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Consulta 1J/2021 – OLX Portugal vs. Banco Credibom

Reunida no décimo quinto dia do mês de Junho do ano de dois mil e vinte e um, a Primeira Secção do Júri de Ética da Auto Regulação Publicitária, apreciou o processo nº 1J/2021 tendo deliberado o seguinte:


Processo n.º
1J/2021

  1. Objeto dos Autos

A) Da Queixa

A OLX PORTUGAL, S.A. (doravante “Requerente”), vem, nos termos e ao abrigo do artigo 10.º do Regulamento do Júri de Ética da Auto Regulação Publicitária (“ARP”) apresentar queixa contra o BANCO CREDIBOM, S.A., adiante designado por Requerida, relativamente às alegações comerciais “de que a plataforma Pisca Pisca é a plataforma «nº1 de variedade de carros usados – mais de 53 mil automóveis à tua espera» em Portugal e ainda que «já igualou o líder de mercado da última década no número de carros disponíveis — são mais de 50.000», objeto de difusão junto do público em geral, através da sua inserção em diversos anúncios nas redes sociais, (como Facebook em https://www.facebook.com/piscapiscapt) em formato digital da própria empresa e em conteúdos publicitários no contexto de parcerias comerciais, nestas sem a necessária identificação, por entender que as mesmas não são verdadeiras, e como tal são enganosas, violando o artigo 5.º e 9.º do Código de Conduta da Auto Regulação Publicitária em matéria de Publicidade (Código de Conduta da ARP), os artigos 10.º e 11.º do Código da Publicidade e artigos 5.º, 7.º e 9.º do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de março. Considera, ainda a Requerente que as alegações contidas na parceria comercial com o jornal online Observador constituem publicidade comparativa não admitida, nos termos do art.º 15.º do Código de Conduta da ARP e do n.º 2 do artigo 16.º do Código da Publicidade. Solicita, assim, a Requerente que as alegações publicitárias em questão sejam “reputadas de desconformes com as regras que norteiam a atividade publicitária, determinando-se, com efeitos imediatos, a cessação da veiculação da alegação publicitária em todos os suportes publicitários.”

Notificada para o efeito a Requerida apresentou a respetiva contestação dentro do prazo previsto no n.º 1 do art.º 10.º do Regulamento do JE da ARP.

B) Da Contestação

A Requerida, em súmula, argui pela “inveracidade dos factos alegados” pela Requerente, considerando que os mesmos “não resultam da prova junta aos autos”, entendendo não existir qualquer violação de normativo legal, quer do Código da Publicidade, quer do Decreto-Lei sobre as Práticas Comerciais Desleais. No que respeita à publicidade comparativa, considera o Requerido que a mesma “constituí publicidade comparativa permitida no âmbito do enquadramento legal, não sendo enganosa, sempre seria, como o é, lícita.” Entende, assim, o Requerido, que a queixa deverá improceder por não se encontrar provada.

  1. Enquadramento ético-legal

São colocadas em crise, no presente processo, as seguintes alegações comerciais do Requerido:

“N.º 1 na variedade de carros usados”

“mais de 53 mil automóveis à tua espera”

“já igualou o líder de mercado da última década no número de carros disponíveis — são mais de 50.000”

O artigo 4.º, n.º 1 do Código de Conduta da ARP, sob a epígrafe “Princípios Fundamentais” dispõe que “Toda a comunicação comercial deve ser legal, decente, honesta e verdadeira”, sendo que, de acordo com o artigo 5.º do mesmo Código, a mesma deve “…respeitar os valores, direitos e princípios reconhecidos na Constituição e na restante legislação aplicável”, prescrevendo o n.º 1 do artigo 9.º que “A comunicação Comercial deve ser verdadeira e não enganosa”.

Ora, para apreciação da veracidade das alegações comerciais, o Código da Publicidade, dispõe, no n.º 2 do seu artigo 10.º que “As afirmações relativas à origem, natureza, composição, propriedades e condições de aquisição dos bens ou serviços publicitados devem ser exatas e passíveis de prova, a todo o momento, perante as instâncias competentes.”, mais estabelecendo o n.º 3 do artigo 11.º, como norma de instrução em matéria de observância do princípio da veracidade, uma regra de direito probatório nos termos da qual se presumem inexatos os dados referidos pelo anunciante na falta de apresentação de provas ou na insuficiência das mesmas, em linha com o disposto nos artigos 4.º, 5.º e 12.º do Código de Conduta da ARP, este último dispondo que “As descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma Comunicação Comercial, devem ser suscetíveis de comprovação”.

Depreende-se dos termos do Código da Publicidade, assim como do Código de Conduta da ARP, que cabe ao anunciante a apresentação de provas da exatidão material dos dados de facto contidos nas alegações comerciais, e, sendo o anunciante a pessoa singular ou coletiva no interesse de quem se realiza a publicidade, no caso, o Requerido, é sobre ele que impende, o ónus da prova das alegações publicitárias em lide, conforme prescrito no mencionado artigo 12.º do Código de Conduta da ARP, “As descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser suscetíveis de comprovação” e “Esta comprovação deve estar disponível de maneira que a prova possa ser prontamente apresentada por mera solicitação da Auto Regulação Publicitária”.

Ora, o Requerido, ao longo da sua Contestação, que nos termos do n.º 3 do artigo 11.º do Regulamento do Júri de Ética, “deve ser acompanhada de toda a documentação referente aos factos em causa” limita-se a indicar que a Requerente não logrou provar a inveracidade dos factos alegados nas comunicações comerciais, parecendo desconhecer o princípio básico de inversão do ónus de prova em matéria de publicidade, estabelecido pelo legislador nacional.

