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4J / 2014 – Recurso :: Beiersdorf Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

4J/2014
Recurso

 

Beiersdorf Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

 

COMISSÃO DE APELO

 

Proc. n.º 4J/2014

Recorrente:
“FROMAGERIES BEL PORTUGAL”

versus:

“UNILEVER JERÓNIMO MARTINS, LDA.”

 

I- RELATÓRIO

1. A denunciante veio requerer ao Júri de Ética (JE) do Instituto Civil da Autodisciplina da Comunicação Comercial (ICAP) a apreciação da licitude da campanha publicitária promovida pela denunciada, relativamente à comunicação comercial ao seu produto “FLORA” – nos suportes rotulagem, televisão, Internet, MUPI, folheto, bem como gôndola e, ou, linear de supermercados -, pedindo que sejam determinadas as medidas necessárias à imediata cessação da publicidade enganosa e desleal do creme de barrar FLORA.

Na denúncia identifica a mensagem publicitária em causa e os diversos suportes onde a mesma é veiculada, alegando que tal mensagem publicitária pretende colocar o produto na mesma categoria da manteiga ou, no mínimo, dar a entender que se trata de um produto constituído à base de ingredientes lácteos, quando na realidade o produto em causa tem por base óleos vegetais líquidos, não se tratando de manteiga. Aliás, na embalagem do produto em causa, não resulta do topo, nem das laterais da mesma, qualquer indicação de que se trata de um creme vegetal, constando tal informação apenas na base, em letras pequenas. Mais alega que é manifestamente abusiva e enganadora a correlação que se pretende estabelecer entre o sabor e a presença de leite dos Açores, quando o produto em questão conta, na sua composição, com 1% de leite (apenas) e em pó (algo que não é sequer reconhecido de modo frontal e claro).

Conclui que a mensagem publicitária em causa constitui publicidade enganosa e não respeita o princípio da veracidade, ocorrendo assim violação dos artigos 9.º, n.ºs 1 e 2 da Lei de Defesa do Consumidor, os art.ºs 6, 10.º nº 2 e 11.º nº 1 do Código da Publicidade, o art.º 7º do DL n.º 57/2008, de 26 de Março, bem como o art.º 23º e 28º do DL n.º 560/99, de 18 de Dezembro e, ainda, art.º 9º nºs 1 e 2, al. a) do Código de Conduta do ICAP.

Contestou a denunciada pedindo que se considere improcedente a queixa e que seja negado provimento ao pedido de imediata cessação da publicidade do creme para barrar FLORA.

Estriba a sua defesa alegando que a sua comunicação comercial está comprovada pois o produto FLORA é feito com leite dos Açores e que a utilização de leite em pó é equivalente à utilização de leite líquido, que também se poderia designar por leite magro reconstituído.

Mais alega que a mensagem que a publicidade em causa transmite para o consumidor (consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido) é a mensagem que será percepcionada por este, o qual não é de modo nenhum induzido em erro, pois nunca se afirma que se trata de uma manteiga. É face a tal consumidor que devem ser apreciados os eventuais exageros ou hipérboles publicitárias, como admite que também acontece no caso em apreço, ainda que considere que é perfeitamente justificado o destaque que é dado à presença de leite dos Açores no produto.

Conclui que as afirmações utilizadas na embalagem e na campanha ora em causa, relativas à composição e qualidade do produto FLORA são verdadeiras, honestas e comprovadas e, como tal, encontram-se em conformidade com as diferentes disposições do CCI, assim como do DL 57/2008, de 26 de Março e também do Código da Publicidade sendo a denúncia desprovida de qualquer fundamento.

2. Prosseguindo os autos os seus regulares termos veio a 2ª Secção do JE do ICAP a deliberar que a “a comunicação comercial da responsabilidade da ULJM – veiculada nos suportes televisão, Internet, MUPI, folheto, bem como gôndola e, ou, linear de supermercados – em apreciação no presente processo, se encontra desconforme com o disposto nos artigos 4.º, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) e 12.º do Código de Conduta do ICAP e 10.º e 11.º do Código da Publicidade, o último, com a redacção do artigo 7.º, n.º 1, alínea b) introduzida pelo Decreto-lei n.º 57/2008, de 26 de Março, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE. »

3. É desta decisão que, inconformada, a denunciante vem recorrer, apresentando alegações nas quais requerer que esta Comissão de Apelo (CA) altere a decisão recorrida, “determinando-se em consequência a cessação imediata de toda a comunicação comercial da responsabilidade da ULJM, relativa ao creme para barrar FLORA, contendo as menções COM LEITE DOS AÇORES, incluindo a sua representação gráfica, bem como MANTEIGA e SABOR A MANTEIGA, em todos os suportes, nomeadamente na embalagem, em qualquer formato, além da cessação imediata que já foi anteriormente determinada pela douta decisão recorrida”.

