Mais recentes

6J / 2017 :: L’óreal Portugal vs. Beiersdorf Portuguesa

6J/2017

L’óreal Portugal
vs.
Beiersdorf Portuguesa

 

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no vigésimo sétimo dia do mês de Junho do ano de dois mil e dezassete, a Segunda Secção do Júri de Ética da Auto-Regulação Publicitária, apreciou o processo nº 6J/2017 tendo deliberado o seguinte:

Processo nº 6J/2017

1. Objecto dos Autos

1. A L’ORÉAL PORTUGAL UNIPESSOAL, LDA. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por L’ OREAL ou Requerente) veio, junto do Júri de Ética da ARP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a BEIERSDORF PORTUGUESA, LDA. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por BEIERSDORF ou Requerida), relativamente a comunicação comercial às sub-marcas pela última comercializadas Nivea Sun Loção Protect & Moisture; Nivea Sun Kids Spray Hidratante; Nivea Sun Spray Protect & Moisture; Nivea Sun Roll-on Protect & Moisture; Nivea Sun Kids Loção Hidratante e Nivea Sun kids Roll-on Hidratante, (adiante abreviadamente designadas por produto e, ou, produtos Nívea Sun) – comunicação essa promovida nos suportes televisão, outdoor, internet, folheto, embalagem e gôndola de ponto de venda – tal, por alegada violação dos artigos 9.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e h) e 21.º do Código de Conduta da Auto-Regulação Publicitária (“ARP”) 11.º e 13.º do Código da Publicidade, artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 189/2008, de 24 de Setembro, que estabelece o regime jurídico dos produtos cosméticos e de higiene corporal, artigo 20.º do Regulamento n.º 1223/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Novembro de 2009, que regulamenta os produtos cosméticos, artigo 1.º do Regulamento (EU) n.º 655/2013 da Comissão, de 10 de Julho de 2013 e ponto 6.1. do respetivo Anexo, bem como da Recomendação da Comissão Europeia, de 22 de Setembro de 2006, relativa à eficácia e às propriedades reivindicadas dos protectores solares.

1.1. Notificada para o efeito, a BEIERSDORF apresentou a sua contestação.

Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

1.2. Questão prévia

Em sede da petição da L’OREAL, é o Júri remetido para a consulta de sites da internet para o efeito de análise de claims constantes de vídeos – alegadamente veiculados através não só daquele suporte (cfr. pontos 3.4.2. e 3.4.3.) como, igualmente, em televisão (cfr. ponto 3.5) – não juntando a Requerente aos autos qualquer cópia das peças publicitárias divulgadas nos meios referidos.

Ora, nos termos dos n.ºs 1, 2 e 5 do artigo 10.º do Regulamento do JE, sob a epígrafe “Petição”, e respetivamente, “A queixa deverá ser feita por escrito, devendo o queixoso indicar com precisão os suportes que pretende ver analisados…”; aquela “…deverá ser entregue em suporte de papel e em suporte digital, neste último caso apenas no que respeita ao articulado e em formato Word, e deve ser acompanhada de toda a documentação referente aos factos alegados, sendo obrigatório juntar a comunicação comercial cuja apreciação se pretende ver analisada, devidamente isolada, sem outra comunicação comercial e/ou conteúdo editorial, num suporte que a reproduza, com fidelidade, tal como foi veiculada.” e “…Serão recusadas a queixa ou qualquer documentação a ela junta que não reúnam todos os requisitos estabelecidos…” no mesmo artigo 10.º.Em conformidade, e não obstante o referido a art.º 7.º da contestação, o JE não procederá à análise das peças publicitárias multimédia veiculadas através dos suportes internet e televisão. Esta, aliás, uma prática sobre a qual o Júri teve já a oportunidade de se pronunciar, designadamente, no âmbito dos processos 8J/2009, 17J/2009, 2J/2010 e 10J/2016 do ICAP.

1.3. Dos factos

A BEIERSDORF divulgou através de internet (no seu site institucional) outdoor, folheto, embalagem e gôndola de ponto de venda, uma campanha publicitária destinada a promover a sua linha de produtos Nívea Sun. (Cfr. Anexo I junto à queixa).

1.3.1. Das alegações publicitárias ou claims

1.3.1.1. Refere a BEIERSDORF em sede de contestação que: “As informações de que os Produtos protegem a roupa das manchas causadas pelos filtros UV são, por isso, verdadeiras, objectivas e comprováveis, a vários níveis (…) como facilmente se retira da análise da informação que consta dos Produtos, incluindo a disponibilizada através do asterisco (*) que, ao contrário do que a Denunciante pretende fazer crer, faz parte da mensagem publicitária em apreço, nos termos que analisaremos infra em detalhe” (sic. art.º 16.º) e, que, “As informações alusivas a que as fórmulas dos Produtos ajudam a reduzir as manchas durante a lavagem da roupa são, aliás, incluídas numa caixa destacada, para enfatizar as mesmas e para que não surjam dúvidas sobre a sua interpretação.” (sic. art.º 21.º, negrito e sublinhado do JE).

