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4J – 8M-G / 2017 :: ARP – GTJ vs. Unicer

4J – 8M-G | 2017

 

ARP-GTJ
vs.
UNICER

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no terceiro dia do mês de Abril do ano de dois mil e dezassete, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 8M-G/4J-2017 tendo deliberado o seguinte:

«Processo nº 8M-G/4J-2017

1. Objecto dos Autos

1. 1. Tendo o ICAP – Instituto Civil da Autodisciplina da Comunicação Comercial, através do seu GTJ – Gabinete Técnico-Jurídico, decidido manter o teor da sua decisão em sede do Processo de Monitorização n. º 4M-G/2017 relativo a comunicação comercial divulgada em suporte outdoor sob o slogan de campanha Bock to Basics, da responsabilidade da UNICER – Bebidas de Portugal, SGPS, S. A. (adiante indiferenciada e abreviadamente designada por UNICER ou Requerida), remeteu aquele Gabinete para o Júri de Ética (adiante indiferenciadamente designado por JE ou Júri), para que este se pronuncie superiormente no âmbito da sua competência material.

1.2. Dão-se por reproduzidas a ficha de Monitorização n.º 8M-G/2017, a contestação da UNICER, os documentos por esta apresentados, bem como os anexos àquela ficha.

1.3. Dos factos

Colocada em crise, está a comunicação comercial à cerveja Super Bock, divulgada em suporte outdoor, sob o slogan de campanha Bock to Basics, da responsabilidade da UNICER, em relação à qual, no âmbito do Processo de Monitorização n.º 8M-G/2017, e na sequência de contestação da última, decidiu o GTJ – Gabinete Técnico-Jurídico do ICAP o seguinte:

“(…) Quanto à questão do uso de expressão em inglês, o GTJ baseou a sua opinião no disposto no art. 7.º, n.º 3 e 4 do Cód. da Publicidade, que são disposições vincadamente limitativas do uso da língua estrangeira em mensagens publicitárias e que se podem inserir no quadro do direito do consumidor à informação em geral.
Não obstante todo o respeito que nos merece a argumentação apresentada na contestação, o GTJ mantém o entendimento de que a expressão inglesa a que se refere a frase “Bock to Basics” não é subsumível à excepção prevista pelo art. 7.º, n.º 4 uma vez que nos parece que a mesma não seria compreensível por parte de uma larga faixa de consumidores de cerveja. No entanto, o GTJ admite que esse problema pudesse ser ultrapassado através de um asterisco com legenda explicativa. (…).”

No âmbito do referido processo de monitorização, o Gabinete Técnico-Jurídico identificou, ainda, uma irregularidade relativa à dimensão da mensagem educacional, a qual, nos termos do artigo 4.º, n.º 2 do Código de Auto-Regulação dos Cervejeiros Portugueses para a Comunicação Comercial deveria ocupar, no mínimo, 33% da face com maior dimensão do suporte publicitário, irregularidade que foi sanada por parte da UNICER. (Cfr. art.ºs 5.º e 6.º da contestação e documentos juntos aos autos relativos a comunicação do ICAP de 16 de Março de 2017).

De onde cabe ao Júri pronunciar-se, somente, sobre a alegada desconformidade do slogan de campanha Bock to Basics, com o disposto nos números 3 e 4 do artigo 7.º do Código da Publicidade, aqueles, aplicáveis por via do artigo 4.º, n.º 1, do Código de Conduta do ICAP.

2. Enquadramento ético-legal

Nos termos do artigo 7.º do Código da Publicidade, sob a epígrafe “Princípio da licitude”, “Só é permitida a utilização de línguas de outros países na mensagem publicitária, mesmo que em conjunto com a língua portuguesa, quando aquela tenha os estrangeiros por destinatários exclusivos ou principais, sem prejuízo do disposto no número seguinte” (3) sendo “…admitida a utilização excepcional de palavras ou de expressões em línguas de outros países quando necessárias à obtenção do efeito visado na concepção da mensagem.” (4).

A UNICER “…não disputa a interpretação efetuada pelo Gabinete Técnico-Jurídico no que concerne à interpretação da regra do artigo 7º, n.º 3 do Código da Publicidade” (sic. art.º 10 da contestação) e, o JE igualmente não o faz, no que tange à respetiva aplicabilidade ao caso sub judice. Em conformidade, concorda-se em que o lema publicitário Bock to Basics não tem os estrangeiros por destinatários exclusivos ou principais, atento o suporte utilizado, pelo que importa analisar, apenas, a alegada desconformidade com a norma excecional do artigo 7.º, n.º 4 do Código da Publicidade.

Ora, constitui posição do Júri que, quer ao nível da pragmática, quer ao nível da semântica, a comunicação comercial em termos imagéticos e verbais assenta num trocadilho conseguido pela expressão idiomática em língua inglesa back to basics, cuja “necessidade” em termos de significado pretendido, importa escalpelizar. Remete aqui, o JE para a subdivisão morrisiana traduzida pelas vertentes pragmática, semântica e sintática. (vd. C. Morris in Foundations of the Teory of Signs, Encyclopedia of Unified Science, 1, 2, Chicago, 1938).

