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9J / 2017 :: Sumol + Compal vs. Sociedade da Água do Luso

9J/2017

Sumol + Compal Marcas, S.A
vs.
Sociedade da Água do Luso, S.A.

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no sexto dia do mês de Outubro do ano de dois mil e dezassete, a Segunda Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 9J/2017 tendo deliberado o seguinte:

1. Objecto dos Autos 

1.1. SUMOL+COMPAL MARCAS, S.A. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por SUMOL+COMPAL ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética da ARP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa apresentar queixa contra SOCIEDADE DA ÁGUA DO LUSO, S.A., (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por SAL ou Requerida), relativamente a comunicação comercial ao produto “LUSO FRUTA KIDS” – pela última comercializado e comunicado nos suportes embalagem, televisão, internet, outdoor, gôndola e ilha de hipermercado – tal, por alegada violação dos artigos 9.º, n.º 1 do Código de Conduta da ARP, 10.º do Código da Publicidade, bem como do artigo 7.º do Regulamento n.º 1169/2001 (UE), do Parlamento e do Conselho, de 25 de outubro, relativo à prestação de informação aos consumidores sobre géneros alimentícios.

1.2. Notificada para o efeito, a SAL apresentou a sua contestação.
Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

1.3. Questões prévias

1.3.1. Alega a SAL, em sede de contestação, que “A Queixa apresentada e a que ora se responde, prende-se, em bom rigor, apenas com a análise dos dois filmes publicitários juntos à mesma como documentos nº 7 e 8, Porquanto “ (sic. ponto 5) porque “Os demais suportes citados – outdoors e meios digitais – ou não foram utilizados na campanha, como é o caso do outdoor de 8×3 (conforme documento nº 1 junto, que se dá como integralmente reproduzido)” (sic. ponto 6), acrescentando que “Não foram incluídas provas bastantes para apreciação pelo JE.” (sic. ponto 7).

Explicita a Requerida que, “Com efeito, uma vez que os documentos juntos à Queixa de nº 2 a 8 como prova se concretizam apenas em: – Doc. nº 2 – Imagem disponibilizada no Comunicado à Imprensa; – Doc. nº 3 – Artigo publicado no órgão de comunicação social denominado “MARKETEER”; – Doc. nº 4 – Artigo publicado no órgão de comunicação social denominado “Meios e Publicidade”; – Doc. nº 5 – Fotografia tirada num supermercado ou hipermercado; – Doc. nº 6 – Fotografia tirada num supermercado ou hipermercado; – Doc. nº 7 – Filme publicitário de 90 segundos e – Doc. nº 8 – Filme publicitário de 30 segundos” (sic. ponto 8), “É forçoso concluir que a Queixosa não cumpriu com a sua obrigação de juntar à Queixa a comunicação comercial cuja apreciação pretende ver analisada, nos termos estabelecidos no nº 2 do art. 10º do Regulamento do JE, devendo, assim, ser desconsiderados pelo JE os suportes outdoor e meios digitais referidos no articulado pela Requerida.” (sic. ponto 9).

Conclui ainda, a SAL, que “…mesmo que assim não se entenda, o que não se concede, cumpre desde logo informar que a campanha em suportes de exterior (mupis), cujas imagens são analisadas nos pontos 55 a 57, infra, decorreu apenas entre 23 de Agosto e 5 de Setembro, estando de momento encerrada.” (sic. ponto 10).

Analisados pelo Júri os documentos juntos aos autos com a queixa da SUMOL+COMPAL a que a Requerida se refere, cumpre esclarecer.

No que à expressão outdoor concerne, é um facto público e notório a confusão conceptual reinante no nosso país entre o de 8×3 (cfr. doc n.º 1 da contestação) e o suporte nomeado pelo acrónimo MUPI – entre outros tipos de publicidade exterior colocada ao ar livre -, de onde não lhe repugna admitir como válida tal designação para identificar um caso de “Mobiliário Urbano Para Informação”. Tal, desde que ao JE seja dado entender que as Partes se referem a um mesmo conteúdo e suporte específicos.

Ora, refere a SUMOL+COMPAL, na sua petição, que a SAL se encontra “…a fazer uma ampla comunicação publicitária, com presença em televisão, outdoors e meios digitais, ao referido produto “LUSO FRUTA KIDS”…” (sic. ponto 7), sem que em tais documentos existam quaisquer menções que permitam identificar o suporte ilustrado, como é o caso do documento n.º 2 da petição, em relação ao qual a Requerida faz uma retificação, referindo tratar-se de “Imagem disponibilizada no Comunicado à Imprensa.” (Cfr. ponto 8 da queixa).

