento ao pedido de cessação da publicidade do creme para barrar FLORA.

2.   Enquadramento ético-legal

2.1.   Da qualificação da queixa
Como acima se sintetizou, a comunicação comercial objecto da presente queixa traz à colação os processos 4J/2014, 7J/2014 e 14J/2014 já decididos pelo júri, bem como a decisão da Comissão de Apelo que incidiu sobre o recurso no processo 4J/2014.

As Partes utilizam e parcialmente suportam as suas posições nestas deliberações anteriores, delas extraindo passagens que avaliam pertinentes.

O Júri recorda que Código de Conduta do ICAP dispõe, no seu artigo 30º, sob a epígrafe “Respeito pelas decisões do ICAP”, que:

“1. Todo e qualquer comerciante/anunciante, profissional da comunicação, agência de publicidade, editor, proprietário dos Meios ou contratante, deve abster-se de participar na publicação ou distribuição de um anúncio ou outra qualquer comunicação comercial que tenha sido julgada inaceitável pelo ICAP. 2. Todas as partes envolvidas são encorajadas a incluir e, sendo sociedades, a fazerem os seus melhores esforços por que as sociedades com elas coligadas incluam nos respectivos contratos ou outros acordos relativos a publicidade e outras comunicações comerciais, uma declaração vinculando os signatários a submeterem-se às normas auto-reguladoras aplicáveis e a respeitarem as decisões e regras ditadas pelo ICAP. 3. Os sócios do ICAP e os membros associados das Associações e outras congéneres filiadas no Instituto, bem como quaisquer entidades, incluindo não membros, que submetam questões à apreciação do JE – Júri de Ética, são obrigados a acatar prontamente, na letra e no espírito, as decisões oriundas, nomeadamente, dos órgãos sociais do ICAP e do JE – Júri de Ética. (…)

Em conformidade com este dispositivo, o Regulamento do JE prevê, no nº 1 do seu artigo 7º, que as Secções do Júri são competentes para dirimir as queixas em matéria de comunicação comercial:
a) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, contra associados ou terceiros; b) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, sobre comunicações comerciais decorrentes de alterações naquelas que tenham sido objecto de deliberações proferidas pelo JE; c) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas sobre comunicações comerciais veiculadas posteriormente noutros suportes que não tenham sido identificados na queixa. (sublinhado nosso).

No contexto da auto-regulação o objecto da queixa é relevante, entre outros, para a determinação do prazo e conteúdo da contestação (Cf. art. 10º do Regulamento do JE “2. O prazo (…) no que respeita ao artigo 7º, alíneas b) e c) é de dois dias úteis, contados a partir do primeiro dia útil seguinte ao da notificação da queixa, inclusive. (…) 5. A contestação prevista no artigo 7º, alíneas b) e c), apenas carece da apresentação dos factos e fundamentação do alegado cumprimento.”).

No caso em apreço, estão em causa, concretamente, dois suportes – as embalagens e o spot televisivo – e um único claim, a saber, o claim “com leite dos Açores”.

O claim em questão foi objecto de queixas anteriores (processos 4J/2014 e decisão da Comissão de Apelo e 7J/2014).

Os suportes agora identificados, são os mesmos já apreciados.

Pese embora a queixa não seja totalmente clara quando, simultaneamente pede “a) Sejam, tanto a “nova” rotulagem como o “novo” spot publicitário, declarados ilegais por expressa violação da decisão do ICAP, nos termos do art. 30º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; b) Sejam a alegação “com leite dos Açores” e respectiva representação gráfica declaradas ilegais, por violação expressa do previsto no art. 6º do Código da Publicidade e arts. 4º, 5º e 9º do Código de Conduta do ICAP em Matéria de Publicidade e outras formas de comunicação complementar; (…)”, o Júri considera que, perante os factos invocados e fundamentos da mesma, deve ser inequivocamente qualificada como uma queixa por incumprimento ao abrigo do art.º. 7º nº 1 alínea b).

Com efeito, para uma nova queixa, faleceriam tanto factos como fundamentos e, naturalmente, defesa.

Refira-se que o JE não pode, nem deve, proceder à reapreciação de factos que foram objecto dos processos anteriores, corrigi-los ou rectifica-los, nem tampouco elaborar deliberações com o intuito de interpretar, estender ou restringir decisões anteriores.

Diga-se, aliás, que uma reapreciação de factos objecto de análise em processo anterior, ou, uma apreciação de matéria nova no âmbito de uma queixa por incumprimento, não se compadeceria com o direito de defesa que deve ser garantido e que, manifestamente, não seria possível exercer no prazo reduzido para dois dias que é concedido para contestar, o que resulta numa tendencial insusceptibilidade de cumulação duma queixa com vista à verificação do incumprimento, com uma que pretenda a apreciação de comunicação comercial.

E embora o Júri pudesse, em teoria, discorrer sobre se estaria ou não perante uma nova queixa.

2.2.   Da verificação do incumprimento

Para efeitos de incumprimento a queixosa, sustentando-se nas decisões do JE acima citadas e na decisão da Comissão de Apelo, procura defender não ser admissível, relativamente ao produto em causa – o creme vegetal – que as Requeridas façam qualquer referência a leite dos Açores.
Na parte que aqui importa, a Comissão de Apelo, no “RELATÓRIO” da sua decisão de 15 de Maio de 2014 – onde circunscreve o objecto do recurso “(..) à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (cf. ponto 5.) – entendeu que:
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem, bem como a sua representação gráfica, não cumpriam os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia, uma vez que estava associada à outra comunicação constante da mesma embalagem produzida no sentido de que “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, pelo que se teria de concluir que a mesma não serviria apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo, o que é bastante diverso do “per se” invocado pela Requerente, quanto ao primeiro claim;
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem é enganosa quanto às características do produto FLORA, por associação, devido “à omissão de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público…” (cf. decisão da Comissão de Apelo).

Considera o Júri conveniente transcrever os fundamentos expostos pela Comissão, quanto à embalagem do produto FLORA:
“Afigura-se-nos, ressalvada melhor opinião naturalmente, que a comunicação comercial contida na embalagem do produto em causa não pode restringir-se à descrita no nº 2 da f.f., como aparentemente se fez na decisão recorrida, devendo qualificar-se como tal também a comunicação contida na lateral daquela embalagem, descrita no nº 3 da f.f. (…)
Ora, considerando que estamos perante um produto que é caracterizado por ser “um creme vegetal” – em cuja composição os ingredientes principais são o óleo de girassol e matérias gordas vegetais – e não perante uma “manteiga” – cujos ingredientes principais são produtos lácteos – já seria muito duvidoso que, por si só, o destaque dado na embalagem ao disclaimer “Com leite dos Açores” – no topo e numa lateral – , destaque também resultante da sua apresentação gráfica (inserido num círculo e com pingo de leite estilizado), associado à omissão naqueles locais de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público, o qual só tem acesso a essa informação se pegar na embalagem e olhar para a sua parte de baixo, o que não é procedimento comum, em termos de normalidade para o consumidor médio) e ao facto de a percentagem de leite (e em pó) ser de apenas 1%, já seria muito duvidoso dizíamos, que tal comunicação comercial fosse compatível com os mencionados princípios da honestidade e veracidade, acolhidos nos citados dispositivos do CCICAP e preceitos legais. (negrito e sublinhado do Júri) (…)
Mas, além disso, ou seja, analisando a comunicação comercial em causa, no seu conjunto, nomeadamente considerando o disclaimer referido no nº 2 da f.f. e a mensagem contida numa lateral da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), em que se procura induzir, quando não expressar uma associação entre o produto em causa e a manteiga, ao comparar-se a gordura saturada de Flora e a gordura saturada da manteiga standard, afigura-se-nos que foram realmente ultrapassados os limites das honestidade e veracidade da comunicação comercial. (negrito e sublinhado do júri).
Na verdade, nestas circunstâncias, o consumidor médio, ainda que normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, é não só susceptível de ser induzido em erro sobre as características essenciais do produto em causa (ser constituído essencialmente por produtos lácteos e não produtos vegetais), como pode ser determinado e influenciado na escolha do produto, considerando como relevante na sua composição o “leite dos Açores”, quando na verdade a integração do leite naquele produto é muito reduzida.  (…)

Ora, uma vez que a comunicação “com leite dos Açores” está associada à outra comunicação constante da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), teremos de concluir que a mesma não serve apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo. Nesta medida pode também considerar-se que as denominações constantes do produto em causa não estão conformes ao art.º 78º do Regulamento (EU) 1 308/2013 de 17.12.” (carregado e sublinhado nosso).
O JE constata que, nas comunicações comerciais em causa, permanece a referência “com leite dos Açores”, com a apresentação gráfica descrita, indicando-se agora de modo diferente a natureza de creme vegetal e omitindo associações à manteiga, produto lácteo relativamente ao qual a menção à origem, dos Açores, se traduz numa mais valia.
Mas a queixosa pretenderá, sustentando-se para isso na decisão da Comissão de Apelo – ou melhor, na interpretação que faz daquela decisão – que seja verificado o incumprimento, logo, fique integralmente vedada a utilização do claim “com leite dos Açores” num produto como o creme vegetal.

Sucede que, tal claim “com leite dos Açores” já foi objecto de apreciação, no âmbito dos processos mencionados e a sua proibição foi determinada quando e se associado a outros claims e omissões, porquanto sugeria que o produto em causa era um produto lácteo.

A susceptibilidade de confusão com um produto lácteo era gerada, pelo conjunto das menções escritas, respectivos destaques e localização, bem como pelas omissões da comunicação comercial.

As deliberações não proibiram a utilização do claim, per se, isoladamente.
Proibiram-no, sim, quando utilizado de modo tal que, aquela referência a um componente (assaz diminuto, aliás, na composição global do produto), pudesse ter como efeito a descaracterização da essência do próprio produto i.e., quando um creme vegetal pudesse ser confundido com manteiga.

A questão colocada na presente queixa é, de facto, uma única: se a utilização do claim “com leite dos Açores”, mantida nas embalagens e no spot televisivo, expurgada das associações ou omissões que conduziram à decisão de cessação anterior, constitui, ou não, um incumprimento das deliberações anteriores do JE.

Considera o Júri, contrariamente ao que pretende a queixosa, que as deliberações anteriores não proibiram a utilização do claim “com leite dos Açores” em cremes vegetais, criando uma espécie de exclusividade de uso para produtos lácteos, nem determinaram qualquer tipo de valor percentual a partir ou abaixo do qual pode, ou não, ser feita menção ou destaque a um componente de um produto (recorde-se, aliás, que foi utilizado apenas como lugar paralelo o exemplo das bebidas alcoólicas e as percentagens legalmente estabelecidas para qualificação “com” ou “sem” álcool). Donde, a resposta do Júri é negativa.

3. Decisão

Termos em que a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido da não verificação do incumprimento e, consequentemente, pela improcedência da queixa.».

A Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação15J / 2014 :: Lactogal vs. FIMA
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14J / 2014 :: Fromageries Bel Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

14J/2014

Fromageries Bel Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no sétimo dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, ao abrigo do disposto no artigo 3º, nº 2 do Regulamento do JE, a Secção Ad-hoc do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 14J/2014 tendo deliberado o seguinte:
«Processo nº 14J/2014
1.  Objecto dos Autos
1.1.  A FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A. – COMUNICAÇÕES PESSOAIS, S.A, (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por FROMAGERIES ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS, Lda. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por ULJM ou Requerida), relativamente a invocado incumprimento da decisão da Comissão de Apelo relativa ao processo 4J/2014 do ICAP, cujo objecto foi a comunicação do produto “FLORA” comercializado pela Requerida – e promovida nos suportes embalagem, televisão, Internet, MUPI, folheto, bem como gôndola e, ou, linear de supermercados – para tal, alegando a violação dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta, 14.º do Regulamento do JE e 8º, alínea h) dos Estatutos, todos do ICAP.
1.2.  Notificada para o efeito, a ULJM apresentou a sua contestação.
Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.
1.3.  Questões prévias
1.3.1.  Da exposição de factos pela Requerente
Constituiu entendimento da Comissão de Apelo no “RELATÓRIO” da sua decisão de 15 de Maio de 2014 que, “Cumpre apreciar e decidir, salientando-se desde já que o objecto do recurso é restrito à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (sic. ponto 5., negrito e sublinhado do Júri).
De onde se mantém a decisão da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, no que tange à comunicação comercial do produto FLORA veiculada:
– (i) nos suportes Internet, MUPI, folheto e lineares ou gôndolas de supermercado, em que se considerou que o disclaimer “Com Leite dos Açores” – atenta a respectiva percentagem provada pela ULJM – configuraria uma prática de publicidade enganosa, nos casos (e só nos casos) em que se encontrasse associado a claims suscetíveis de criar junto do consumidor médio, a convicção de que Flora “com leite dos Açores”, por este facto alegado, e de acordo com um nexo de causalidade:
         – tem um delicioso sabor;
e, ou,
– de que o mesmo sabor é o de manteiga;
 e, ou,
– de que pode satisfazer os apreciadores desta, como se de manteiga se tratasse;
– (ii) Nos suportes televisão e Internet, a alegação publicitária “Com leite dos Açores e tão saborosa só podia ser Flora” a qual, no entender do Júri, consubstanciava uma prática de publicidade enganosa por induzir o consumidor médio em erro quanto ao nexo de causalidade entre o leite dos Açores e o sinal forte da marca Flora, o qual nunca foi, nem é, o de um creme vegetal com leite dos Açores. Logo, ao possui-lo (seja qual for a percentagem em que o possua), nunca poderia ser Flora.
A Comissão de Apelo por seu turno – e em conformidade com o entendimento no sentido de que, “o objecto do recurso é restrito à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.” (sic. ponto 5., negrito e sublinhado do Júri) – vem a decidir que, “Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar procedente o recurso e, em consequência, determinam a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA, quanto à comunicação “Com leite dos Açores”, associada à comunicação constante da lateral daquela embalagem: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, devendo a sua divulgação cessar de imediato e não ser resposta.” (sic.III – DECISÃO, negrito e sublinhado do Júri).
Pelo exposto, considera o Júri constituir uma descontextualização do que foram os fundamentos e a decisão da Comissão de Apelo, no âmbito do recurso da deliberação do JE 4J/2014, o ora alegado por parte  da FROMAGERIES em sede de queixa, no sentido de que constituem “FACTOS”, esta sua interpretação:
“A Comissão de Apelo expôs o tema decidendi nos seguintes termos : “Perante as conclusões das alegações da recorrente é essencialmente uma a questão que as mesmas nos convocam a dilucidar e a resolver, a qual pode equacionar-se da seguinte forma: A comunicação comercial incluída na embalagem do produto FLORA viola o princípio da veracidade e consubstancia uma acção publicitária enganosa, não cumprindo igualmente os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos no Direito da União Europeia vigente?”.
A Comissão de Apelo respondeu afirmativamente à questão colocada (“afigura-se-nos que lhe assiste razão” ), tendo decidido em conformidade que “… impõe-se julgar procedente o recurso e determinar a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA.” ” (cfr. II. 2, da queixa).
Aliás, se de outra forma não se revelasse possível, sempre restariam as próprias notas de rodapé através das quais a FROMAGERIES procede à identificação de partes transcritas e escolhidas de um todo contextualizado da decisão da Comissão de Apelo – o qual não foi transcrito –, e redigidas como se de um todo se tratassem, o que não se terá devido a razões de economia:
– “ Vide segundo parágrafo da página 6 da decisão da CA de 15 de Maio de 2014;
– 2 Vide primeiro parágrafo in fine da página 7 da decisão da CA de 15 de Maio de 2014.
– 3 Vide último parágrafo in fine da página 11 da decisão da CA de 15 de Maio de 2014.” (sic).
Constata o Júri que, tal descontextualização ou ginástica gramatical vai “ao encontro” do que vem a FROMAGERIES “relembrar” na queixa, no sentido de que:

“1. A Comissão de Apelo apreciou já a matéria de fundo objecto da presente queixa no âmbito do proc. n.º 4J/2014; no seu recurso para a Comissão de Apelo, a Bel Portugal formulou, em síntese, as seguintes conclusões:

