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8J / 2017 :: Reckitt Benckiser vs. Unilever Jerónimo Martins

8J/2017

Reckitt Benckiser (Portugal), S.A.
vs.
Unilever Jerónimo Martins, Lda

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no segundo dia do mês de agosto do ano de dois mil e dezassete, a Primeira Secção do Júri de Ética da Auto Regulação Publicitária, apreciou o processo nº 8J/2017 tendo deliberado o seguinte:

«Processo nº 8J/2017

1. Objecto dos Autos 

A Reckitt Benckiser (Portugal), S.A., adiante designada por Requerente, veio apresentar queixa junto do Júri de Ética (JE) Publicitária da Auto Regulação Publicitária contra a Unilever Jerónimo Martins, Lda., adiante designada por Requerida, relativamente a comunicação comercial difundida nos suportes “muppies”, “internet” e televisão  relativa ao produto “SUN Extra Power”, por alegada violação dos artigos 4.º, 5.º, 9,º, 12.º, e 15.º, n.º 2, alínea a) do Código de Conduta da Auto Regulação Publicitária (“ARP”), e nos artigos 10.º, 11.º, n.º 3 e 16.º, n.º 2, alínea a) e 5 do Código da Publicidade.

O objeto da queixa prende-se com a comunicação comercial relativa ao produto SUN Extra Power: “Só a melhor pastilha põe tudo em pratos limpos”. Com tal mensagem publicitária, entende a Requerente que a Requerida está a realizar publicidade de tom exclusivo, do tipo comparativo, que, não sendo comprovada será enganadora e ilícita, atingindo diretamente a reputação dos produtos concorrentes e configurando, assim, concorrência desleal. Neste contexto, a Requerente pede seja declarada a ilicitude da publicidade denunciada e ordenada a cessação imediata e definitiva da mesma.Notificada para o efeito a Requerida apresentou contestação dentro do prazo previsto no n.º 1 do art.º 10.º do Regulamento do JE. Contesta a Requerida afirmando que a alegação publicitária em causa é apenas “Só a melhor pastilha põe tudo em pratos limpos” e que a mesma pretende aludir à expressão idiomática portuguesa “deixar tudo em pratos limpos”, fazendo um trocadilho entre a referida expressão e o desígnio dos detergentes para a máquina de lavar loiça em forma de pastilhas. Afirma tratar-se de uma hipérbole publicitária, que pretende fazer uso de um jogo de palavras e exagerar, de forma jocosa, as propriedades do produto Sun Extra Power. Quanto à alegada prática de publicidade comparativa a Requerida contradiz a qualificação pelo facto de não serem identificados implicitamente produtos oferecidos por um concorrente, mas antes a generalidade dos produtos presentes no mercado. Retira desta qualificação não ter o ónus de prova da veracidade das alegações publicitárias, por considerar que a sua inversão opera apenas perante publicidade comparativa.

Não obstante o referido, a Requerida alega a veracidade da sua alegação, juntando para comprovação dois relatórios elaborados pela Tensioconsult.

Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos aos autos pelas mesmas.

2. Enquadramento ético-legal

Vem a Requerida, nos pontos 10 e 11 da sua contestação, invocar que a campanha publicitária relativa ao produto em análise tem de ser vista como um todo, existindo “outras execuções que fazem parte da mesma campanha mas que não foram alvo de queixa por parte da Reckitt Benckiser, e que apresentam alegações publicitárias complementares, tais como “no fim do jantar ninguém fica para ajudar”, seguido de “Sun põe tudo em pratos limpos”, e “alguém tem de fazer o trabalho sujo”, seguido de “Sun põe tudo em pratos limpos””.

Ora, entende o JE que a pretensão da Requerente não se funda na utilização da expressão idiomática ou do uso de trocadilhos mas no uso da expressão “Só a melhor”, sendo esta a que merecerá a análise ético-jurídica, ainda que devidamente enquadrada no seu contexto.

Quanto a esta, a Requerida entende que “A expressão empregue não é “Só a melhor pastilha lava os pratos” ou só o “Sun Extra Power lava os pratos”, ou “Só a melhor pastilha põe os pratos todos limpos”.

A expressão empregue é precisamente “Só a melhor pastilha põe tudo em pratos limpos”, isto é, só a melhor pastilha clarifica as coisas, tira as dúvidas, “coloca os pontos nos is”, que não é de todo a mesma coisa.”

Salvo melhor opinião, não cremos, também aqui, que assista razão à Requerida. A expressão, como admite, de resto, a Requerida, é usada no claim publicitário jogando com o trocadilho, querendo, quando muito transmitir ambas as ideias, isto é, no sentido literal – só a melhor pastilha lava os pratos – e no sentido da expressão idiomática usada – só a melhor pastilha põe os pontos nos “is”, ou, clarifica a questão.