Assim sendo, e uma vez que o Requerido não apresenta qualquer prova das alegações comerciais em causa, outra não pode ser a conclusão deste Júri senão de que a comunicação comercial da responsabilidade do Requerido se encontra em desconformidade com o quadro ético legal em matéria de princípios da veracidade e de livre e leal concorrência.

Analisada a contestação verifica-se que o Requerido não juntou aos autos comprovação da superioridade absoluta ínsita ao claim “N.º 1 na variedade de carros usados”, nem prova das alegações “mais de 53 mil automóveis à tua espera” e “já igualou o líder de mercado da última década no número de carros disponíveis — são mais de 50.000”, assim ofendendo o princípio da veracidade.

Como nota adicional, e relativamente ao claim “N.º 1 na variedade de carros usados”, refira-se que o mesmo consubstancia uma prática de publicidade de tom exclusivo, na medida em que afirma uma posição de proeminência relativamente aos restantes concorrentes, no que concerne a todas as qualidades passíveis de se enquadrarem na expressão “N.º 1”. Esta modalidade de publicidade, de tom exclusivo, é definida pela melhor doutrina como aquela através da qual “o anunciante pretende excluir da posição que ocupa os restantes concorrentes (…) alcançando uma posição superior à dos seus rivais” (vd. Carlos Lema Devesa in “La Publicidad de Tono Excluyente”, Editorial Moncorvo, 1980), limitando-se “a realçar a sua posição de proeminência sem fazer nenhuma referência directa aos seus concorrentes.” (vd. Anxo Tato Plaza in “La Publicidad Comparativa”, Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales, S.A. Madrid, 1996, p.50), pelo que através deste claim o Requerido está a afirmar que o seu serviço é superior aos da concorrência, seja esta suscetível de ser identificada na totalidade pelo chamado consumidor médio, ou não. Tal implica a conclusão de que os serviços dos concorrentes não gozam das mesmas qualidades ou características sem que tal deva ser valorado na sua vertente comparativa, que é acessória, mas sim, na alegação de uma posição de proeminência em determinado mercado, posição essa não alcançada pelos restantes concorrentes em geral e não pode ser admitida sem que essa superioridade seja cabalmente demonstrada. Conclui-se assim que a alegação é enganosa, nos termos dos artigos 10.º, 11.º do Código da Publicidade e dos artigos 5.º e 9.º do Código de Conduta da ARP, configurando uma prática comercial desleal nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 57/2008.

Relativamente à alegada publicidade comparativa contida no claim “já igualou o líder de mercado da última década”, entende este JE que a alegação pretende converter o Requerido em marca líder, em detrimento dos demais existentes, facto não comprovado pelo Requerido e que como tal se deve considerar não verdadeiro e, assim, enganoso.

O legislador faz uma descrição das formas de identificação da publicidade comparativa, permitindo uma comparação explícita ou implícita, sendo que a mesma se deverá efetuar sempre por referência a um concorrente, sendo autorizada desde que não seja enganosa. Ora, a denegrição e a confusão na publicidade comparativa provocam no mercado distorções de concorrência e conduzem a situações que levam os consumidores façam as suas escolhas assentes em pressupostos errados, falsos, ou até, enganosos, pelo que a comparação deve ser efetuada com base em características essenciais, pertinentes, comprováveis e representativas dos produtos em confronto, verificando-se, que no caso, a comparação é relativa ao “no número de carros disponíveis (…) para compra”. Afastando-se um ato de denegrição na publicidade em lide, não há dúvidas que o Requerido pretende através da comparação igualar-se e retirar benefícios do crédito ou da reputação do seu concorrente, o “líder”, o que poderá configurar uma prática de concorrência desleal. Ora, neste ponto, o JE apoia a posição da Requerente quando afirma que “Da perspetiva de um consumidor que pretende adquirir um carro usado, a plataforma em que faz a pesquisa será tanto mais atrativa quanto maior for o número de automóveis nela anunciados. Esse número – ou a percepção da grandeza relativa do mesmo – é suscetível de levar um consumidor a utilizar uma plataforma (no caso, a Pisca Pisca) em detrimento de plataformas concorrentes.”.

Não se encontrando comprovada a alegação, a mesma deverá ser considerada enganosa, nos termos dos artigos 10.º, 11.º e 16.º do Código da Publicidade e dos artigos 5.º e 9.º e 15.º do Código de Conduta da ARP, mais configurando uma prática comercial desleal nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 57/2008, sendo por isso proibida.

  1. Decisão

Pelo exposto, atende-se à pretensão da Requerente, deliberando a Primeira Secção do Júri de Ética da ARP a cessação imediata da veiculação das alegações comerciais em apreciação no presente processo em todos os suportes publicitários, por se considerar que as mesmas não são verdadeiras, e porquanto enganosas nos termos dos artigos 5.º, 9.º, 12.º e 15.º do Código de Conduta da ARP e nos termos conjugados dos artigos 10.º, 11.º e 16.º do Código da Publicidade, sendo proibidas nos termos conjugados do artigo 4.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 57/2008. As alegações comerciais não deverão ser repostas – quer na sua totalidade, quer em termos parciais, seja em que suporte for – caso se mantenham os tipos de ilícito apurados pelo JE.»

A Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética da Auto Regulação Publicitária

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