Ora, se é facto que determinadas imagens documentadas não necessitam de menção que identifique o respectivo suporte (contraditando-se o alegado pela SAL a pontos 7 a 9 da contestação), como são os casos, por exemplo, das constantes de rótulo de embalagem (cfr. Doc. 1 da queixa), de página da internet integralmente reproduzida (cfr. doc. 4 da queixa) ou de gôndola de hipermercado em plano geral (cfr. Docs. 5 queixa), já outras imagens reproduzidas não permitem tal identificação “a olho”, como é o caso da que a Requerente juntou aos autos como Doc. 2.A tal acresce que a publicidade alegadamente feita através de ilha de hipermercado (cfr. Doc. 5 da queixa) a existir, não se consegue visualizar através do documento junto aos autos com a petição.

De onde o Júri não procederá à análise de publicidade alegadamente constante de outdoor, de ilha de hipermercado, bem como a de suporte indecifrável do Doc. 3 da queixa. Esta, aliás, uma prática sobre a qual o JE teve já a oportunidade de se pronunciar, designadamente, no âmbito dos processos 8J/2009, 17J/2009, 2J/2010, 10J/2016 do então ICAP, actualmente Auto-Regulação Publicitária, e 6J/2017. Com efeito, nos termos dos n.ºs 1, 2 e 5 do artigo 10.º do Regulamento do JE, sob a epígrafe “Petição”, e respetivamente, a queixa dever ser “… feita por escrito, devendo o queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados…”; aquela “…deverá ser entregue em suporte de papel e em suporte digital, neste último caso apenas no que respeita ao articulado e em formato Word, e deve ser acompanhada de toda a documentação referente aos factos alegados, sendo obrigatório juntar a comunicação comercial cuja apreciação se pretende ver analisada, devidamente isolada, sem outra comunicação comercial e/ou conteúdo editorial, num suporte que a reproduza, com fidelidade, tal como foi veiculada.” e “…Serão recusadas a queixa ou qualquer documentação a ela junta que não reúnam todos os requisitos estabelecidos…” no mesmo artigo 10.º.

Contudo, e sem prejuízo do exposto, ao Júri cumpre ressalvar que não colhe o alegado pela SAL, a ponto 10 da contestação, no sentido que “…cumpre (…) informar que a campanha em suportes de exterior (mupis) (…) decorreu apenas entre 23 de Agosto e 5 de Setembro, estando de momento encerrada.” (sic).

Na realidade, as deliberações do JE, para além de dirimirem conflitos entre Partes – resultantes da difusão de determinada mensagem publicitária por via da apreciação da sua eventual desconformidade com o Código de Conduta da ARP – têm, igualmente, um objetivo pedagógico e preventivo no que tange quer a novas campanhas publicitárias, quer a repetições de atuais ou de antigas.

Assim sendo, e porque no âmbito da auto-regulação, as mesmas deliberações do Júri são vinculativas em relação a todos os membros da ARP e seus representados, bem como a quem tenha submetido comunicações comerciais à apreciação do primeiro, pretende-se que para além do respetivo efeito célere, válido e eficaz, a mesma auto-regulação propicie, também, a concretização do desiderato constante do parágrafo anterior.

1.3.2. A propósito de algumas alegações vertidas em sede de petição, designadamente, mas sem excluir, as constantes de art.ºs 5.º e 6.º suportadas por Doc. 1 da Requerente, quer o Júri vincar que, uma embalagem de um produto só consubstancia um suporte publicitário, caso possua alegações que encerrem juízos de valor que caibam no conceito ético-legal de comunicação comercial ou institucional. Caso contrário, estar-se-á em somente presença de informação ao consumidor aposta em rotulagem e, logo, perante a incompetência material da ARP.

Dito de outra forma, entende o JE que tal informação apenas será apta, per se, a propiciar quaisquer juízos de valor promocionais junto do destinatário – e, logo, a ser considerada um disclaimer de uma comunicação comercial – caso:
– Se insira num contexto ou possua um destaque não obrigatório por lei e, ou, ou superior aos carateres utilizados na informação ao consumidor;
– Não consubstanciando, em si mesma, algo que não seja uma mera informação ao consumidor “resvale” para o conceito de publicidade, por via de uma associação verbal e, ou, visual com claims publicitários.