A propósito, quer o Júri vincar que, uma embalagem de um produto consubstancia um suporte publicitário, sempre que possua alegações que encerrem juízos de valor que caibam no conceito ético-legal de comunicação comercial e não, somente, um meio de informação ao consumidor.

Dito de outra forma, entende o JE que alguma da “informação” a que a Requerente se refere será apta, per se, a propiciar tais juízos de valor promocionais junto do destinatário – e, logo, a ser considerada publicidade, no sentido próprio do termo, caso:

– Traduza uma menção e, ou, um destaque não obrigatório à luz da lei do consumidor;

– Não consubstanciando, em si mesma, algo que não seja uma mera informação ao consumidor “resvale” para o conceito de comunicação comercial, por via de uma associação verbal e, ou, visual com claims publicitários que propicie uma conotação valorativa a estes últimos.

Ora, analisada a globalidade da campanha publicitária da responsabilidade da BEIERSDORF, à luz de tal raciocínio, conclui o Júri que, somente poderão ser consideradas disclaimers, (ou meras informação prestada ao consumidor) as menções “Para melhores resultados: • Lave a frio • Use detergente líquido • Evite lixívia” e “*Comparado com fórmulas anteriores”, respetivamente identificadas no ponto seguinte como (i-A) e (i-B). Por maioria de razão, todas as restantes alegações serão publicitárias.

1.3.1.2. Em conformidade com o referido supra, bem como com os pontos 3.2. a 3.4.1. da petição e dos documentos juntos aos autos com a mesma (entranhados em Anexo I) são os seguintes, os claims ou alegações publicitárias (igualmente apelidadas de reivindicações, de acordo com a legislação europeia aplicável) colocados em crise:

através de gôndola de ponto de venda (indoor) folheto e internet
– (i-a) “t-shirt branca” estampada associada a- (i-b) “CONTRA AS MANCHAS AMARELAS DO PROTECTOR”;- (i-c) “O PRIMEIRO PROTECTOR SOLAR QUE PROTEGE A ROUPA*”;- (i-d) “*PROTECÇÃO DA ROUPA: a fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparada com fórmulas anteriores”;- (i-e) “O 1º PROTECTOR SOLAR NO MUNDO QUE PROTEGE TAMBÉM A ROUPA”;- (i-f) “A protecção solar eficaz necessita de poderosos filtros UV. Infelizmente, estes filtros podem causar manchas desagradáveis na sua roupa”;- (i-g) “Nivea Sun, em cooperação com o Instituto Hohenstein, desenvolveu uma inovação revolucionária:”;- (i-h) “Não só protege a sua pele como também potencia o desaparecimento das manchas dos filtros UV mais facilmente na lavagem da sua roupa*”, associados aos dois disclaimers – (i-A) “Para melhores resultados: • Lave a frio • Use detergente líquido • Evite lixívia”;- (i-B) “*Comparado com fórmulas anteriores”;- (i-i) “COMO FUNCIONA 1 – O agente complexante atrai e aprisiona os iões de metal da água de lavar para reduzir significativamente a coloração da roupa provocada pelas moléculas dos filtros UV. 2 – O agente antiredeposição une-se com os filtros UV evitando que estes se agarrem às fibras têxteis e torna mais fácil a sua eliminação na lavagem”;- (i-j-somente em internet) “Ajuda a reduzir as manchas na roupa causadas pelos filtros UV durante a lavagem”;- (i-l) “figura de embalagem, na qual, sob um fundo azul, se encontra a ilustração de “uma t-shirt branca, ao lado da indicação do Fator de Proteção Solar e com igual dimensão e destaque”;- (i-m) “figura de embalagem, encontrando-se no respetivo rosto e tampa em autocolante amarelo, uma t-shirt branca” associada a- (i-n) “NOVO PROTECÇÃO DA ROUPA*”;

através de embalagem
– (i-l) em cujo rosto, sob um fundo azul, se encontra a ilustração de “uma t-shirt branca, ao lado da indicação do Fator de Proteção Solar e com igual dimensão e destaque”;- (i-m) em cujos rosto e tampa se encontra aposto num autocolante amarelo, uma “t-shirt branca” associada a- (i-n) “NOVO PROTECÇÃO DA ROUPA*” associado a- (i-o) “*PROTECÇÃO DA ROUPA: a fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparado com fórmulas anteriores.” (em caixa de texto aposta na parte de trás da embalagem);

através de outdoor
– (i-p) “PROTEJA A PELE E A ROUPA” associado a- (i-q) “imagem de uma mulher e de uma criança”; – (i-u) “A fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparada com fórmulas anteriores.”