Termina aquelas alegações com as seguintes conclusões:

1ª – A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, bem como a sua representação gráfica, não cumprem os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia vigente, nomeadamente o disposto no artigo 78º e na Parte III do Anexo VII ao Regulamento (EU) nº 1308/2013, de 17 de Dezembro, bem como o disposto no artigo 7º, nºs 1 e 2 da Directiva 2000/13/CE, aplicável ex vi do respectivo artigo 3º/3;

2ª – A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, é uma indicação / alegação distorcida e enganosa quanto às características do creme para barrar FLORA, nomeadamente no que se refere à sua natureza, identidade e local de proveniência, deste modo violando o princípio da veracidade ínsito no artigo 10º do Código da Publicidade e consubstanciando uma acção publicitária enganosa, igualmente ilícita por violação do disposto no artigo 11º do Código da Publicidade e do artigo 7º do Regulamento (EU) nº 1169/2011. A menção COM LEITE DOS AÇORES, per se, viola ainda o disposto nos artigos 7º e 9º do Código de Conduta do ICAP;

3ª – A alegação “sabor a manteiga”, e “manteiga” que consta de diversa comunicação comercial, incluindo da embalagem do creme para barrar FLORA, é igualmente ilícita em razão do disposto na Parte III do Anexo VII ao Regulamento (UE) 1308/2013, porquanto o uso da designação “manteiga” – isolada ou acompanhada de qualquer advérbio – é de uso exclusivo dos cremes para barrar de origem láctea, e a “manteiga” não é uma matéria-prima de base nem um ingrediente do creme para barrar FLORA.

4. A denunciante apresentou resposta ao recurso, em que conclui que a decisão recorrida não merece qualquer espécie de censura.

5. Cumpre apreciar e decidir, salientando-se desde já que o objecto do recurso é restrito à decisão do JE que considerou que, quanto à “rotulagem”, a comunicação comercial aposta no produto em causa não enfermava do apontado vício de publicidade enganosa.

II- FUNDAMENTAÇÃO

1. De facto

a) Na decisão recorrida – e no que é relevante para a economia do presente recurso – consideraram-se provados os seguintes factos, que não se mostram impugnados:

1. Encontra-se a ser comercializado no mercado o produto da marca FLORA (tratando-se de um creme vegetal para barrar a 79 %, designação legal de acordo com o Regulamento (UE) nº 1308/2013), adiante designado “produto” ou “creme vegetal”…”, o qual “…é produzido pela sociedade FIMA – Produtos Alimentares, S.A. e é comercializado pela sociedade Unilever Jerónimo Martins, Lda. (…)”;

2. A alegação publicitária ou claims objecto da “rotulagem” é a seguinte: disclaimer (S1) “Com leite dos Açores”; associado ao – (i) claim “Flora derrete-te” (doc. nº 3 junto com a queixa).

b) Resultando da prova documental junta aos autos, que não se mostra impugnada, deve ainda tomar-se em consideração, por relevante, o seguinte facto:

3. Na “rotulagem” da embalagem, na lateral, por debaixo do claim “Flora derrete-te” consta igualmente a seguinte comunicação: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura” (doc. nº 3 junto com a queixa).

2. Jurídica e ética

Perante as conclusões das alegações da recorrente é essencialmente uma a questão que as mesmas nos convocam a dilucidar e a resolver, a qual pode equacionar-se da seguinte forma:

A comunicação comercial incluída na embalagem do creme para barrar FLORA, viola o princípio da veracidade e consubstancia uma acção publicitária enganosa, não cumprindo igualmente os critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos estabelecidos pelo Direito da União Europeia vigente?