Por maioria de razão, as embalagens do produto “LUSO FRUTA KIDS” consubstanciam um suporte publicitário, atento o destaque e contexto dos claims “Água Luso + Sumo de Fruta Natural”.e “Tem água Luso e sumo de fruta natural”.

1.3.3. Tal como se referiu supra, alega a SAL em sede de contestação que “A Queixa apresentada e a que ora se responde, prende-se, em bom rigor, apenas com a análise dos dois filmes publicitários juntos à mesma como documentos nº 7 e 8, Porquanto “ (sic. ponto 5, negrito e sublinhado do JE) “Os demais suportes citados – outdoors e meios digitais – ou não foram utilizados na campanha, como é o caso do outdoor de 8×3 (conforme documento nº 1 junto…)”,  (sic. ponto 6) ou “Não foram incluídas provas bastantes para apreciação pelo JE.” (sic. ponto 7, negrito e sublinhado do Júri).

O JE não concorda com a alegação da Requerida, no que tange ao suporte reproduzido no documento 4 da queixa traduzido por cópia de sítio institucional de internet do jornal Meios & Publicidade e de cuja página – com vocação de distribuição geral através de partilhas nas redes sociais – constam alegações publicitárias. De facto, trata-se aqui de um caso de comunicação comercial através de suporte internet, ao abrigo do disposto nos artigos 4.º, n.º 1 do Código de Conduta da ARP e 3.º, n.º 1 e 5.º, n.º 1, alínea a) do Código da Publicidade, sendo que, nos termos da última, é “Anunciante: a pessoa singular ou colectiva no interesse de quem se realiza a publicidade”. (Negrito e sublinhado do JE).

1.3.4. Em conformidade com o expendido, o Júri apreciará a campanha publicitária da responsabilidade da SAL divulgada em suporte embalagem (cfr. Doc. 1 da queixa), televisão (cfr. Docs. 7 e 8 da queixa), internet (cfr. Doc. 4 da queixa) e gôndola de hipermercado (cfr. Doc. 6 da queixa).

1.4. Dos factos
A campanha publicitária da SAL ao produto “LUSO FRUTA KIDS”, a analisar pelo JE, é veiculada nos suportes embalagem, televisão, internet e gôndola de hipermercado. (Cfr. Docs. 1, 4, 6, 7 e 8 da queixa).

1.4.1 Das alegações publicitárias ou claims
Em conformidade com o referido nos pontos anteriores, são os seguintes, os claims ou alegações publicitárias colocados em crise:- (i) “Água Luso + Sumo de Fruta Natural”;- (ii) “Tem água Luso e sumo de fruta natural”.

1.5. Das alegações das Partes

1.5.1. Considerando que a campanha publicitária da responsabilidade da SAL constitui uma prática de publicidade enganosa, alega a SUMOL+COMPAL, em sede de queixa, e em síntese, que:
– (i) “Constam, (…) do verso das (…) embalagens, os seguintes ingredientes: a. LUSO FRUTA KIDS MORANGO “Água Mineral Natural de Luso (82,6%), sumos de fruta à base de concentrado (maçã 11,0%, morango 1,0%), extrato natural de fruta, concentrado de cenoura púrpura, acidificante, ácido cítrico, aromas naturais” (…) b. LUSO FRUTA KIDS MAÇÃ “Água Mineral Natural de Luso (77,50%), sumo de maçã à base de concentrado (15,0%), extrato natural de fruta, extrato de malte de cevada, acidificante, ácido cítrico, aroma natural de maçã com outros aromas naturais”” (sic. ponto 5), acrescentando que, “Trata-se, pois, de uma bebida refrigerante, feita à base de concentrado de fruta e contendo açúcares derivados da fruta e outros ingredientes comunicados ao consumidor” (sic. ponto 6);- (ii) “Nos materiais de publicidade o produto aposta na evidenciação das palavras “Água Luso + Sumo de Fruta Natural” (sic. ponto 10) que,  “…a publicidade feita (…) é falsa e enganosa, tendo sido elaborada de modo a, voluntariamente, induzir o consumidor em erro a respeito das características essenciais do produto.” (sic. ponto 11) “Pretendendo dar deste uma falsa ideia de naturalidade.” (sic. ponto 12), acrescentando que “…o produto em causa não é feito com sumo de fruta natural” (sic. ponto 15) e que “…não colhe alegar que a publicidade se refere à naturalidade da fruta (sumo de fruta natural) e não do sumo (sumo natural de fruta) pelo que não será enganosa.” (sic. ponto 16).