Considera-se, assim, que a alegação publicitária em causa tem o sentido de afirmar uma posição de supremacia do produto relativamente a todos os seus concorrentes – “a melhor” -, configurando uma prática de publicidade de tom exclusivo que, não obstante, não se poderá qualificar de comparativa pois nenhuma referência específica é feita, direta ou indiretamente, a qualquer concorrente ou produto.

Com efeito, a expressão “a melhor”, é um adjetivo superlativo relativo de superioridade que revela um juízo subjetivo próprio que exclui todos os concorrentes da posição de proeminência. À semântica há que aliar a perceção do destinatário da mensagem, a sua descodificação no contexto em que é inserida, no caso, se a descodifica como hipérbole ou como uma qualidade e/ou resultado prometido real atendendo a elementos como o contexto ou quadro sugestivo em que se insere a alegação, a frequência e o modo de utilização no setor de referência, as características do destinatário, bem como a ausência ou presença de métodos de verificação objetivos.

As meras hipérboles ou exageros publicitários são apreendidos pelo “consumidor médio”, e incapazes, por isso, de o induzir em erro, não estando, por isso, sujeitas ao princípio da veracidade.

São imediatamente reconhecíveis e, em geral, impossíveis no resultado proposto. No caso em apreço não ressaltam tais características, antes uma reivindicação geral de supremacia no desempenho do produto.

Assim, é a assertividade do adjetivo usado e a posição de supremacia em que coloca o anunciante face à concorrência, que leva o JE a considerar que alegação não pode ser considerada um mero exagero publicitário mas uma alegação publicitária sujeita ao princípio da veracidade, devendo, por esse motivo, ser comprovada.

Ora, quanto a este particular, e não obstante a junção dos relatórios constantes dos documentos II e III, entende a Requerida não ter o ónus de demonstrar que a sua alegação publicitária é verdadeira.

Não assiste razão à Requerida.

No ordenamento jurídico português, tal como no comunitário, a norma de instrução em matéria de observância do princípio da veracidade e de prática de publicidade comparativa, contém uma regra de direito probatório nos termos da qual se presumem inexatos os dados referidos pelo anunciante na falta de apresentação de provas ou na insuficiência das mesmas, conforme  n.º 2 e 3 do artigo 11.º e n.º 5 artigo 12.º do Código de Conduta da ARP. O ónus de prova da veracidade das alegações recai sobre o anunciante, e existe uma presunção de inexatidão relativamente a afirmações publicitárias, em caso de insuficiência de prova.

Compulsada a prova carreada pela Requerida verifica-se a existência de dois estudos realizados pela empresa TENSIOCONSULT, um com incidência sobre os produtos Sun Expert Extra Power, Fairy Platinum All-in-One, Finish All-in-1 Max Super Charged e um outro incidente sobre os produtos Sun Expert Extra Power, Finish Quantum Max Super Charged, Finish All-in-1 Max Lemon e Fairy Original All-in-One, datados, respetivamente, de 22 de fevereiro e 14 de maço de 2017, realizados com base no método IKW mais recente, proposto pela Requerente.

Não obstante os produtos terem denominações diversas entende-se que a Requerida demonstrou tratar-se dos mesmos produtos comercializados em Portugal.Os relatórios descrevem estudos comparativos da eficácia da limpeza e remoção de manchas de detergentes multifuncionais para máquinas de lavar loiça automáticas, entendendo o JE que se encontra suficientemente demonstrada a veracidade do claim, dado que obtém um melhor resultado comparativamente aos concorrentes no seu setor de mercado, abarcando a prova um universo e amostra representativos do mesmo.

Faz-se notar que os resultados dos testes não traduzem uma característica do produto que seja diferencialmente apreciável pelos consumidores de detergente para máquinas de lavar louça.

O próprio teste indica que os resultados obtidos podem não ser percetíveis pelo consumidor.Não obstante, analisados relatórios juntos aos autos com a contestação, nos termos do n.º 1 do artigo 4. º e dos artigos 5. º e 12. º do Código de Conduta da ARP, entende o JE que a Requerida logrou provar uma maior eficácia na limpeza que os produtos concorrentes do seu setor, termos em que, neste tocante, o JE entende que a comunicação comercial da responsabilidade da Requerida, veiculada nos seus vários suportes, não se encontra desconforme com o disposto nos artigos 9. º e 12. º do Código de Conduta da ARP, não consubstanciando, em consequência, uma prática de publicidade enganosa.

3. Conclusão

Nestes termos, a Primeira Secção do Júri de Ética da ARP, delibera no sentido da improcedência da queixa apresentada.

Declaração de Voto de Vencido
Votou vencido o Dr. Diogo Saraiva e Sousa que formulou a seguinte Declaração de Voto:“Compreendendo a posição dos restantes membros, considero que a expressão “a melhor” traduz um juízo demasiado subjetivo e que coloca o anunciante numa posição e supremacia face aos concorrentes em relação a todas as suas qualidades e não exclusivamente à limpeza, que aqui está comprovada” »

A Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética da Auto Regulação Publicitária

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