Na decisão recorrida começou por traçar-se, e bem, o que pode consubstanciar ou não alegação publicitária contida na rotulagem e, nessa medida, deixou-se claro que “a cor branca de uma embalagem”, ao contrário do que pretextava a denunciante, não poderia ser considerada como tal. Depois, considerou-se (mais uma vez bem, em nosso entender) em que termos as informações ou disclaimers, por si, ou associadas (verbal ou visualmente) com claims, seriam aptas a propiciar juízos de valor promocionais junto do consumidor (no conceito da jurisprudência comunitária e na acepção também vertida nos art.ºs 3º e 5º do Código de Conduta do ICAP, que igualmente se subscreve), exigindo-se que possuam um destaque não obrigatório por lei e não consubstanciem uma mera informação ao consumidor. Conclui-se depois, na decisão recorrida, que a comunicação constante do nº 2 da fundamentação de facto (f.f.) “não induz a percepção do consumidor médio, no sentido de que a Flora é uma manteiga e não um creme vegetal para barrar, de que a mesma Flora tem gosto a manteiga e, ou – por maioria de razão – de que goza do prestígio da manteiga feita com leite dos Açores” (cfr. fls. 11).

A recorrente insurge-se contra este entendimento do JE e, analisada a sua argumentação, não deixando de ponderar na argumentação da recorrida constante das contra-alegações e na expressa pelo JE, afigura-se-nos que lhe assiste razão, como a seguir se procurará fundamentar.

Vejamos.

São princípios fundamentais da comunicação comercial, nos termos do Código de Conduta do ICAP (CCICAP), que tais comunicações “devem ser “honestas e verdadeiras” (art.º 4º nº 1), “devem ser conformes aos princípios da leal concorrência, tal como estes são comummente aceites em assuntos de âmbito comercial” (art.º 4º nº 2) e “não devem minar a confiança do público” (art.º 4º nº 3).

Como concretização destes princípios fundamentais estabelece-se ainda no CCICAP que a comunicação comercial “deve ser verdadeira e não enganosa” (art.º 9º nº 1) e “deve proscrever qualquer declaração … que seja de natureza a, directa ou indirectamente, mediante omissões, ambiguidades ou exageros, induzir, ou ser susceptível de induzir em erro o consumidor, designadamente no que respeita a: a) características essenciais do produto, ou que sejam determinantes para influenciar a escolha do consumidor, como por exemplo: a natureza, a composição…” (art.º 9º nº 2 al. a)). Ainda na concretização do princípio da honestidade, a comunicação comercial “deve ser concebida de forma a não abusar da confiança dos consumidores” (art.º 7º nº 1)

Aqueles princípios e estes deveres estão na sua essência igualmente plasmados em comandos legais, como no DL 57/2008 de 26.03 (regime aplicável às práticas comerciais desleais das empresas nas relações com os consumidores, ocorridas antes, durante ou após uma transacção comercial relativa a um bem ou serviço) nomeadamente quando aí se considera “enganosa a prática comercial que contenha informações … que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor”, em relação às “características principais do bem” tais como “a sua composição”, conduzindo, ou sendo susceptível “de conduzir, o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo” (art.º 7º nº 1 al. b)).

Também o Código da Publicidade (CP), aprovado pelo DL 330/90 de 23.10, consagra o princípio da veracidade, nos termos do qual “a publicidade deve respeitar a verdade, não deformando os factos” e “as afirmações relativas à origem, natureza, composição, propriedades” dos “bens … devem ser exactas…” (art.º 10º nºs 1 e 2), estabelecendo ainda a proibição de “toda a publicidade que seja enganosa nos termos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março” (art.º 11º).

Afigura-se-nos, ressalvada melhor opinião naturalmente, que a comunicação comercial contida na embalagem do produto em causa não pode restringir-se à descrita no nº 2 da f.f., como aparentemente se fez na decisão recorrida, devendo qualificar-se como tal também a comunicação contida na lateral daquela embalagem, descrita no nº 3 da f.f.

Na verdade, a mensagem que se pretende com a comunicação comercial inserta na embalagem do produto em causa resulta de um todo, ou seja, do conjunto das diversas asserções nela contidas, que tenham as características acima referidas: transmissão de um juízo de valor promocional junto do consumidor (seu destinatário no conceito acima enunciado, que se subscreve) e, por outro lado, não constituam uma mera informação ao consumidor, nem possuam um destaque que seja obrigatório por lei.