1.4. Das alegações das Partes

1.4.1. Em síntese, alega a L’OREAL, em sede de queixa, que:

– (i) “…colocando em primeiro plano uma t-shirt branca – elemento de forte proteção contra o sol, na perceção do consumidor – na embalagem do produto, junto ao índice de proteção solar e com o mesmo destaque, a Denunciada induz o consumidor em erro, pois este irá supor que o produto terá uma proteção idêntica à de uma t-shirt, ou pelo menos, uma proteção reforçada, o que não corresponde à verdade” (sic. ponto 4.1), considerando que tal prática consubstancia uma violação do quadro ético-legal de direito interno e europeu tangente aos princípios da veracidade e do respeito pelos direitos do consumidor em matéria de comunicações comerciais a produtos cosméticos (cfr. pontos  4.1. e 4.3.);

– (ii) “A reivindicação “PROTECÇÃO DA ROUPA” é uma técnica de marketing com a qual a Denunciada tenta captar a atenção do consumidor médio, sem que tal alegação corresponda à realidade. Ou seja, o consumidor médio é enganado pela Denunciada, sob várias formas: a) A primeira é a de que, ao contrário do alegado pela Denunciada, o Produto não protege a priori/na aplicação, a roupa contra as manchas, mas apenas auxiliará na remoção dessas manchas posteriormente (ou melhor, “ajudará a reduzir”); b) A segunda é a de que, na realidade, a roupa fica, sim manchada e nem sequer essas manchas sairão em termos absolutos. A limpeza será “facilitada”, em termos relativos, podendo a roupa ficar com manchas mesmo após lavagem; c) Por fim, o consumidor é enganado com a comparação do Produto com “fórmulas anteriores”, porquanto desconhece em que elementos ou protetores solares a Denunciada se baseou para fazer essa comparação, não se indicando a que formulas e/ou a que produtos se refere” (sic. ponto 4.2.), o que entende configurar uma prática de publicidade enganosa. (cfr. pontos 4.2 e 4.3).

1.4.2. Contestando a denúncia da L’OREAL, vem a BEIERSDORF defender a ética e a legalidade da sua campanha publicitária referindo, designadamente, que:

– (i) as afirmações (…) que são descritas na queixa da Denunciada, sejam as constantes das embalagens dos Produtos, das mensagens publicitárias, incluindo folhetos, outdoors, anúncios televisivos e site de Internet e dos seus expositores, não violam, nem são susceptíveis de violar qualquer norma legal, designadamente, em matéria de publicidade” (sic. art.º 7.º), acrescentando que, “Na verdade, as afirmações feitas pela Denunciada em relação aos Produtos são verdadeiras, claras, leais, objectivas, não sendo susceptíveis de induzir o consumidor em erro” (sic. art.º 8.º);

– (ii) “As informações alusivas a que as fórmulas dos Produtos ajudam a reduzir as manchas durante a lavagem da roupa são, aliás, incluídas numa caixa destacada, para enfatizar as mesmas e para que não surjam dúvidas sobre a sua interpretação, conforme se retira da análise do documento que (…) se junta…” (sic. art.º 21.º), acrescentando que, “…estão logo a seguir à expressão “Protecção da Roupa”, para que não haja qualquer dúvida de que tal protecção está associada à lavagem da roupa” (sic. art.º 22.º) e que, “…sempre se dirá que, independentemente do momento em que a acção de Protecção da Roupa se efectiva, ou seja, a priori ou a posteriori, a mesma é um facto, verdadeiro e susceptível de prova, na medida em que podem mesmo não se chegar a encontrar quaisquer resíduos dos filtros UV na roupa, após a lavagem” (sic. art.º 23.º), o que “…se retira da análise dos Doc. (…) que ora se juntam e que constituem prova das referidas alegações.” (sic. art.º 24.º);

– (iii) “Já no que concerne ao argumento de que a utilização de uma t-shirt branca induz o consumidor em erro, pois este entenderá que os Produtos terão uma protecção idêntica à de uma t-shirt, ou pelo menos, uma protecção reforçada, tal interpretação não só carece de qualquer fundamento como chega a roçar a fantasia” (sic. art.º 56.º), acrescentando que “…o uso da t-shirt (…) nunca poderá ser interpretado de forma isolada, face a todos os outros elementos informativos que constam dos próprios Produtos e de todo o material de comunicação associado…” (sic. art.º 57.º) porquanto “…a t-shirt está inserida numa mensagem em que se pode ler: “O PRIMEIRO PROTECTOR SOLAR QUE PROTEGE A ROUPA CONTRA AS MANCHAS AMARELAS DO PROTECTOR” (sic. art.º 58.º) e “A própria t-shirt tem inscrita em algumas comunicações (…) a seguinte referência: “PROTECTOR SOLAR QUE PROTEGE A ROUPA CONTRA AS MANCHAS AMARELAS DO PROTECTOR”. (sic. art.º 59.º);

– (iv) “Acresce que a Denunciante não faz qualquer prova de que o uso da imagem da t-shirt, nos termos em que o faz a Denunciada, é susceptível de confundir o consumidor e/ou que efectivamente o confunde, levando-o a não se proteger eficazmente, por entender que o uso dos Produtos equivale a ter uma t-shirt vestida” sic. art.º 63.º).