1.5.2. Contestando a denúncia da SUMOL+COMPAL, vem a SAL defender a ética e a legalidade da sua campanha publicitária referindo, designadamente, que:
– (i) “Os sumos e extractos utilizados em LUSO FRUTA e LUSO FRUTA KIDS como se comprova através das declarações emitidas pelos fornecedores dos mesmos (…) são provenientes de origem natural” (sic. ponto 28), acrescentando que “À LUSO FRUTA, no que se inclui LUSO FRUTA KIDS, não é adicionado açúcar ou edulcorantes, contendo apenas os açúcares naturalmente presentes na fruta (conforme Doc. nº 7 junto…) ” (sic. ponto 35) e que, “LUSO FRUTA constitui, assim, um produto mais uma vez diferenciado que, pelo facto de conter sumo e extracto de fruta e de não conter açúcar ou edulcorantes adicionados, é considerado uma bebida que promove uma alimentação equilibrada e um estilo de vida saudável.” (sic. ponto 36); – (ii) Quanto aos filmes publicitários é “De notar que os ingredientes destacados são os quantitativa e qualitativamente mais relevantes em LUSO FRUTA KIDS e que são apresentados com a clareza que se impõe, através da frase “Tem Água de LUSO e sumo de fruta natural” (sic. ponto 43) que, “Tendo a Requerida, em acréscimo, tido o especial cuidado de posicionar a palavra “natural” em local que comunicasse a naturalidade de um dos ingredientes do produto sem que com isso induzisse o consumidor médio em erro quanto a ser um “sumo natural de fruta” (sic ponto 45) e que “…é caso para se dizer que nem por mera hipótese teórica se deveria admitir que um jingle publicitário, como o em análise, seja considerado enganador por não citar toda a lista de ingredientes do produto, sob pena de incorrer numa publicidade enganosa!” (sic. ponto 49);- (iii) “Assim, a menção “natural” aos sumos de fruta utilizados deve ser confirmada como legal, por documentalmente comprovada e realizada com o cuidado acrescido que um operador responsável deve ter para com os seus consumidores…” (sic. ponto 52), que “…em todo o material publicitário que a Requerida veiculou, houve sempre o especial cuidado em afirmar a verdade quanto à composição de LUSO FRUTA: que “o produto tem água mineral natural de Luso e sumo de fruta natural, sem corantes, conservantes ou edulcorantes, apenas com os açúcares naturais da fruta” conforme o Comunicado à Imprensa junto…” (sic. ponto 55), acrescentando, ainda, que não pode “…ser presumida alguma ilegalidade do mero facto de LUSO FRUTA e LUSO FRUTA KIDS, ao ser uma bebida refrigerante à base de sumo de frutos e ter tal denominação de venda, comunicar os seus ingredientes, tal como pretende inferir a Queixosa…” (sic. ponto 67).

2. Enquadramento ético-legal

2.1. Da alegada prática de publicidade enganosa
Por exclusão de partes ou por maioria de razão do que referiu a pontos 1.3.1., 1.3.3. e 1.3.4., o JE não procederá à análise do conteúdo gráfico-imagético constante do Doc. 3 da petição, o qual, ao contrário do que refere a Requerente em sede da mesma (cfr. pontos 3 e 9), é o único em que se encontra referida a frase “Apenas água e sumo de fruta natural” (sublinhado do Júri). Logo, cumpre apurar, tão somente, uma eventual desconformidade dos claims “Água Luso + Sumo de Fruta Natural” e “Tem água Luso e sumo de fruta natural”, com o quadro ético-legal em matéria de princípio da veracidade das comunicações comerciais, no qual se inclui o invocado artigo 7.º do Regulamento n.º 1169/2001 (UE), do Parlamento e do Conselho, de 25 de outubro, relativo à prestação de informação aos consumidores sobre géneros alimentícios, por força do respectivo n.º 4. (Cfr. Docs. 1, 4, 6, 7 e 8 da petição e pontos 55 a 59 da contestação).