1.1.  A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, bem como a sua representação gráfica, não cumprem os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia;
1.2.  A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, é uma indicação / alegação distorcida e enganosa quanto às características do produto FLORA, nomeadamente no que se refere à sua natureza, identidade e local de proveniência; e
1.3.  A alegação “sabor a manteiga” e “manteiga” que consta de diversa comunicação comercial, incluindo da embalagem do produto FLORA, é igualmente ilícita.” (sic. ponto I).
Ora, o que foi entendido pela Comissão de Apelo foi que:
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem, bem como a sua representação gráfica, não cumpriam os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia, uma vez que estava associada à outra comunicação constante da mesma embalagem produzida no sentido de que “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, pelo que se teria de concluir que a mesma não serviria, apenas, para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo, o que é bastante diverso do “per se” invocado pela Requerente, quanto ao primeiro claim;
– A menção “com leite dos Açores” na embalagem é enganosa quanto às características do produto FLORA, por associação, devido “à omissão de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público…” (sic. decisão da Comissão de Apelo).
Neste tocante assiste razão à ULJM, quando refere a art.º 19.º da sua contestação que: “A verdade é que se não fosse assim, a BEL não se teria alongado em considerações de facto, e de direito, em particular de Direito Comunitário, sem fundamento para o fazer, uma vez que bastaria indicar ou transcrever a parte de uma daquelas decisões que proibisse a utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” para não precisar de alegar mais nada no sentido de demonstrar o alegado incumprimento.”
De onde, considera o Júri como conveniente transcrever o que foram os fundamentos expostos pela Comissão, quanto à embalagem do produto FLORA:
“Afigura-se-nos, ressalvada melhor opinião naturalmente, que a comunicação comercial contida na embalagem do produto em causa não pode restringir-se à descrita no nº 2 da f.f., como aparentemente se fez na decisão recorrida, devendo qualificar-se como tal também a comunicação contida na lateral daquela embalagem, descrita no nº 3 da f.f.
(…)
Ora, considerando que estamos perante um produto que é caracterizado por ser “um creme vegetal” – em cuja composição os ingredientes principais são o óleo de girassol e matérias gordas vegetais – e não perante uma “manteiga” – cujos ingredientes principais são produtos lácteos – já seria muito duvidoso que, por si só, o destaque dado na embalagem ao disclaimer “Com leite dos Açores” – no topo e numa lateral – , destaque também resultante da sua apresentação gráfica (inserido num círculo e com pingo de leite estilizado), associado à omissão naqueles locais de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público, o qual só tem acesso a essa informação se pegar na embalagem e olhar para a sua parte de baixo, o que não é procedimento comum, em termos de normalidade para o consumidor médio) e ao facto de a percentagem de leite (e em pó) ser de apenas 1%, já seria muito duvidoso dizíamos, que tal comunicação comercial fosse compatível com os mencionados princípios da honestidade e veracidade, acolhidos nos citados dispositivos do CCICAP e preceitos legais. (negrito e sublinhado do Júri)
(…)
Mas, além disso, ou seja, analisando a comunicação comercial em causa, no seu conjunto, nomeadamente considerando o disclaimer referido no nº 2 da f.f. e a mensagem contida numa lateral da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), em que se procura induzir, quando não expressar uma associação entre o produto em causa e a manteiga, ao comparar-se a gordura saturada de Flora e a gordura saturada da manteiga standard, afigura-se-nos que foram realmente ultrapassados os limites das honestidade e veracidade da comunicação comercial. (negrito e sublinhado do júri).
Na verdade, nestas circunstâncias, o consumidor médio, ainda que normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, é não só susceptível de ser induzido em erro sobre as características essenciais do produto em causa (ser constituído essencialmente por produtos lácteos e não produtos vegetais), como pode ser determinado e influenciado na escolha do produto, considerando como relevante na sua composição o “leite dos Açores”, quando na verdade a integração do leite naquele produto é muito reduzida.
 (…)
Ora, uma vez que a comunicação “com leite dos Açores” está associada à outra comunicação constante da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), teremos de concluir que a mesma não serve apenas para descrever a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo. Nesta medida pode também considerar-se que as denominações constantes do produto em causa não estão conformes ao art.º 78º do Regulamento (EU) 1 308/2013 de 17.12.” (Negrito e sublinhado do JE).
Termos em que, no que concerne aos presentes autos apreciar-se-á, tão somente, a alegada desconformidade da actual campanha publicitária ao produto FLORA, da responsabilidade da ULJM, com as decisões da Comissão de Apelo e da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, de acordo com a interpretação que ficou exposta pelo Júri, as quais não permitem corroborar, em toda a sua extensão, o alegado pela FROMAGERIES a parágrafo primeiro do ponto II.1 da queixa, no sentido de que, “A Unilever mantém o destaque impressivo da menção “COM LEITE DOS AÇORES”, quer na embalagem do produto Flora, quer nos demais suportes da sua comunicação comercial, o que foi censurado pela decisão da Comissão de Apelo, nos termos da lei .”.
1.3.2. Da desejável celeridade em matéria de autoregulação
Não pode o Júri esquivar-se a deixar aqui uma nota sobre esta questão, já que o que se encontra em lide nos presentes autos diz respeito a alegado incumprimento de comunicação comercial que foi objecto de deliberações do JE (cfr. artigo 7.º, n.º 1, alínea b, do respectivo Regulamento), para cuja decisão milita com maior força, a necessária celeridade em matéria de autoregulação. Aliás, esta é a razão pela qual, nestes casos, não só o prazo para contestar é de apenas dois dias úteis, como somente se exige em termos petição, a apresentação dos factos e a fundamentação do alegado incumprimento pela outra parte, bem como a junção da comunicação comercial (cfr. artigo 10.º, n.º 4) e, em sede de contestação, a apresentação dos factos e fundamentação do alegado cumprimento. (Cfr. artigo 11.º, n.º 5).
Por outro lado, em bom rigor, deveria igualmente o Júri conseguir pronunciar-se sobre tais eventuais incumprimentos de deliberações, com maior rapidez.
Ora, colocado perante a queixa da Requerente, na qual se intercalam alegações sobre factos novos com articulados que denunciam o incumprimento das deliberações respeitantes ao processo 4J/2014 (cfr. parágrafos décimo a décimo segundo do ponto II.2. sobre a invocada ilicitude de “adição da menção “creme vegetal” encimando o selo da embalagem”) e, ainda, com outros sobre matéria conclusiva e de direito cuja análise implicaria uma reapreciação dos factos que foram objeto daquele processo, circunstâncias a que acresce a descontextualização das conclusões da Comissão de Apelo no mesmo vertidas, entende o JE que a litigância da Requerente não é compatível com a referida celeridade em matéria de autoregulação.
De facto, constata o JE a profusa alegação em sede de queixa, de:
– nova matéria conclusiva ou de direito sobre factos já apreciados em sede do processo 4J/2014 do ICAP, num total de vinte e dois parágrafos no ponto  II.1., sobre o claim “Com Leite dos Açores”, de mais treze parágrafos (do décimo sexto ao vigésimo oitavo) no ponto II.2. sobre a invocada ilicitude de “adição da menção “creme vegetal” encimando o selo da embalagem”, de outros quatro parágrafos (do primeiro ao quarto), a propósito do ponto II.3. acerca da “manutenção concomitante da comunicação comercial visada” e, finalmente, de três parágrafos de “Conclusões” (do primeiro ao terceiro, do ponto III) todos eles não numerados e, num total de quarenta e dois;
– matéria de facto nova, por não apreciada no âmbito do processo 4J/2014 e não abrangida na letra ou no espírito das decisões da Comissão de Apelo e do Júri – cuja articulação é inconsentânea com o prazo de dois dias concedido para contestar, mais reduzido em atenção à finalidade a que se destina – tal, a parágrafos de um a nono e vigésimo nono no ponto II.2. sobre a invocada ilicitude de “adição da menção “creme vegetal” encimando o selo da embalagem”, bem como de quinto, do ponto II.3. acerca da “manutenção concomitante da comunicação comercial visada” e, finalmente, a parágrafos quarto e quinto do ponto “III. Conclusões”, todos os parágrafos não numerados, num total de treze…
1.3.3. Da matéria que não cumpre ao Júri apreciar no âmbito dos presentes autos
Todos os referidos cinquenta e cinco parágrafos não numerados como articulados que pretendem ser, encontram-se precedidos da declaração de intenção por parte da FROMAGERIES feita no sentido de que: “A comunicação comercial da Unilever acima descrita constitui uma violação intencional da decisão da Comissão de Apelo e consubstancia, concomitantemente, o desrespeito grave e censurável das suas obrigações, quer enquanto parte requerida no processo nº 4J/2014, quer enquanto membro do ICAP, como se irá seguidamente demonstrar.” (sic. parágrafo quinto do ponto II. “FUNDAMENTAÇÃO” da queixa).
Contudo, na parte em que tal “demonstração” se refira à tentativa de reapreciação de factos que foram objecto de análise em sede do processo 4J/2014 do ICAP – de acordo com o aduzido a 1.3.1. – e/ou, à apreciação de matéria nova que – para além de se não compadecer com o já referido prazo de dois dias concedido para contestar – justifica a organização de um novo processo, segundo o que se concluiu a 1.3.2., não será tida em conta pelo Júri em sede dos presentes autos.
4. Dos factos
Nos termos do 8º da contestação, a requerida aceita o alegado pela FROMAGERIES “…nos nºs 4 (impugna-se “alegado”) a 8 e 14 (com a explicação infra – 13º), da Exposição dos Factos” constante da queixa da Requerente.
Em conformidade, e no que é relevante para a economia da presente decisão, consideraram-se provados os seguintes factos que não se mostram impugnados, e alegados na petição:
– (i) Em 20 de Maio de 2014, a ULJM comunicou ao ICAP o cumprimento da decisão da Comissão de Apelo (anexo 1), nos seguintes termos: Embalagem Flora “Proposta de alterações: – no selo “Com Leite dos Açores”, colocar sempre “creme vegetal”, ficando assim “creme vegetal com leite dos Açores” (imagem).
Timing de implementação: Início da produção das novas embalagens – 1ª quinzena de Julho. Início das entregas aos Clientes – última semana de Julho.”;
– (ii) Campanha TV
“Proposta de alterações: – alterar voz-off para “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora, agora com leite dos Açores”; retirar frase “Com leite dos Açores” que está escrita no packshot final.
Timings de implementação: próxima vaga da campanha já irá para o ar nestas condições.” (Cfr. art.º 4.º);
 – (iii) Desde pelo menos o dia 6 de Junho de 2014, a ULJM publica e divulga no Youtube diversa comunicação comercial alusiva ao produto FLORA – incluindo filmes publicitários e imagens da embalagem – das quais constam os seguintes claims:
– “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora… agora com LEITE DOS AÇORES”
– “Experimenta o novo creme vegetal Flora, agora com LEITE DOS AÇORES!” (Cfr. art.º 5.º).
A imagem principal da embalagem no topo da referida comunicação mantém o selo “COM LEITE DOS AÇORES”. (Cfr. art.º 6.º e Doc.2 junto à petição);
– (iv) A UIJM é igualmente responsável pela emissão em televisão do spot publicitário constante de Doc. 3 junto à queixa, do qual constam os seguintes claims:
– “Derrete-te com o novo creme vegetal Flora… agora com LEITE DOS AÇORES” (Cfr. art.º 7.º).
Entre os dias 31 de Maio de 2014 e 10 de Junho de 2014, o referido anúncio foi emitido pelo menos 212 vezes, incluindo 38 vezes na SIC, 29 vezes na TVI e 35 vezes na RTP 1, conforme documento que se junta (anexo 4). (Cfr. art.º 8.º);
– (v) Concomitantemente, no dia 1 de Junho de 2014, foi publicada na revista Zen Energy, a seguinte comunicação comercial:
-“MANTEIGA FLORA
NOVA RECEITA COM LEITE DOS AÇORES
Ainda mais saborosa, a nova Flora apresenta-se aos portugueses com uma nova embalagem, dois novos formatos e com um intenso sabor a manteiga, resultante da nova receita com Leite dos Açores. […]. O seu novo e delicioso sabor proveniente do Leite dos Açores vai conquistar todos os apreciadores deste ritual, quer seja ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que apetecer. […].” (Cfr. art.º 9.º, e Doc. 5 junto);
– (vi) No dia 4 de Julho de 2014, a ULJM continuava a comunicar o claim “Delicioso sabor, com leite dos Açores” com o selo “COM LEITE DOS AÇORES”, conforme resulta das fotografias tiradas na loja Continente de Leiria. (Cfr. art.º 10.º e Doc. 6 anexo à queixa);
– (vii) Ainda no mesmo dia 4 de Julho de 2014, a ULJM publicitava o seu produto FLORA através dos claims “Delicioso sabor, com leite dos Açores” e do selo “COM LEITE DOS AÇORES”, conforme resulta das fotografias tiradas na loja Continente de Leiria que junta à queixa. (Cfr. art.º 10.º e Doc. 7 anexo);
– (viii) No dia 14 de Junho de 2014, a ULJM continuava a comercializar o produto FLORA, através da utilização de uma embalagem contendo a menção  “COM LEITE DOS AÇORES” (selo), conforme resulta da fotografia tirada na loja Pingo Doce do Centro Comercial Spazio (Olivais), em Lisboa, e de factura de compra de uma embalagem. (Cfr. art.º 11.º e Docs. 8 e 9 juntos à petição);
– (ix) A ULJM continua a realizar nas lojas uma campanha publicitária através da qual oferece descontos no produto FLORA, usando para o efeito suportes de comunicação comercial como folhetos, cupões e similares, contendo a imagem da embalagem da respectiva embalagem com o selo “COM LEITE DOS AÇORES”, sob a imagem de um pingo de leite estilizado. (Cfr. art.ºs 12.º e 13.º e Docs 10 a 14 anexos à queixa);
– (x) A ULJM continuava a transmitir na data de 20 de Junho de 2014, no seu site institucional da Internet, a seguinte comunicação comercial:
– “A marca Flora foi relançada com uma receita digna dos verdadeiros apreciadores de manteiga: um sabor intenso, com leite dos Açores, irresistível num bom pão quentinho acabado de sair do forno.
A receita de Flora, para além de deliciosamente apetitosa, tem a vantagem de ter menos gordura saturada que a manteiga standard*, o que faz dela a escolha certa para um consumo diário ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que te apetecer.
Flora é um creme vegetal com o delicioso sabor a manteiga, disponível nos formatos 250g e 500g.
*Mais precisamente, – 32% gordura saturada vs manteiga standard a 82% de gordura. Teste realizado em laboratório independente em Outubro de 2013.” (Cfr. art.º 14.º e Doc. 15 junto à petição).
5. Das alegações das Partes
5.1. Defende a FROMAGERIES como “FUNDAMENTAÇÃO” em sede de queixa que:
– (i) “Os regulamentos do ICAP obrigam as partes intervenientes a acatar prontamente, “na letra e no espírito”, as decisões do ICAP (artigo 30º, nº 3 do Código de Conduta), dispondo do “prazo de máximo de 2 dias úteis” para comprovar a cessação imediata da comunicação visada pela decisão (artigo 14º do Regulamento do JE)”;
– (ii) “A Unilever, enquanto associado do ICAP, obrigou-se igualmente a cumprir os normativos do ICAP e as decisões dos seus órgãos (artigo 8º, alínea h) dos Estatutos do ICAP)”;
– (iii) “Todavia, nem quanto à letra e ao espírito da decisão do CA, nem quanto ao prazo de cumprimento, a Unilever cumpriu o que quer que fosse.”;
– (iv) “A comunicação comercial da Unilever acima descrita constitui uma violação intencional da decisão da Comissão de Apelo e consubstancia, concomitantemente, o desrespeito grave e censurável das suas obrigações, quer enquanto parte requerida no processo nº 4J/2014, quer enquanto membro do ICAP, como se irá seguidamente demonstrar.” (sic).
5.2. Contraditando a denúncia da FROMAGERIES, vem a ULJM impugnar o seu teor na generalidade, alegando, em síntese, que:
– (i) “…tudo o que é afirmado (…) corresponde à verdade e não é susceptível de induzir em erro o consumidor médio relativamente a qualquer dos elementos do produto FLORA.” (sic. art.º 32.º), acrescentando que “Aquela que já era a percepção do consumidor médio (…) está agora ainda mais clara” (sic. art.º 28.º) e que”…é natural que existam ainda no mercado embalagens que não estejam conformes com a comunicação de 20 de Maio dirigida ao ICAP, sendo certo que (…) as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho, e é possível que um ou outro folheto, também desconforme, tenha ficado pelos pontos de venda, pois é muito difícil que assim não aconteça.” (sic. art.º 10.º);
– (ii) “…os materiais de ponto de venda ainda não têm o novo selo com a menção “creme vegetal”, pois esta alteração decorre da Decisão da Comissão de Apelo que tem por objecto unicamente a embalagem, e aqueles já tinham tido uma primeira alteração referente à frase “Delicioso sabor, com leite dos Açores”, decorrente da Decisão do JE.” (sic art.º 11.º), sendo que “Os materiais de ponto de venda em produção, e em processo de substituição, terão já o novo selo incorporado, tal como vai estar na embalagem.” (sic. art.º 12.º);
– (iii) “…o filme que tem sido emitido em televisão e no youtube está exactamente como consta da citada comunicação de 20 de Maio p.p., e nem a BEL refere o contrário” (sic. art.º 14.º) e, “…para que não houvesse qualquer dúvida quanto à natureza do produto FLORA, a ULJM foi mesmo para além da Decisão da Comissão de Apelo, uma vez que tendo aquela proibido a comunicação “Com leite dos Açores” associada à que constava da lateral da embalagem, o produto passou a ser claramente enquadrado pela aposição da menção “creme vegetal” junto ao disclaimer “Com leite dos Açores”, indicando de forma expressa, e sem margem para qualquer dúvida, que não se trata de um produto lácteo (o sublinhado é nosso).” (sic. art.º 16.º);
– (iv) “A utilização do disclaimer “Com leite dos Açores” não foi proibida pelas decisões…” (sic. art.º 20.º), acrescentando que “…a menção “creme vegetal” foi incluída na embalagem sem que a isso a ULJM estivesse obrigada pelas Decisões, mas por lhe parecer que dessa forma se dissipava qualquer dúvida que pudesse subsistir, deixando ainda mais evidente (…) que não se tratava de uma manteiga” (sic. art.º 21.º) e que “…de acordo com o entendimento expresso pelo JE na Decisão que proferiu, se não há qualquer hipótese de o consumidor considerar que está perante algo que não seja um creme vegetal para barrar, com a menção “creme vegetal” ainda menos.” (sic. art.º 24.º).
2. Análise dos factos alegadamente desconformes com deliberações do JE
De acordo com os fundamentos e conclusões do Júri a pontos de 1.3.1. a 1.3.3. supra, no sentido de que no que concerne aos presentes autos apreciar-se-á, tão somente, a alegada desconformidade da actual campanha publicitária ao produto FLORA, da responsabilidade da ULJM, com as decisões do JE, concretamente, da Comissão de Apelo de 15 de Maio de 2014 e da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, de acordo com a interpretação que ficou exposta, o JE não se debruçará sobre a alegada ilegalidade:
– da menção “com leite dos Açores”, por impossibilidade de reapreciação do facto,
– da menção “creme vegetal”, a qual se considera como matéria nova.
Dito de outra forma, cumpre agora averiguar da alegada desconformidade dos “factos” elencados a 1.4. com:
– a decisão da Comissão de Apelo de 15 de Maio de 2014, segundo a qual “Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar procedente o recurso e, em consequência, determinam a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA, quanto à comunicação “Com leite dos Açores”, associada à comunicação constante da lateral daquela embalagem: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, devendo a sua divulgação cessar de imediato e não ser resposta.” (sic.III – DECISÃO, negrito e sublinhado do Júri);
– a decisão da Segunda Secção no âmbito do processo 4J/2014, no que tange à comunicação comercial do produto FLORA (veiculada nos suportes Internet, MUPI, folheto e lineares ou gôndolas de supermercado) em que se considerou que o disclaimer “Com Leite dos Açores” – atenta a respectiva percentagem provada pela ULJM – configuraria uma prática de publicidade enganosa, nos casos (e só nos casos) em que se encontrasse associado a claims susceptíveis de criar junto do consumidor médio, a convicção de que Flora “com leite dos Açores”, por este facto alegado, e de acordo com um nexo de causalidade tem um delicioso sabor; e, ou, de que o mesmo sabor é o de manteiga e, ou, de que pode satisfazer os apreciadores desta, como se de manteiga se tratasse.
2.1. Factos que não cumpre ao Júri apreciar
Em conformidade com o que ficou exposto, analisados os “factos” definidos a 1.4. supra, entende o Júri que se encontram na categoria daqueles que não lhe cumpre apreciar, os seguintes:
 – “1.4. (iii)”, “1.4. (vi)”, “1.4. (viii)” e “1.4. (ix)”, por virtude se afigurar pretendida uma reapreciação da referência “ com leite dos Açores”, (cfr., e respectivamente, Docs. 2, 6, 8 e 9 e 10 a 14 juntos à petição);
– “1.4. (iv)” em razão de se preconizar uma reapreciação da referência  “com leite dos Açores” (cf. Docs. 3 e 4 anexos à queixa) e, na medida em que é a própria Requerente a admitir o cumprimento por parte da ULJM do alegado a “1.4. (i)” e “1.4. (ii)” em matéria de “campanha na TV”, (cfr. parágrafo vigésimo nono do ponto II.2. da petição).
2.2. Factos cuja alegada desconformidade com as deliberações do JE cumpre ao Júri apreciar
2.2.1. Da comunicação comercial através de site institucional da ULJM
Segundo o ponto “1.4. (x)” supra, a ULJM continuava a transmitir na data de 20 de Junho de 2014, no seu site institucional da Internet, a seguinte comunicação comercial:
– “A marca Flora foi relançada com uma receita digna dos verdadeiros apreciadores de manteiga: um sabor intenso, com leite dos Açores, irresistível num bom pão quentinho acabado de sair do forno.
A receita de Flora, para além de deliciosamente apetitosa, tem a vantagem de ter menos gordura saturada que a manteiga standard*, o que faz dela a escolha certa para um consumo diário ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que te apetecer.
Flora é um creme vegetal com o delicioso sabor a manteiga, disponível nos formatos 250g e 500g.
*Mais precisamente, – 32% gordura saturada vs manteiga standard a 82% de gordura. Teste realizado em laboratório independente em Outubro de 2013.” (Cfr. art.º 14.º e Doc. 15 junto à petição).
Esclarece a ULJM na sua contestação que: “Em relação ao site corporativo, que era o único elemento que não tinha sido alterado de acordo com o comunicado pela ULJM ao ICAP, devido a problemas técnicos, está já em conformidade com essa comunicação” (sic. art.º 13.º), juntando comprovação aos autos através de documento anexo à mesma contestação de que já procedeu à necessária alteração, em ordem a cumprir o disposto nos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º, do Regulamento do JE, todos do ICAP.
2.2.2. Da comunicação comercial publicada na revista Zen Energy
De acordo com “1.4. (v)” supra, no dia 1 de Junho de 2014, foi publicada na revista Zen Energy, a seguinte comunicação comercial:
-“MANTEIGA FLORA
NOVA RECEITA COM LEITE DOS AÇORES
Ainda mais saborosa, a nova Flora apresenta-se aos portugueses com uma nova embalagem, dois novos formatos e com um intenso sabor a manteiga, resultante da nova receita com Leite dos Açores. […]. O seu novo e delicioso sabor proveniente do Leite dos Açores vai conquistar todos os apreciadores deste ritual, quer seja ao pequeno-almoço, ao lanche ou sempre que apetecer. […].” (Cfr. art.º 9.º, e Doc. 5 junto).
A propósito, vem alegar a ULJM em sede de contestação que, “…ainda que seja exacto o alegado no nº 9, a verdade é que se trata de uma notícia, elaborada por um jornalista, com base num press realese que a ULJM distribuiu em Março, na altura do lançamento do produto, pelo que nenhuma responsabilidade pode ser assacada à contestante que não é a autora, não a “encomendou”, nem pode interferir na liberdade de criação do jornalista e na publicação do que aquele entender, a não ser a posteriori.” (sic. art.º 9.º).
O JE discorda deste entendimento da Requerida, porquanto, nos termos do artigo 5.º, n.º 1, alínea a) do Código da Publicidade, sob a epígrafe “Anunciante, profissional, agência de publicidade, suporte publicitário e destinatário” – aplicável por via do artigo 4º, n.º 1 do Código de Conduta do ICAP – considera-se anunciante, “…a pessoa singular ou colectiva no interesse de quem se realiza a publicidade”. (Negrito e sublinhado do Júri).
Em conformidade, não tendo a ULJM juntado à sua contestação qualquer tipo de prova que permita retirar conclusão inversa, entende o Júri ser a Requerida, a pessoa colectiva que tem interesse em que o produto FLORA, por si comercializado, seja comunicado, in casu, através do que o Júri entende tratar-se de um caso de “publi-reportagem” (não identificada como tal), atenta a ausência dos contornos subjacentes a uma notícia de interesse público…
De onde, considera o JE que se está aqui em presença de alegações publicitárias ao produto FLORA e não, de informação, entendida esta no sentido próprio do termo.
Acontece que o meio considerado, o de imprensa escrita, não faz parte dos suportes que foram objecto de apreciação por parte do Júri no âmbito do processo 4J/2014.
Contudo, tem-se por bom o entendimento segundo o qual toda a deliberação final do JE deve ser entendida como aplicável apenas à comunicação comercial veiculada pelos suportes e meios visados no respectivo processo, se o contrário dela própria não resultar.
Ora, entende-se que da deliberação da Segunda Secção – na parte que não constituiu objecto de recurso –  resulta claramente que, quaisquer alegações publicitárias que, ao jeito de brand management, visem inculcar na mente do consumidor médio a convicção de que a percentagem de leite dos Açores contida no produto FLORA é apta a gerar “um intenso sabor manteiga” constitui uma prática de publicidade enganosa.
Por outro lado, o conteúdo de claims julgado contrário a uma deliberação transitada do JE abrange e é extensível a quaisquer textos cujo sentido possa claramente ser considerado, para um consumidor médio, igual ou nele incluído.
Entende o Júri ser o caso.
Com efeito, considerou o JE em sede da referida deliberação que, algo muito semelhante – divulgado em suporte Internet – configurava, igualmente, uma ofensa ao princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, a lembrar, por transcrição:
– “(iii) comunicação de marca por “Hipersuper” (cfr. Doc. 10):
Disclaimer (S1) “Com leite dos Açores” associado a
Claims: ”…Na prova decisiva que é em casa dos consumidores, acreditamos que o intenso sabor a manteiga de Flora, resultante da nova receita com Leite dos Açores, vai conquistar os mais exigentes apreciadores”, explica Luís Gomes, Flora Brand Manager”.”.
Por maioria de razão do que expôs, entende o Júri que a comunicação comercial veiculada através da revista Zen Energy, apta a gerar a convicção de que FLORA “com leite dos Açores”, por este facto alegado, e de acordo com um nexo de causalidade tem um delicioso sabor; e/ou, de que o mesmo sabor é o de manteiga; e/ou, de que pode satisfazer os apreciadores desta – como se de manteiga se tratasse -, configura uma violação dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º, do Regulamento do JE, todos do ICAP.
2.2.3. Da comunicação comercial através de folheto
Segundo se referiu a ponto “1.4. (vii)”, “Ainda no mesmo dia 4 de Julho de 2014, a ULJM publicitava o seu produto FLORA através dos claims Delicioso sabor, com leite dos Açores”, bem como a publicitar e vender o mesmo produto com o selo “COM LEITE DOS AÇORES”, conforme resulta das fotografias tiradas na loja Continente de Leiria juntas à petição. (Cfr. art.º 10.º e Doc. 7 anexo)”.
À primeira vista, tais alegações seriam susceptíveis de serem consideradas como um facto já apreciado e não considerado desconforme com a moldura ético-legal em matéria de princípio da veracidade (pelos fundamentos e à semelhança do que se expôs em 2.1. supra), não fosse a situação constatada pelo JE de se poder extrair, neste caso específico, um nexo de causalidade entre o sabor da nova FLORA e o leite dos Açores o que, como se referiu ad nauseum no âmbito do processo 4J72014, se trata de uma prática de publicidade enganosa.
Assim, muito embora sejam compreensíveis para o Júri, as razões elencadas pela ULJM a art.º 10.º da contestação no sentido de ser “…natural que existam ainda no mercado embalagens que não estejam conformes com a comunicação de 20 de Maio dirigida ao ICAP, sendo certo que (…) as embalagens alteradas só chegarão aos pontos de venda em Julho, e é possível que um ou outro folheto, também desconforme, tenha ficado pelos pontos de venda, pois é muito difícil que assim não aconteça” (sic.), o certo é que o JE não se pode estribar na razoabilidade das mesmas, para o efeito de não considerar que se verifica uma desconformidade entre divulgação das alegações publicitárias ora em causa – através de suporte folheto – e a observância, por parte da Requerida, dos artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º e do Regulamento do JE, todos do ICAP.

3. Decisão
Termos em que a Secção ad-hoc do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da ULJM – veiculada nos suportes imprensa escrita [1.4. (v)] e folheto [1.4. (vii)] – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com os artigos 30.º, n.º 3 do Código de Conduta e 14.º, do Regulamento do JE, todos do ICAP, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE no âmbito das deliberações do processo 4J/2014 do ICAP.
A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP
Auto Regulação14J / 2014 :: Fromageries Bel Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins
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13J / 2014 :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