Em conformidade, através da análise da comunicação comercial objeto da questão controvertida, são suscetíveis de serem retiradas as seguintes conclusões:

– (i) Concorda o JE em que “…a mensagem compreende (…) uma conjugação de elementos de fantasia com elementos linguísticos reais, criando uma mensagem (…) autoexplicativa facilmente compreendida e apreensível pelo consumidor” (sic. art.º 26 da contestação) acrescentando que é este mesmo consumidor, o que se encontra conceptualizado em sede dos n.ºs 3 e 5 do artigo 3.º do Código de Conduta do ICAP;

– (ii) Verifica-se uma intertextualidade na comunicação comercial da UNICER, através do recurso à estilização – seja no plano da expressão, seja ao nível do próprio conteúdo – a qual implica, in casu, a existência de um trocadilho, ou seja, a existência de uma “vida dupla” do texto, em que coexistem dois planos distintos, mas que se intersetam: o de “bock” (marca) e o de “back” (de volta), significando o regresso às raízes, ou aos elementos mais simples e importantes (cfr. art. 22 da contestação). Dito de outra forma, o retomar da antiga garrafa da cerveja Super Bock;

– (iii) Ora, tal intertextualidade, não seria possível em língua portuguesa, já que tal significaria fazer fonologia sem fonética – Morris Hale (2002) – porquanto a última não resulta da tradução;

– (iv) De onde, se considera verificado o requisito de “necessidade” de utilização de uma língua estrangeira para a prossecução do efeito visado pela mensagem (cfr. artigo. 7.º, n.º 4 do Código da Publicidade) o que, per se, seria irrelevante, não fosse o facto de, in casu, os direitos do consumidor à informação não se encontrarem minimamente beliscados;

– (v) Com efeito, concorda o Júri com a UNICER quanto ao alegado no sentido de que “… o respeito pela utilização da língua portuguesa, deriva, primordialmente do disposto no Decreto-Lei n.º 238/86, de 19 de Agosto, aletrado pelo Decreto-Lei n.º 42/88, de 6 de Fevereiro, que prevê que “as informações sobre a natureza, características e garantias de bens ou serviços oferecidos ao público no mercado nacional, quer as constantes de rótulos, embalagens, prospetos, catálogos, livros de instruções para utilização ou outros meios informativos, (…), deverão ser prestadas em língua portuguesa.” (sic. art.º 32 da contestação. Acrescenta o Júri que, naquelas, não são subsumíveis slogans como o em apreço;

– (vi) Concorda-se, deste modo, com a Requerida, quanto à posição de que “…a expressão Bock to Basics não colide com o direito à informação dos consumidores, porquanto (…) não compreende qualquer teor significativo no que concerne ao “bem” promovido” (sic. art.º 35 da contestação);

– (viii) Pelo que, atenta a ordem de motivos exposta, para a subsunção do lema Bock to Basics à norma excecional do n.º 4 do artigo 7.º do Código da Publicidade, a questão da internacionalização da marca Super Bock (referida de art.ºs 13 a 17 da contestação) acaba por ser despicienda, muito embora noutras campanhas o possa não ser;

– (ix) Tal, na medida em que o legislador, ao pretender consignar a “exceção” de utilização de línguas estrangeiras à “regra” do n.º 3 do artigo 7.º do Código em causa, o que de facto fez, foi “esvaziar” esta última, quase na totalidade, ao estabelecer o requisito de necessidade excecional para a “obtenção do efeito visado na concepção da mensagem“;

– (x) Isto, já que a dita “excecionalidade” não se encontra minimamente balizada (não possuindo, pois, qualquer rigor técnico-legal) sendo que os limites acabam por decorrer, somente, da Lei do Consumidor, nos moldes que ficaram definidos;

– (xi) Logo, em caso de claims que consubstanciem informações não essenciais ou meras fantasias, tal característica de “excecionalidade” acaba, na prática, por ser ditada por quem concebe a mensagem: o criativo publicitário;

– (xii) Pelo que, sem querer dar início a um fórum de discussão – o Júri disputa quer a interpretação efetuada pelo Gabinete Técnico-Jurídico, no que concerne à interpretação das normas do artigo 7º, n.ºs 3 e 4 do Código da Publicidade como “vincadamente limitativas”, quer o entendimento da UNICER sobre “…o caráter absolutamente excecional da aplicabilidade do disposto no referido n.º 4. (Cfr. decisão do GTJ e art.º 12 da contestação, negrito e sublinhado do JE);

– (xiii) Não concordando com a posição do GTJ no sentido de que o slogan Bock to Basics configura um “problema”- em coerência com o expendido -, não defende o Júri, por maioria de razão, que sobre a UNICER impenda a obrigação de apor na peça publicitária a que se reportam os autos, “um asterisco com legenda explicativa”.

Pelo exposto, o Júri não subscreve a decisão tomada pelo GTJ – Gabinete Técnico-Jurídico do ICAP, no âmbito do Processo de Monitorização n.º 8M-G/2010, por considerar que o slogan de campanha Bock to Basics, da responsabilidade da UNICER, é subsumível na norma excecional do n.º 4 do artigo 7.º do Código da Publicidade. Assim, no entender do JE, assiste razão à Requerida, quanto ao por esta alegado no art.º 11 da sua contestação, no sentido de que “a utilização da língua estrangeira, no caso, o inglês, se afigura absolutamente necessária à obtenção do efeito visado na conceção da mensagem, pelo que (…) se encontram reunidas as condições de excecionalidade previstas no disposto no n.º 4 do artigo 7º do Código da Publicidade.”

3. Decisão

Termos em que a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da UNICER, em apreciação no presente processo, não se encontra desconforme com o disposto nos artigos 7.º, n.ºs 3 e 4 do Código da Publicidade.».

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP

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