Ora, considerando que estamos perante um produto que é caracterizado por ser “um creme vegetal” – em cuja composição os ingredientes principais são o óleo de girassol e matérias gordas vegetais – e não perante uma “manteiga” – cujos ingredientes principais são produtos lácteos – já seria muito duvidoso que, por si só, o destaque dado na embalagem ao disclaimer “Com leite dos Açores” – no topo e numa lateral – , destaque também resultante da sua apresentação gráfica (inserido num círculo e com pingo de leite estilizado), associado à omissão naqueles locais de qualquer referência a que o produto em causa é um “creme vegetal” (informação que só consta na parte debaixo da embalagem, não visível em termos de normalidade para o público, o qual só tem acesso a essa informação se pegar na embalagem e olhar para a sua parte de baixo, o que não é procedimento comum, em termos de normalidade para o consumidor médio) e ao facto de a percentagem de leite (e em pó) ser de apenas 1%, já seria muito duvidoso dizíamos, que tal comunicação comercial fosse compatível com os mencionados princípios da honestidade e veracidade, acolhidos nos citados dispositivos do CCICAP e preceitos legais.

Nem se diga, como pretexta a recorrida, que “a utilização do mencionado disclaimer, no caso de um creme vegetal que, em regra, não tem leite, é também muito importante do ponto de vista da segurança alimentar, por se tratar de um alergénio e de uma chamada de atenção aos consumidores, designadamente para os intolerantes à lactose”. Como é linear, e resulta do que atrás se argumentou, o objectivo com o mencionado disclaimer não é a segurança alimentar e uma chamada de atenção aos consumidores. Se a preocupação fosse essa a comunicação deveria evidenciar que se tratava de um creme vegetal, ainda que com leite. Mas não, como se fez saliência, a indicação de que se trata de um “creme vegetal” só consta da parte inferior da embalagem (normalmente não acessível ao consumidor, quando o produto está exposto).

Mas, além disso, ou seja, analisando a comunicação comercial em causa, no seu conjunto, nomeadamente considerando o disclaimer referido no nº 2 da f.f. e a mensagem contida numa lateral da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), em que se procura induzir, quando não expressar uma associação entre o produto em causa e a manteiga, ao comparar-se a gordura saturada de Flora e a gordura saturada da manteiga standard, afigura-se-nos que foram realmente ultrapassados os limites das honestidade e veracidade da comunicação comercial.

Na verdade, nestas circunstâncias, o consumidor médio, ainda que normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, é não só susceptível de ser induzido em erro sobre as características essenciais do produto em causa (ser constituído essencialmente por produtos lácteos e não produtos vegetais), como pode ser determinado e influenciado na escolha do produto, considerando como relevante na sua composição o “leite dos Açores”, quando na verdade a integração do leite naquele produto é muito reduzida.

Refira-se que, ao contrário do que propugna a recorrida, esta questão da alegação nutricional que envolve a comparação da FLORA com manteiga, não se trata de uma “nova questão”, que não possa ser apreciada nesta instância de recurso, considerando a jurisprudência que invoca – bem, em termos abstractos – nos termos da qual os recursos não se destinam a suscitar e a obter decisões sobre questões novas, ou seja, questões não colocadas ao tribunal (in casu, órgão) recorrido, mas antes e apenas ao reexame das decisões proferidas sobre as questões suscitadas ab initio pelo recorrente.

Na verdade, ainda que não da forma talvez mais estruturada, pois não se fez uma devida discriminação das diversas comunicações comerciais em função dos diversos suportes, não pode deixar de se reconhecer que logo na denúncia a ora recorrente suscita a questão da conexão entre a «referência “com leite dos Açores” e a sua (assumida) conexão com o sabor intenso a manteiga” (cfr. art.º 30º da denúncia).