No entanto, e sem prejuízo de tal conclusão, é de salientar que tal como referiu o Júri a 1.3.3., para efeitos ético-legais é “Anunciante: a pessoa singular ou colectiva no interesse de quem se realiza a publicidade”. (Cfr. artigo 5.º, n.º 1, alínea a) do Código da Publicidade (Negrito e sublinhado do JE). Em conformidade (caso se tratasse de uma comunicação comercial e na ausência de qualquer pedido de retificação), não colheriam os argumentos vertidos na contestação no sentido de que “…em todo o material publicitário que a Requerida veiculou, houve sempre o especial cuidado em afirmar (…) que “o produto tem água mineral natural de Luso e sumo de fruta natural, sem corantes, conservantes ou edulcorantes, apenas com os açúcares naturais da fruta” …” (sic. ponto 55)“, “Nunca que a bebida é “composta apenas por água e sumo de fruta natural” (…) ou que o produto contém “apenas Água de Luso e Sumo de Fruta Natural”…” (sic. ponto 56), “Frases estas que, aparecem na Queixa numa infeliz tentativa da Queixosa para atribuir à Requerida palavras que esta não disse” (sic. ponto 57), “Mas que, (…) foram ambas “recortadas” de um artigo publicado num meio de comunicação social digital junto à Queixa como doc. nº 3 e que poderiam levar um leitor menos atento à conclusão pretendida.” (sic. ponto 58).

De referir, igualmente, que não se encontram em lide quer alegações no sentido de o produto comunicado não ser “saudável” ou não prestigiado, quer quaisquer eventuais práticas publicitárias da Requerente, pelo que o Júri considera despiciendo o teor dos articulados da contestação de pontos 17 a 26, 29 a 34 e 47 a 55, bem como o conteúdo dos documentos juntos como suporte daqueles.

O produto LUSO FRUTA, no que se inclui a variante “à medida dos mais pequenos” comercializada em embalagens de 20cl e denominada LUSO FRUTA KIDS, é, em termos de rotulagem alimentar (cfr. Doc. 1 da queixa), uma bebida refrigerante à base de água Mineral de Luso, comercializada com dois sabores, a saber: – LUSO FRUTA KIDS MORANGO“Água Mineral Natural de Luso (82,6%), sumos de fruta à base de concentrado (maçã 11,0%, morango 1,0%), extrato natural de fruta, concentrado de cenoura púrpura, acidificante, ácido cítrico, aromas naturais.” (Cfr. Doc. 1 da queixa);- LUSO FRUTA KIDS MAÇÓÁgua Mineral Natural de Luso (77,50%), sumo de maçã à base de concentrado (15,0%), extrato natural de fruta, extrato de malte de cevada, acidificante, ácido cítrico, aroma natural de maçã com outros aromas naturais.” (Cfr. Doc. 1 da queixa).

Analisados os documentos juntos aos autos com a contestação, e considerando o alegado a pontos 3 e 4 da última, conclui o Júri que a Requerida logrou provar que o produto “LUSO FRUTA KIDS”:- (i) contem sumo de fruta concentrado (cfr. Doc. n.º 4 da contestação);- (ii) não contem açucares derivados e sim, apenas aqueles que se encontram presentes na fruta (cfr. Docs n.º 4 e 7 da contestação).

Foi entendido quer pelo legislador português, quer pela União Europeia (cfr. Directivas 84/450/CEE e 97/55/CE) que como norma de instrução em matéria de observância do princípio da veracidade, se devia instituir uma regra de direito probatório (cfr. actual n.º 3 do artigo 11.º do Código da Publicidade) nos termos da qual se presumem inexactos os dados referidos pelo anunciante na falta de apresentação de provas ou na insuficiência das mesmas, no que, aliás, o articulado dos artigos 4.º, 5.º e 12.º do Código de Conduta da ARP se encontram em consonância, pelo que impende sobre a SAL, o ónus da prova das alegações publicitárias em lide.

Com efeito, nos termos do referido artigo 12.º, “As descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser susceptíveis de comprovação” (1) e “Esta comprovação deve estar disponível de maneira que a prova possa ser prontamente apresentada por mera solicitação do então ICAP, actualmente Auto-Regulação Publicitária”. (2).

Logo, a questão que se encontra em aberto é a de saber se impenderia sobre a Requerida o ónus da prova de que o produto em apreço, entendido nas suas duas variantes, contem sumo natural de fruta, já que os documentos da contestação não são de molde a comprovar tal presença.

Ora, a resposta a tal questão irá depender, necessariamente, do estabelecimento da representação que o consumidor médio – entendido de acordo com a acepção amplamente divulgada pelo JE – ou destinatário dos claims “Água Luso + Sumo de Fruta Natural” e “Tem água Luso e sumo de fruta natural” fará dos mesmos. Dito de outra forma, se existirá a susceptibilidade de aquele entender que o produto em causa é feito com água de Luso e com sumo natural de fruta, caso em que se estará perante uma prática de publicidade enganosa quanto às caraterísticas comunicadas.O Júri considera que tal susceptibilidade existe.