13J/2014

Beiersdorf Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no primeiro dia do mês de Julho do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 13J/2014 tendo deliberado o seguinte:
Processo n.º 13J/2014
1.  Objecto dos autos
1.1.  A BEIERSDORF PORTUGAL, LDA., (“Beiersdorf” ou “Queixosa”) vem, nos temos do artigo 10.º do Regulamento do Júri de Ética do ICAP (“Regulamento JE”) apresentar queixa contra UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, LDA. (adiante abreviadamente UJM ou denunciada), relativamente a comunicação comercial iniciada em Portugal em 23 de Março de 2014 referente ao produto da Unilever “Dove Invisible Dry”, um desodorizante e ao alegado “efeito” 100 cor, veiculada através de televisão, Internet e rotulagem, por violação dos artigos 9.º, n.º 1, alínea a) do Código de Conduta do ICAP e 10.º do Código da Publicidade; artigos 9.º do Código de Conduta do ICAP e 11.º do Código da Publicidade e do Decreto-Lei n.º 57/2008, no seu artigo 7.º, n.º 1, alínea b).
1.2.  Notificada para o efeito, a UJM apresentou a sua contestação.
1.3.  Dão-se por reproduzidas a queixa, a contestação e os documentos apresentados pelas Partes.
1.4.  Síntese da posição da parte queixosa
As posições da Queixosa podem ser sintetizadas como segue:
– A Unilever lançou uma campanha publicitária relativa ao produto Dove Invisible Dry.
– A referida campanha “Dove Invisible Dry 100 colors”, foi projectada para enfatizar propriedades e acção anti-manchas do produto Dove Invisible Dry de uma forma enganosa, procurando, em especial, incutir a ideia errada de que se trata de um desodorizante com uma acção anti-mancha especificamente eficaz em todos os tipos de manchas, incluindo manchas amarelas (que surgem nos tecidos de cor clara), o que não é verdade.
– Além disso, esta alegação foi comunicada num contexto em que o produto Dove surge como sendo o “primeiro” desodorizante no segmento de anti-manchas – atente-se na afirmação “o primeiro desodorizante”-, gerando, assim, uma comparação com os seus concorrentes com base em falsas premissas, o que agrava o carácter ilícito da campanha publicitária da Unilever, ao promover entre o consumidor uma inevitável comparação com os concorrentes partindo do falso pressuposto de que este se trata do primeiro anti-manchas do mercado.
– Na campanha publicitária objecto da presente queixa, estão em causa as mensagens publicitárias referentes à eficácia anti-manchas em 100 cores, eficácia essa atribuída pela Unilever ao seu produto “Dove Invisible Dry”, incluindo eficiência na roupa de cor preta e de cor branca, bem como as referências, ainda que indirectas, a produtos de outras marcas.
– Em suma, estão em causa as seguintes afirmações:
•  “Ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é fantástico”.
•  “Apresentamos o novo Dove Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 Cores.”
•  “Novo Dove Invisible Dry, Invisível em 100 Cores, incluindo nas que mais gosta.”
•  “Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco.
•  “Tested on 100 colours”
– Sempre que a acção anti-mancha de um desodorizante é limitada a apenas um dos dois tipos de mancha indicado acima, a publicidade a esse produto, pretendendo evidenciar o poder anti-mancha, deve indicar o tipo de mancha que o produto evita, de forma muito precisa e clara.
– Sucede que, a Unilever, na sua campanha publicitária ao produto Dove Invisible Dry fez, exactamente, o oposto.
– De facto, as afirmações como “Invisível em 100 cores” ou “Tested in 100 colours” apenas pode ser entendido pelo consumidor médio, como sendo referente a uma eficácia anti-manchas ilimitada, ou pelo menos eficaz em 100 cores.
– Este conceito “anti-mancha ilimitado” sai ainda mais reforçado no anúncio de televisão, que afirma expressamente “(…) ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favorito é realmente fantástico”.
– Porém a publicidade ao produto vai ainda mais longe e para que não haja incertezas, é ainda afirmado que o produto é “Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco”, ou seja não restam dúvidas que na campanha publicitária em causa, a Unilever pretendeu claramente afirmar que o produto é eficaz em todas as cores, incluindo a cor branca e as cores pálidas.
– Cabe ao anunciante demonstrar as afirmações feitas no âmbito da mensagem publicitária, designadamente comprovar as afirmações sobre o produto promovido.
– A afirmação de que o produto é invisível em 100 cores, e não apenas no preto e no branco, é uma alegação de um facto verificável e como tal, deve ser objecto de comprovação pela Unilever.
– O ónus da prova a este respeito é da responsabilidade do anunciante conforme resulta do n.º 2 do artigo 12.º do Código de Conduta do ICAP e ainda do artigo 11.º do Código da Publicidade.
– A Unilever terá, portanto, de provar que:
a)  Testou o produto em 100 cores (uma vez que especificamente afirma a sua eficácia em 100 cores na publicidade em questão);
b)  Que a eficácia anti-mancha foi demonstrada nessas 100 cores;
c)  O produto Dove Invisible Dry impede a formação de manchas brancas, e de manchas ou marcas amarelas.
– E nem se diga que a Unilever procurou informar o consumidor médio ao colocar no rótulo traseiro das embalagens a menção “anti white stains”, pois tal como já foi explanado e resulta da experiência comum, por um lado o efeito anti-manchas brancas reflecte-se na roupa escura, mas não na roupa clara.
– E, por outro, o efeito antimancha amarela não resulta de um produto com composição apenas anti-mancha branca, pois trata-se de efeitos químicos diferentes.
– Na verdade a mancha branca é imediata e surge por contacto directo do desodorizante anterior à sua secagem e a mancha amarela surge apenas depois de alguma utilização e pela reacção do tecido a outros agentes (o suor e os detergentes utilizados nas lavagens).
– Acresce que, a mensagem “anti white stains” não é suficiente de per se para excluir a eficácia do produto relativamente a outros tipos de manchas, como as amarelas, sendo certo que essa afirmação nunca será assim interpretada pelo consumidor médio que desconhece as diferentes causas das manchas brancas e amarelas.
– Aliás, o consumidor médio não está, sequer, alerta para esta diferença, já que toda a promoção é direccionada, precisamente, no sentido de o produto da Unilever ser eficaz em todas as manchas, chegando até a afirmar “Não apenas no preto e no branco.”
– A este respeito diga-se que o Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária, em Itália, decidiu já queixa em tudo semelhante à ora apresentada, tendo concluído que a campanha publicitária da Unilever enquadra o conceito de publicidade enganosa previsto no artigo 2.º do Codice di Autodisciplina della Comunicazione Commerciale que dispõe:
“ Comunicação Empresarial enganosa”
A Comunicação Comercial deve evitar qualquer declaração ou representação susceptível de induzir em erro os consumidores, mesmo por omissão, ambiguidade ou afirmações exageradas, especialmente no que concerne às características e os efeitos do produto, preço, gratuidade, condições de venda, distribuição, identidade das pessoas representadas (…).
– Ao avaliar a comunicação comercial enganosa é tomado como referência o consumidor médio do grupo de referência.
– Aliás, nesse processo, a Unilever apresentou testes de mercado alegando que os mesmos comprovariam a eficácia do produto em 100 cores.
– Os referidos testes foram impugnados pela Beiersdorf Itália no que concerne, nomeadamente, à metodologia utilizada por um lado e, por outro, quanto às conclusões dos consumidores relativamente à eficácia directa nas manchas amarelas, já que todas as questões alegadamente colocadas ao consumidor estão orientadas para a produção/não produção de manchas brancas, sendo certo que os testes no Brasil se reportam exclusivamente às manchas brancas.
– Ainda no que concerne ao tipo de manchas, da informação colocada no contra-rótulo das embalagens, junto às indicações da composição do produto e em letra de tamanho claramente inferior, resulta que é a própria Unilever que admite que o produto apenas é eficaz nas manchas brancas, donde a eficácia nas manchas amarelas em cores claras e na cor branca não estará, de forma alguma, garantida.
– Tal admissão, que se aceita, não pode, em qualquer caso, ser vista como uma rectificação ao conteúdo da mensagem publicitária, porquanto:
•  Não existe qualquer menção/ reserva na mensagem publicitária propriamente dita, como, por exemplo: “Tested on 100 colours”, seguido de asterisco com mensagem explicativa, e
•  A informação está escondida entre as informações sobre a composição do produto que aparece na parte de trás do rótulo, em letra substancialmente inferior.
– Em qualquer caso, faz-se notar que a proibição de utilização de uma mensagem publicitária enganosa não é mitigada por alusões ou eventuais rectificações que não afastem em absoluto a eficácia da mensagem enganosa, em especial quando a mensagem enganosa constitui o centro ou o foco principal da mensagem publicitária, como é, claramente aqui o caso.
– Assim, devem as mensagens publicitárias da Unilever supra identificadas e integrantes da campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” serem declaradas como publicidade enganosa, especificamente violando o artigo 11.º do Código da Publicidade, mais devendo ser declarada a mensagem publicitária subjacente à Campanha 100 Cores como uma prática enganosa proibida pelo Decreto-Lei n.º 57/2008, e em concreto identificada no artigo 7.º, n.º 1, alínea b), do referido diploma.
– A campanha publicitária “Dove Invisible Dry 100 Cores” deve, igualmente, ser declarada desconforme ao princípio da verdade nos termos dos artigos 10.º do Código da Publicidade e 9.º do Código de Conduta do ICAP,
1.5.  Síntese da posição da parte denunciada
– A campanha publicitária ora em causa diz respeito, essencialmente, às mensagens constantes do filme utilizado em televisão e Internet, na própria embalagem e nos materiais de ponto de venda alusivos ao produto Dove Invisible Dry.
– No que ao filme diz respeito, este começa por descrever que foram convidadas mulheres a utilizar o produto em 100 cores e que a protagonista do TVC terá escolhido a cor vermelha.
– Nas imagens, surge a referida protagonista a aplicar o desodorizante Dove Invisible Dry e a mostrar a sua axila em direcção à câmara, demonstrando, a final, que o vestido que enverga não contém qualquer mancha, afirmando “Veja, sem marcas!”.
– Antes da mencionada demonstração da protagonista, é apresentada uma outra, que consiste na aplicação do aerossol de Dove Invisible Dry num conjunto de tecidos de diversas cores, no intuito de demonstrar que os mesmos ficam sem manchas após essa aplicação.
– É um facto que, entre os tecidos no qual é aplicado o aerossol de Dove Invisible Dry se encontram tecidos de cores escuras e claras, o que apenas reforça a alegação de que o desodorizante foi efectivamente testado num largo espectro de cores, sem que se verificasse o surgimento de qualquer mancha.
– As execuções do spot televisivo de 15 segundos e de 5 segundos, também juntos à queixa da BDF, centram-se exactamente nas mesmas imagens e alegações, isto é, na aplicação do desodorizante e demonstração da inexistência de manchas.
– Crê a ULJM ser por demais evidente que o spot televisivo ora em análise (nas suas diferentes extensões) é direccionado exclusivamente para as manchas normalmente produzidas pelos desodorizantes aquando da sua aplicação (a que vimos chamando de manchas brancas) e não às manchas que, a longo prazo e com a utilização e lavagem, podem surgir na roupa.
– Não compreende a ULJM como se pode extrair do dito anúncio que a mensagem percepcionada pelo «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido» é a de que a publicidade diga respeito a outras manchas que não aquelas que surgem no momento após a aplicação do desodorizante anunciado.
– Pretende a BDF defender a tese de que a embalagem de Dove Invisible Dry induz o consumidor médio ao entendimento de que o desodorizante em causa impede o aparecimento de manchas amarelas nas roupas que, como se disse, podem surgir a longo prazo nas roupas claras.
– Da imagem colorida com a indicação “tested on 100 colours” não pode retirar-se qualquer conclusão no sentido de se aplicar a umas ou outras manchas.
– Simplesmente se pode concluir que o produto foi testado em 100 cores.
– Sendo certo que nenhuma das cores que preenchem o número 100 é uma cor clara, ou seja, uma cor onde fosse possível verificar-se o aparecimento das manchas amarelas.
– Por debaixo da mencionada imagem colorida com o número 100, surge a imagem de um vestido preto.
– Com a colocação desta imagem na embalagem, pretendeu-se, precisamente, evidenciar o efeito do produto nas roupas escuras.
– Ora, as manchas amarelas que surgem nas roupas ao longo do tempo, decorrentes da sua utilização e lavagem frequentes, apenas são visíveis, como repetidamente afirma a BDF na sua queixa e agora corrobora a ULJM, nas roupas claras.
– Donde, nenhuma dúvida existe de que as manchas em que o produto se anuncia na embalagem como sendo eficaz são precisamente aquelas que sobressaem em vestidos negros, isto é, as manchas brancas.
– A terceira referência a manchas que se pode encontrar nas embalagens é, como se disse, a frase, a negrito, no verso da embalagem onde se pode ler “anti-white marks/anti-manchas brancas”.
– Apesar da BDF qualificar esta referência da embalagem como irrelevante para o consumidor, a verdade é que a mesma se encontra bem visível na parte posterior da embalagem (é a primeira), em negrito, e em tamanho superior ao restante texto.
– Mas, acima de tudo, é coerente com as restantes referências visuais à questão das manchas.
– Tudo na embalagem aponta para a eficácia contra o aparecimento de manchas brancas após aplicação do produto.
– Finalmente, no que respeita à embalagem e não obstante as referências da BDF ao litígio ocorrido em Itália, deve ficar claro que nenhuma decisão em Itália obrigou a qualquer alteração das embalagens, cuja comunicação é similar àquela que consta das embalagens portuguesas.
– Para além do filme televisivo e da comunicação da embalagem, centra a BDF a sua queixa nos materiais de comunicação colocados nos pontos de venda e algumas acções de marketing, onde a ULJM utiliza, para além das imagens e alegações constantes do filme e das embalagens, a alegação publicitária “Invisível em todas as cores. Não apenas no Preto e Branco”.
– Segundo a BDF esta alegação publicitária constitui uma expressa referência à acção anti-manchas, não só contra as manchas brancas, como também contra as manchas amarelas.
– A ULJM discorda deste entendimento (…) Desde logo, porque nenhuma referência é feita a qualquer acção contra as manchas amarelas.
– Em segundo lugar porque, como se verá, o teste feito ao Dove Invisible Dry em mais de 100 cores.
– E de entre as 100 cores encontram-se o preto e o branco. Não só, mas também. (…) O que significa que a alegação é verdadeira.
– Resta demonstrar se, apesar de verdadeira, induz ou não os consumidores em erro quanto aos efeitos do produto.
– A este respeito convém ter presente que, até à data do lançamento do Dove Invisible Dry, todos os desodorizantes com ingredientes destinados a actuar sobre o surgimento de manchas amarelas, que se anunciaram no mercado especificamente como tal.
– Por outras palavras, sempre que um determinado produto se pretende afirmar como tendo uma acção anti-manchas amarelas, anuncia-o de forma expressa em toda a comunicação que apresenta aos consumidores.
– O que significa que, ao contrário do que a BDF pretende fazer crer, os consumidores que procuram desodorizantes que evitem o aparecimento de manchas amarelas a longo prazo nas suas roupas, procuram especificamente produtos que se anunciem como sendo eficazes nessas manchas.
– E a verdade é que Dove Invisible Dry não se anuncia como tendo eficácia contra manchas amarelas.
– Quanto ao inquérito junto pela BDF à sua queixa, trata-se de um estudo feito com consumidores do mercado italiano, nas circunstâncias desse mesmo mercado, que certamente tem em conta as circunstâncias daquele mercado, designadamente a publicidade que as marcas de diferentes desodorizantes difundem no mesmo.
– Trata-se, pois, de um estudo sem qualquer credibilidade para a avaliação do comportamento do consumidor português que, sabemos, é diariamente confrontado com comunicação de desodorizantes que se anunciam expressamente como se destinando a evitar o aparecimento de marcas amarelas.
– Como forma de sustentar as alegações publicitárias agora em causa, a ULJM solicitou a uma entidade externa independente a realização de um estudo de mercado, a Blue Yonder, documento que se junta como DOC 3.
– O mencionado estudo consistiu (como aliás é descrito no spot televisivo) em recrutar um conjunto de 120 mulheres, com vista a utilizar o seu novo produto Dove Invisible Dry e, seguidamente, envergar T-Shirts de 120 cores diferentes.
– As referidas mulheres aplicaram o dito produto sob monitorização da empresa de estudos de mercado e, entre 5 e 7 horas depois, foram questionadas sobre os efeitos do dito produto nas T-Shirts que envergaram.
– Os resultados foram inequívocos (…):
a.  Relativamente a 119 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “fica invisível”;
b.  Relativamente a 117 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “é invisível”;
c.  Relativamente a 114 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “é invisível nas minhas roupas”;
d.  Relativamente a 115 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “posso dizer adeus às manchas brancas”;
e.  Relativamente a 110 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “não preciso de me preocupar com manchas brancas nas roupas”;
f.  Relativamente a 109 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “o produto não deixou quaisquer manchas”;
g.  Relativamente a 113 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “estaria confiante em utilizar este produto com tecidos diferentes e tops de cores”;
h.  Relativamente a 109 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação de que o produto “proporciona protecção não detectável”;
i.  Relativamente a 109 cores as entrevistadas concordaram com a afirmação “o produto não é detectável”.
– Não resta, pois, qualquer dúvida de que o produto Dove Invisible Dry foi efectivamente testado em 100 cores, sendo verdadeira a afirmação constante dos diferentes suportes ora em causa.
– Por outro lado, é igualmente verdadeira a afirmação segundo a qual o produto, após aplicado, não provocou manchas em 100 cores.
– É esse o resultado do teste efectuado.
– Através dos mencionados testes, a ULJM obteve a demonstração de que o produto Dove Invisible Dry é, de facto, invisível em 100 cores.
– As consumidoras recrutadas para realização dos testes confirmaram, efectivamente, que após a aplicação do produto Dove Invisible Dry, não detectavam (não visualizavam) qualquer mancha em mais de 100 cores.
– Em suma, que o produto era invisível (…) Fica, pois, demonstrada a eficácia do produto quanto à (in)visibilidade das manchas por ele provocadas nas roupas, após a sua aplicação (a que vimos chamando de manchas brancas).
– Que se conheça, nenhum outro desodorizante presente no mercado português foi, alguma vez, testado em 100 cores.
– Razão pela qual se afigura como legítima a alegação publicitária segundo a qual se trata do primeiro desodorizante invisível em 100 cores.
– Como acima ficou explanado, o produto Dove Invisible Dry não é publicitado pela ULJM como tendo eficácia no não aparecimento de manchas amarelas, isto é, de manchas ocorridas a longo prazo, após repetidas utilizações e lavagens do tecido, fruto da interacção do produto com a transpiração e com o detergente de lavagem de roupa.
– A ULJM não publicita o produto como tendo essa eficácia, nem o consumidor percepciona os elementos de comunicação utilizados tal.
– Pelo contrário, dos elementos de comunicação utilizados pela ULJM, o consumidor percepciona que o desodorizante em causa não provoca manchas nos tecidos após a sua aplicação.
– Essa é a mensagem transmitida e essa será a mensagem percepcionada.
– No que se refere ao spot televisivo, como ficou dito, toda a acção, imagens e texto se direccionam no sentido de ser feita referência às manchas que surgem na roupa após a aplicação do desodorizante.
– Nenhuma imagem, texto escrito ou mensagem oral sugere ou pode transmitir a ideia de que as referências à invisibilidade do produto diz respeito a manchas que não aquelas que normalmente surgem após a sua aplicação.
– O produto Dove Invisible Dry é eficaz também no não aparecimento das manchas amarelas.
– É aliás mais eficaz do que o produto Nivea for Black & White, que expressamente é anunciado pela BDF como sendo anti-manchas amarelas.
– É igualmente mais eficaz do que o produto Narta 5 Protection, que igualmente se anuncia como sendo anti-manchas amarelas:
– O teste científico independente realizado pela Universidade Federal de São Paulo, que se junta como DOC 4, demonstra que Dove Invisible Dry (identificado como Dove Prism), evita o aparecimento de manchas amarelas na roupa de forma mais eficaz do que os produtos Nivea for Black & White e Narta 5 Protection.
– Face ao que agora fica exposto, verifica-se que a mensagem transmitida para os consumidores não se encontra inquinada de qualquer falsidade ou engano, desde logo pelo facto do consumidor percepcionar a mensagem de que o produto em causa se destina a evitar o aparecimento de manchas na roupa imediatamente após a sua aplicação – o que ficou comprovado ser verdade.
– (…) Inexiste qualquer violação do disposto nos artigos 9.º do CCICAP ou 10.º e 11.º do Código da Publicidade, pelo facto de a ULJM ter apresentado a comprovação das suas alegações e de inexistir qualquer mensagem susceptível de induzir em erro o consumidor.
2. Enquadramento e fundamentação ético-legal
Cinjamo-nos, em primeiro lugar, à questão dos spots televisivos e de Internet (pela coincidência dos seus conteúdos).
No spot publicitário objecto de queixa, nas suas três versões, é possível descortinar no respectivo guião os seguintes dizeres:
“Convidámos mulheres a experimentar o novo Dove Invisible Dry em 100 cores”.
Uma narradora pergunta: “Adivinhe que cor escolheu a Bia?”
A Bia refere que o vermelho é a sua cor favorita e diz “…ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é realmente fantástico”.
Segue-se a afirmação “Dove apresenta Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 cores”.
A par, o número “100” aparece na tela cheia, obtido pela sobreposição de uma camada branca, com o número “100” cortada fora dele, num fundo constituído por uma pluralidade de tecidos coloridos. Tecidos com cores claras, como branco / cinza claro, verde-claro, azul claro e rosa claro podem ser vistos, em especial no interior do número “100”.
O referido anúncio termina com a locutora a ler a frase que ocupa todo o ecrã “Novo Dove Invisible Dry. Invisível em 100 cores”.
O mesmo se passa na Internet onde, através do YouTube, se constata, na página da Dove Portugal, que o referido video está a ser difundido na mesma, a par de uma outra divulgação na internet onde se lê:
“Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco”, (vídeo constante de documento n.º 10 e print screen retirado da internet junto como documento n.º 11.), bem assim como os print screens da campanha realizada quer no website da Revista Caras, quer no website sapo mulher, conforme documentos n.ºs 12 e 13, respectivamente, juntos pela queixosa.
Importa neste âmbito, e na realidade, perceber qual a percepção que o consumidor médio tem relativamente à veracidade dos conteúdos das mensagens comerciais objecto de divulgação por parte da UNILEVER.
E, nomeadamente, como bem afirma a Queixosa, saber se nestes autos foi, ou não feita prova por parte do anunciante relativamente a:
a)  Existência, ou não, de um teste referente ao produto em 100 cores, de acordo com uma das suas alegações;
b)  Demonstração da eficácia anti-mancha nessas 100 cores.
Não acompanha este Júri, todavia, o entendimento da BDF quanto à questão da necessidade de prova relativamente ao facto de o produto “Dove Invisible Dry” impedir a formação de manchas brancas, e de manchas ou marcas amarelas.
E isto porque, aqui se dando razão à UJM, em momento algum dos spots se pode, na realidade, extrair dos referidos anúncios que a mensagem percepcionada pelo «consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido», é a de que a publicidade se refira a outras manchas que não aquelas que surgem no momento após a aplicação do desodorizante anunciado.
Ou seja, e em abono da verdade, a percepção que o consumidor médio tem é que nos spots não há qualquer referência a manchas amarelas, a lavagens ou mesmo a manchas que possam surgir a longo prazo mas, tão só,a alusão ao facto do desodorizante não deixar marcas em 100 cores, a par da demonstração da aplicação do referido produto.
Assim, necessário se torna apurar da existência, ou não, nos autos, das provas bastantes para comprovar da veracidade da existência de um teste referente ao produto em 100 cores e da eficácia anti-mancha nessas 100 cores.
E é aqui que entram os documentos carreados pelas Partes. Apresenta a Queixosa um estudo de mercado feito por uma empresa italiana independente e especializada em produtos de consumo, a GNResearch S.p.A. onde se concluiu, citamos “ (…) que mais de 70% dos consumidores, após visionarem o spot televisivo, estavam convictos que o produto da Unilever não deixa as manchas brancas e manchas amarelas em 100 cores”, “subindo a percentagem para os 90% quando confrontados com uma questão quanto à eficácia nas cores preta e branca, tudo conforme resultados do estudo (vide última pág. “conclusões”)”.
Ao mesmo tempo, a BDF fez chegar aos autos a decisão tomada no âmbito do Istituto dell’Auto Disciplina Pubblicitária, em Itália, onde se terá concluído, cita-se, “que a campanha publicitária da Unilever enquadra o conceito de publicidade enganosa previsto no artigo 2.º do Codice di Autodisciplina della Comunicazione Commerciale que dispõe:
“Comunicação Empresarial enganosa”
A Comunicação Comercial deve evitar qualquer declaração ou representação susceptível de induzir em erro os consumidores, mesmo por omissão, ambiguidade ou afirmações exageradas, especialmente no que concerne às características e os efeitos do produto, preço, gratuidade, condições de venda, distribuição, identidade das pessoas representadas (…).
O teste supra referido é desvalorizado pela UJM porque, afirma, se trata de um estudo feito com consumidores do mercado italiano, nas circunstâncias desse mesmo mercado, que certamente tem em conta as circunstâncias daquele mercado, designadamente a publicidade que as marcas de diferentes desodorizantes difundem no mesmo e que a mesma considera sem credibilidade para a avaliação do comportamento do consumidor português.
Paralelamente, e como forma de comprovar as alegações publicitárias em causa, a UJM juntou um estudo de mercado de autoria de uma entidade externa independente, a Blue Yonder, no qual se pode ler  que as mulheres dele constantes aplicaram o dito produto sob monitorização da empresa de estudos de mercado e, entre 5 e 7 horas depois, foram questionadas sobre os efeitos do dito produto nas T-Shirts que envergaram, sendo que os resultados apurados terão sido foram inequívocos, já que uma esmagadora maioria das mesmas terá concordado  com a matéria da invisibilidade da aplicação do referido produto nas roupas e que o mesmo não terá deixado quaisquer manchas.
Ou seja, que o produto Dove Invisible Dry foi testado em 100 cores e, após aplicado, não provocou manchas em 100 cores, sendo pois invisível.
Confrontando-se o JE com a existência de dois estudos, com conclusões opostas, importa saber qual deles entende o Júri valorizar, sem que tal ponha em causa a idoneidade das entidades neles envolvida.
Opta o JE, pelo facto de o estudo se referir em concreto ao mercado português e, com detalhe à comunicação comercial objecto destes autos, pela valorização das conclusões explanadas no estudo da Denunciada, motivo que leva o Júri a considerar como legítima a alegação publicitária segundo a qual se trata do primeiro desodorizante invisível em 100 cores.
Vejamos, agora, o que se refere às embalagens estão em causa, as seguintes afirmações:
•  “Ter um desodorizante que não deixa marcas nas minhas roupas favoritas é fantástico”.
•  “Apresentamos o novo Dove Invisible Dry, o primeiro desodorizante que não deixa marcas em 100 Cores.”
•  “Novo Dove Invisible Dry, Invisível em 100 Cores, incluindo nas que mais gosta.”
•  “Invisível em 100 Cores. Não apenas no Preto e Branco.
•  “Tested on 100 colours”
Alega a Queixosa que existe violação do princípio da veracidade – artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP e artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade já que, afirma “Sempre que a acção anti-mancha de um desodorizante é limitada a apenas um dos dois tipos de mancha indicado acima, a publicidade a esse produto, pretendendo evidenciar o poder anti-mancha, deve indicar o tipo de mancha que o produto evita, de forma muito precisa e clara.”
E mais afirma a BDF que a Unilever, na sua campanha publicitária ao produto Dove Invisible Dry fez exactamente o oposto sendo que, no seu entendimento, as afirmações como “Invisível em 100 cores” ou “Tested in 100 colours” apenas podem ser entendidos pelo consumidor médio, como sendo referentes a uma eficácia anti-manchas ilimitada, ou pelo menos eficaz em 100 cores.
A alegação feita pela UJM neste caso, ao invés do que sucedia nos anúncios televisivos e de Internet é já mais específica uma vez que alude, em termos comparativos, não só ao preto e branco mas, sim, a mais cores, ainda que de forma indistinta.
Logo, e concordando o JE com a queixosa, a Unilever pretendeu claramente afirmar que o produto é eficaz em todas as cores, nestas se incluindo, entre outras, a cor branca.
Só que, quanto a esta, resulta do estudo acima identificado a comprovação da invisibilidade do produto quanto às manchas brancas, razão pelo qual não se dá razão à Queixosa.
Importa, por último, aludir no que tange às manchas amarelas objecto de referência pela BDF.
Ora, a verdade é que, em local algum da embalagem, se pode descortinar a existência de referência específica a esta cor.
Isto porque, como se constata, o produto Dove Invisible Dry não é, na verdade, publicitado pela UJM como tendo eficácia no não aparecimento de manchas amarelas, ou seja, aquelas que ocorrem, como é consabido, a longo prazo, após repetidas utilizações e lavagens do tecido, conjugada esta questão com outros factores como sejam a transpiração e o detergente de lavagem de roupa.
E, não sendo publicitado, o consumidor médio não pode, evidentemente, ter a percepção dessa eficácia específica no que às manchas amarelas diz respeito.
E isto para além de quaisquer considerações específicas ao estudo científico que a UJM apresenta e que demonstra, também, a reacção dos tecidos face às manchas amarelas, ao qual o JE, pelos motivos atrás explanados, não necessita de aludir de forma mais desenvolvida.
3. Decisão
Termos em que a 1ª Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da UJM não viola quaisquer dos dispositivos objecto de queixa.».
O Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP
Auto Regulação13J / 2014 :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins
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12J / 2014 :: Olivedesportos vs. Pingo Doce, Distribuição Alimentar

12J/2014

Olivedesportos
vs.
Pingo Doce, Distribuição Alimentar

EXTRACTO DE ACTA

 

Reunida no vigésimo quinto dia do mês de Junho do ano de dois mil e catorze, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 12J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 12J/2014

1. Objecto dos autos

1.1. A OLIVEDESPORTOS – PUBLICIDADE, TELEVISÃO E MÉDIA, S.A. (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por OLIVEDESPORTOS ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por Júri ou JE) apresentar queixa contra JERÓNIMO MARTINS, SGPS, S.A. e PINGO DOCE – DISTRIBUIÇÃO alimentar, S.A., (adiante abreviada e indiscriminadamente designadas, e respectivamente, por JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE ou Requeridas), relativamente a comunicação comercial sob o lema “Venha a jogo com Portugal e Ganhe Sempre!” – e veiculada através dos suportes rádio, imprensa escrita, Internet e folheto – tal, por alegada violação dos artigos 4º, 5º e 27º do Capítulo I da Parte II, artigos A-1, alínea e) do artigo B-II e B2 do Capítulo II da Parte II, todos do Código de Conduta do ICAP, artigos 4.º e 7.º n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março (“Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais”) e artigo 317º do Código da Propriedade Industrial.

1.2. Questão Prévia

Notificadas a PINGO DOCE e a JERÓNIMO MARTINS, SGPS; S.A. para contestar, foi o ICAP informado por carta da última, de 6 de Junho p.p., de que teria havido um equívoco na interpelação “… porque tratando-se de uma empresa cotada, que gere participações em várias sociedades, a Jerónimo Martins, SGPS, SA., não possui quaisquer estabelecimentos comerciais e não efectua, nem lança campanhas publicitárias.”, pelo que passaria a devolver toda a documentação remetida. (Cfr. carta da JERÓNIMO MARTINS SGPS, S.A. junta aos autos).

Dado que, por e-mail de 5 de Junho p.p., a OLIVEDESPORTOS comunicou ao ICAP a sua vontade de ser a queixa apresentada contra as duas entidades – Jerónimo Martins SGPS, SA. e Pingo Doce – a deliberação do Júri entendê-las-á como Requeridas. (Cfr. e. mail junto aos autos).

1.3. Notificada para o efeito, a PINGO DOCE não apresentou contestação.

1.4. Dão-se por reproduzidos 7 (sete) documentos juntos pela OLIVEDESPORTOS, a saber:

– (i) Doc. 1: cópia em cd-rom de primeiro spot publicitário radiofónico;
– (ii) Doc. 2: cópia em cd-rom de segundo spot publicitário radiofónico;
– (iii) Doc. 3: cópia de comunicação comercial feita através de imprensa escrita;
– (iv) Doc. 4: cópia de comunicação comercial feita através de Internet;
– (v) Doc. 5. cópia de folheto promocional do PINGO DOCE;
– (vi) Doc. 6: cópia de Regulamento de Concurso “REGRAS DO JOGO”;
– (vii) Doc. 7: cópia de TERCEIRO ADITAMENTO AO CONTRATO de 21 DE MAIO DE 2002 FPF/OLIVEDESPORTOS”.

1.5. Dos factos

A Requerente alega na sua petição – e as Requeridas não contraditam – que foi lançada “…recentemente uma campanha publicitária e promocional à cadeia de supermercados e hipermercados Pingo Doce designada “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”, destinada a promover a adesão ao cartão Poupa Mais e as vendas…” (sic art.º 1) naqueles estabelecimentos e “…amplamente divulgada em diversos anúncios veiculados (…) através da rádio (…) imprensa escrita …), internet e folhetos…” (sic. art.º 2), sendo que se encontra em causa “…uma promoção que oferece descontos baseados no desempenho e classificação da Selecção Nacional A de futebol no Campeonato Mundial de Futebol a realizar no Brasil, a COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014…” (sic. art.º 3) de ora em diante designado por “Mundial 2014”.

1.5.1. Das alegações publicitárias ou claims

Encontram-se colocadas em crise, as seguintes alegações publicitárias ou claims (cfr. documentos 1 a 5 da queixa):

– (i) “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”;
– (ii) “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se
Se Portugal passar aos oitavos de final”;
– (iii) “Se Portugal não passar poupe 25%”;
– (iv) “ÍconeTaça da FIFA”;
– (v) “Cores da Selecção Nacional de Futebol”;
– (vi) “Chuteiras”.

1.6. Das alegações da OLIVEDESPORTOS

Sustenta a OLIVEDESPORTOS na sua queixa, e em síntese, que a campanha publicitária da responsabilidade das JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE – com inclusão da sua promoção de vendas – configura uma prática de publicidade enganosa, desonesta e de concorrência desleal, bem como um embuste de um bem sob patrocínio e, ainda, uma promoção de vendas ilícita, por virtude de:

– (i) “No exercício da sua actividade, a Olivedesportos adquiriu à Federação Portuguesa de Futebol (doravante simplesmente FPF), por contrato (…) com carácter de exclusividade, os direitos televisivos, de publicidade, de patrocínio, de “sponsorização” e de imagem das Selecções Nacionais de Futebol e da própria FPF” (sic. art.º 20), acrescentando que, “…é, como tal, a única e exclusiva titular dos direitos comerciais e de propriedade intelectual relativos às Selecções Nacionais de Futebol, no que se inclui, sem limitar, os direitos de imagem e patrocínio das Selecções Nacionais de Futebol e da própria Federação Portuguesa de Futebol, incluindo todos os direitos de utilização e exploração comercial de símbolos, emblemas, logótipos oficiais ou imagens colectivas das Selecções Nacionais de Futebol” (sic. art.º 21);

– (ii) “…a utilização das referências a “Venha a jogo com Portugal”, “Se Portugal passar aos oitavos de final”, no contexto específico da aproximação do evento desportivo denominado “COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014” (de ora em diante o “Mundial de Futebol”), acompanhada das cores da Selecção Nacional de Futebol e de ícones tais como a Taça da FIFA e chuteiras, cria, na campanha publicitária em causa, uma associação clara, porém ilícita, da JERÓNIMO MARTINS à Selecção Nacional de Futebol.” (sic. art.º 8), acrescentando que “…a conjugação de todos estes elementos cria indiscutivelmente no consumidor médio uma evidente associação entre a marca “Pingo Doce” e a imagem das Selecções Nacionais de futebol em termos que visam promover comercialmente as referidas marcas e os estabelecimentos comerciais do Grupo Jerónimo Martins” (sic. art.º 9);

– (iii) “A JERÓNIMO MARTINS propõe a todos os clientes dos supermercados Pingo Doce que utilizem, entre 27 de Maio e 23 de Junho, o cartão Poupa Mais nas lojas Pingo Doce, a acumulação em cartão do valor gasto na compra de todos os produtos das marcas identificadas no folheto promocional, valor este que acumula para um total e que será o valor de compra dos produtos das marcas indicadas no folheto deduzido de todos os descontos aplicados” (sic. art.º 13), sendo que “A Promoção em causa e a campanha que a publicita é um exemplo parasitário de uma estratégia de marketing e publicidade de “emboscada” ou parasitária, nos termos da qual a JERÓNIMO MARTINS procura buscar uma vantagem comercial ilícita, à custa da imagem das Selecções Nacionais sem ter adquiridos os respectivos direitos de patrocínio e em violação evidente e clara dos direitos dos legítimos patrocinadores (sendo um dos quais, notoriamente, um dos seus mais directos concorrentes)”. (sic. art.º 14).

2. Enquadramento ético-legal

2.1. Da alegada prática de publicidade enganosa

Alega a OLIVEDESPORTOS em sede de queixa que, “…a campanha em questão capitaliza a esperança generalizada de uma boa prestação da Selecção Nacional no Mundial de 2014, aliciando os consumidores com a possibilidade de acumulação de um desconto em compras cujo valor pode ir até 50% do valor despendido, caso a Selecção Nacional A passe aos oitavos de final do Mundial de 2014, ou que, em qualquer situação e independentemente da prestação da mesma, será sempre de 25% desse mesmo valor.” (sic. art.º 47), acrescentando que, “…ao oferecer aos consumidores a possibilidade de acumular uma determinada percentagem do valor gasto em compras variável em função do desempenho da Selecção Nacional no Mundial 2014, a JERÓNIMO MARTINS “conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor médio a tomar uma decisão de compra que este não teria tomado de outro modo”. (sic. art.º 48).

Constata o Júri que a OLIVEDESPORTOS, ao referir-se ao disposto no artigo 7.º, alínea c) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março (e em relação ao qual o artigo 9.º do Código de Conduta do ICAP se encontra em consonância), omite um elemento essencial para que se possa estabelecer qualquer prática de publicidade enganosa: o da indução, ou susceptibilidade de indução do consumidor médio1 em erro.

Com efeito, será esta indução ou susceptibilidade de indução erro que poderá conduzir o mesmo consumidor a tomar uma decisão de compra que este não teria tomado de outro modo e não, como parece pretender a Requerente, a circunstância de se “oferecer aos consumidores a possibilidade de acumular uma determinada percentagem do valor gasto em compras variável em função do desempenho da Selecção Nacional no Mundial 2014”. (Cfr. art.º 48 da petição). Isto, na medida em que a OLIVEDESPORTOS não sustenta que tal oferta consubstancie uma inverdade.