Por outro lado, independentemente de tal alegação – no aspecto fáctico – até poder ser verdadeira, por estar suportada em análises efectuadas por laboratório independente e acreditado – que terão sido juntas a outro processo, segundo é alegado, mas cuja prova não é feita neste – ainda assim, dizíamos, tal não exclui que a comunicação em causa possa ser considerada enganosa. Basta para tanto, como se estabelece no art.º 7º nº 1 al b) do DL 57/2008, acima analisado, que essa informação, ainda que factualmente correcta, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor, em relação às características principais do bem tais como a sua composição, conduzindo, ou sendo susceptível de conduzir, o consumidor a tomar uma decisão de transacção que não teria tomado de outro modo.

Nestes termos e considerando os factos acima salientados e a argumentação aí exposta, não pode deixar de se concluir, também, que a comunicação comercial em causa, por acções e omissões, bem como ambiguidades e exageros, foi concebida sem respeitar o princípio da honestidade, abusando da confiança dos consumidores.

Estando assim, como estamos, perante comunicação comercial que ofende os princípios da veracidade e da honestidade, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 4º nºs 1 a 3, 7º nº 1, 9º nºs 1 e 2 al. a), todos do CCICAP, art.º 7º nº 1 al. b) do DL 57/2008 de 26.03, art.ºs 10º nº 1, 11º nº 1, ambos do CP, impõe-se julgar procedente o recurso e determinar a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA.

Considerando o atrás exposto, nomeadamente a procedência do recurso, tornar-se-ia desnecessário e irrelevante apurar da desconformidade, ou não, da comunicação comercial incluída na embalagem do creme para barrar FLORA face aos critérios de licitude em matéria de publicidade a produtos não-lácteos, estabelecidos pelo Direito da União Europeia vigente1.

Sempre se dirá, no entanto, relativamente ao direito da União Europeia invocado pela recorrente, que o Regulamento (EU) 1169/2011 de 25.10, ainda não se encontra em vigor, pois só é genericamente aplicável, nomeadamente quanto à matéria em causa, a partir de 13.12.2014 (cfr. art.º 55º). Por outro lado, a Directiva 2000/13/CE, não é directamente aplicável, como se sabe uma vez que seus os destinatários são os Estados membros (cfr. art.º 28º), e não foi directamente transporta para o direito interno, sem prejuízo de se considerar que o DL 560/99 de 18.12 lhe dá inteiro cumprimento.

Quanto ao Regulamento (EU) 1308/2013 de 17.12 estabelece o mesmo, no nº 6 da Parte III do Anexo VII do mesmo que no que se refere a produtos que não se enquadrem nos nºs 1, 2 e 3, como é o produto em causa, “não pode ser utilizado qualquer rótulo, documento comercial, material publicitário ou forma de publicidade, na aceção do artigo 2º da Diretiva 2006/114/CE do Conselho, nem qualquer forma de apresentação que indique, implique ou sugira que o produto em causa é um produto lácteo”, sem prejuízo de «a designação “leite” ou as designações referidas na presente parte, nº 2, segundo parágrafo, podem, porém, ser utilizadas no caso de produtos que contenham leite ou produtos lácteos, mas apenas para descrever as matérias-primas de base e para enumerar os ingredientes nos termos da Diretiva 2001/13/CE ou do Regulamento (UE) nº 1169/2011.” (2ª parte daquele nº 6). Ora, uma vez que a comunicação “com leite dos Açores” está associada à outra comunicação constante da embalagem (cfr. nº 3 da f.f.), teremos de concluir que a mesma não serve apenas para descreves a matéria-prima de base ou o ingrediente do produto FLORA, sugerindo antes que o produto em causa é, essencialmente, um produto lácteo. Nesta medida pode também considerar-se que as denominações constantes do produto em causa não estão conformes ao art.º 78º do Regulamento (EU) 1 308/2013 de 17.12.

III- DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, deliberam os membros da Comissão de Apelo em julgar procedente o recurso e, em consequência, determinam a cessação da comunicação comercial contida na embalagem do produto FLORA, quanto à comunicação “Com leite dos Açores”, associada à comunicação constante da lateral daquela embalagem: “Se ter sabor a manteiga é bom, ter menos gorduras saturadas é óptimo. Flora tem menos 32% de gordura saturada que a manteiga standard a 82% de gordura”, devendo a sua divulgação cessar de imediato e não ser resposta.

Lisboa, 15 de Maio de 2014

António Francisco Martins
Presidente da Comissão Apelo

Augusto Ferreira do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

Francisco Xavier do Amaral
Vice-Presidente Comissão Apelo

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