2. Enquadramento ético-legal

2.1. Das alegações publicitárias que reivindicam a proteção da roupa

Estão ora em causa, os claims: (i-a) “t-shirt branca” estampada associada a (i-b) “CONTRA AS MANCHAS AMARELAS DO PROTECTOR”; (i-c) “O PRIMEIRO PROTECTOR SOLAR QUE PROTEGE A ROUPA*”; (i-d) “*PROTECÇÃO DA ROUPA: a fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparada com fórmulas anteriores”; (i-e) “O 1º PROTECTOR SOLAR NO MUNDO QUE PROTEGE TAMBÉM A ROUPA”; (i-f) “A protecção solar eficaz necessita de poderosos filtros UV. Infelizmente, estes filtros podem causar manchas desagradáveis na sua roupa”; (i-h) “Não só protege a sua pele como também potencia o desaparecimento das manchas dos filtros UV mais facilmente na lavagem da sua roupa*”, (i-i) “COMO FUNCIONA 1 – O agente complexante atrai e aprisiona os iões de metal da água de lavar para reduzir significativamente a coloração da roupa provocada pelas moléculas dos filtros UV. 2 – O agente antiredeposição une-se com os filtros UV evitando que estes se agarrem às fibras têxteis e torna mais fácil a sua eliminação na lavagem”; (i-j-somente em internet) “Ajuda a reduzir as manchas na roupa causadas pelos filtros UV durante a lavagem”; (i-m) “rosto e tampa de embalagem em autocolante amarelo, uma t-shirt branca” associada a (i-n) “NOVO PROTECÇÃO DA ROUPA*” associado a (i-o) “*PROTECÇÃO DA ROUPA: a fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparado com fórmulas anteriores.” (em caixa de texto aposta na parte de trás da embalagem).
Considerando que os claims referidos consubstanciam uma prática de publicidade enganosa, alega a LÓREAL a ponto 4.2. da sua queixa que:
“….o consumidor médio é enganado pela Denunciada, sob várias formas:a) A primeira é a de que, ao contrário do alegado pela Denunciada, o Produto não protege a priori/na aplicação, a roupa contra as manchas, mas apenas auxiliará na remoção dessas manchas posteriormente (ou melhor, “ajudará a reduzir”);b) A segunda é a de que, na realidade, a roupa fica, sim manchada e nem sequer essas manchas sairão em termos absolutos. A limpeza será “facilitada”, em termos relativos, podendo a roupa ficar com manchas mesmo após lavagem;c) Por fim, o consumidor é enganado com a comparação do Produto com “fórmulas anteriores”, porquanto desconhece em que elementos ou protetores solares a Denunciada se baseou para fazer essa comparação, não se indicando a que formulas e/ou a que produtos se refere.” (sic).

No que concerne ao alegado entendimento por parte do consumidor médio de que a utilização dos produtos Nívea Sun implica, necessariamente, a proteção total da roupa a priori, porquanto possuem propriedades que impedem a formação de manchas aquando da respetiva aplicação, entende o Júri que a expressão “proteger” assume vários significados de entre os quais, não raras vezes, o relacionado com a ideia de prevenção. No entanto, nesta não se esgotam as conotações possíveis. Com efeito, de acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2003), pp. 3002, tal expressão, também pode significar “ajudar”, “cuidar”, “auxiliar”, “favorecer” e “privilegiar”, entre outros significados possíveis, o que o Júri considera encontrar-se em concordância com o argumentado pela BEIERSDORF no sentido de que: “…sempre se dirá que, independentemente do momento em que a acção de Protecção da Roupa se efectiva, ou seja, a priori ou a posteriori, a mesma é um facto, verdadeiro e susceptível de prova, na medida em que podem mesmo não se chegar a encontrar quaisquer resíduos dos filtros UV na roupa, após a lavagem”. (sic. art.º 23.º da contestação).

Ora, na realidade, de acordo com o teor dos docs. 1 a 9 juntos aos autos pela Requerida, conclui o JE que as alegações publicitárias em lide se encontram comprovadas, em observância do disposto nos artigos 4,º, n.ºs 1 e 2, 5.º, 9.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) e 12.º do Código de Conduta da ARP.

Mais, rejeita o Júri, ainda, a tese de que as variantes do claim “proteção da roupa” assumem os significados invocados pela Requerente de “proteção total” e de “roupa não manchada logo após a utilização”, por dois motivos que vão para além dos respetivos significados literal e semântico, e os quais decorrem:

– (i) por um lado, do facto de os claims (i-d) “*PROTECÇÃO DA ROUPA: a fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparada com fórmulas anteriores”; (i-h) “Não só protege a sua pele como também potencia o desaparecimento das manchas dos filtros UV mais facilmente na lavagem da sua roupa*”, (i-i) “COMO FUNCIONA (…) O agente antiredeposição une-se com os filtros UV evitando que estes se agarrem às fibras têxteis e torna mais fácil a sua eliminação na lavagem”; (i-o) “*PROTECÇÃO DA ROUPA: a fórmula inovadora ajuda a reduzir as manchas na roupa, causadas pelos filtros UV, durante a lavagem – quando comparado com fórmulas anteriores.” (em caixa de texto aposta na parte de trás da embalagem) serem comprovadamente visíveis nos vários suportes da campanha em lide, permitindo a valoração das aludidas variantes de reivindicação de proteção da roupa (cfr. (i-a), (i-b), (i-c), (i-e), (i-f), (i-g), (i-l), (i-m) e (i-n)) não se verificando, deste modo, uma prática de publicidade enganosa por omissão;