Por outro lado, entende o Júri que não existe, igualmente, indução ou susceptibilidade de indução em erro do consumidor médio quanto ao “conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pelo profissional, a motivação da prática comercial e a natureza do processo de venda, bem como a utilização de qualquer afirmação ou símbolo indicativos de que o profissional, o bem ou o serviço beneficiam, directa ou indirectamente, de patrocínio ou de apoio” (cfr. artigo 7.º, alínea c) do Decreto-lei n.º 57/2008) enquanto factor determinante de uma transação.

De facto, a utilização não autorizada através de suporte folheto de um símbolo semelhante ao do troféu oficial do Campeonato do Mundo, sem que lhe conferido um destaque particular (cf. Doc. 5 da queixa) afigura-se, no entendimento do Júri, insuficiente para induzir em erro o consumidor médio quanto à qualidade do anunciante, enquanto determinante de uma decisão de transação.

Acresce que, muito embora “…a utilização das referências a “Venha a jogo com Portugal”, “Se Portugal passar aos oitavos de final”, no contexto específico da (…) “COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014” (de ora em diante o “Mundial de Futebol”), acompanhada das cores da Selecção Nacional de Futebol e de ícones tais como a Taça da FIFA e chuteiras implique uma associação clara, das Requeridas à Selecção Nacional de Futebol (cfr. art.º 8.º da queixa) não crê o JE que a mesma seja de molde a criar na mente do consumidor médio, a convicção de que as JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE possuem o estatuto de patrocinadoras oficiais do evento em apreço.

Dito de outra forma, aquele consumidor não é susceptível de ser induzido em erro quanto à qualidade do anunciante, até porque perceberá que a expressão “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional ” não consta de qualquer suporte da campanha e promoção de vendas associada.

N realidade, defende o JE que, não será por via da violação do princípio da veracidade que a comunicação comercial em lide, entendida no seu todo, poderá consubstanciar uma prática de publicidade ilícita.

2.1.1. Do invocado embuste do objecto de patrocínio

Qualquer embuste de um bem sob patrocínio, in casu, o campeonato mundial de futebol, quando praticado através de publicidade, constituirá sempre um caso de violação do princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, por indução do destinatário em erro, quanto à qualidade do anunciante.

De facto, dispõe-se no artigo B2, Capítulo II da Parte II do Código de Conduta do ICAP sob a epígrafe “Embuste do objecto de patrocínio” que, “Nenhuma parte deve procurar dar a entender que patrocina um qualquer acontecimento ou a transmissão ou comunicação do mesmo nos Meios, seja ele patrocinado ou não, se não for, de facto, patrocinador de um bem ou dessa transmissão ou comunicação.” (Negrito e sublinhado do JE).

A referida intencionalidade “de dar a entender que patrocina” não resulta, manifestamente, da comunicação comercial em apreço. Com efeito, é o estabelecimento de uma eventual prática de publicidade enganosa que determinará a conclusão sobre a existência de um embuste de um bem sob patrocínio e não é a verificação deste último, a premissa para se considerar que se violou o princípio da veracidade em matéria de promoção de vendas ou se praticou publicidade desleal e ofensiva da livre e leal concorrência.

Ora, concluiu o Júri no ponto anterior, pela inexistência de uma prática de publicidade e de promoção de vendas enganosa quanto à qualidade do anunciante pelo que, forçosamente, terá que sustentar que a comunicação comercial da responsabilidade das Requeridas, entendida no seu todo – de acordo com o disposto no artigo 27.º, n.º 3, do Código de Conduta do ICAP – não consubstancia um embuste de um bem sob patrocínio.

Sem prejuízo das conclusões a que chegou o JE, as JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE estão, contudo, a associar-se a um evento que não patrocinam, aproveitando a sua realização para promover a venda de bens que comercializam. De onde ocorre questionar se, mesmo quando se encontra estabelecido que não há susceptibilidade de confusão ou de engano dever-se-á, ainda assim, considerar uma outra fronteira: a da associação parasitária a uma forma de publicidade reservada a terceiros.

2.2. Da alegada prática de publicidade parasitária ou da exploração da reputação

Entende o Júri que, em ordem a responder à questão colocada, importa apurar o que, no âmbito concreto dos presentes autos, deve ser considerado como “forma de publicidade reservada a terceiros ”, análise que terá que incidir sobre os claims colocados em crise nos quais assenta a promoção de vendas, e que são:

– (i) “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”;
– (ii) “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se Portugal passar aos oitavos de final”;
– (iii) “Se Portugal não passar poupe 25%”;

tal, por referência ao quadro normativo do Código de Conduta do ICAP e, concretamente, o constante dos artigos:

– 19.º, n.º 2, do Capítulo |, Parte II, sob a epígrafe “Exploração da reputação”, segundo o qual “A comunicação comercial não deve, em caso algum, retirar indevidamente proveito da reputação ligada ao nome, marcas ou a qualquer outro elemento de propriedade intelectual relativo a uma outra empresa, pessoa ou instituição (…).”;

– A3, do Capítulo II, Parte II, sob a epígrafe “Apresentação”, em que se dispõe que, “(…)Toda a comunicação comercial relativa a promoção de vendas, aqui incluídas as actividades nos pontos de venda, deve estar em estrita conformidade com a Parte I e II – I Capítulo.”,

– B, alínea e) do capítulo II, Parte II que define “Patrocínio” como “…todo e qualquer acordo comercial pelo qual o patrocinador, para benefício mútuo, seu e do patrocinado, oferece contratualmente apoio financeiro ou outro, visando estabelecer uma associação entre a imagem, marcas, bens, ou serviços do patrocinador e o objecto patrocinado (…) /ou para garantir determinados benefícios, directos ou indirectos, que tenham sido objecto de acordo.

Analisada a campanha promocional nos seus vários suportes, constitui opinião do Júri que os claims “Venha a Jogo com Portugal e Ganhe Sempre!”; “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se Portugal passar aos oitavos de final”; e “Se Portugal não passar poupe 25%” (cfr. documentos 1 a 6 da queixa) se encontram “demasiadamente perto” do que se pode considerar uma aposta desportiva, ao jeito de “totobola” ou “totogolo”. Com efeito, ao invés do que constituiu o objecto da lide no caso de promoção de vendas objeto do processo 10J/2012 do ICAP (em que o Júri considerou que a respectiva campanha publicitária não era susceptível de induzir o chamado consumidor médio a tomar uma decisão de transação com base em alusões ao evento desportivo), no caso ora em apreciação, o mesmo consumidor tomará tal decisão respondendo a um repto sugestivo de algo semelhante a uma aposta, a efectuar através da utilização do cartão “Poupa Mais” nas lojas Pingo Doce (cfr. ponto 1. do Regulamento constante de Doc. 6 junto à petição).

Tal em virtude de, como muito bem ilustra o lema da promoção de vendas, ter o referido consumidor que decidir “se vai a jogo” de 27 de Maio a 23 de Junho arriscando gastar naquelas lojas 200 euros em compras dos produtos indicados no regulamento, e só nestes, em menos de um mês (cfr. pontos 2 e 6) com base numa expectativa interiorizada, em jeito de aposta, de vir a poupar o valor pecuniário de 50% numa compra posterior a efectuar entre 27 de Junho e 2 de Julho, ou seja em 5 dias (cfr. ponto 7), a qual, presume-se, não poderá, ser inferior a 100 euros, caso Portugal passe aos “oitavos final”, representando na sua mente, à laia de “almofada”, a possibilidade de sempre vir a poupar 25% daquele valor, caso Portugal não venha a passar. (Cfr. ponto 7).

Sem que cumpra ao Júri imiscuir-se na legitimidade duvidosa de tal promoção de vendas noutras sedes normativas, que não a da autoregulação das comunicações comerciais, sempre se dirá que Portugal passará ou não à fase “oitavos final”, de acordo com o desempenho da Selecção Portuguesa de Futebol e não – com o devido respeito –, com base numa estrita relação qualidade/ preço dos produtos a adquirir nas lojas Pingo Doce, desempenho esse que, a servir de aliciante à compra de produtos comercializados em supermercados (a metade ou a um quarto do preço tabelado), deveria ser objecto de autorização prévia da Federação Portuguesa de Futebol. Isto, já que até a OLIVEDESPORTOS, a tal tem que proceder – apesar do seu estatuto de detentora de direitos limitados de imagem das selecções nacionais e de merchandising para exploração comercial em regime de exclusividade – de molde a cumprir uma obrigação inerente à salvaguarda do bom nome e reputação da Federação Portuguesa de Futebol. (Cfr. Doc. 7, considerando A, cláusulas 1. ª, n.º 2 e 2.ª, n.º 4.).

De onde, por maioria de razão, não sendo as Requeridas patrocinadoras oficiais do evento em causa, entende o Júri que a comunicação comercial da sua responsabilidade, com inclusão da promoção de vendas efectuada nos moldes que ficaram expostos, consubstancia uma exploração da reputação do nome da FPF e da Selecção Nacional, desconforme com o disposto no artigo 19.º, n.º 2 do Código de Conduta do ICAP e, logo, uma promoção de vendas ilícita, nos termos do artigo A3, do Capítulo II, Parte II do mesmo Código.

Apesar de ter concluído pela não verificação de um embuste de objeto patrocinado, à luz do disposto no artigo B2, Capítulo II, Parte II do Código de Conduta do ICAP (por ausência do elemento intencionalidade de se fazerem as Requeridas passar por patrocinadoras oficiais do Mundial de Futebol, bem como da percepção por parte do consumidor médio de tal estatuto), o certo é que, na opinião do Júri, qualquer promoção de vendas cuja eficácia em termos de receitas dependa do desempenho da Selecção Nacional – como é o caso em lide – é susceptível de constituir um benefício indirecto típico de um acordo de patrocínio, à luz do disposto no atrás citado artigo B, alínea e) do capítulo II, Parte II do Código de Conduta do ICAP.

Com efeito, as Requeridas não se fazem passar por patrocinadoras oficiais do Mundial de Futebol mas, pretendem usufruir dos benefícios indirectos de natureza comercial que adviriam dessa qualidade, os quais carecem de autorização expressa da Federação Portuguesa de Futebol e, ou, da OLIVEDESPORTOS. (Cfr. Doc. 7 junto à petição).

Mais, para tal conclusão não tem que militar qualquer fonte contratual que disponha que o aproveitamento do desempenho da Selecção Nacional para efeitos comerciais integra o leque de direitos da Federação Portuguesa de Futebol sobre a imagem colectiva da mesma.

De facto, estamos no âmbito da ética aplicável às comunicações comerciais, de que as promoções de vendas constituem uma das formas possíveis. Em conformidade, bastará atender-se à óbvia possibilidade de o consumidor médio representar na sua mente que os claims “Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se Portugal passar aos oitavos de final”; e “Se Portugal não passar poupe 25%” possuem o mesmo significado que as expressões ““Poupe metade do valor numa compra de 27 de Junho a 2 de Julho se a Selecção chegar aos oitavos de final”; e “Se a Selecção não chegar poupe 25%”.

Dito de outra forma, entende o Júri que, in casu, as expressões “Portugal” e “Selecção” equivalem-se em termos semânticos. Ora, se a primeira é insusceptível de apropriação individual (tal como o são as imagens genéricas de chuteiras ou das cores da bandeira portuguesa), já o mesmo não se poderá alegar em relação à segunda e este, sim, configura um facto público e notório.

2.3. Conclusão

Improcedendo as razões invocadas pela OLIVEDESPORTOS quanto à confundibilidade da anunciante com um patrocinador da Selecção Nacional, bem como à susceptibilidade de indução dos consumidores em erro quanto a esse mesmo aspecto, entende o Júri existirem indícios de desconformidade da comunicação comercial, entendida no seu todo, com o quadro ético-legal em matéria de exploração da reputação de um nome.

Não obstante, o Júri não quer deixar de vincar que o cerne da apreciação da campanha publicitária objeto dos autos é o da ética publicitária, o que não prejudica a possibilidade de as Partes suscitarem e discutirem eventuais danos e, ou, prejuízos contratuais junto das competentes instâncias judiciais.

3. Decisão

Termos em que o Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial e promoção de vendas da responsabilidade das JERÓNIMO MARTINS e PINGO DOCE – veiculadas nos suportes rádio, imprensa escrita, Internet e folheto – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto no artigo 19.º, n.º 2 do Capítulo I e A3 do Capítulo II, todos da Parte II do Código de Conduta do ICAP, pelo que deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta em termos parciais, caso qualquer dos tipos de ilícito apurados pelo JE se mantenham.

Declaração de Voto Vencido

Votaram vencidos os Senhores Doutor Rui Estrela e Dr. João Veiga Gomes, que formularam a seguinte declaração de voto:

“Não votámos a favor da Deliberação supra, em virtude das dúvidas que nos levanta a tese de que a comunicação comercial em questão consubstancia uma exploração da reputação do nome da Federação Portuguesa de Futebol.

Não nos parece que as Requeridas pretendam “ usufruir dos benefícios indirectos” de qualquer patrocínio, o que não está em causa, uma vez que “não se fazem passar por Patrocinadoras oficiais do Mundial do Futebol”.

Não vemos como é que as Requeridas possam parasitar “formas de publicidade reservada” a Instituições reguladoras do Futebol, a nível nacional ou internacional, quando se trata apenas de promover a venda de alimentos ou bebidas, nos supermercados.

Também não vemos como é que as Requeridas podem beneficiar do crédito ou da reputação, do nome, estabelecimento ou marcas da FIFA ou da Federação Portuguesa de Futebol, dado que estas não são suas concorrentes no mercado, nem existe qualquer afinidade entre as actividades próprias daquelas instituições e as actividades comerciais das Requeridas.

Quanto às empresas que concorrem realmente com as Requeridas, exercendo actividades análogas, é de notar que nenhuma delas se queixou, embora certamente também tenham ponderado a possibilidade de associar a promoção dos seus produtos ao Mundial de Futebol / 2014. (cf. A1, nº. 4,”Princípios aplicáveis à promoção de vendas”, no Cap. II, Parte II, do Cód. de Conduta do ICAP).”

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação12J / 2014 :: Olivedesportos vs. Pingo Doce, Distribuição Alimentar
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11J / 2014 :: Federação Portuguesa de Futebol vs. Pingo Doce, Distribuição Alimentar

11J/2014

Federação Portuguesa de Futebol
vs.
Pingo Doce, Distribuição Alimentar

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no décimo oitavo dia do mês de Junho do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 11J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 11J/2014

1. Objecto dos autos

1.1. A FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por FPF, denunciante, queixosa ou requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por Júri ou JE) apresentar queixa contra PINGO DOCE, DISTRIBUIÇÃO ALIMENTAR SA (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por PINGO DOCE, denunciado ou requerido), relativamente a comunicação comercial da campanha lançada por este e intitulada “Venha a jogo com Portugal”, a qual consiste num jogo que: “(…) a. A quem realize compras, entre 27 de maio a 27 de junho de 2014, em lojas Pingo Doce, no montante mínimo de €50,00 por semana; b. É concedido um desconto, entre 27 de junho a 2 de julho de 2014, de 50% ou 25%, consoante a Seleção Nacional de Futebol (Clube Portugal) seja ou não apurada para os oitavos de final do Campeonato do Mundo de 2014;” e que é difundido no sítio da internet do Requerido www.pingodoce.pt, em virtude de, no entender da denunciante, o denunciado estar a praticar marketing de associação (ambush marketing); utilizar sem consentimento marcas registadas pela FPF e FIFA, e praticar acto de concorrência desleal, tudo em violação do disposto nos artigos 224º, 317º e 323º f) do Código da Propriedade Industrial bem como, ainda, o artigo B2 B2 do Código de Conduta do ICAP.

1.2. Notificado para o efeito, o PINGO DOCE apresentou contestação fora do prazo previsto regulamentarmente para o efeito pelo que, por extemporaneidade, a defesa da Requerida não pode ser considerada pelo Júri.

1.3. Dão-se por reproduzidos os 8 (oito) documentos juntos à queixa, a saber: impressões da página de internet (documentos 1 a 4); registos de marcas (documentos 5 a 7); comunicado do ICAP intitulado “Ambush Marketing” em que identifica os patrocinadores da Selecção Nacional de Futebol no Campeonato do Mundo de Futebol a realizar no Brasil, bem como os Parceiros Comerciais e Patrocinadores do mesmo Campeonato do Mundo de Futebol.

1.4. Síntese da posição das Partes

1.4.1. Vem a queixosa a sua petição invocar, em síntese, os seguintes fundamentos:
“ Ao abrir o website www.pingodoce.pt visualiza-se (…) o símbolo das 5 quinas inserido no equipamento da Seleção Nacional, o troféu do campeonato do mundo de futebol e o slogan “Venha a Jogo com Portugal ” (cf. ponto 2 e documento 1);
“Clicando no link “SABER MAIS” visualiza-se de novo o troféu do campeonato do mundo de futebol, as marcas “BP Pingo Doce Poupa Mais” e “Pingo Doce” e ainda a comunicação «Poupe metade do valor numa compra de 27 de junho a 2 de julho se Portugal passar aos oitavos de final» e «Se Portugal não passar poupe 25%» “ (cf. ponto 3 e documento 2);

O sítio refere as regras de “Como ir a Jogo” – «Basta comprar €50 por semana com o seu cartão Poupa Mais entre 27 de maio a 23 de junho nas marcas selecionadas» – e identifica várias marcas associadas à campanha (cf. ponto 4 e documento 3), sendo que, do ponto 7 do Regulamento resulta que «O Prémio do Jogo a que corresponde esta campanha é um desconto de 50% ou um desconto de 25%. Se Portugal passar aos oitavos de final, o desconto é de 50%. Se Portugal não passar, o desconto é de 25% (…)»; constando, ainda, uma clara identificação das datas dos jogos «Os jogos de Portugal na fase de grupos irão realizar-se dias 16 de junho (Alemanha x Portugal), 22 de junho (EUA X Portugal), 26 de junho (Portugal x Gana)» (cf. ponto 5 e documento 4);

Refere, assim, a denunciante que: “A comunicação comercial referida associa a instituição, imagem e marca “Pingo Doce” e ainda de várias marcas por esta sociedade selecionadas a marcas registadas ou desenvolvidas, propriedade da FPF e FIFA;” na medida em que “(…) as alusões a “Portugal” só são entendíveis se substituídas pela marca Seleção Nacional de Futebol, porquanto só esta, e apenas esta, vai disputar o Campeonato do Mundo de 2014, entre 12 de junho a 13 de julho de 2014, podendo ser qualificada para os oitavos de final, dependendo do resultado que obtiver nos jogos referidos, contra Alemanha, EUA e Gana;” (cf. pontos 6 e 7 da queixa);
Invoca, subsequentemente, a Requerente FPF ser ela própria titular das marcas registadas:

“Seleção Nacional de Futebol” (INPI n.º 516590 e documento 5);
cinco quinas e a identificação “Portugal” (marca nacional mista INPI n.º 368490 documento 6);

E ser a FIFA, a organizadora Campeonato do Mundo de Futebol da qual a queixosa é afiliada, a proprietária da marca relativa ao Troféu Oficial do Campeonato do Mundo de 2014 (marca internacional n.º 482138 e documento 7, cf. pontos 8 a 10 e 12);

Alega a queixosa, que detém o direito exclusivo de organizar Seleções Nacionais, para o que negoceia e celebra contratos de patrocínio e que a denunciada utiliza, sem consentimento, as referidas marcas registadas pela FPF e FIFA, associando-se à atividade da Selecção Nacional e ao sucesso que a equipa poderá ter no Campeonato do Mundo de 2014, com o fim de aproveitamento indevido da notoriedade, prestígio ou reputação daquela equipa e competição; (cf. pontos 11, 13 e 14);

Refere, ainda, que a utilização dos símbolos, referências e marcas relacionadas com a Selecção Nacional se encontra reservada à FPF e aos Patrocinadores daquela e que a “(…) denunciada não é patrocinadora da Seleção Nacional nem do Campeonato do Mundo de 2014 e obtém, sem causa justificativa, proveitos à custa da atividade desenvolvida pela FPF e FIFA (…) “ (cf. ponto 15 e 16 e documento 8);

Na sua opinião, “A denunciada dá a entender que patrocina a Seleção Nacional e a sua participação no campeonato do mundo, violando expressamente aquele Comunicado [Comunicado de 21.05.2014 do ICAP sobre proibição de ambush marketing e documento 8] e o artigo B2 do Código de Conduta do ICAP em matéria de Publicidade e outras Formas de Comunicação Comercial. “ e embora não contribua “para a viabilidade do Campeonato do Mundo de 2014 ou sustentabilidade da Seleção Nacional de Futebol” associa-se “sem consentimento e de modo gratuito, àquele evento e equipa, com o fim de beneficiar do crédito ou da reputação da Seleção Nacional de Futebol e do Campeonato do Mundo de 2014” (cf. pontos 17 a 19);

O comportamento denunciado consubstancia, no entendimento da Requerente, concorrência desleal nos termos da alínea c) do art. 317º do CPI, prejudicando a FPF e os patrocinadores da seleção nacional e em especial o patrocinador oficial da Seleção Nacional de Futebol Modelo Continente Hipermercados SA, diretamente concorrente da denunciada atenta a utilização, de marcas registadas em violação “da alínea f) do artigo 323º do CPI”;

Finda por requerer ao Júri a suspensão da campanha “em todos os suportes ou meio” e a determinação de abstenção de difusão.
1.4.2. Como já mencionado, a resposta apresentada pelo Pingo Doce foi extemporânea pelo que, não poderá nem será considerada pelo JE.

2. Enquadramento ético-publicitário

2.1. Questões prévias

2.1.1. Qualidade de associado do ICAP

Importa, cautelar e primeiramente, esclarecer que a qualidade de associado do ICAP é irrelevante na apreciação técnica que incumbe ao Júri.

No contexto da autorregulação em matéria de comunicações comerciais em que a grande maioria dos meios de comunicação/difusão de campanhas é associada do ICAP, quando o Júri de Ética profere uma deliberação e a comunica às Partes, vincula os meios de difusão das campanhas (cf. artigo 30.º do Código de Conduta do ICAP). E a campanha, sendo o caso, deixará de ser difundida através do associado (v.g. televisão, rádio), o qual, nos termos previstos regulamentarmente, antecipadamente prevê e informa o anunciante da sua vinculação ao ICAP.

2.1.2. Suportes analisados

De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 9.º do Regulamento do JE: “A queixa deverá ser feita por escrito, devendo o queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados…”. (carregado e sublinhado nossos).

A FPF identifica unicamente como suporte, o sítio na internet mantido pela Denunciada. Foi, aliás, desse suporte que foram extraídas as impressões juntas como documentos 1 a 4.
Assim, embora o JE admita, pelas regras de experiência comuns, que existam outros suportes de difusão da campanha (v.g. folhetos, cartazes), a apreciação do JE circunscreve-se ao suporte identificado pelas Partes, a saber: o sítio na internet da Denunciada.

O JE reconhece que, em virtude do suporte utilizado – o sítio na internet do próprio anunciante e Denunciado –, a eficácia da sua decisão pode encontrar-se limitada, porquanto aquele único meio de difusão identificado pela FPF é exclusivamente controlado pelo próprio Denunciado.

Contudo, o Júri tem consistentemente defendido que, independentemente do suporte em causa e da qualidade de associado do ICAP, deve pronunciar-se e apreciar as campanhas que sejam objeto de queixa. Por todos, cita-se o referido na Deliberação sobre o Processo 13J/2010:

“…o efeito pretendido – célere, válido e eficaz – das deliberações do Júri é que, findo o prazo de recurso e efectuadas as devidas notificações, se verifique a cessação – ou não – da publicidade que o Júri apreciou à luz do Código de Conduta, sendo tal deliberação (auto) vinculativa para os membros do ICAP. Assim, não se pode descurar a importante componente didáctica-pedagógica das deliberações do Júri quando aprecia uma mensagem, do ponto de vista da ética-publicitária, habilitando os associados do ICAP, designadamente os meios, a melhor avaliar futuramente as mensagens cuja difusão lhes é solicitada pelos anunciantes.”.

2.1.3. Competência material do Júri

Finalmente, o Júri deve lembrar que a sua competência material se cinge à apreciação de publicidade e de comunicações comerciais, não podendo, ou devendo, pronunciar-se sobre aspectos de natureza diversa, designadamente contratual, que as Partes poderão, querendo, suscitar junto dos tribunais.

2.2. Dos factos e seu enquadramento

A Requerente alega, na sua petição, que o Pingo Doce lançou uma campanha, intitulada “Venha a Jogo com Portugal”, de acordo com a qual são prometidos descontos aos consumidores adquirentes de produtos identificados, descontos esses que variam em função dos resultados que a Selecção Nacional de Futebol obtiver no Campeonato do Mundo a decorrer no Brasil.

Na base da queixa apresentada encontra-se o facto de, segundo a Queixosa, a campanha lançada pelo Denunciado, utilizar marcas registadas pela quer pela Requerente, quer pela FIFA, marcas essas que se encontram protegidas em sede de propriedade industrial e reservadas à FIFA, FPF e Patrocinadores.

2.2.1. Partindo deste pressuposto, de utilização abusiva de marcas, defende a Requerente existir confundibilidade, leia-se, para o consumidor, entre o anunciante e os Patrocinadores do evento desportivo. Há, portanto, que verificar, primeiramente, se a alegada utilização não autorizada existe em cada uma das três marcas postas em causa, a saber:

a) Da marca “Selecção Nacional de Futebol” (INPI n.º 516590 e documento 5)

Argumenta a Requerente que “as alusões a “Portugal” existentes na comunicação comercial em apreço “só são entendíveis se substituídas pela marca Seleção Nacional de Futebol” (sublinhado nosso).

Ou seja, não é a utilização duma marca registada que é posta em causa mas, outrossim, a leitura de equivalência que, segundo a Requerente, será feita pelo destinatário da mensagem quando lê … Portugal.

O Júri constata que, mau grado as alusões a Portugal e aos resultados e jogos de Portugal, no contexto inegável do Campeonato Mundial de Futebol, a campanha em apreço é marcada pela ausência de referências expressas à “Selecção Nacional de Futebol”.

Vislumbra-se, assim, com dificuldade poder concluir que existe a utilização de marca … que não é utilizada.

Ora o JE não pode ignorar o argumento literal e assumir, como parece pretender a Denunciante, que a proteção conferida pelo registo de marca alcança as interpretações e as associações que cada um possa fazer de outros elementos terceiros. Assim, o Júri não subscreve o entendimento de que “as alusões a “Portugal” existentes na comunicação comercial em apreço “só são entendíveis se substituídas pela marca Seleção Nacional de Futebol” e, portanto, por via dum processo cognitivo/associativo se verifica uma violação dos direitos conferidos à marca registada.

Para o Júri, a comunicação comercial é completa e inteligível para o consumidor médio que, podendo naturalmente intuir que a campanha se relaciona com a prestação da Selecção Nacional de Futebol no Mundial, também percebe, detecta e identifica a inexistência de qualquer referencia expressa à Selecção Nacional de Futebol, donde à marca da titularidade da Queixosa.

Inexiste, assim, na campanha em apreço e na opinião do Júri, uma utilização da marca registada Selecção Nacional de Futebol.

b) Das cinco quinas e da marca mista “Clube Portugal” (marca nacional mista INPI n.º 368490 documento 6)

Diz a queixosa que, “Ao abrir o website www.pingodoce.pt visualiza-se (…) o símbolo das 5 quinas inserido no equipamento da Seleção Nacional, o troféu do campeonato do mundo de futebol e o slogan “Venha a Jogo com Portugal ” (cf. ponto 2 e documento 1).

Confrontado o símbolo constante da marca registada com aqueles que são utilizados na campanha em apreciação (cf. documentos 1 a 4), constata o Júri que os símbolos não são iguais nem semelhantes e dificilmente se afiguram suscetíveis de confusão.

A Denunciada usa na sua campanha as cores da bandeira nacional e alguns símbolos “típicos nacionais”, entre os quais uma forma estilizada das cinco quinas que integram a bandeira nacional.

Ora, a imagem das cinco quinas utilizada pela Denunciada:

Fonte: www.pingodoce.pt em 18.06.2014, não correspondendo já ao documento 1 da Denunciante

Em nada é confundível com a que se encontra registada a favor da Queixosa:

Fonte: INPI

O Júri faz, ademais, notar que o uso de símbolos nacionais em comunicações comerciais não configura uma prática proibida, seja pelo Código de Conduta, seja pelo Código da Publicidade, a menos que se extraiam significados pejorativos o que, obviamente, não é o caso.