A propósito, sustenta a Requerida na sua contestação que teve o “…especial cuidado de posicionar a palavra “natural” em local que comunicasse a naturalidade de um dos ingredientes do produto sem que com isso induzisse o consumidor médio em erro quanto a ser um “sumo natural de fruta”. (sic. ponto 45 da contestação, negrito e sublinhado do JE).

Entendimento contrário – que o Júri subscreve na totalidade – sustenta a Requerente ao alegar, na sua queixa, que “Nos materiais de publicidade o produto aposta na evidenciação das palavras “Água Luso + Sumo de Fruta Natural” (sic. ponto 10) “Pretendendo dar deste uma falsa ideia de naturalidade” (sic. ponto 12) sendo que, “…ao contrário do que comunica ao público (com especial incidência nas crianças) e da informação constante dos rótulos dos produtos, a bebida LUSO FRUTA KIDS não contém de sumo de fruta natural” (sic. ponto 14) e que, de facto, “…o produto em causa não é feito com sumo de fruta natural” (sic. ponto 15).

A tal acresce que “…não colhe alegar que a publicidade se refere à naturalidade da fruta (sumo de fruta natural) e não do sumo (sumo natural de fruta) pelo que não será enganosa.” (sic. ponto 16) e que  “É por demais evidente que essa diferença não é percebida pelos consumidores, traduzindo um exercício linguístico propositadamente elaborado para justificar o que não é justificável: a tradução de uma naturalidade que não existe” (sic. ponto 17, negrito e sublinhado do JE) a que acresce a circunstância de a publicidade estática e os rótulos das embalagens dos produtos conterem de forma especialmente destacada referências a “Sumo de Fruta de…” (Cfr.. ponto 18).

De onde, os claims “Água Luso + Sumo de Fruta Natural” e “Tem água Luso e sumo de fruta natural” são de molde a gerar a suscetibilidade de indução em erro do consumidor quanto às características essenciais do género alimentício LUSO FRUTA KIDS, porquanto propiciam o entendimento de que se está a adquirir uma bebida com alto teor de sumo de fruta natural, teor esse que não é objecto de comprovação por parte da SAL.

E não se diga com uma ponta de ironia, como o faz a Requerida em sede de contestação, que se teria que “…citar toda a lista de ingredientes do produto, sob pena de incorrer numa publicidade enganosa” (cfr. ponto 49), já que o que é exigível, tão somente, é que claims ou alegações publicitárias não contradigam a informação rotular prestada ao consumidor em caracteres necessariamente reduzidos.

Em conformidade, conclui o Júri que as alegações publicitárias em lide constituem uma prática de publicidade enganosa por desconformidade com o disposto no artigo 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do Código de Conduta da ARP, bem como com o consignado no artigo 7.º, n.º 1, alíneas a) e c) do Regulamento n.º 1169/2001 (UE), do Parlamento e do Conselho, de 25 de outubro, relativo à prestação de informação aos consumidores sobre géneros alimentícios, nos termos das quais “…a informação sobre os géneros alimentícios não deve induzir em erro, em especial no que respeita às características do género alimentício e, nomeadamente, no que se refere à sua natureza, identidade, propriedades, composição, quantidade…” (a) “Sugerindo que o género alimentício possui características especiais quando todos os géneros alimentícios similares possuem essas mesmas características evidenciando, especificamente, a existência ou inexistência de determinados ingredientes e/ou nutrientes.” (c).

3. Decisão 

Termos em que, a Segunda Secção do Júri de Ética da Auto Regulação Publicitária delibera no sentido de que a comunicação comercial traduzida pelos claims “Água Luso + Sumo de Fruta Natural” e “Tem água Luso e sumo de fruta natural”, da responsabilidade da SAL, se encontra desconforme com o disposto nos artigos 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do Código de Conduta da ARP e 7.º, n.º 1, alíneas a) e c) do Regulamento n.º 1169/2001 (UE), do Parlamento e do Conselho, de 25 de outubro, relativo à prestação de informação aos consumidores sobre géneros alimentícios, pelo que a sua divulgação não deverá ser reposta ou mantida, quer parcial, quer totalmente, seja em que suporte for, caso subsistam os tipos de ilícito apurados pelo JE.

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética da Auto-Regulação Publicitária

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