– (ii) em estreita relação com esta última conclusão, e por outro lado, da circunstância de o entendimento da L’OREAL se estribar num estudo em que a metodologia não é explicada, cuja amostra é de somente cento e cinquenta pessoas, e cuja omissão de apresentação aos inquiridos da totalidade dos claims verbais e visuais que o JE acabou de elencar, faz com que o mesmo, no tocante às alegações publicitárias ora analisadas, não possua significado conclusivo a nível nacional, pelo que, atento o entendimento a que chegou o Júri sobre a bondade da prova apresentada pela BEIERSDORF (e pela própria Requerente, que junta aos autos cópia da comunicação comercial nos vários suportes considerados pelo Júri), quanto aos claims ora em análise, sobre a Requerida não impenderia a obrigação de junção de estudo contraditório incidente sobre a perceção do consumidor médio.

Finalmente, sustenta ainda a L’OREAL que “…o consumidor é enganado com a comparação do Produto com “fórmulas anteriores”, porquanto desconhece em que elementos ou protetores solares a Denunciada se baseou para fazer essa comparação, não se indicando a que formulas e/ou a que produtos se refere.” (sic. ponto 4.2. da petição).

O JE discorda de tal linha de raciocínio da Requerente, por virtude de se estar aqui em presença de uma caso de “auto-comparação” a qual – de acordo com melhor doutrina jus-publicitária -, dispensará qualquer listagem de produtos comercializados pelo anunciante antes do “produto inovador” comunicado, devendo considerar-se informação essencial e bastante a prestar ao consumidor médio, razoavelmente advertido, esclarecido e informado, a menção: “quando comparado com fórmulas anteriores”. (Cfr. 1.3.1.2. (i-o) e (i-u)).

2.2. Do claim t-shirt branca alegadamente valorativo do fator de proteção solar  Encontra-se ora em causa a alegação publicitária ou reivindicação (i-l) “embalagem, ou figura de embalagem, na qual, sob um fundo azul, se encontra a ilustração de “uma t-shirt branca, ao lado da indicação do Fator de Proteção Solar e com igual dimensão e destaque”.

A propósito, sustenta a L’OREAL, em sede de petição a ponto. 4.1., que:
“O autocolante amarelo, na tampa azul do Produto, com uma t-shirt branca provoca a atenção do consumidor. Da mesma forma, a segunda t-shirt branca colocada novamente, sobre o fundo azul da embalagem do Produto, desta vez, ao lado do FPS, provoca a atenção do consumidor.

Entendemos que a colocação da t-shirt branca, ao lado do FPS, com o mesmo destaque (dimensão e destaque visual pela cor), suscita no consumidor a conclusão de que o Produto protege tão eficazmente contra os raios solares como uma t-shirt. Na verdade, o “consumidor médio” português sabe que a melhor proteção contra os efeitos maliciosos do sol será a utilização de roupa. Com efeito, por força das campanhas de proteção solar das autoridades de saúde, o consumidor é sempre informado dos benefícios da utilização de roupa clara nos momentos de exposição solar. A título de exemplo, recordamos a (…) recomendação da Direção Geral de Saúde (…) Em várias ocasiões, essa mesma recomendação é ilustrada por desenhos de t-shirt em tudo igual à reproduzida no Produto da Denunciada.

Assim, colocando em primeiro plano uma t-shirt branca – elemento de forte proteção contra o sol, na perceção do consumidor – na embalagem do produto, junto ao índice de proteção solar e com o mesmo destaque, a Denunciada induz o consumidor em erro, pois este irá supor que o produto terá uma proteção idêntica à de uma t-shirt, ou pelo menos, uma proteção reforçada, o que não corresponde à verdade.

O consumidor médio, ao ver duas t-shirts na embalagem do Produto, forma uma conexão lógica entre o fator de proteção solar e a t-shirt, entendendo que a proteção contra o sol é garantida pelo Produto como se usasse roupas de proteção.

À presença de duas t-shirts brancas na embalagem do produto – uma junto ao FPS, formando uma unidade gráfica, e outra no autocolante na tampa – podem ser objetivamente atribuídos dois significados:(i) à t-shirt da tampa, que o produto protege a roupa, uma vez que vem acompanhada dessa alegação;(ii) à t-shirt junto do FPS, que o produto protege tanto como a utilização de uma t-shirt.

Poderá a Denunciada argumentar que ambas as t-shirts no produto terão a mesma mensagem – a de o Produto proteger a roupa – no entanto, assim não é, as duas interpretações são plausíveis, o que é, em si, confuso para o consumidor.

Essa conclusão tem, até, o efeito potencialmente nefasto para a saúde, de o consumidor não se proteger o máximo possível, uma vez que pensa que com o Produto beneficia de uma proteção semelhante à da roupa.” (sic., negrito e sublinhado do JE).

O Júri concorda, na íntegra, com as afirmações vertidas na queixa da L’OREAL e reproduzidas, cumprindo-lhe acrescentar que tal interpretação possui fundamento e não roça a fantasia, ao contrário do alegado a art.º 56.º da contestação.