O JE tem seguido o entendimento de que os elementos que equivalham a símbolos nacionais, consagrados no artigo 11º da Constituição da República Portuguesa – como sejam, concretamente, a bandeira nacional ou as suas cores -, não são passíveis de apropriação privativa e exclusiva dos patrocinadores de eventos internacionais e, consequentemente, são insusceptíveis de constituir sinais distintivos de concorrentes ou geradores de confusão. O mesmo se pode dizer quanto ao uso de palavras como “Portugal” ou “Jogo”, de carácter genérico ou simplesmente descritivo e igualmente insusceptível de apropriação individual (cf. entre outros, a recente Deliberação no processo 10J/2014).

Inexiste, assim, na campanha em apreço e na opinião do Júri, uma utilização da marca registada Das cinco quinas e da marca mista “Clube Portugal”.
c) Do Troféu Oficial do Campeonato do Mundo de 2014 (marca internacional n.º 482138 e documento 7)

Resta, finalmente, verificar a terceira marca, o símbolo do troféu oficial do Campeonato do Mundo pertença da FIFA.

Neste caso particular, confrontadas as imagens em causa (cf. fonte documento 2 e 7), o Júri reconhece existir semelhança entre ambas.

Não se trata de uma cópia ou reprodução fiel – o nível de detalhe e a identificação “FIFA” existe apenas na marca registada -, mas um primeiro olhar permite ao destinatário reforçar a contextualização o Jogo anunciado no âmbito do Campeonato Mundial de Futebol.

Na opinião do Júri, a utilização de tal símbolo, próximo do do troféu da FIFA, é desnecessária e dispensável para identificação do “Jogo” já que o contexto do Campeonato Mundial de Futebol já que é feita a partir de todos os demais elementos da campanha.

E diga-se, ademais, que as imagens da FIFA associadas ao Campeonato atualmente em curso são diferentes:

Fonte: anexo 2 do Comunicado do ICAP de 19 de Maio de 2014 sobre Ambush Marketing

Contudo, há que considerar que, neste caso, existe uso de imagem e símbolo suscetível de ser confundido com a marca registada.

É, por isso, pertinente, em sede de ética publicitária, chamar à colação o artigo 19º do Código de Conduta do ICAP que, sob a epígrafe Exploração da reputação dispõe:

1. A comunicação comercial não deve utilizar injustificadamente os nomes, siglas, logótipos e/ou marcas de uma outra empresa, sociedade ou instituição.

2. A comunicação comercial não deve, em caso algum, retirar indevidamente proveito da reputação ligada ao nome, marcas ou a qualquer outro elemento de propriedade intelectual relativo a uma outra empresa, pessoa ou instituição, nem tirar proveito da notoriedade obtida por outras campanhas de marketing, sem ter obtido a sua prévia autorização.

Conclui o Júri que a utilização, pelo Pingo Doce, na sua campanha “Venha a jogo com Portugal”, dum símbolo semelhante ao registado pela FIFA sem desta ter obtido prévia autorização, constitui uma violação do disposto no artigo 19º do Código de Conduta.

2.2.2. Discutida a questão das marcas registadas e a suscetibilidade de confusão com os símbolos utilizados na campanha pela Denunciada, cabe tecer agora algumas observações em matéria de patrocínio.

Lembra-se que, na opinião da Queixosa, a Denunciada dá a entender ser patrocinadora da Selecção Nacional de Futebol, o que não corresponde à verdade, praticando “ambush marketing” e obtendo “(…) sem causa justificativa, proveitos à custa da atividade desenvolvida pela FPF e FIFA (…)”.

Sucede que, analisada a campanha, o Júri constatou que, ao contrário do que a Queixosa quer fazer crer, em momento algum o Pingo Doce refere ou indicia ser Patrocinador da Selecção Nacional de Futebol.

O uso não consentido dum símbolo semelhante ao da FIFA, sem que lhe seja dado um destaque particular (cf. documentos 1 e 2), afigura-se, no entendimento do Júri, insuficiente para induzir em erro o consumidor médio1 quanto à qualidade do anunciante, enquanto determinante de uma decisão de transação.

É inegável que o Denunciado (se) aproveita da existência dum evento desportivo, que não patrocina, para obter para si benefícios. Mas a questão que se coloca é saber se essa associação que a Denunciada faz ao evento é, ou não, sancionada em sede legal e de auto regulação.

Dispõe o Código de Conduta, no que aqui importa a propósito de Patrocínio:

Artigo B1 Princípios aplicáveis ao patrocínio
1. Todos os patrocínios devem basear-se nas obrigações legais e contratuais acordadas entre patrocinador e parte patrocinada. Patrocinador e parte patrocinada devem estabelecer, com clareza, os termos e condições com todos os parceiros e definir as suas expectativas relativamente a todos os aspectos do acordo de patrocínio.
2. O patrocínio deve ser identificado como tal.
3. Os termos do patrocínio e a sua gestão devem basear-se no princípio da boa-fé entre todas as partes envolvidas no patrocínio.
(…)

Artigo B3 Imitação e confusão
Patrocinadores e partes patrocinadas, bem como as demais partes envolvidas no patrocínio, devem evitar a imitação de representação de outras acções de patrocínios, sempre que tais imitações possam induzir em erro ou gerar confusão, ainda que as acções imitadas digam respeito a produtos, empresas ou acontecimentos não concorrenciais. (sublinhado nosso)

Artigo B4 Embuste dos bens sob patrocínio
Nenhuma parte deve procurar dar a impressão de que patrocina um qualquer acontecimento ou a cobertura mediática de um evento, seja ele patrocinado ou não, se não for de facto o patrocinador oficial de um bem ou dessa cobertura mediática. (sublinhado nosso)

Como se pode concluir, do regime de auto-regulação aplicável, não resulta que a mera associação entre uma marca e um objecto patrocinado, como é a Selecção Nacional de Futebol, nas promoções de vendas de terceiros, não patrocinadores, configure, para todos os fins, uma violação do regime estabelecido para Patrocínio.

O Júri tem ainda ciente que a campanha em apreço envolve duas marcas – Pingo Doce e a BP – que são diretamente concorrentes de dois dos patrocinadores da Seleção Nacional de Futebol – Continente e Galp. Mas ainda que possa ser aceite a existência de direitos exclusivos decorrentes de contrato celebrado entre a FPF e os Patrocinadores da Selecção Nacional, o Júri desconhece a extensão e contornos desses direitos e, designadamente, em que medida caberia à FPF a titularidade do direito de queixa quanto a eventuais prejuízos causados aos concorrentes.

Aqui chegados, lembre-se o entendimento vertido na deliberação 13J/2010, desta mesma secção do Júri no âmbito de um outro Campeonato de Futebol.

“Constata o JE que, embora sejam claras as alusões ao evento desportivo que se irá iniciar e em que Portugal participará, nem a expressão “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional”, nem as imagens colectivas da Selecção Nacional, de jogadores ou mesmo de lugares associados à mesma são utilizadas na campanha em apreciação.

Tampouco parece evidente ao Júri que, da associação que a […] faz ao evento, resulte para o consumidor médio a conclusão, ou mesmo a dúvida, sobre a qualidade de Patrocinador da Selecção do anunciante.

A queixosa está, contudo, a associar-se ao evento que não patrocina, aproveitando a sua realização e da possibilidade de Portugal ganhar, para promover a venda de bens que comercializa.

Recorde-se que, aquando da realização do Euro 2004, foi um diploma específico, o Decreto–Lei nº 86/2004, de 16 de Abril, que proibiu a utilização directa o indirecta, por qualquer meio de uma firma, denominação, marca ou outro sinal distintivo do comércio por quem não tivesse obtido autorização das entidades responsáveis pela realização da fase final do campeonato europeu, que sugerisse ou criasse a falsa impressão de que estava autorizada ou de alguma forma, associada ao acontecimento.

Esta regra, ampla, estabelecida especificamente para efeitos do Euro 2004 não é mais aplicável, pelo que há que ter presente que inexiste, do ponto de vista legal ou de ética-publicitária, um alargamento da protecção dos patrocinadores ou restrição à publicidade de objectos patrocinados diferente dos limites os impostos pelas leis de concorrência e de conduta.

Ou seja, sendo embora claro para o Júri que a […], ao promover a campanha nos termos em que o faz, se associa ao evento desportivo – aliás dependerá dele para efeitos de cumprimento da promessa que anuncia e que, por força do estabelecida na Lei de Defesa do Consumidor integra o contrato que celebrou com os adquirentes -, considera o JE que tal associação é feita sem violação das normas atinentes ao patrocínio, tratando-se duma mensagem cautelar e cirurgicamente colocada nas margens, limites, do legalmente admissível.

As dificuldades de estabelecimento desta linha, entre o lícito e o ilícito, e do seu tratamento na publicidade que surge em momentos galvanizadores nacionais, é exemplarmente ilustrada na Deliberação que a Comissão de Apelo tomou no processo n. º 5/2008 e que parece pertinente citar: “ (…) (5) A publicidade emboscada (Ambush Marketing) levanta problemas difíceis de delimitação, pois suscita o problema mais geral do respeito pelas iniciativas dos concorrentes em face dos acontecimentos mobilizadores da opinião pública com reflexos no consumo. (6) E é sem dúvida que os temas clássicos da confusão e do engano quanto ao patrocínio caem no domínio da ilicitude, por deslealdade publicitária. Mas quando está claramente estabelecido que não há susceptibilidade de confusão ou de engano, ainda assim, deveremos considerar uma outra fronteira: a da associação parasitária a um tema de publicidade reservado aos concorrentes. (8) Neste sentido, quando não exista uma mensagem diferenciada do clima de aproveitamento da realização pública patrocinada, pode haver uma deslealdade na acção publicitária. ”

Ora, os “temas” futebol ou competição, mundial de futebol não são, em si mesmo e em todas a suas vertentes vedados e exclusivos dos patrocinadores.

Como o JE teve oportunidade de defender em Deliberação anterior, a Deliberação n. º 5/2008 para cuja consulta, bem como da Deliberação de recurso da Comissão de Apelo remete, há elementos insusceptíveis de apropriação individual sendo que, no caso concreto, a anunciante se abstém de usar qualquer elemento específico de patrocinador.

O Artigo B2 do Código de Conduta, sob a epígrafe “Embuste do objecto de patrocínio”, dispõe que: “Nenhuma parte deve procurar dar a entender que patrocina um qualquer acontecimento ou a transmissão ou comunicação do mesmo nos Meios, seja ele patrocinado ou não, se não for, de facto, patrocinador de um bem ou dessa transmissão ou comunicação. ”

Ora, tendo o Júri chegado à conclusão de que a publicidade, embora associada e dependente do evento patrocinado por terceiros, não transmite a ideia de que o anunciante é seu patrocinador, não pode deixar de concluir pela não violação do disposto no art. B2 do Código de Conduta.

De igual modo, inexistindo tal confundibilidade quanto à qualidade de patrocinador por parte do destinatário da mensagem, não se vislumbra a violação do disposto sobre práticas comerciais desleais.

Recorde-se que o invocado art. 7º do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março, sob a epígrafe “Acções enganosas” dispõe: “1 — É enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo: (…) c) O conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pelo profissional, a motivação da prática comercial e a natureza do processo de venda, bem como a utilização de qualquer afirmação ou símbolo indicativos de que o profissional, o bem ou o serviço beneficiam, directa ou indirectamente, de patrocínio ou de apoio; ou serviço em causa, e o preço indicado; “.

O JE admite que a campanha promovida pela […] possa ter tido uma especialmente boa resposta por parte dos consumidores. Contudo, para que a norma acima citada se revelasse violada, seria necessário comprovar que a decisão de aquisição estava ligada ao facto do anunciante ser patrocinador ou apoiante da Selecção e não, como o Júri está convencido, com a oferta concreta e os meios utilizados.

O mesmo se diga do disposto no Artigo A1 do Código de Conduta do ICAP, que estabelece os princípios aplicáveis à promoção de vendas.
Improcedendo as razões invocadas pela queixosa quanto à confundibilidade da anunciante com um patrocinador da Selecção Nacional e à susceptibilidade de indução dos consumidores em erro quanto a esse mesmo aspecto – e sem prejuízo de se reconhecer que a campanha da denunciada criou uma associação com o campeonato mundial de futebol (desde logo por fazer depender a oferta dos produtos adquiridos duma vitória de Portugal) -, entende o Júri inexistirem indícios da violação do disposto no art. 317. º do CPI e dos art. 4. º, 5. º, 20. º e 27. º do Código de Conduta do ICAP. “

A longa citação de deliberação anterior é relevante porquanto o caso em apreço apresenta, efetivamente, uma grande semelhança com o supra citado, mantendo-se agora, como então, o mesmo enquadramento normativo legal e de conduta.

É que, na verdade, não existe hoje uma moldura normativa ético-legal em matéria de comunicação comercial que proteja os Patrocinadores – e, ou, determinadas e concretas restrições à publicidade de bens ou eventos patrocinados – para além do que resulta dos limites impostos no Código de Conduta do ICAP e, dos decorrentes dos princípios da licitude, da veracidade e da livre e leal concorrência, sejam estes consignados naquele ou na lei.

E no âmbito da ética publicitária, cumpre ao Júri questionar até que ponto poderá estender-se a protecção dos legítimos interesses dos Patrocinadores oficiais de um evento de extraordinário interesse público, como o que é objecto dos presentes autos.

No caso concreto, para estar em causa a realização de um embuste de um bem sob patrocínio seria necessário que na campanha em causa o anunciante se fizesse voluntariamente passar por Patrocinador do evento ou criasse no consumidor médio tal convicção. Sucede que, apreciada a campanha, o Júri concluiu que:
(i) Sendo evidentes as alusões ao evento desportivo, expressões como ““Patrocinador”; “Patrocínio”; “Selecção Nacional” ou “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional” foram evitadas na campanha em apreciação;
(ii) É feita uma associação não à Selecção Nacional mas, outrossim, ao evento, aos resultados que Portugal vier a atingir na competição que integra a representação nacional;
(iii) Não resulta evidente que, para o consumidor médio exista ou possa existir confusão, ou até dúvida, sobre a qualidade de Patrocinador da Selecção por parte do anunciante, já que, no entendimento do Júri, aquele consumidor detecta facilmente que a expressão “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional” não consta no suporte da campanha, não são usados símbolos oficiais amplamente divulgados, deixando-se assim a associação que o Pingo Doce faz ao evento nas margens do legalmente admissível;
(iv) Inexistindo confundibilidade por parte do destinatário da mensagem quanto à qualidade de Patrocinador, não se vislumbra a existência de embuste de um bem sob patrocínio, que constituiria um caso de violação do princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, por indução do destinatário em erro, quanto à qualidade do anunciante;

A redação do Artigo B2, Capítulo II, Parte II, do Código de Conduta, sob a epígrafe “Embuste do objecto de patrocínio” dispõe que, “Nenhuma parte deve procurar dar a entender que patrocina (…)”.

Esta intencionalidade “de dar a entender que patrocina” não resulta, manifestamente, da comunicação comercial em apreço.

Se o Requerido se está a associar ao momento dum evento que não patrocina, aproveitando-se da sua realização para promover a venda de bens que comercializa, ocorreria questionar se, não havendo a susceptibilidade de confusão ou de engano invocada, se deveria, ainda assim, considerar a associação parasitária a um tema de publicidade reservado aos concorrentes?

Mas restaria, então, perguntar se o concreto tema em análise se encontra sob reserva. E não. Recorde-se que aquando da realização do Euro 2004, foi um diploma específico, o Decreto-Lei nº 86/2004, de 16 de Abril, que proibiu a utilização directa ou indirecta, por qualquer meio de uma firma, denominação, marca ou outro sinal distintivo do comércio por quem não tivesse obtido autorização das entidades responsáveis pela realização da fase final do campeonato europeu, que sugerisse ou criasse a falsa impressão de que estava autorizada ou de alguma forma, associada ao acontecimento.

Assim se regulava o chamado “Ambush Marketing” em termos que aproveitariam, em teoria, o Denunciante e os Patrocinadores mas que, atualmente, fora do contexto daquela competição específica, já passada, são inaplicáveis.

Improcedendo as razões invocadas pela FPF quanto à confundibilidade da anunciante com um Patrocinador da Selecção Nacional, bem como à susceptibilidade de indução dos consumidores em erro quanto a essa qualidade – e sem prejuízo de se reconhecer que a campanha da denunciada cria uma clara associação com o momento do campeonato mundial de futebol e com a prestação da Selecção Nacional nesse Campeonato -, o Júri considera que não existem indícios de desconformidade da comunicação comercial, entendida no seu todo, com o disposto nos artigos B-II do Código de Conduta do ICAP e artigo 317º do Código da Propriedade Industrial.

Subsiste, em resultado da utilização na campanha em apreciação, dum símbolo equivalente ao da marca registada pela FIFA, organização da qual a Queixosa é associada, a violação do artigo 19º do Código de Conduta do ICAP, pese embora o Júri tenha identificado em consulta realizada ao sítio da Denunciada em 18.06.2014 (cf. supra) que a imagem posta em questão já não consta como elemento da campanha.

3. Decisão

Nestes termos, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade do Pingo Doce – veiculada pela Internet – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o artigo 19.º do Código de Conduta do ICAP, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta enquanto se mantiver o ilícito apurado pelo JE.».

A Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação11J / 2014 :: Federação Portuguesa de Futebol vs. Pingo Doce, Distribuição Alimentar
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10J / 2014 :: Olivedesportos vs. ITMP Alimentar

10J/2014

Olivedesportos
vs.
ITMP Alimentar

EXTRACTO DE ACTA

 

Reunida no segundo dia do mês de Junho do ano de dois mil e catorze, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 10J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 10J/2014

1. Objecto dos autos

A OLIVEDESPORTOS – PUBLICIDADE, TELEVISÃO E MÉDIA, S. A. (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por OLIVEDESPORTOS ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por Júri ou JE) apresentar queixa contra a ITMP ALIMENTAR, S.A., (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por INTERMARCHÉ ou Requerida), relativamente a comunicação comercial sob o lema “Intermarché, Patrocinador da Poupança Nacional”, na qual se integra o lançamento de um concurso intitulado “Por Portugal – Sorteio no Mundial” – e veiculada através dos suportes televisão, rádio, Internet, folheto e MUPI – tal, por alegada violação dos artigos 4º, 5º e 27º do Capítulo I da Parte II, artigos A-1, alínea e) dos artigo B-II e B2 do Capítulo II da Parte II, todos do Código de Conduta do ICAP, artigos 4.º e 7.º n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março (“Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais”) e artigo 317º do Código da Propriedade Industrial.

1.2. Notificada para o efeito, a INTERMARCHÉ apresentou tempestivamente a sua contestação.

1.3. Dão-se por reproduzidos os 6 (seis) documentos juntos pela OLIVEDESPORTOS, a saber:
– (i) Doc. 1: cópia em cd-rom de spot publicitário televisivo;
– (ii) Doc. 2: cópia em cd-rom de spot publicitário radiofónico;
– (iii) Doc. 3: cópia de comunicação comercial feita no sítio de Internet da Requerida;
– (iv) Doc. 4: cópia de comunicação comercial feita através do sítio de Internet sic.sapo.pt;
– (v) Doc. 5: cópia de folheto “poupanças da semana” da INTERMARCHÉ;
– (vi) Doc. 6: cópia de Regulamento do Concurso “Por Portugal – Sorteio no Mundial”;

bem como os 2 (dois) documentos juntos pela INTERMARCHÉ, a saber:

– (i) Doc. 1: cópia de registo de marca nacional n.º500772;
– (ii) Doc. 2: Cópia de notícia de jornal “ O Expresso”, de 13 de Maio de 2014: “Os 30 pré-convocados de Portugal”.

1.4. Questões prévias

1.4.1. Alega a INTERMARCHÉ em sede de contestação que: “…a ora exponente não é membro do ICAP, não é seu associado, nem, por qualquer via aceitou, ou aderiu à autoregulação do ICAP” (sic. ponto 1) que, “o mesmo é dizer que a exponente não está sujeita à jurisdição do ICAP” (sic. ponto 2) “nem reconhece competência, nem autoridade, ao ICAP para decidir sobre quaisquer litígios em que a exponente seja parte, incluindo os decorrentes de relações comerciais e de publicidade”, (sic. ponto 3) “pelo que qualquer eventual decisão que possa ser deliberada pelo ICAP, em decorrência da “consulta” (…) não pode obrigar, seja por que forma for, a exponente, nem sobre a mesma pode produzir quaisquer efeitos” (sic. ponto 6.) acrescentando que: “Unicamente por respeito à verdade e à instituição ICAP, impõe-se (…) prestar (…) esclarecimentos.” (sic. ponto 7).

No que tange a esta posição da INTERMARCHÉ, cumpre ao Júri esclarecer que, não obstante não ser a Requerida associada do ICAP, importa ter presente, designadamente, que muitos dos meios de comunicação de comunicação de campanhas publicitárias o são, pelo que o respetivo Júri de Ética é materialmente competente para proferir a decisão e vincular a mesma INTERMARCHÉ quanto ao conteúdo decisório emanado. Com efeito, resulta do disposto no artigo 30.º do Código de Conduta do ICAP que, tal conteúdo é comunicado às Partes e vincula os meios de comunicação das ditas campanhas, no que respeita às decisões de cessação.

Por outro lado, e tal como ficou referido na Decisão do Processo 13J/2010, “…o efeito pretendido – célere, válido e eficaz – das deliberações do Júri é que, findo o prazo de recurso e efectuadas as devidas notificações, se verifique a cessação – ou não – da publicidade que o Júri apreciou à luz do Código de Conduta, sendo tal deliberação (auto) vinculativa para os membros do ICAP. Assim, não se pode descurar a importante componente didáctica-pedagógica das deliberações do Júri quando aprecia uma mensagem, do ponto de vista da ética-publicitária, habilitando os associados do ICAP, designadamente os meios, a melhor avaliar futuramente as mensagens cuja difusão lhes é solicitada pelos anunciantes.”

1.4.2. Atentas as diversas questões do exclusivo foro contratual suscitadas pela OLIVEDESPORTOS, cumpre ao JE lembrar que, a sua competência material se encontra circunscrita à apreciação da publicidade e comunicações comerciais, não podendo e, ou, devendo pronunciar-se sobre tais questões, sendo que as Partes, a qualquer momento, poderão suscitá-las junto dos tribunais.

1.4.3. Já quanto à posição assumida pela INTERMARCHÉ a pontos 8 e 9 da contestação, no que concerne às “pretensões” do ICAP, dispensa-se o Júri de invocar quaisquer normativos, atenta a sua conhecida associação à ética e à lei.

1.4.4. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 9.º do Regulamento do JE, sob a epígrafe “Petição”, “A queixa deverá ser feita por escrito, devendo o queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados…”. (Negrito e sublinhado do JE).

Esta é, aliás, uma prática sobre a qual o Júri teve já a oportunidade de se pronunciar, designadamente, no âmbito dos Processos 8J/2009, 17J/2009, 2J/ 2010, 16J/2012 e 4J/2014 do ICAP.

Ora, constata o JE que a OLIVEDESPORTOS não junta aos autos – em anexo à sua queixa – cópia de publicidade da responsabilidade da INTERMARCHÉ veiculada através de suporte MUPI (cfr. art.ºs 1, 2 e 35), bem como não junta cópia de alegada publicidade feita no site http://www.intermarche.pt/campanha-mundial.aspx (cfr. art.º 10) pelo que, sobre estes casos específicos, não se deterá a análise do Júri.

1.5. Dos factos

A Requerente alega na sua petição – e a Requerida não contradita – que “O INTERMARCHÉ lançou recentemente uma campanha publicitária e promocional designada “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”, com o lançamento de um concurso intitulado “Por Portugal – Sorteio no Mundial”, destinada a promover as vendas nos supermercados INTERMARCHÉ e ÉCOMARCHÉ” (sic. art.º 1), a qual “…tem sido amplamente divulgada em diversos anúncios veiculados, pelo menos, em televisão, rádio, internet, folhetos e mupis, de que se juntam, em suporte CD-ROM, cópias em anexo…” (sic. art.º 2, cfr. Docs 1 a 5 da queixa).

1.5.1. Das alegações publicitárias ou claims

Encontram-se colocadas em crise (cfr. art.ºs 3 a 6 e 9 a 11 da petição), as seguintes alegações publicitárias ou claims:

A. Televisão (cfr. Doc. 1 junto à queixa)
– (i) Claim visual: “Jogador de futebol William Carvalho pontapeia uma bola para uma baliza”;
– (ii) Claim visual: Legenda com o nome William Carvalho;
– (iii) Claim visual: em ambiente caseiro, uma família envergando cachecóis com a bandeira nacional incentiva, frente a uma televisão, uma equipa e o jogador William Carvalho;
– (iv) Claim verbal em voz off: “Os portugueses apoiam os jogadores. O Intermarché apoia os portugueses”;
– (v) Claim verbal e em voz off: (promoção de vendas): “Até 31 de Maio por cada 25 € com compras em cartão habilite-se a um dos mais de 900 TV led” associado a imagem de William Carvalho;
– (vi) Claim verbal em voz off: “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”, associado a imagem de William Carvalho.

B. Rádio (cfr. Doc. 2 junto à queixa)
– (i) “Os portugueses apoiam os jogadores. O Intermarché apoia os portugueses”;
– (ii) (promoção de vendas): “Até 31 de Maio por cada 25 € com compras em cartão habilite-se a um dos mais de 900 TV led”;
– (iii) “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”.

C. Internet (cfr. Docs. 3, 4 e 6 juntos à queixa)

C.1. Comunicação comercial feita no sítio da Requerida (cfr. Doc. 3)
– (i) Claim verbal “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”;
– (ii) Claim verbal “Os portugueses apoiam os jogadores”;
– (iii) Claim visual: num écran de televisão, vários adeptos torcem por uma equipa de futebol com os rostos pintados com riscas verdes e encarnadas, ao jeito de bandeira portuguesa;
– (iv) Claim verbal (promoção de vendas): “HABILITE-SE a 1 DOS + DE 900 TV LED 32” POR CADA 25€ COM CARTÃO = 1 CUPÃO”.

C.2. Comunicação comercial feita através de sic.sapo.pt (cfr. Doc. 4)
– (i) Claim verbal: “Movimento Nacional de Poupança Intermarché”;
– (ii) Claim visual: “Jogador de futebol William Carvalho pontapeia uma bola para uma bola num écran de televisão”;
– (iii) “Os portugueses apoiam os jogadores. O Intermarché apoia os portugueses”;
– (iv) Claim verbal (promoção de vendas): “HABILITE-SE a 1 DOS + DE 900 TV LED 32” POR CADA 25€ COM CARTÃO = 1 CUPÃO”;
– (v) Claim visual: num écran de televisão, vários adeptos torcem por uma equipa de futebol com os rostos pintados com riscas verdes e encarnadas.

C.3. Comunicação comercial (promoção de vendas) em concurso regulamentado (cfr. Doc. 6)
“Por Portugal – Sorteio no Mundial”.

D. Folheto (cfr. Doc. 5 junto à queixa)
– (i) Claim verbal: “Movimento Nacional de Poupança Intermarché”;
– (ii) Claim verbal “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”;
– (iii) Claim verbal (promoção de vendas): “HABILITE-SE a 1 DOS + DE 900 TV LED 32” POR CADA 25€ COM CARTÃO = 1 CUPÃO”.

1.6. Das alegações das Partes

1.6.1. Sustenta a OLIVEDESPORTOS na sua queixa, e em síntese, que a campanha publicitária da responsabilidade da INTERMARCHÉ, com inclusão da sua promoção de vendas configura uma prática de publicidade enganosa, desonesta e de concorrência desleal, bem como um embuste de um bem sob patrocínio e, ainda, uma promoção de vendas ilícita, por virtude de:

– (i) A Olivedesportos ser “…por contrato celebrado com a Federação Portuguesa de Futebol, a única e exclusiva titular dos direitos comerciais e de propriedade intelectual relativos às Selecções Nacionais de Futebol, no que se inclui, sem limitar, os direitos de imagem e patrocínio das Selecções Nacionais de Futebol e da própria Federação Portuguesa de Futebol, incluindo todos os direitos de utilização e exploração comercial de símbolos, emblemas, logótipos oficiais ou imagens colectivas das Selecções Nacionais de Futebol.” (sic. art.º 16);

– (ii) “Assim, apenas a Federação Portuguesa de Futebol, a Olivedesportos e as empresas por estas autorizadas têm o direito de se associarem às Selecções Nacionais de Futebol, nomeadamente para a utilização comercial de referências às mesmas para a promoção das suas vendas, no que constitui o chamado “patrocínio”” (sic art.º 17), acrescentando que “Decorre, pois, do regime de auto-regulação aplicável que a comunicação pública de uma associação entre uma marca, como o INTERMARCHÉ, e de um objecto patrocinado, como é a Selecção Nacional de Futebol, nas promoções de vendas daquela marca, configuram, para todos os fins, parte dos “benefícios, directos ou indirectos, que tenham sido objecto de acordo” de Patrocínio, conforme melhor disposto na al. e) do Artigo B do Capítulo II da Parte II do actual Código de Conduta. Todavia.” (sic. art.º 20);

– (iii) “O INTERMARCHÉ não é um patrocinador da Selecção Nacional de Futebol, contrariamente ao que dá a entender pela sua prática comercial” (sic. art.º 21) e “Através de uma clara e premeditada ambiguidade gramatical, o INTERMARCHÉ associa, de forma não autorizada pela Olivedesportos e/ou pela Federação Portuguesa de Futebol, a Promoção e a campanha publicitária à Selecção Nacional de Futebol, e à sua participação no Mundial de Futebol” (sic. art.º 24) “Situação tanto mais grave quanto de tais práticas, resulta um claro benefício para o INTERMARCHÉ, fruto de um proveito ilícito nas suas vendas, através de uma colagem “parasitária” a direitos que não lhe pertencem, constituindo, para todos os fins, uma despudorada violação aos direitos exclusivos da Olivedesportos e às normas anteriormente referidas!” (sic. art.º 25.);

– (iv) “…através do empastelamento realizado, o INTERMARCHÉ induz em erro os consumidores ao transmitir uma ideia – falsa – de associação legal à Selecção Nacional de Futebol” (sic. art.º 27) “Abusando, de forma dolosamente intencional, da confiança dos consumidores” (sic. art.º 28) pelo que, “…a actuação do INTERMARCHÉ “parasita a diligência contratual, a criatividade e o marketing alheio, (sendo) de resultado contraditório, afinal, com uma publicidade decente e honesta (…)” (sic. art.º 30);

– (v) “A Promoção, aludindo ao desempenho futuro da Selecção Nacional de Futebol num determinado evento para fins de promoção de vendas, fere os direitos da Olivedesportos e do concorrente da INTERMARCHÉ a quem tais direitos foram contratualmente conferidos” (sic. art.º 33) e “Ao criar um benefício, ilícito, para o INTERMARCHÉ com base na reputação e imagem da Selecção Nacional de Futebol, a conduta supra descrita constitui, ainda, um acto de concorrência desleal…” (sic. art.º 34), acrescentando que “O dano daí resultante para a Olivedesportos e o concorrente da INTERMARCHÉ a quem tais direitos foram contratualmente conferidos, não se esgotou, nem se esgota, na primeira exibição dos anúncios televisivos e radiofónicos ou na primeira visão dos “outdoors” ou “mupis” espalhados pelo território nacional ou dos anúncios divulgados na internet.” (sic. art.º 35).

– (vi) “…no âmbito da Promoção, ao oferecer aos consumidores a possibilidade de ganhar uma 1 das mais de 900 TV LED série 4 da marca Samsung, ecrã 32 polegadas (80 cm) e resolução de ecrã de 1366x768s, o INTERMARCHÉ “conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor médio a tomar uma decisão de compra que este não teria tomado de outro modo” “ (sic. art.º 38) dado que, as “…afirmações surgem com ares de concretização das contrapartidas ou benefícios a que a INTERMARCHÉ teria direito por força de um contrato de patrocínio.” (sic. art.º 41.º);

– (vii) “A campanha publicitária e a Promoção realizadas pelo INTERMARCHÉ, não só ameaçam os contratos já celebrados pela Olivedesportos, colocando em causa os direitos legitimamente adquiridos pelos efectivos patrocinadores oficiais da Selecção Nacional de Futebol, como comprometem irremediavelmente as negociações em curso para a celebração de futuros contratos de patrocínio” (sic. art.º 43) “Traduzindo-se numa gravíssima perda de prestígio e valor comercial da referida imagem” (sic. art.º 44), acrescentando que “A prossecução desta campanha deitará à praça pública o que é um direito exclusivo da Olivedesportos, direito esse que lhe foi legitimamente transmitido pelo seu único titular originário, a Federação Portuguesa de Futebol.” (sic. art.º 45).

1.6.2. Contraditando a denúncia da Requerente, defende a INTERMARCHÉ na sua contestação, a ética e a legalidade da campanha publicitária da sua responsabilidade invocando, designadamente, que:

– (i) “…ao difundir a campanha “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional, a exponente mais não faz do que dar uso e devida utilização à sua marca nacional” (sic. ponto 21) “…procurando a exponente (…) promover os seus produtos num momento importante decorrente do facto de Portugal estar presente numa fase final de um campeonato do mundo de futebol e de os jogos serem transmitidos em televisão nos meses de Junho e Julho de 2014” (sic. ponto 22);

– (ii) “…a campanha da exponente integra imagem do jogador William de Carvalho…” (sic. ponto 23) “o qual, porém, surge na ação publicitária sem qualquer equipamento, da Selecção Nacional de Futebol, ou representativo de qualquer colectividade, (sic. ponto 24) “tendo as imagens do mesmo jogador sido obtidas numa altura em que tão pouco era conhecida a convocação do jogador William de Carvalho para representar a Selecção Nacional de Futebol” (sic. ponto 25) “que, de resto, ainda na presente data não é certo, uma vez que é apenas conhecida a lista provisória dos jogadores pré-convocados para ir ao Mundial de Futebol, não se sabendo se o referido jogador fará ou não parte da lista definitiva de 23 selecionados” (ponto 25) “não deixando de ser “Jogador de Portugal”, independentemente de fazer ou não parte dos convocados para a Seleção Nacional, porque tem a nacionalidade portuguesa e joga futebol”! (sic. ponto 27);

– (iii) “Não se descortina na campanha publicitária em causa qualquer utilização de cachecóis, ou outros elementos, alusivos à Seleção Nacional de Futebol, mas apenas cachecóis com as cores da Bandeira Nacional, que, tanto quanto se sabe, ainda é um símbolo nacional (…) propriedade de TODOS os portugueses!” (sic. ponto 28) “Insusceptível de apropriação individual” (sic. ponto 29), acrescentando que “…em momento algum da campanha é usada, ou referida, a designação “Mundial de Futebol” (sic. ponto 30), “Mas antes e apenas é usado o substantivo “Mundial” no nome do concurso, não sendo utilizada em qualquer outra parte ou situação da campanha publicitária” (sic. ponto 31), “Concurso esse, “Por Portugal – Sorteio no Mundial”, que foi devidamente autorizado pela Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, que lhe atribuiu o n.º 76/2014.” (sic. ponto 32);

– (iv) “Os eventos, como um Mundial de Futebol, não são exclusivos dos seus patrocinadores, tal como exclusivo não é o apoio de qualquer outra instituição e cidadão à sua Seleção!” (sic. ponto 36) e “Na ação publicitária em causa, basta uma simples análise séria (…) para se concluir que a mesma não encerra qualquer limitação aos direitos de imagem e patrocínio da Seleção nacional de Futebol, incluindo emblemas, logótipo oficiais ou imagens desta.” (sic. ponto 37);

– (v) “Sendo manifestas as alusões ao evento desportivo mundial de futebol (…) em momento algum da campanha publicitária é usada a expressão “Patrocinador Oficial da Seleção Nacional “, nem imagens da seleção nacional, nem de lugares associado àquelas” (sic. ponto 39) acrescentando que, “De resto, as matérias respeitantes a futebol, competições, mundial de futebol, não são em si mesmas exclusivas dos seus patrocinadores, constituindo, também elas, elementos insusceptíveis de apropriação individual.” (sic ponto 41).

2. Enquadramento ético-legal

2.1. Da extensão dos direitos exclusivos da OLIVEDESPORTOS

Alega a Requerente na sua queixa que, “O INTERMARCHÉ não é um patrocinador da Selecção Nacional de Futebol, contrariamente ao que dá a entender pela sua prática comercial” (sic. art.º 21) e que “Através de uma clara e premeditada ambiguidade gramatical, o INTERMARCHÉ associa, de forma não autorizada pela Olivedesportos e/ou pela Federação Portuguesa de Futebol, a Promoção e a campanha publicitária à Selecção Nacional de Futebol, e à sua participação no Mundial de Futebol” (sic. art.º 24) “Situação tanto mais grave quanto de tais práticas, resulta um claro benefício para o INTERMARCHÉ, fruto de um proveito ilícito nas suas vendas, através de uma colagem “parasitária” a direitos que não lhe pertencem, constituindo, para todos os fins, uma despudorada violação aos direitos exclusivos da Olivedesportos e às normas anteriormente referidas!” (sic. art.º 25).

Perante tal denúncia, cumpre ao Júri pronunciar-se sobre o que é possível entender-se como “direitos exclusivos” da OLIVEDESPORTOS, ainda antes de qualquer análise na totalidade (cfr. artigo 27.º, n.º 3 do Código de Conduta do ICAP) da campanha publicitária objeto da lide.

A Requerente não só invoca a titularidade de direitos ilimitados sobre a Selecção Nacional, sem os concretizar como – constata o JE, face aos elementos carreados para os autos -, não junta qualquer prova dos mesmos alegados direitos conferidos por contrato, o que deveria ter feito de acordo com o consignado no artigo 9.º, n.º 2 do Regulamento do JE e, bem assim, nos termos das regras gerais dos artigos 342.º e seguintes do Código Civil, no que respeita à denúncia sobre embuste de um bem sob patrocínio.

Ainda que possa ser aceite – por tal ser do domínio público – a existência de direitos exclusivos decorrentes de contrato celebrado entre a OLIVEDESPORTOS e a Federação Portuguesa de Futebol, nunca poderá conceder o Júri que, a exacta extensão dos direitos decorrentes consubstancie um facto público e notório e logo, apto a dispensar produção de prova. Deste modo, não concorda o JE quanto ao alegado pela Requerente a art.º 17 da petição.

Mais, eventuais violações de direitos exclusivos não se apuram sem o conhecimento prévio dos seus exactos contornos e extensão e, não se concorda em que a argumentação que fundamentou a decisão número 5J/2008 ainda releve, como parece pretender a Requerente.

Chegado aqui, quer-se relembrar o entendimento que ficou vertido na deliberação da primeira secção do Júri número 13J/2010, no sentido de ser evidente que: “…um facto público e notório pode, ou não, perdurar no tempo, rejeitando o JE aceitar, sem mais, que aquilo que foi avaliado como público e notório em 2008 assim fique qualificado para a eternidade.”

Por outro lado, as regras especialmente estabelecidas para efeitos do Euro 2004 já não são aplicáveis. De onde, não existe hoje uma moldura normativa ético-legal em matéria de comunicação comercial (entendida esta, em sentido amplo) que estatua uma protecção de patrocinadores – e, ou, determinadas e concretas restrições à publicidade de bens ou eventos patrocinados – diversa da que resulta quer dos limites impostos em sede do Capítulo II da Parte II do Código de Conduta do ICAP quer, dos decorrentes dos princípios da licitude, da veracidade e da livre e leal concorrência, sejam estes consignados naquele ou na lei.

Em conformidade, constitui posição do Júri que, o que ficou exposto assume particular relevância no que concerne a dois géneros de claims colocados em crise os quais, atentos os quadros normativos à luz de que são apreciados, deverão sê-lo individualmente e, de acordo com o seu significado literal. O contrário, ou seja, a apreciação do significado das alegações publicitárias no seu todo (cfr. art.º 4 da queixa) justificar-se-á em sede de averiguação da eventual indução do consumidor médio em erro quanto à qualidade do anunciante, a mesma, independente da questão da titularidade de direitos exclusivos de natureza contratual.

Assim, são ora relevantes:

– (i) os claims visuais e verbais relativos ao nome e à imagem do jogador William Carvalho [cfr. A. (i), (ii), (iii), (v), (vi), C.2. (ii)];

– (ii) os claims verbais “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”; [cfr. A. (vi), B. (iii), C.1. (i), D. (i)] e “Por Portugal – Sorteio no Mundial” [cfr. A. (iv), (vi), B. (iii), C.1. (i), C.3., D. (ii)];

– (iii) os claims visuais traduzidos por pinturas de rosto, bem como por cachecóis com a bandeira portuguesa e envergados por intervenientes na campanha publicitária [cfr. A. (iii), C.1. (iii)] e os verbais, consubstanciados pelas expressões “Portugal”, “Jogador de Portugal”, “portugueses” e “jogadores” [cfr. A. (i), (ii). (iv), B. (i), C.1. (ii), C.2. (ii), (iii) C.3.].

2.1.1. Dos claims relativos ao nome e à imagem do jogador William Carvalho

Embora o direito à imagem seja irrenunciável e inalienável, não são de considerar-se interditas, as limitações ao exercício desse direito de personalidade, nomeadamente a cedência a terceiros, por futebolistas, do direito à exploração comercial da sua imagem de desportistas profissionais.

Viola o disposto no artigo 79.º, n.º 1 do Código Civil – de que o consignado no artigo 7.º do Código da Publicidade, n.º 2, alínea e) é corolário em matéria de comunicações comerciais – a empresa que, sem obtenção de autorização prévia de um futebolista ou, por parte de quem aquele haja cedido o direito de explorar comercialmente, com exclusividade, a sua imagem pública.

Ora, no caso vertente, considerando que:

– (i) a INTERMARCHÉ logrou provar que as imagens de William Carvalho inseridas na sua campanha publicitária foram obtidas numa altura em que era desconhecida a sua convocação como jogador representante da Seleção Nacional. (Cfr. pontos 25 e 26 da contestação e Doc. 2 junto à mesma);
– (ii) que tal é susceptível de ser entendido como despiciendo face à circunstância – a que o Júri já fez menção – de a eventual titularidade por parte da OLIVEDESPORTOS de direitos exclusivos de exploração comercial da imagem de William Carvalho, não constituir um facto público e notório, e de sobre a mesma não ter sido carreada para os autos qualquer prova, designadamente, mas sem excluir quanto à sua extensão1;
– (iii) o facto acrescido de a OLIVEDESPORTOS não colocar em causa a obtenção de autorização prévia de William Carvalho por parte da INTERMARCHÉ (ou, por a quem aquele haja, eventualmente, cedido o direito de explorar comercialmente, com exclusividade, a sua imagem pública), para o efeito da respetiva utilização em publicidade tal, em respeito do citado artigo 7.º, n.º 2, alínea e), do Código da Publicidade e do artigo 79.º, n.º 1 do C.C.2;

Conclui o Júri que, neste tocante, e por maioria de razão, a lide reporta-se tão somente a matéria contratual a qual, deste modo, extravasa a ética e a lei em matéria de publicidade.

2.1.2. Do claim “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional” e do concurso “Por Portugal – Sorteio no Mundial”
São ora atendíveis, os claims verbais [cfr. A. (iv), (vi), B. (iii), C.1. (i), C.3., D. (ii)] concernentes à comunicação comercial e promoção de vendas que a Requerente entende, em sede de queixa, traduzirem uma “…colagem “parasitária” a direitos que não lhe pertencem” (sic. art.º 25) e os quais se encontram alegadamente abrangidos no direito de marca da INTERMARCHÉ. (Cfr. pontos 21 a 32 da contestação).

Na verdade, alega a INTERMARCHÉ na sua contestação que, ao difundir a campanha “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional”, a exponente mais não faz do que dar uso e devida utilização à sua marca nacional.” (sic. ponto 21).

Acrescenta a Requerida que, “…o grupo que detém a propriedade da insígnia Intermarché, designado por grupo “Os Mosqueteiros”, tem registada a seu favor, e como marca nacional n.º 500772, a marca “Movimento Nacional de Poupança” (sic. ponto 20), o que, considera o Júri, a INTERMARCHÉ logrou provar. (Cfr. Doc.1 da contestação).

No que diz respeito à comunicação comercial feita a partir de uma promoção de vendas em concurso regulamentado “Por Portugal – Sorteio no Mundial”, (cfr. Doc. 6 da queixa), não está ora em causa se a Requerida usa ou não usa a designação “Mundial de Futebol” ou apenas o termo “Mundial”, ao contrário do que afirma a ponto 30 da contestação. Aliás, sempre se dirá que, em contexto, o significado semântico é um e um só.

Com efeito, o que é curial nesta sede relativa à extensão dos alegados direitos exclusivos da OLIVESDESPORTOS, é o facto de a INTERMARCHÉ também alegar que, o concurso “Por Portugal – Sorteio no Mundial” foi “…devidamente autorizado pela Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, que lhe atribuiu o n.º 76/2014” (sic. ponto 32) e de sobre tal ter junto prova aos autos pela própria Requerente. (Cfr. cópia do respetivo regulamento identificado como Doc. 6 da petição).

Em coerência com o exposto, analisados os lemas “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional” e “Movimento Nacional de Poupança”, bem como o regulamento do concurso sob o título “POR PORTUGAL – SORTEIO NO MUNDIAL” pela perspectiva do seu significado literal – e isoladamente em relação às restantes alegações publicitárias – entende o Júri que, atento o já sobejamente referido desconhecimento sobre a extensão dos direitos exclusivos de fonte contratual adquiridos pela OLIVEDESPORTOS, os referidos lemas, per se, não se encontram desconformes com o disposto em qualquer quadro ético-legal em matéria de comunicação comercial entendida em sentido amplo, bem como de livre e leal concorrência.

2.1.3. Da alegada insusceptibilidade de apropriação de símbolos nacionais e de designações genéricas

No que tange aos claims visuais traduzidos por pinturas de rosto, bem por como cachecóis com a bandeira portuguesa e envergados por intervenientes na campanha publicitária [cfr. A. (iii), C.1. (iii)] e os verbais, consubstanciados pelas expressões “Portugal”, “Jogador de Portugal”, “portugueses” e “jogadores” [cfr. A. (i), (ii). (iv), B. (i), C.1. (ii), C.2. (ii), (iii) C.3.], alega a OLIVEDESPORTOS a art.º 7 da petição que:

– “…a utilização das referências a “Portugal”, “no Mundial”, bem como a “portugueses” e aos “jogadores”, no contexto específico da aproximação do evento desportivo denominado “COPA DO MUNDO DA FIFA BRASIL 2014” (de ora em diante o “Mundial de Futebol”), acompanhada das cores e da exibição de cachecóis da Selecção Nacional de Futebol, cria, na campanha publicitária em causa, uma associação clara, porém ilícita, da INTERMARCHÉ à Selecção Nacional de Futebol.” (sic).

De salientar que, a Requerente não junta aos autos prova de que os cachecóis envergados pelos intervenientes nas mensagens publicitarias que ficaram identificadas são os da Seleção Nacional de Futebol, o que deveria ter feito à luz do disposto no artigo 9.º, n.º 2 do Regulamento do JE e, bem assim, nos termos das regras gerais dos artigos 342.º e seguintes do Código Civil.

Aliás, vem a INTERMARCHÉ contraditar tal alegação, sustentando que “Não se descortina na campanha publicitária em causa qualquer utilização de cachecóis, ou outros elementos, alusivos à Seleção Nacional de Futebol, mas apenas cachecóis com as cores da Bandeira Nacional, que, tanto quanto se sabe, ainda é um símbolo nacional (…) propriedade de TODOS os portugueses!” (sic. ponto 28).

Por maioria de razão do que se concluiu nos números anteriores, no sentido de a alegada extensão dos direitos exclusivos da OLIVEDESPORTOS não consubstanciar um facto público e notório, constitui posição do JE que, analisados individualmente os referidos claims colocados em crise, ainda com maior veemência se poderá sustentar que a respetiva utilização não é de molde a colidir com as normas ético-legais em matéria de publicidade. Na realidade, dentro do delimitado âmbito da ética publicitária, e na hipótese de regularidade e existência de um contrato de exclusividade, cumpre ao Júri questionar até que ponto poderá estender-se a protecção dos legítimos interesses dos patrocinadores oficiais de um evento de extraordinário interesse público, como o que é objecto dos presentes autos.

Por outro lado, e como é sabido, o uso de símbolos nacionais nas comunicações comerciais não consubstancia, presentemente, uma prática proibida quer em sede de Código de Conduta, quer pelo Código da Publicidade, desde que não se extraiam significados pejorativos o que, obviamente, não é o caso.

Mais, o JE entende que elementos que equivalham a símbolos nacionais consagrados no artigo 11º da Constituição da República Portuguesa como sejam, concretamente, a bandeira nacional ou as suas cores, não são passíveis de apropriação privativa e exclusiva dos patrocinadores de eventos internacionais como o em apreço e, logo, deverão ser considerados insusceptíveis de configurar sinais distintivos de concorrentes ou geradores de confusão, se analisados individualmente, pela perspectiva do seu significado semântico.

O mesmo defende o Júri, no que diz respeito às expressões “Portugal”, “Jogador de Portugal”, “portugueses” e “jogadores” as quais, atenta a referida ad nauseum ausência de conhecimento sobre a alegada extensão dos direitos exclusivos da OLIVEDESPORTOS constituem, em si mesmas, meros símbolos (in casu, publicitários) de carácter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo – quiçá, de uma indicação geográfica – e, desse modo, igualmente insusceptíveis de apropriação em sede de propriedade intelectual. De onde, na opinião do JE, a respetiva utilização não se encontra desconforme com o disposto em qualquer quadro ético-legal em matéria de comunicação comercial entendida em sentido amplo, bem como de livre e leal concorrência.

2.1.4. Conclusão sobre os efeitos do desconhecimento da extensão dos direitos exclusivos

Em conformidade, com exclusão de todos os factos relevantes que somente possam ser comprovados através da junção de prova do conteúdo do contrato celebrado entre a OLIVEDESPORTOS e a Federação Portuguesa de Futebol, entende o Júri poder apreciar no seu todo, a campanha publicitária denominada “Intermarché. Patrocinador da Poupança Nacional” em associação ao concurso intitulado “Por Portugal – Sorteio no Mundial”, e veiculada nos suportes televisão, rádio, Internet e folheto, nos termos que se seguem.

2.3. Da alegada prática de publicidade enganosa

2.3.1. Da alegada indução do consumidor médio3 em erro quanto à qualidade do anunciante enquanto determinante de uma decisão de transacção

Alega a OLIVEDESPORTOS em sede de queixa – o que a Requerida não contradita – que, “O INTERMARCHÉ propõe-se atribuir a todos os clientes dos supermercados INTERMARCHÉ e ÉCOMARCHÉ, sitos em todo o território nacional, que sejam titulares do cartão “Os Mosqueteiros” ou cartão “Poupança”, um cupão para participação no referido Concurso por cada 25€ em compras efectuadas com o mesmo cartão “Os Mosqueteiros” ou cartão “Poupança”, entre 5 e 31 de Maio de 2014, cupão esse que lhes dará a possibilidade de participar no sorteio de 1 dos mais de 900 TV LED série 4 da marca Samsung, ecrã 32 polegadas (80 cm) e resolução de ecrã de 1366×768.” (sic. artigo º 11).

A tal, acrescenta a OLIVEDESPORTOS que “Decorre (…) do regime de auto-regulação aplicável que a comunicação pública de uma associação entre uma marca, como o INTERMARCHÉ, e de um objecto patrocinado, como é a Selecção Nacional de Futebol, nas promoções de vendas daquela marca, configuram, para todos os fins, parte dos “benefícios, directos ou indirectos, que tenham sido objecto de acordo” de Patrocínio, conforme melhor disposto na al. e) do Artigo B do Capítulo II da Parte II do actual Código de Conduta.” (sic. art.º 20 da queixa).

O Júri não subscreve esta posição da OLIVEDESPORTOS, por maioria de razão do que sustentou amplamente, no capítulo anterior da presente deliberação. Com efeito, ainda que possa ser aceite – por tal ser do domínio público – a existência de direitos exclusivos decorrentes de contrato celebrado entre a OLIVEDESPORTOS e a Federação Portuguesa de Futebol, nunca poderá conceder o Júri que, a exacta extensão dos direitos decorrentes consubstancie um facto público e notório e logo, apto a dispensar produção de prova. Logo, não se poderá falar aqui de “benefícios directos ou indirectos, que tenham sido objecto de acordo” de Patrocínio, para efeitos da aplicação do disposto na alínea e) do Artigo B do Capítulo II, Parte II do Código de Conduta do ICAP porquanto, se desconhece o teor concreto do mesmo acordo.

A OLIVEDESPORTOS sustenta ainda na sua petição que, “A Promoção em causa e a campanha que a publicita, tal como é realizada, constitui conduta ilícita violadora, por um lado, da al. e) do artigo B-II e do artigo B2 do Capítulo II da Parte II do Código de Conduta, ao realizar um claro embuste de um bem sob patrocínio.” (sic. artigo 12.).

A propósito, entende o JE que, não se estando agora em presença de matéria meramente contratual mas, antes, do exclusivo foro da ética e da lei em matéria de comunicações comerciais, a apreciação da questão ora suscitada, implica a análise da campanha como um todo, com inclusão da promoção de vendas, análise esta a que o Júri se permite, de acordo com o disposto no artigo 27.º, n.º 3, do Código de Conduta do ICAP.

Ora, apreciada a campanha em lide na sua totalidade, conclui o Júri que:

– (i) Embora sejam claras as alusões ao evento desportivo que se irá iniciar e em que Portugal participará – através de expressões como “Portugal” “Mundial” “Patrocinador da Poupança Nacional”, “Jogador de Portugal”, “jogadores”, bem como de alegações visuais “bandeira portuguesa” e “adeptos futebolísticos entusiasmados” – a expressão “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional”, não é utilizada na campanha em apreciação, sendo que o caso de William Carvalho assume os contornos que atrás ficaram definidos os quais, não contrariam esta conclusão;
– (ii) Estabelece-se, assim, não uma associação à Selecção Nacional mas, uma alusão ao momento de representação nacional num evento de notório interesse público, o que a Requerida aliás concede, a ponto 39 da contestação;
– (iii) Tão pouco parece evidente que, de tal resulte para o consumidor médio a conclusão, ou mesmo a dúvida, sobre a qualidade de Patrocinador da Selecção do anunciante, já que tal consumidor perceberá que a expressão “Patrocinador Oficial da Selecção Nacional ” não consta de qualquer suporte da campanha e promoção de vendas associada, pelo que tal associação se entende como cirurgicamente colocada nas margens ou limites, do legalmente admissível;
– (iv) A campanha publicitária – com a inclusão da promoção de vendas em causa – não é susceptível de induzir o chamado consumidor médio a tomar uma decisão de transação com base em tais alusões ao evento desportivo. Assim, admite-se que tal decisão se funde na circunstância de através de cada 25€ em compras efectuadas com o cartão “Os Mosqueteiros” ou cartão “Poupança”, aquele consumidor poder ter a possibilidade de ganhar 1 dos mais de 900 TV LED (cfr. Docs. 1 a 6 da queixa) e tal, em função da relação qualidade/preço dos produtos e das ofertas propostas, ao contrário do que se alega a art.º 25. da queixa;
– (v) Com efeito, não se crê que um patrocinador oficial ou, quem eventualmente procure dá-lo a entender sem o ser, será mais interessante para o consumidor médio em termos de probabilidade de ganho de um TV LED, como se tal qualidade fosse de molde a condicionar, sem mais, uma aquisição de transação através de cupões, a qual, de outro modo, não se efectuaria. (Cfr. artigo 7.º do Decreto-lei n.º 57/2008);
– (vi) O mesmo se afirma quanto ao disposto no Artigo A1 do Código de Conduta do ICAP, que estabelece os princípios aplicáveis à promoção de vendas;
– (vii) Mais, com a devida vénia, e sem prejuízo do que se referiu, não compreende o Júri a razão pela qual a OLIVEDESPORTOS considera ofendido o disposto no n.º 1, alínea c) do citado artigo, segundo o qual, a indução em erro pode incidir no “… conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pelo profissional, a motivação da prática comercial (…) bem como a utilização de qualquer afirmação ou símbolo indicativos de que o profissional, o bem ou o serviço beneficiam, directa ou indirectamente, de patrocínio ou de apoio” já que, aqui se consagram situações exactamente inversas à que fundamenta a denúncia da Requerente;
– (viii) Pelo exposto, inexistindo a confundibilidade por parte do destinatário da mensagem, quanto à qualidade de patrocinador, não se vislumbra a violação do disposto sobre práticas comerciais desleais, sendo que a campanha da INTERMARCHÉ não constitui uma violação do princípio da livre e leal concorrência. (Cfr. artigos 4.º a 6.º do Decreto-lei n.º 57/2008).