De facto, é verdade que quanto à denuncia ora em análise, a Requerente “…não faz qualquer prova de que o uso da imagem da t-shirt, nos termos em que o faz a Denunciada, é susceptível de confundir o consumidor e/ou que efectivamente o confunde, levando-o a não se proteger eficazmente, por entender que o uso dos Produtos equivale a ter uma t-shirt vestida” (sic. art.º 63.º da contestação) e que “…a única prova que a Denunciante apresenta é o estudo encomendado (…) à Netsonda” (sic. art.º 64.º da contestação) e junto aos autos com a queixa como Anexo II, cujos vícios o Júri apontou no ponto anterior.

Contudo, não é menos verdade que é sobre a BEIERSDORF, enquanto anunciante, que impende o ónus da prova de que a associação da imagem da t-shirt ao Fator de proteção solar não é suscetível de confundir o consumidor, levando-o a não se proteger eficazmente, por entender que os produtos Nívea Sun possuem uma proteção reforçada, prova essa que a Requerida não juntou aos autos com a contestação. A contrario, à L’OREAL bastaria colocar em causa a impossibilidade de não indução em erro do consumidor, por via do claim t.shirt branca associado ao fator de proteção solar. Tal, já que tange ao princípio da veracidade em matéria de comunicações comerciais, vulgo, publicidade (de que o quadro legal decorrente dos artigos 11.º do Decreto-Lei n.º 189/2008, de 24 de Setembro, 20.º do Regulamento n.º 1223/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Novembro de 2009, artigo 1.º do Regulamento (UE) n.º 655/2013 da Comissão, de 10 de Julho de 2013 e ponto 6.1. do respetivo Anexo, bem como da Recomendação da Comissão Europeia, de 22 de Setembro de 2006, relativa à eficácia e às propriedades reivindicadas dos protectores solares constitui corolário lógico) não se aplica o disposto no artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, porquanto se inverte o ónus da prova.

Saliente-se que se dispõe no artigo 4.º, n.º 1 do Código da Auto-Regulação Publicitária, sob a epígrafe “Princípios Fundamentais” que, “Todas as comunicações comerciais devem ser legais, decentes, honestas e verdadeiras” (negrito e sublinhado do JE) sendo que, de acordo com o artigo 5.º do mesmo Código, as mesmas devem “…respeitar os valores, direitos e princípios reconhecidos na Constituição e na restante legislação aplicável”.

Ora, foi entendido quer pelo legislador português, quer pela União Europeia (cfr. Directivas 84/450/CEE e 97/55/CE) que, como norma de instrução em matéria de observância do princípio da veracidade, se devia instituir uma regra de direito probatório (cfr. actual n.º 3 do artigo 11.º do Código da Publicidade) nos termos da qual se presumem inexatos os dados referidos pelo anunciante na falta de apresentação de provas ou na insuficiência das mesmas, no que, aliás, o articulado dos artigos 4.º, 5.º e 12.º do Código de Conduta do ICAP se encontram em consonância, pelo que impende sobre a BEIERSDORF, o ónus da prova das alegações publicitárias em lide.

Com efeito, nos termos do referido artigo 12.º, “As descrições, alegações ou ilustrações relativas a factos verificáveis de uma comunicação comercial, devem ser susceptíveis de comprovação” (1) e “Esta comprovação deve estar disponível de maneira que a prova possa ser prontamente apresentada por mera solicitação do ICAP”. (2).

Não se pode deixar de referir que o estudo da Netsonda (cfr. Anexo II junto aos autos com a queixa), não obstante padecer das incorreções e, ou, insuficiências que já foram elencadas pelo Júri, bem como de outras apontadas pela BEIERSDORF a art.ºs 71.º a 88.º da contestação – e as quais obrigam à conclusão de uma considerável margem de erro quanto aos resultados – aponta, contudo, para uma tendência…Isto, na medida em que o JE não concorda com a Requerida quanto ao alegado a art.º 84.º da contestação, no sentido de que “As conclusões do estudo em apreço apenas reflectem os elementos apurados naquele específico nível de generalidade e abstracção, uma vez que não foram devidamente considerados todos os elementos relevantes de informação que constam das embalagens dos Produtos na sua totalidade e do contexto global em que se inserem.“ (sic). Com efeito, opina o JE que, no que se refere ao caso particular do claim imagético ora em análise (segunda t-shirt branca ao lado do fator de proteção solar) não só deve ser considerado irrelevante o “contexto global em que se insere”, como deve ser tido como relevante, o “nível de generalidade e abstração” comunicado aos respondentes.

O Júri terá oportunidade de se debruçar sobre as razões de ambos os entendimentos.

Para já, tal como se expôs supra, quer reforçar a ideia de que um estudo com cento e cinquenta respostas é um estudo indicativo de possíveis conclusões mas, não significativo a nível nacional. Porém, podem inferir-se tendências de opinião. De uma forma espontânea, as respostas com menos de 20% são isso mesmo: pouco expressivas. Por outro lado, 65% quando observa a imagem da t-shirt ao lado do fator de proteção solar diz que tem um alto grau de proteção, e isso é, dentro da amostra importante.

Ora, quer o Júri vincar em primeiro lugar que, quando se trata da proteção jurídica do bem jurídico saúde (com inclusão do de crianças, o que milita como fator agravante: cfr, Anexo I junto à queixa) – e em relação ao qual será escusado afirmar que a respetiva importância em nada se coaduna com a atribuída a mero vestuário – como acontece in casu:

– (i) a utilização do critério do consumidor médio “normalmente informado e razoavelmente atento e advertido”  não deve implicar que se considere despicienda uma ínfima percentagem que seja de indivíduos comuns (no caso vertente, até capazes de responder a inquéritos através da internet) que não percecionem quaisquer signos ou associações imagético-verbais de forma semelhante à maioria… Isto, de forma a que aqueles não possam ser considerados como “descartáveis”, no que diz respeito à proteção do bem jurídico saúde. Logo, o Júri rejeita como admissível, a tentativa de redução de uma imagem associada a um fator de proteção solar, a signos e estruturas mínimas estatisticamente quantificáveis;

– (ii) É, aliás, por este motivo, que existem estabelecidos quadros legais de direito interno e europeu os quais, não se bastando com o referente aos princípios da veracidade e do respeito pelos direitos do consumidor consagrados nas leis da publicidade, consignam normas específicas e mais restritivas em matéria de obrigação de clareza quanto às reivindicações que indicam a eficácia dos protetores solares, impondo que as ditas sejam simples, inequívocas, significativas e assentem em critérios normalizados e reprodutíveis. Tal, nomeadamente, através de Regulamentos da União Europeia, com no chamado efeito direto ou da aplicabilidade direta do direito produzido no âmbito da UE, no quadro do princípio do primado. Logo, os critérios restritivos de licitude em matéria de publicidade e rotulagem quer de produtos cosméticos em geral, quer de protetores solares em particular, é imperativo e imediato obrigando, diretamente, todos na União Europeia, incluindo as empresas.

– (iii) É exatamente por tal razão, que o legislador europeu, em sede do Regulamento (CE) N.º 1223/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 30 de Novembro de 2009 relativo aos produtos cosméticos, dispõe nos considerandos 2 e 4 que “Um regulamento constitui o instrumento jurídico adequado, dado que impõe normas claras e circunstanciadas, sem dar azo a transposições divergentes pelos Estados-Membros. Além disso, um regulamento assegura que os requisitos jurídicos sejam aplicados ao mesmo tempo em toda a Comunidade” e “que o “…regulamento harmoniza de forma exaustiva as normas aplicáveis na Comunidade a fim de estabelecer um mercado interno dos produtos cosméticos, assegurando em simultâneo um elevado nível de protecção da saúde humana.”. Tal, em coerência com a redação do respetivo artigo 1.º, sob a epígrafe “Âmbito e objetivo”, onde se lê: “O presente regulamento estabelece as normas que os produtos cosméticos disponíveis no mercado devem cumprir a fim de garantir (…) um elevado nível de protecção da saúde humana”, bem como com a do artigo 20.º, n.ºs 1 e 2, sob a epígrafe “Alegações sobre o produto”, em que se dispõe, claramente, que: “Na rotulagem, na disponibilização no mercado e na publicidade dos produtos cosméticos, o texto, as denominações, marcas, imagens ou outros sinais, figurativos ou não, não podem ser utilizados para atribuir a esses produtos características ou funções que não possuem” e “A Comissão deve elaborar, em cooperação com os Estados-Membros, um plano de acção relativo às alegações utilizadas e fixar prioridades para a determinação de critérios comuns que justifiquem a utilização de uma alegação.” (negrito e sublinhado do JE);

– (iv) É, igualmente, por tal motivo que, no artigo 1.º do Regulamento (UE) n.º 655/2013 da Comissão, de 10 de Julho de 2013, se consigna que, o mesmo “… é aplicável às alegações sob a forma de texto, denominações, marcas, fotografias e imagens ou a outros sinais que transmitam explícita ou implicitamente características ou funções do produto na rotulagem, na comercialização e na publicidade dos produtos cosméticos” e que, o mesmo “…é aplicável a qualquer alegação, independentemente do suporte ou tipo de instrumento de comercialização utilizados, funções alegadas para o produto e público-alvo”, dispondo-se, ainda, no ponto 6.1. do respetivo Anexo, que “1) As alegações devem ser claras e compreensíveis para o utilizador final comum. 2) As alegações são parte integrante dos produtos e devem conter informações que permitam que o utilizador final comum faça uma escolha informada. 3) As mensagens de natureza comercial devem ter em conta a capacidade de o público-alvo (conjunto da população dos Estados-Membros pertinentes ou segmentos da população, por exemplo, os utilizadores finais de diferentes idades e género) compreender a comunicação. As mensagens de natureza comercial devem ser claras, exatas, pertinentes e compreensíveis pelo público-alvo.” (negrito e sublinhado do JE);