2.3.3. Do invocado embuste de um bem sob patrocínio

Qualquer embuste de um bem sob patrocínio, in casu, o campeonato mundial de futebol, quando praticado através de publicidade, constituirá sempre um caso de violação do princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, por indução do destinatário em erro, quanto à qualidade do anunciante, independentemente de ser ou não conhecida e notória, a real extensão dos direitos que são abrigados pelo “chapéu de chuva” patrocínio;

Com efeito, não se conhecendo a abrangência de tais direitos, é o estabelecimento de uma eventual prática de publicidade enganosa que determinará a conclusão sobre a existência de um embuste de um bem sob patrocínio e não é a verificação deste último, a premissa para se considerar que se violou o princípio da veracidade em matéria de promoção de vendas ou se praticou publicidade desleal e ofensiva da livre e leal concorrência.

Ora, concluiu o Júri no ponto anterior, pela inexistência de uma prática de publicidade e de promoção de vendas enganosa quanto à qualidade do anunciante pelo que, forçosamente, terá que sustentar que a comunicação comercial da responsabilidade da INTERMARCHÉ, entendida no seu todo, não consubstancia um embuste de um bem sob patrocínio.

A Requerida está, porém, a associar-se ao momento do evento que não patrocina, aproveitando a sua realização para promover a venda de bens que comercializa. (Cfr. ponto 39 da contestação). Ocorre questionar se, mesmo quando se encontra estabelecido que não há susceptibilidade de confusão ou de engano dever-se-á, ainda assim, considerar uma outra fronteira: a da associação parasitária a um tema de publicidade reservado aos concorrentes?

Recorde-se que, aquando da realização do Euro 2004, foi um diploma específico, o Decreto–Lei nº 86/2004, de 16 de Abril, que proibiu a utilização directa ou indirecta, por qualquer meio de uma firma, denominação, marca ou outro sinal distintivo do comércio por quem não tivesse obtido autorização das entidades responsáveis pela realização da fase final do campeonato europeu, que sugerisse ou criasse a falsa impressão de que estava autorizada ou de alguma forma, associada ao acontecimento. Assim se regulava o chamado “Ambush Marketing”.

Ora, não só tal Lei já não se encontra em vigor, como os alegados direitos exclusivos da OLIVEDESPORTOS não constituem um facto público e notório, pelo que a resposta à questão colocada, terá que ser negativa no âmbito dos presentes autos.

Para o que milita, aliás, a própria redação do Artigo B2, Capítulo II, Parte II, do Código de Conduta, sob a epígrafe “Embuste do objecto de patrocínio”. Com efeito, a expressão “embuste” não é consentânea com a ausência de uma conduta dolosa. Na realidade, dispõe-se que, “Nenhuma parte deve procurar dar a entender que patrocina (…)”. (Negrito sublinhado do JE).

2.4. Conclusão

Improcedendo as razões invocadas pela OLIVEDESPORTOS quanto à confundibilidade da anunciante com um patrocinador da Selecção Nacional, bem como à susceptibilidade de indução dos consumidores em erro quanto a esse mesmo aspecto – e sem prejuízo de se reconhecer que a campanha da denunciada criou uma associação com o momento do campeonato mundial de futebol -, entende o Júri inexistirem indícios de desconformidade da comunicação comercial, entendida no seu todo, com o disposto nos artigos 4º, 5º e 27º do Capítulo I da Parte II, artigos A-1, alínea e) do artigo B-II, e artigo B2 do Capítulo II, Parte II, todos do Código de Conduta do ICAP, artigos 4.º e 7.º n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei nº 57/2008, de 26 de Março (“Regime Jurídico das Práticas Comerciais Desleais”) e artigo 317º do Código da Propriedade Industrial.

Não obstante, o Júri não quer deixar de vincar o que atrás referiu em sede de questões prévias: o cerne da apreciação da campanha publicitária objeto dos autos é o da ética publicitária, o que não prejudica a possibilidade de as Partes suscitarem e discutirem eventuais danos e, ou, prejuízos contratuais junto das competentes instâncias judiciais.

3. Decisão

Nestes termos, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, delibera no sentido da improcedência da queixa apresentada.».

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP

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9J / 2014 :: ACAP vs. Norauto

9J/2014

ACAP – Associação Automóvel de Portugal
vs.
Norauto Portugal

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no trigésimo dia do mês de Maio do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 9J/2014 tendo deliberado o seguinte:
Processo n.º 9J/2014
1.  Objecto dos autos
1.1.  A ACAP – ASSOCIAÇÃO AUTOMÓVEL DE PORTUGAL (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por ACAP ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a NORAUTO PORTUGAL, SA. (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por NORAUTO ou Requerida), relativamente a comunicação comercial ao seu serviço de revisão automóvel promovida pela comunicação social, nomeadamente no suporte rádio por alegada violação dos artigos 6. º, 7. º, nº 1, alínea c), nº 2, alínea b), e 8. º do Decreto-lei n. º 57/2008, de 26 de Março, bem assim como os artigos 5º, 7º, 9º, 15º e 27º do Código de Conduta do ICAP.
1.2.  Notificada para o efeito, a NORAUTO apresentou a sua contestação. Fê-lo, contudo, fora do prazo previsto no artigo 11º do Regulamento do Júri de Ética do ICAP, ultrapassando o mesmo em 1 (um) dia, pelo que a contestação não pode ser considerada para efeitos dos presentes autos.
1.3.  Dá-se por reproduzida a queixa e os documentos apresentados pela Queixosa.
2. Enquadramento e fundamentação ético-legal 
2. 1. Síntese da posição da parte queixosa
As posições da Queixosa podem ser sintetizadas como segue:
2. 1. 1. Queixosa
– A ACAP (Associação Automóvel de Portugal) representa a globalidade do Sector Automóvel, nas vertentes grossista e retalhista, incluindo-se aqui todas as marcas de automóveis e as respectivas redes de concessionários;
– A ACAP considera que a divulgação da campanha intitulada “Revisão Oficial – 40% que na marca” e/ou “Revisão Oficial 40% mais barata que na Marca” pela NORAUTO, se mencionam expressamente os concessionários como entidades que têm “facturas elevadas” com “valor final uma surpresa”;
– A ACAP entende que esse tipo de publicidade configura publicidade comparativa explícita e implícita aos serviços prestados pelas marcas de automóveis (nº 1 do artigo 16º, do Código da Publicidade (D.L. nº 330/90 de 23/10);
– A queixosa afirma que essa publicidade comparativa viola os critérios para que pudesse ser utilizada, em violação do disposto no nº 2 do artigo 16º, do Código da Publicidade (D.L. nº 330/90 de 23/10) nomeadamente:
a)  Não trata objectivamente as características essenciais, pertinentes, comprováveis e representativas dos serviços prestados pelas marcas, incluindo o preço pois, ambas as campanhas, não referem quais os critérios utilizados para a obtenção de determinado preço praticado nas marcas (alínea c) do nº 2 do artigo 16º do Código da Publicidade);
 – Sustenta que tal sucede já que as diferentes marcas na prestação dos seus serviços praticam preços diferenciados de acordo com a marca em causa e dentro de cada marca, de acordo com o respectivo modelo e versão do veículo, respeitando, diz, sempre a legislação em vigor sobre a afixação de preços, a qual exige referência ao critério utilizado, Decreto-Lei nº 162/99, de 13.05; Portaria nº 797/93, de 06.09; Portaria nº 99/91, de 02.02; Decreto-Lei nº 138/90, de 26.04);
– A ACAP afirma que a campanha desacredita e deprecia marcas, gera confusões nos profissionais e nos consumidores, quando refere falta de transparência e que a factura emitida pela marca nunca é igual ao orçamento (alínea d) e e) do nº 2 do artigo 16º do Código da Publicidade);
– A queixosa sustenta que a veiculada pela empresa NORAUTO é enganosa (prática comercial desleal, nos termos do D.L. nº 57/2008 de 26/03, pois distorce ou é susceptível de distorcer o comportamento económico do consumidor destinatário (referência do homem médio), contendo práticas comerciais enganosas e agressivas, nos termos do artigo 5º e 6º do diploma mencionado), (alínea a) do nº 2 do artigo 16º do Código da Publicidade);
– Considera ainda que a empresa NORAUTO, com a campanha “Revisão Oficial – 40% que na marca” ou “Revisão Oficial 40% mais barata que na Marca”, é igualmente passível de confundir o consumidor, pois também opera no mercado sem ser representante de marcas de automóveis;
– Mais afirma que a campanha “Revisão Oficial” da NORAUTO induz ou é susceptível de induzir em erro o consumidor, fazendo-o crer que se trata de representantes de marcas automóveis a prestar o serviço (Reparador Autorizado), o que configura prática comercial desleal, incluindo publicidade desleal, nos termos do artigo 6º do D. L. nº 57/2008 de 26/03;
– Sustenta que as campanhas “Revisão Oficial – 40% que na marca” ou “Revisão Oficial 40% mais barata que na Marca”, da NORAUTO são susceptíveis de induzir em erro o consumidor, ao utilizarem a afirmação “Revisão Oficial”, indicativo de que o serviço beneficia directa ou indirectamente de patrocínio ou de apoio, o que configura prática comercial enganosa prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 7º do D.L. nº 57/2008 de 26/03;
– Mais afirma que, as campanhas promovem comercialmente um serviço que cria confusão com serviços de concorrentes, no caso, reparadores autorizados e representantes oficiais das marcas de automóveis o que configura igualmente prática comercial enganosa prevista na alínea b) do nº 2 do artigo 7º do D.L. nº 57/2008 de 26/03;
– Sustenta, também, que a campanha da NORAUTO “Revisão Oficial – 40% que na marca” é susceptível de induzir em erro o consumidor, ao utilizar a afirmação “Revisão Oficial”, dando a entender que os seus serviços foram aprovados, reconhecidos ou autorizados por, no caso, organismo privado, quando tal não corresponde à verdade, o que configura a violação da alínea d) do artigo 8º do D.L. nº 57/2008 de 26/03, constituindo assim igualmente uma prática comercial enganosa;
– Mais considera que a natureza da publicidade da campanha acima mencionada, para além da violação dos artigos supra referidos, viola, em geral, diversos artigos do Código de Conduta do ICAP e do Código da Publicidade, solicitando que seja imediatamente retirada toda a publicidade sobre a campanha “sobre a campanha promovida pela NORAUTO “Revisão Oficial – 40% que na marca” ou “Revisão Oficial 40% mais barata que na Marca”.
2. 2. O Artigo 16º (Publicidade comparativa) do Código da Publicidade dispõe que
“1 – É comparativa a publicidade que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente.”
Mais estipula que
” 2 – A publicidade comparativa, independentemente do suporte utilizado para a sua difusão, só é consentida, no que respeita à comparação, desde que respeite as seguintes condições:
a) Não seja enganosa, nos termos do artigo 11º;
b) Compare bens ou serviços que respondam às mesmas necessidades ou que tenham os mesmos objectivos;
c) Compare objectivamente uma ou mais características essenciais, pertinentes, comprováveis e representativas desses bens ou serviços, entre as quais se pode incluir o preço;
d) Não gere confusão no mercado entre os profissionais, entre o anunciante e um concorrente ou entre marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens ou serviços do anunciante e os de um concorrente;
e) Não desacredite ou deprecie marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens, serviços, actividades ou situação de um concorrente;
f) Se refira, em todos os casos de produtos com denominação de origem, a produtos com a mesma denominação;
g) Não retire partido indevido do renome de uma marca, designação comercial ou outro sinal distintivo de um concorrente ou da denominação de origem de produtos concorrentes;
h) Não apresente um bem ou serviço como sendo imitação ou reprodução de um bem ou serviço cuja marca ou designação comercial seja protegida.
3 – Sempre que a comparação faça referência a uma oferta especial deverá, de forma clara e inequívoca, conter a indicação do seu termo ou, se for o caso, que essa oferta especial depende da disponibilidade dos produtos ou serviços.
4 – Quando a oferta especial a que se refere o número anterior ainda não se tenha iniciado deverá indicar-se também a data de início do período durante o qual é aplicável o preço especial ou qualquer outra condição específica.
5 – O ónus da prova da veracidade da publicidade comparativa recai sobre o anunciante.
4.  Assim, e no que concerne ao disposto na alínea c) do nº 2, a licitude da publicidade comparativa depende do preenchimento dos seguintes requisitos:
a)  Comparação de uma ou mais características dos bens ou serviços (pode ser só uma delas);
b)  Características devem ser essenciais, pertinentes, comprováveis e representativas desses bens ou serviços.”.
É entendimento do JE que, na realidade, se está nos presentes autos perante publicidade comparativa, sendo que a mesma pode ter como base o preço pelo que, qualquer referência ao já aludido preço, não implicaria, por si só, a existência de qualquer situação menos passível de ser enquadrada legalmente, uma vez que o preço, na verdade, se assume como uma das características passíveis de serem comparadas.
Acontece que, nos presentes autos, o anunciante não logrou, como era seu mister, fazer prova relativamente à veracidade da publicidade comparativa, dado que não apresentou em tempo oportuno a competente contestação, não carreando, pois, para os autos, quaisquer tipo de provas que lhe permitissem sustentar a aludida publicidade comparativa por si veiculada, ónus que sobre si recaía, nos termos do acima citado nº 5 do artigo 16º do Código da Publicidade e artº 15º do Código de Conduta do ICAP.
Nestes termos, veiculou o anunciante publicidade comparativa ilícita, por violação do supracitado dispositivo legal, desta forma se encontrando igualmente violado o Artigo 9º (princípio da veracidade) do Código de Conduta do ICAP.
3. Decisão
Termos em que a 1ª Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da NORAUTO em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto no artigos 9º e 15º do Código de Conduta do ICAP e no nº 5 do artigo 16º do Código da Publicidade, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais – caso se mantenham os tipos de ilícito apurado pelo JE.».
O Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP
Auto Regulação9J / 2014 :: ACAP vs. Norauto
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8J / 2014 :: ACAP vs. MIDAS

8J/2014

ACAP – Associação Automóvel de Portugal
vs.
MIDAS Portugal

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no vigésimo sexto dia do mês de Maio do ano de dois mil e catorze, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 8J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 8J/2014

1.   Objecto dos autos

1.1. A ACAP – ASSOCIAÇÃO AUTOMÓVEL DE PORTUGAL (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por ACAP ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante abreviada e indiscriminadamente designado por Júri ou JE) apresentar queixa contra a MIDAS PORTUGAL NÚMERO UM, SA. (adiante abreviada e indiscriminadamente designada por MIDAS ou Requerida), relativamente a comunicação comercial ao seu serviço de revisão automóvel promovida em suporte rádio, por alegada violação dos artigos 5.º, 7.º, 9.º, 15.º e do Código de Conduta do ICAP, bem como dos artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade o último, com a redacção introduzida pelos artigos 6.º, 7.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 8.º do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março.
Notificada para o efeito, a MIDAS apresentou tempestivamente a sua contestação.

Dão-se por reproduzidas a queixa, a contestação e os documentos apresentados pelas Partes.

1.2. Questão prévia

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 9.º do Regulamento do JE, sob a epígrafe “Petição”, “A queixa deverá ser feita por escrito, devendo o queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados, expor os factos e a fundamentação, tão sintética quanto possível, indicar as disposições do Código de Conduta do ICAP, e, ou, outras fontes que considere infringidas e formular com clareza a sua pretensão, salvo quando apresentada por consumidor nos temos definidos na Lei de Defesa do Consumidor”. (Negrito e sublinhado do JE).

Esta é, aliás, uma prática sobre a qual o JE teve já a oportunidade de se pronunciar, designadamente, no âmbito dos Processos 8J/2009, 17J/2009, 2J/ 2010, 16J/2012 e 4J/2014 do ICAP.

Ora, refere a Requerente em sede de queixa que estão em causa alegações publicitárias como “A Revisão Oficial até 40% mais barata que na marca”, e que “…nos referidos anúncios, se mencionam expressamente os concessionários como entidades que têm “facturas elevadas” com “valor final uma surpresa”, referindo, a MIDAS, que a sua “factura é igual ao orçamento”” (sic), alegações essas e suportes esses de que não produz prova.

Com efeito, o único suporte reproduzido em documento em cd-rom junto à petição, é o de rádio. Por outro lado, do mesmo consta, somente, um spot com os claims “Novo – A Revisão Oficial” e “A revisão oficial Midas é sempre mais barata do que na marca…”.

Em conformidade, apenas nestes, incidirá a presente decisão.

1.3.   Dos factos ou das alegações publicitárias

A comunicação comercial em análise nos presentes autos é composta por um  spot publicitário radiofónico, encontrando-se em crise, as alegações publicitárias “Novo – A Revisão Oficial” e “A revisão oficial Midas é sempre mais barata do que na marca…”.  (Cfr. documento em CD rom junto à queixa).

1.4. Das alegações das Partes

1.4.1. Em resumo, a ACAP refere na sua queixa que, a MIDAS difunde publicidade comparativa enganosa, desonesta, desleal e ofensiva do princípio ético da responsabilidade social, considerando que:

– (i) “…a publicidade veiculada pela MIDAS, se refere a uma redução de preço dos serviços prestados em determinada percentagem “mais baratos que na marca”, a qual, “…configura publicidade comparativa explícita e implícita aos serviços prestados pelas marcas de automóveis (nº 1 do artigo 16º, do Código da Publicidade em violação do disposto no nº 2 do artigo 16º, do Código da Publicidade…” (sic);

– (ii) “…o slogan “A Revisão Oficial”, é passível de confundir o consumidor quanto à natureza do serviço prestado, dado tratar-se de uma empresa que opera no mercado sem representar as marcas de automóveis” e “…induz ou é susceptível de induzir em erro o consumidor, fazendo-o crer que se trata de representante de marcas automóveis a prestar o serviço (Reparador Autorizado)”. (sic).

1.4.2. Na sua contestação, a MIDAS contradita a argumentação da ACAP, sustentando a veracidade, a honestidade e a responsabilidade social inerente à sua comunicação comercial alegando, em síntese, que:

– (i) “ O conteúdo da campanha Midas tal como já foi feito noutros países da União Europeia pela Midas desde 2010 e sem qualquer impedimento, bem como em várias marcas no mercado português, enquadra-se no Regulamento da União Europeia Nº 461/2010 da Comissão, de 27 de Maio de 2010…” (sic. § 2.º);

– (ii) “ A terminologia “oficial” refere-se à realização da revisão de acordo com o plano de manutenção oficial das marcas automóveis”, acrescentando que, “Este termo tem sido utilizado de uma forma comum no mercado português e europeu  nos últimos anos e existem campanhas como a “Repare bem. Repare onde quiser” da DPAI que contribuem para o esclarecimento dos consumidores”. (sic. § 3.º).

2. Enquadramento ético-legal 

2.1.   Da alegada prática de publicidade ofensiva dos princípios da veracidade, da honestidade, da responsabilidade social e da livre e leal concorrência.

Nos termos do artigo 4.º do Código e Conduta do ICAP, sob a epígrafe “Princípios Fundamentais”, “Todas as comunicações comerciais devem ser legais, decentes, honestas e verdadeiras” (1) e “…devem ser concebidas com o sentido de responsabilidade social e profissional e (…) ser conformes aos princípios da leal concorrência, tal como estes são
comummente aceites em assuntos de âmbito comercial” (2).

Segundo o disposto nos artigos 5.º e 7.º, n.º 1 do Código de Conduta do ICAP, e respectivamente, “A comunicação comercial deve respeitar os valores, direitos e princípios reconhecidos na Constituição e na restante legislação aplicável” e “…deve ser concebida de forma a não abusar da confiança dos consumidores e a não explorar a sua falta de conhecimento ou de experiência”.

Por seu turno, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 9.º do mesmo Código, sob a epígrafe “Veracidade” – que encontra correspondência nos artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade (o último, de acordo com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março), a última deve proscrever toda a declaração ou apresentação que, directa ou indirectamente, por via de omissões ou ambiguidades, bem como por virtude de todos e quaisquer exageros apresentados induza ou seja susceptível de induzir em erro o destinatário, “…nomeadamente no que se refere a: a) Características do bem ou serviço, como a natureza (…) possibilidades e resultados da utilização (…).”. (sublinhado e negrito da responsabilidade do JE).

Em conformidade com o artigo 10.º do Código da Publicidade, esta “…deve respeitar a verdade, não deformando os factos” (cfr. n.º1), devendo as “…afirmações relativas à origem, natureza, composição e condições de aquisição dos bens ou serviços publicitados…” ser “…exactas e passíveis de prova, a todo o momento, perante as instâncias competentes” (cfr. n.º 2.), considerando-se publicidade enganosa em sede do n.º 1 do artigo 11.º daquele diploma legal, aquela que ”…seja enganosa nos termos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março, relativo às práticas comerciais desleais das empresas nas relações com os consumidores.”

Ora, nos termos do n.º 1, alínea c) e n.º 2, alínea b) do artigo 7.º daquele Decreto-Lei, e respectivamente, “É enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo: (1.) (…), tais como (…) O conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pelo profissional, a motivação da prática comercial e a natureza do processo de venda, bem como a utilização de qualquer afirmação ou símbolo indicativos de que o profissional, o bem ou o serviço beneficiam, directa ou indirectamente de patrocínio ou de apoio; (c)) sendo, igualmente (2) “…enganosa a prática comercial que envolva (…) O incumprimento pelo profissional de compromisso efectivo decorrente do código de conduta a que está vinculado no caso de ter informado, na prática comercial, de que se encontra vinculado àquele código” (b).

Segundo o disposto no artigo 8.º, alínea d) do Decreto-lei a que o Júri se reporta, “São consideradas enganosas em qualquer circunstância” as práticas comerciais que consistam em “…Afirmar que um profissional, incluindo as suas práticas comerciais, ou um bem ou serviço foram aprovados reconhecidos ou autorizados por um organismo público ou privado quando tal não corresponde à verdade ou fazer tal afirmação sem respeitar os termos da aprovação, do reconhecimento ou da autorização”. Por sua vez, estatui-se no artigo 6.º, alínea b) do Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março que, “São desleais em especial (…) “As prática comerciais enganosas e as práticas comerciais agressivas referidas nos artigos 7.º, 9.º e 11.º”.

No que tange ao claim “Novo – A Revisão Oficial”, constitui posição do JE que, o termo “oficial” é susceptível de significar “emanado do governo ou de uma autoridade administrativa reconhecida”; “certificado pela autoridade pública ou por uma autoridade competente” (…); “reconhecido como o principal entre outros que têm o mesmo papel.

Assim, entende o Júri que, a expressão “oficial” – no contexto do claim objecto da questão controvertida – permite o entendimento por parte do consumidor médio, razoavelmente atento, esclarecido e informado que, a revisão automóvel comunicada é efectuada pela MIDAS de acordo com os ditames da marca do fornecedor do veículo que estiver em causa, mediante certificação deste, funcionando tal expressão, deste modo, como um “sinal distintivo”.

De onde, sustenta o JE que, o termo “oficial” é um dos possíveis sinónimos de “autorizada” e que, por maioria de razão, o claim “REVISÃO OFICIAL” – na mente do respectivo destinatário  equivalerá a “REVISÃO AUTORIZADA” (de acordo com o REGULAMENTO junto aos autos com a contestação) pelo fornecedor de veículos a motor cuja marca a oficina que assim opere possa legitimamente representar para o efeito em apreço: o de revisão conforme com as especificações do livro de manutenção.

Com efeito, nos termos do Artigo 1.º, n.º 1, alínea c), sob a epígrafe “Definições” (sistematicamente inserido no capítulo DISPOSIÇÕES COMUNS), do REGULAMENTO, e para efeitos deste “…entende-se por (…) “oficina de reparação autorizada, o prestador de serviços de reparação e manutenção de veículos a motor que exerce as suas actividades no âmbito de um sistema de distribuição criado por um fornecedor de veículos a motor.”

Assim, o cerne da questão controvertida reside no facto de a comunicação comercial da responsabilidade da Requerida permitir o entendimento por parte do consumidor médio de que, o conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pela Requerida, bem como a motivação da respectiva prática comercial, são os mesmos que adviriam de uma contratação de serviços ao fornecedor do veículo ou a “oficina de reparação autorizada” pelo mesmo fornecedor.

Logo, a comunicação em termos de “revisão oficial” ou “autorizada” dos serviços prestados pela MIDAS, é susceptível de determinar uma decisão de transacção que, na ausência de tal sinal distintivo, poderia não ser tomada.

De onde, impendia sobre a Requerida, o ónus da prova:

– (i) de que os serviços que comunica através do claim “REVISÃO OFICIAL” são prestados no âmbito de um sistema de distribuição criado pelos fornecedores de veículos a motor que a ACAP representa;
ou,

– (ii) de que, na ausência de tal sistema de distribuição, o consumidor médio entendido de acordo com a acepção já enunciada -, colocado perante o lema da campanha “Novo – A Revisão Oficial” entenderá, sem margem para interpretações diversas, que o termo ou sinal distintivo ”oficial” se reporta, somente, aos serviços de revisão, de acordo com o plano de manutenção oficial das marcas automóveis” e não, ao apoio prévio destas, em termos de credenciação pela marca.

Com efeito, nos termos do disposto no artigo 12.º do Código de Conduta, “As descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser susceptíveis de comprovação” (1) e “Esta comprovação deve estar disponível de maneira que a prova possa ser prontamente apresentada por mera solicitação do ICAP”. (2).
Por outro lado, porque foi entendido quer pelo legislador português, quer pela União Europeia (cfr. Directivas 84/450/CEE e 97/55/CE) que, como norma de instrução em matérias de observância do princípio da veracidade, se devia instituir uma regra de direito probatório (cfr. actual n.º 3 do artigo 11.º) nos termos da qual se presumem como inexactos os dados referidos pelo anunciante na falta de apresentação de provas ou na insuficiência das mesmas, no que, aliás, o articulado do citado artigo 12.º, n.º 2 do Código de Conduta do ICAP se encontra em consonância, há que aferir da bondade da prova junta ao autos pela MIDAS, no que tange aos dados de facto alegados na sua comunicação comercial e susceptíveis de serem apreendidos pelo consumidor médio, nos termos expendidos supra.

Ora, no que se refere à prova junta aos autos pela MIDAS, entende o Júri que esta não é molde a comprovar que os serviços que comunica através do claim “REVISÃO OFICIAL”:

– (i) são prestados, através de preços mais baratos, no âmbito de um sistema de reparação criado pelos fornecedores de veículos a motor que a ACAP representa (cfr. § 1.º da queixa);
ou

– (ii) que o consumidor médio entendido de acordo com a acepção já enunciada -, colocado perante o lema da campanha “Novo – A Revisão oficial” entenderá, sem margem para interpretações diversas, que o termo ou sinal distintivo ”oficial” se reporta, somente, aos serviços de revisão, de acordo com o plano oficial das marcas automóveis e não, ao apoio prévio destas, em termos de credenciação pela marca.

Em conformidade com o exposto, entende o JE que a comunicação comercial da responsabilidade da MIDAS consubstancia uma prática de publicidade enganosa em qualquer circunstância e desleal, por se encontrar desconforme com os princípios ético-legais da veracidade e da livre e leal concorrência, concretamente, por ofensa ao disposto nos artigos 4.º, 5.º, 7.º, n.º 1, 12.º, 9.º, nºs 1 e 2, alínea a) do Código de Conduta do ICAP, bem como nos artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade – este, com a redacção dos artigos 6.º, alínea b) 7.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, alínea b) e 8.º, alínea d) introduzida pelo Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março.

2.2. Da alegada prática de publicidade comparativa ilícita

Considera a ACAP na sua petição que a comunicação comercial “…veiculada pela MIDAS, se refere a uma redução de preço dos serviços prestados em determinada percentagem “mais baratos que na marca” (sic) traduzindo uma prática de publicidade comparativa ilícita, encontrando-se em lide o claim “A revisão oficial Midas é sempre mais barata do que na marca…”.

Nos termos do disposto no artigo 15.º do Código de Conduta do ICAP, “É comparativa a comunicação comercial que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente” (n.º 1) e “Na comunicação comercial comparativa, a comparação deve: (…) “não gerar confusão no mercado entre o anunciante e um concorrente ou entre marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens ou serviços do anunciante ou de um concorrente” (n.º 2, alínea e)) e, “não retirar partido indevido do renome de uma marca, designação comercial ou outro sinal distintivo de um concorrente ou da denominação de origem de produtos concorrentes” (n.º 2, alínea h)).

Segundo o autor espanhol Anxo Tato Plaza, para que ocorra uma prática e publicidade comparativa “…deve existir, para além da referência genérica a todos os restantes concorrentes, uma referência inequívoca a um ou vários concorrentes” devendo atender-se “ao sentido que o público receptor da mensagem publicitária dê a este (…). Isto é, quando o público destinatário da mensagem entenda esta como uma comparação com um ou vários concorrentes determinados e identificáveis.” (vd. Anxo Tato Plaza in “La Publicidad Comparativa”, Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales, S.A. Madrid, 1996, p.52).

Ora, entende o JE que, colocado perante o lema da MIDAS “A revisão oficial Midas é sempre mais barata do que na marca…”, o consumidor médio poderá:

– não optar por fazer a revisão do seu automóvel no respectivo fornecedor este, para o mesmo consumidor médio, obviamente tido como concreto, determinado e identificável pelo nome de marca do veículo que possui e, efectuá-la na MIDAS;
ou

– não optar por fazer a revisão do seu automóvel na “oficina de reparação autorizada” pelo respectivo fornecedor, aquela, para o mesmo consumidor médio, obviamente tida como concreta, determinada e identificável por um nome de marca do veículo e, efectuá-la na MIDAS.Na realidade, analisado o conteúdo da comunicação comercial, por referência à alegação publicitária objecto da questão controvertida, entende o Júri estar-se em presença de uma prática de publicidade comparativa implícita entre os serviços de revisão automóvel prestados pela MIDAS e as “oficinas de reparação autorizada” que exercem as suas actividades no âmbito de um sistema de distribuição criado por um fornecedor de veículos a motor ou os prestados pela marca destes últimos passíveis de serem inequivocamente determinadas enquanto tais, por parte do consumidor médio.

Com efeito, não obstante não se tratar aqui de uma comparação entre marcas de uma mesma categoria de serviços concorrentes, constitui entendimento do Júri que, quer os serviços prestados pela MIDAS, quer os facultados pelas “oficinas de reparação autorizada”, quer ainda os prestados pelos próprios fornecedores de veículos a motor, podem propiciar – em sede do que se poderá apelidar de “intersecção significativa” -, a satisfação de pelo menos uma necessidade igual dos consumidores que pretendam contratar a revisão do seu veículo, em conformidade “com as especificações do respectivo livro de manutenção.”

Em coerência, quer por virtude de tal “intersecção significativa” de necessidades e objectivos iguais verificada, quer em razão dos próprios normativos referidos conclui-se que, no âmbito desse “nicho” – e na senda da melhor doutrina em matéria de comunicação empresarial – os serviços de revisão automóvel prestados pela MIDAS são concorrentes quer dos facultados pelas “oficinas de reparação autorizada”, quer dos prestados pelos próprios fornecedores de veículos a motor.

Considera assim o JE que, o caso vertente consubstancia uma prática de publicidade comparativa implícita desconforme com a respectiva moldura ético-legal, atenta a possibilidade de confusão no mercado entre o anunciante MIDAS e um concorrente ou, entre marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens ou serviços de um concorrente ou de concorrentes (cfr. art.º 15.º, n.º 2, alínea e) do Código de Conduta do ICAP), in casu, o sinal distintivo “REVISÃO OFICIAL”. Com efeito, a adopção deste (equivalente ao de revisão autorizada, como se concluiu supra) – em sede de certas categorias de acordos verticais e de práticas concertadas no sector dos veículos automóveis, nos termos do artigo 1.º, n.º 1, alínea c) do REGULAMENTO (UE) N.º 461/2010 DA COMISSÃO de 27 de Maio de 2010 – é reservada aos “prestadores de serviços que exerçam as suas actividades no âmbito de um sistema de distribuição criado por um fornecedor de veículos a motor” (sic), o que a MIDAS não logrou provar, no que tange à sua actividade. Mutatis mutandis, a comunicação comercial da responsabilidade da Requerida encontra-se igualmente desconforme com o disposto no referido artigo 15.º, n. 2, alínea h) do Código de Conduta, nos termos do qual uma prática de publicidade comparativa não pode “…retirar partido indevido do renome de uma marca, designação comercial ou outro sinal distintivo de um concorrente ou da denominação de origem de produtos concorrentes”.

3. Decisão

Termos em que a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da MIDAS, em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto nos disposto nos artigos 4.º, 5.º, 7.º, n.º 1, 12.º, 9.º, nºs 1 e 2, alínea a) e 15.º, n.º 2, alíneas e) e h) do Código de Conduta do ICAP, bem como nos artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade – este, com a redacção dos artigos 6.º, alínea b) 7.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2, alínea b) e 8.º, alínea d) introduzida pelo Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais – caso se mantenha o tipo de ilícito apurado pelo JE.».

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP

Auto Regulação8J / 2014 :: ACAP vs. MIDAS
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7J / 2014 :: Lactogal Produtos Alimentares vs. FIMA Produtos Alimentares

7J/2014

Lactogal, Produtos Alimentares
vs.
FIMA, Produtos Alimentares

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no vigésimo sexto dia do mês de Maio do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 7J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 7J/2014

1. Objecto dos autos

1.1. A LACTOGAL – PRODUTOS ALIMENTARES, S.A., (adiante abreviada e indiferentemente designada por LACTOGAL, Requerente ou Queixosa) veio, junto do Júri de Ética Publicitária do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a FIMA – PRODUTOS ALIMENTARES, SA., (adiante abreviada e indiferentemente designada por designada por FIMA ou Requerida), relativamente à comunicação comercial do produto “FLORA” que a última produz, difundida em vários suportes (spot publicitário, folheto promocional e rotulagem) por, segundo a queixosa: constituir uma prática comercial desleal, sob a forma da acção enganosa (cfr. als. a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março); violar os princípios da legalidade, da veracidade e da proibição da comparação enganosa (cfr. arts. 5º, 9º e 15º do Código de Conduta do ICAP) bem como, ainda, as regras comunitárias a que deve obedecer o uso de alegações nutricionais (cf. art.º. 8º, n.º 1 do Regulamento (CE) nº 1924/2006 do Parlamento e do Conselho de 20 de Dezembro de 2006) e as regras comunitárias e nacionais a que deve obedecer a rotulagem e publicidade dos géneros alimentícios, (cf. alínea a) do n.º 1 do art.º. 2º da Directiva 2000/13/CE, de 20 de Março, art.º. 23º, n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 560/99, de 18 de Dezembro).

1.2. Notificada para o efeito, a FIMA apresentou a sua contestação tendo suscitado, como questão prévia, a pré-existência de queixa e deliberação do JE (processo nº 4J/2014) relativamente ao mesmo objeto da comunicação comercial, o produto “FLORA”, os mesmos claims e suportes, embora com Partes distintas já que, aqueloutro processo, tem como queixosa a FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A. – COMUNICAÇÕES PESSOAIS, S.A e como demandada a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS, Lda.

1.3. Em 6 de maio de 2014, no âmbito do presente processo n.º 7J/2014, ao abrigo do disposto no artigo 12º e 11º nº 2 do Regulamento do JE, o JE deliberou que as Partes fossem notificadas para, no prazo de dois dias úteis, viessem aos autos informar, primeiro a queixosa, se mantinha a queixa (temporalmente anterior à deliberação do JE) e, seguidamente, a demandada, quanto aos termos de tal pronúncia subsequente.

1.4. Em resultado das diligências complementares, a queixosa LACTOGAL veio confirmar a queixa apresentada e a FIMA nada mais acrescentou.

1.5. Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes, bem como a deliberação precedente do JE e a resposta das Partes.

2. Síntese da posição das partes

2.1. Síntese da queixa

A LACTOGAL, na sua queixa, alega, em síntese que:

2.1.1. “A FIMA acaba de efetuar o lançamento de um creme vegetal denominado FLORA DERRETE-TE. ” (cf. art.º 3º) e “(…) decidiu fazer, por diversas vias (spot publicitário, folheto promocional e rotulagem), a comparação daquele creme vegetal com a manteiga, criando no consumidor a ideia (falsa) de que a FLORA DERRETE-TE é “um tipo de manteiga com menos gordura”. (cf. art.º 4º) porquanto, “A publicidade, a rotulagem e o folheto promocional omitem a referência aos identificadores do creme vegetal, dando protagonismo a qualidades essenciais da manteiga – a sua denominação, o seu sabor, a sua origem – criando uma imagem errada junto do consumidor, quer quanto à verdadeira tipologia de produto anunciado, quer quanto às características da própria manteiga (…)” (cf. art.º 5º).

2.1.2. Distinguindo os suportes em causa, alega a queixosa que, quanto ao “FILME QUE SUPORTA A CAMPANHA PUBLICITÁRIA”, em que se ouve “Flora … Flora … Flora …Quem é a Flora?… com leite dos Açores e tão saborosa, Só podia ser Flora” (cf. art.º. 7º e doc. n.º 1) “(…) em momento (…) é feita referência à denominação verdadeira do produto publicitado (margarina ou creme vegetal).” sendo que “A alegação “Com leite dos açores” consente, de forma direta e imediata, a colagem da origem, do sabor e do aporte nutricional do creme vegetal em causa àquela Região portuguesa, conhecida pela produção/origem de lacticínios, nomeadamente de manteiga.” (cf. art.º. 8º e 9º).

Segundo a queixosa, “(…) a “origem Açores” não é, evidentemente, reduto da margarina ou do creme vegetal, mas antes, da manteiga e de outros lacticínios ali produzidos, como é o caso da manteiga “Milhafre”. (cf. art.º. 11º), defendendo que “(…) a alegação “Com leite dos açores” é, por si só, suscetível de criar no consumidor médio – aquele “normalmente informado e razoavelmente atento e avisado” – uma comparação enganosa com a manteiga, induzindo-o em erro quanto à indevida semelhança daquela com o creme vegetal em causa, como do mesmo produto se tratasse.” (cf. art.º. 17º) “(…) a imagem e ouvimos o estaladiço do pão quente, a dele ser tirado um naco à mão e o mesmo barrado com o produto publicitado, que naquele se derrete (…) uma colagem (leia-se: comparação) da FLORA DERRETE-TE (creme vegetal) à manteiga, pois a imagem em causa está habitualmente ligada à manteiga – o pão quente, estaladiço a ser barrado com manteiga.” (cf. art.º 18º e 19º).

“O spot (…) é, através da alegação “Com leite dos Açores” e da imagem do pão quente, suscetível de induzir o consumidor em erro quanto à natureza, características e origem geográfica do creme vegetal publicitado.” (cf. art.º 22º) o que “(…) configura prática comercial desleal, sob a forma da ação enganosa (cfr. als. a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março).” e “(…) suscetíveis de consubstanciarem violação dos princípios da legalidade, da veracidade e da proibição da comparação enganosa (cfr. arts. 5º, 9º e 15º do Código de Conduta do ICAP).“ (cf. art.º 23º e 24º).

2.1.3. Quanto à “ROTULAGEM DA EMBALAGEM FLORA DERRETE-TE”, refere a queixosa que: “(…) na parte lateral da embalagem está inscrita a seguinte alegação nutricional comparativa: “se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura” e, defende, trata-se duma alegação nutricional que: “(…) não respeita as regras comunitárias que consentem a sua utilização (cfr. arts. 8º, n.º 1 do Regulamento (CE) nº 1924/2006 do Parlamento e do Conselho, de 20 de Dezembro).” e que: “(…) não é verdadeira, uma vez que este produto apresenta na rotulagem valores de gorduras saturadas reduzidos em 22% e 14% face à Manteiga Mimosa e à manteiga TCA, respetivamente, para além de ter 79% de gordura (docs. n.os 5 e 6 que adiante se juntam).” (cf. art.º 26º a 28º).

Conclui que: “(…) a alegação “Com leite dos Açores” configura prática comercial desleal (…), tal como sucede com a outra alegação, pelo facto de a comparação com a manteiga ser suscetível de induzir o consumidor em erro quanto á origem e natureza do creme vegetal FLORA DERRETE-TE”. (cf. art.º 32º) o que viola, no entendimento da queixosa, e “(…) quanto ao modo de apresentação da rotulagem e publicidade de produtos alimentícios, pois criam a impressão errada no consumidor quanto às características do género alimentício, concretamente sobre a sua natureza, origem e proveniência, constituindo contraordenação (cfr. al. a) do número 1 do artigo 2º da Diretiva 2000/13/CE, de 20 de Março, al. a) do n.º 1 do art. 23º e al. b) do n.º 1 do art. 28º do Decreto-Lei n.º 560/99 de 18.12 e Parte XVI do Anexo I do Regulamento (CE) nº 1234/2007, do Conselho, de 22 de Outubro).” e “(..) a violação dos princípios da legalidade, da veracidade e da proibição da comparação enganosa (cfr. arts. 5º, 9º e 15º do Código de Conduta do ICAP).”.

2.1.4. Quanto ao “FOLHETO PROMOCIONAL DA FLORA DERRETE-TE”, diz a queixosa que o mesmo, para além de repetir algumas das alegações já postas em causa: “(…) a alegação “a pensar nos verdadeiros apreciadores de manteiga” evidencia, de forma clara e descarada, a colagem que a FIMA faz à manteiga, neste caso concreto, indo ao cúmulo de querer identificar – mais que comparar – o creme vegetal em causa como sendo uma manteiga!” (cf. art. 37º) “(…) perpassando para o consumidor – para os “verdadeiros apreciadores de manteiga” – a ideia de que se trata de “um tipo de manteiga e com menos gordura”.“ (cf. art. 38º) concluindo que “(…) o folheto promocional em apreço constitui prática comercial desleal, sob a forma de ação enganosa p.p. como contraordenação, nos termos das als. a) e b) do n.º 1 do art. 7º e n.º 1 do art. 21º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março. (…) princípios da legalidade, da veracidade e da proibição da comparação enganosa (cfr. arts. 5º, 9º de 15º do Código de Conduta do ICAP).” (cf. art. 40º e 41º).

2.1.5. Após subsunção dos factos às normas jurídicas que entende terem sido violadas, a queixosa apresenta com precisão seu pedido ao JE, a saber:

“ a) Sejam as alegações (i) “com leite dos Açores”, (ii) “se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga saturada a 82% de gordura”, (iii) “a pensar nos verdadeiros apreciadores de manteiga”, bem como a imagem do pão quente, a dele ser tirado à mão um naco e o mesmo barrado com o produto publicitado, que naquele se derrete, declaradas ilegais, em virtude de violarem, respetivamente, o disposto nos arts. 8º, nº 1 do Regulamento (CE) nº 1924/2006 do Parlamento e do Conselho de 20 de Dezembro, nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 7º do Decreto-Lei n.º 57/2008, no art. 23º, n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 560/99 e nos arts. 5º, 9º e 15º do Código de Conduta do ICAP;
b)Seja, consequentemente, ordenado o expurgo daquelas alegações e imagem da campanha publicitária e do folheto através das quais a FIMA vem promovendo a FLORA DERRETE-TE, bem como da rotulagem da sua embalagem. “

2.2. Síntese da contestação

A demandada, na sua defesa:

2.2.1. Conclui pela “inutilidade superveniente da queixa apresentada pela LACTOGAL” sustentando que deverá ser “negado provimento ao pedido de declaração de ilegalidade da publicidade do creme para barrar FLORA”, sustentando que “(..) não se vislumbra nenhum dado novo, nenhum enfoque inovador (até pelo contrário, como adiante se referirá) para as questões já suscitadas pela FROMAGERIES BEL PORTUGAL, S.A., perante o ICAP, e que foram decididas, e bem, no âmbito do processo 4J/2014.” entendendo, que “(…) todas as questões ali resolvidas [processo 4J/2014], são exactamente as mesmas das agora em apreço, com duas excepções: a da alegada colagem/comparação à imagem do pão a ser barrado e a que se refere a alegações nutricionais.” (cf. art.º 2º e 3º).

2.2.2. Refere a demandada que, relativamente aos dois aspetos que identifica como novos relativamente aos apreciados anteriormente pelo JE:

“A primeira, de uma imagem “habitualmente ligada à manteiga”, afirmação sem qualquer suporte de facto ou de direito, é tão absurda que não merece sequer que se perca muito tempo com ela.” (crf. art.º. 4º).

E, quanto à segunda, as alegações nutricionais, trata-se de “ (…) matéria que, salvo melhor entendimento, não se inclui no âmbito daquelas que o ICAP deve apreciar, sempre se dirá, por mera cautela, que aquela a que se reportam os nºs 26 a 29 da denúncia, respeita integralmente as regras comunitárias e nacionais aplicáveis.” sendo que, ademais “(…) é verdadeira, e está suportada em análises efectuadas por laboratório independente e acreditado – que ora se juntam e dão por reproduzidos (…)” (cf. art.º. 6º e 7º e docs. nºs 1 a 4).

2.2.3. Adianta a demandada que, “(…) para que não haja qualquer dúvida, que se trata de produtos da mesma categoria, como resulta do Apêndice II do Regulamento nº 1308/2013, de 17 de Dezembro de 2013, e mais ainda, no documento produzido pelo Standing Committee on the Food Chain, a págs. 7 e 8, o exemplo utilizado para conteúdos nutricionais refere-se expressamente a uma comparação entre margarina e manteiga, pelo que podem e devem ser comparadas” (cf. art.º 13º e doc. nº 5).

2.3. Enquadramento e fundamentação ético-legal

Entende o Júri que o processo sub judice não pode ser analisado, sem chamar à colação a deliberação do Processo 4J/2014 e a deliberação da Comissão de Apelo que decidiu sobre o recurso do mesmo.

Como supra referido, embora o presente processo difira do Processo 4J/2014 quanto às Partes envolvidas, o objecto da comunicação comercial é o mesmo, a campanha controvertida é a mesma, as razões que suscitaram ambas as queixas e os claims postos em crise são, no essencial, os mesmos.

Pese embora a apreciação ético-publicitária seja realizada no contexto da auto-regulação, entende o JE ser igualmente fundamental, salvaguardar e garantir a preservação do princípio da segurança jurídica.

Nessa medida, os mesmos claims, inseridos nos mesmos suportes relativos a um mesmo objecto e campanha comercial, não devem ser apreciados duas vezes pelo JE, colocando-o na situação de repetir ou contradizer deliberação anterior.

É pertinente recordar que, qualquer das Secções do JE tem competência para dirimir queixas em matéria de comunicação comercial:

“ a) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, contra associados ou terceiros;
b) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas, sobre comunicações comerciais decorrentes de alterações naquelas que tenham sido objecto de deliberações proferidas pelo JE;

c) Que lhe sejam submetidas por quaisquer pessoas sobre comunicações comerciais veiculadas posteriormente noutros suportes que não tenham sido identificados na queixa.“ (cf. art.º 7º nº 1 do Regulamento do JE, sublinhado nosso).

O mesmo Regulamente estipula que, para nos casos das queixas previstas no art.º 7º, alíneas b) [comunicações comerciais decorrentes de alterações nas comunicações comerciais que tenham sido objecto de deliberações proferidas pelo JE] e c), [comunicações comerciais veiculadas posteriormente noutros suportes que não tenham sido identificados na queixa]: “ (…) apenas carece da apresentação por escrito da exposição dos factos e fundamentação do eventual incumprimento pela outra parte, bem como da junção da comunicação comercial em causa.” (cf. art. 10º nº 4).

Em sintonia, os prazos de contestação são reduzidos e o próprio conteúdo da mesma deve ser circunscrito à apresentação dos factos e fundamentação do alegado cumprimento. (cf. art.º 11º nº 1 e nº 5).

Como é consabido, as deliberações tomadas pelas Secções e pela Comissão de Apelo do JE, são vinculativas em relação aos membros do ICAP e seus representados e a quem tenha submetido questões à apreciação do JE (cf. art.º 13º), devendo a parte visada, uma vez proferida deliberação a determinar a cessação da respectiva comunicação comercial, remeter por escrito ao ICAP, no prazo máximo de dois dias úteis, a contar da recepção da notificação da deliberação, a comprovação da cessação imediata dessa comunicação (cf. art.º 14º).

Refira-se, ainda, que o recurso para Comissão de Apelo não tem efeito suspensivo, o que significa que, sendo determinada a cessação de uma comunicação comercial pelo JE, esta se manterá independentemente do recurso para a Comissão de Apelo, que poderá admitir novas provas nos termos previstos no Regulamento do JE, inexistindo recurso das deliberações desta Comissão (cf. art.º 15º).

Vejamos o caso concreto.

A Deliberação do JE 4J/2014 identifica com precisão os claims que apreciou e os respectivos suportes, a saber:

“ 1.4.1. Das alegações publicitárias ou claims
Considerando a totalidade da comunicação comercial ao género alimentício “Flora” divulgada nos suportes rotulagem, televisão, Internet, MUPI, folheto, bem como gôndola e, ou, linear de supermercados, resulta da análise das peças processuais e dos documentos juntos pelas Partes serem as seguintes, as alegações publicitárias ou claims objecto da questão controvertida (todos, documentados em ANEXOS da queixa e abreviadamente designados por Docs):

A. Rotulagem (cfr. Doc. 3)
disclaimer (S1) “Com leite dos Açores”;
associado ao
– (i) claim “Flora derrete-te”;

B. Televisão (cfr. spot publicitário em CD rom)
disclaimer (S1) “Com leite dos Açores”;
associao ao
– (i) claim “Com leite dos Açores e tão saborosa só podia ser Flora”;

C. Internet
disclaimer (S1) “Com leite dos Açores” associado a:
– (i) claim constante de cinco spots publicitários (cfr. CD rom)
– “Com leite dos Açores e tão saborosa só podia ser Flora”;
– (ii) sítio da UNILEVER (cfr. Doc. 6)
Claims: “A marca Flora foi relançada com uma receita digna dos verdadeiros apreciadores de manteiga: um sabor intenso, com leite dos Açores, irresistível num bom pão quentinho acabado de sair do forno. A receita de Flora, para além de deliciosamente apetitosa, tem a vantagem de ter menos gordura saturada que a manteiga standard…”;
– (iii) comunicação de marca por “Hipersuper” (cfr. Doc. 10):
Disclaimer (S1) “Com leite dos Açores” associado a
Claims: ”…Na prova decisiva que é em casa dos consumidores, acreditamos que o intenso sabor a manteiga de Flora, resultante da nova receita com Leite dos Açores, vai conquistar os mais exigentes apreciadores”, explica Luís Gomes, Flora Brand Manager”.”;

D. MUPI (cfr. Doc. 4 junto à queixa):
Disclaimer (S1) “Com leite dos Açores” associado ao
– (i) claim “Delicioso sabor com leite dos Açores”;

E. Folheto, Gôndola e, ou, linear de supermecados (cfr. Docs. 5, 8 e 9 junto à queixa):
Disclaimer (S1) “Com leite dos Açores” associado aos claims
– (i) “Delicioso sabor com leite dos açores”;
– (ii) “A nova Flora foi feita a pensar nos verdadeiros apreciadores de manteiga: um sabor intenso, com leite dos Açores…”;
– (iii) “A receita de Flora, para além de deliciosamente apetitosa, tem a vantagem de ter menos gordura saturada que a manteiga standard…”;

F. Gôndola e, ou, linear de supermercados (cfr. Doc. 1 junto à queixa)
– (i) claim visual traduzido por “vacas a pastar”
seguido da referência:
– (ii) “po…nteiga” não completamente legível por aposição de preço com o
Disclaimer (S2) “creme para barrar”. “

Tendo o JE concluído e deliberado, nos termos que fundamentou, que:

“ (…) a comunicação comercial da responsabilidade da ULJM – veiculada nos suportes suportes televisão, Internet, MUPI, folheto, bem como gôndola e, ou, linear de supermercados – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com os artigos 4.º, n.º 1, 5.º, 7.º, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) e 12.º do Código de Conduta do ICAP e 10.º e 11.º do Código da Publicidade, o último, com a redacção do artigo 7.º, n.º 1, alínea b) introduzida pelo Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE. “

A deliberação do JE foi objecto de recurso por parte da queixosa, tendo a Comissão de Apelo sustentado a deliberação e ampliado o âmbito da proibição a um claim constante da rotulagem nos seguintes termos: “Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar procedente o recurso e, em consequência, determinam a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA, quanto à comunicação “Com leite dos Açores”, associada à comunicação constante da lateral daquela embalagem: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, devendo a sua divulgação cessar de imediato e não ser resposta.”

Ao assim deliberar, a Comissão de Apelo acabou por, em sede de recurso, se pronunciar especificamente quanto ao claim que poderia ser objecto de apreciação autónoma no âmbito do presente Processo 7/2014.

Clarifique-se que, para que dúvidas não restem, que o outro claim que, alegadamente, teria alguma autonomia – “a pensar nos verdadeiros apreciadores de manteiga”, bem como a imagem do naco de pão quente a ser barrado com o produto publicitado, que naquele se derrete – merecerá, apenas, uma breve referência.

Com efeito, no entendimento do JE, tal claim encontrava-se já identificado (cf. Processo 4J/2014 supra citado) e é abarcado pelo âmbito da proibição: “a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE.” (sublinhado nosso).
Finalmente, no que toca à imagem do pão a ser barrado com o produto publicitado, o JE entende que a imagem não possui, intrinsecamente, qualquer relevo em termos de ilicitude, na medida em que o produto anunciado se destina, entre outros, a barrar pão, quente ou frio.

A imagem de pão quente a ser barrado com um produto próprio e destinado a tal não é, nem pode, ser considerada por si só como uma imagem exclusiva dum outro produto, a manteiga pelo que, não é na imagem que reside o ilícito mas, outrossim, nas menções associadas acima sobejamente identificadas.
Em conclusão, o JE considera que, no tocante ao processo sub judice, as questões suscitadas no presente Processo foram já apreciadas no âmbito do Processo 4J/2014 e respectivo recurso.

Tendo ocorrido uma coincidência temporal entre a apreciação do presente processo 7J/2014 e a do processo 4J/2014, que o antecedeu, o JE deu oportunidade às Partes para, em sede de diligências complementares, completarem ou alterarem os termos da queixa e contestação apresentadas.
Se fosse o caso, poderia, na prática, converter-se a queixa inicial, numa queixa ao abrigo das alíneas b) e c) do artigo 7º do Regulamento do JE, o que não veio a ocorrer.

Assume-se, consequentemente, sem prejuízo da comprovação a realizar em lugar próprio, que as deliberações do JE e da Comissão de Apelo se encontram a ser cumpridas, facto que já alegava a FIMA na sua contestação [referindo-se, então, apenas à deliberação já proferida, a da Secção].

Donde, as mensagens controvertidas no presente Processo 7J/2014 já não são atuais i.e. deixaram de ser difundidas nos termos e suportes objecto de apreciação no Processo 4J/2014, disponível on line no sítio do ICAP.

Como tem sido defendido pelo JE e pela Comissão de Apelo (v.g. deliberação da Comissão de Apelo de 13 de Julho de 2011, proc. 7J/2011), por via de regra, quando a publicidade/ comunicação comercial deixou de ser difundida e quando, pela queixa, o que se pretendia era fazer cessar essa publicidade/comunicação comercial, como resulta do pedido ao JE, deixa de haver um litígio concreto aberto.

É este o caso dos presentes autos. Nesse pressuposto, é de entender que ocorre uma inutilidade superveniente da lide, que se entende aplicável em sede de auto-regulação publicitária.

3. Decisão

Termos em que a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP delibera determinar o arquivamento dos autos por inutilidade superveniente da lide.».

A Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

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