– (v) É, também, por tal razão que, no considerando (18) da Recomendação da Comissão Europeia, de 22 de Setembro de 2006, relativa à eficácia e às propriedades reivindicadas dos protectores solares, se dispõe que: “As reivindicações respeitantes à eficácia dos protetores solares devem ser simples, significativas e baseadas em critérios idênticos, para ajudarem o consumidor a comparar produtos e a escolher o produto certo para uma determinada exposição e um dado tipo de pele” (negrito e sublinhado do Júri) e que, em 11 se refere que, “Nem mesmo os protectores solares muito eficazes e que protegem das radiações UVB e UVA podem garantir protecção completa contra os riscos da radiação UV para a saúde. Nenhum protector solar consegue filtrar toda a radiação ultravioleta (UV). Além disso, não existem, até agora, provas científicas conclusivas de que a utilização de protectores solares previne o melanoma. Consequentemente, os protectores solares não devem reivindicar ou dar a impressão de que constituem protecção total contra os riscos decorrentes da sobre-exposição à radiação UV.” (negrito e sublinhado do JE);

– (vi) Mais, é por virtude de toda a preocupação europeia vertida nas normas citadas, e sem excluir, que o legislador nacional, refere no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 189/2008, de 24 de Setembro (que estabelece o regime jurídico dos produtos cosméticos e de higiene corporal) que sem prejuízo do disposto no mesmo decreto-lei, “…designadamente quanto à rotulagem, menções ou idioma utilizados, aplica-se à publicidade de produtos cosméticos o disposto no Código da Publicidade”. Logo, aplicam-se, os princípios da veracidade e do respeito pelos direitos do consumidor nele consignados.

É chegado o momento de ser explicada pelo Júri a afirmação que acima verteu, quanto ao caso particular do claim imagético ora em análise (segunda t -shirt branca ao lado do fator de proteção solar) aquela no sentido de não só dever ser considerado irrelevante o “contexto global em que se insere”, como dever ser tido como relevante, o “nível de generalidade e abstração” comunicado aos respondentes ao inquérito da Netsonda. Isto, para o efeito de melhor esclarecer a razão pela qual o JE entende que a presença de duas t-shirts brancas na embalagem dos produtos Nívea Sun (uma junto ao Fator de Proteção Solar, formando uma unidade gráfica, e outra no autocolante na tampa, configurando uma outra) podem ser atribuídos dois significados diversos por parte do consumidor médio: à t-shirt da tampa, o significado de que aqueles protegem a roupa; à t-shirt junto do Fator de Proteção Solar, que o produto protege tanto como a utilização de uma t-shirt ou que, a proteção é reforçada contrariando, assim, o alegado pela BEIERSDORF a art.ºs 56.º a 59.º da contestação.

Ora, concluindo, interessa aqui a chamada metafunção textual, para o efeito de se aferir a legitimidade de não só dever ser considerado irrelevante o contexto global dos elementos contidos na embalagem, e em que se insere o claim ora em causa”, como relevante, o “nível de generalidade e abstração” da sua análise em separado. Concretamente, refere-se o JE aos arranjos de composição específicos na relação de “layout” e, ou, na interligação verbo-icónica contida nas embalagens dos produtos Nívea Sun os quais:

– Quanto ao “valor de informação”, colocam como “novidade”, a t-shirt branca, em razão da respetiva aposição à esquerda;

– No que se refere ao elemento “saliência”, implicam o tamanho da t-shirt seja superior ao do FPS e que o branco usado se sobreponha ao amarelo torrado do mesmo Fator de Proteção Solar;

– Por último, mas de suma importância para o caso em análise, indicam uma opção quanto ao fator “estruturação” (framing). De facto, quanto a este, verifica-se a presença de planos de estruturação concebidos através de elementos que criam linhas divisórias (logotipo Nívea Sun, referência “protect & moisture” – ou outra equivalente – e menção “Hidratante”, pelo menos, e sem excluir) as quais desconectam elementos da imagem, determinando um sentido diverso do derivado do claim “Proteção da roupa” associado a igual t-shirt branca (na tampa) e por uma linha vertical de estruturação real que conecta a segunda t-shirt ao Fator de Proteção Solar:
Deste modo, ao analisar os principais fatores que, através do claim a que se reporta o JE, perpassam o texto publicitário da totalidade da campanha objecto de denúncia, pode-se concluir que, pela utilização de recursos linguístico-argumentativos e icónicos que conferem à dita efeitos de sentido capazes de persuadir o respectivo destinatário (por meio de aparentemente simples jogos de linguagem e de imagética ancorados em layouts), “proteção da roupa” e “proteção da pele”, são uma espécie de “dois em um” (como se de bens jurídicos com importância equivalente, aqui se tratasse). Esta, uma conclusão que se encontra sobejamente ilustrada na peça publicitária divulgada através de outdoor (cfr. Anexo I junto à queixa). Na realidade, deste consta o claim ou reivindicação (i-p) “PROTEJA A PELE E A ROUPA”, quer associado a (i-q) “imagem de uma mulher e de uma criança na praia”, quer a um hastag não mencionado pela Requerente (mas cuja presença o Júri suscita, já que se está aqui no âmbito de auto-regulação) “#SIMaoSOL” (sem mais…). Esta, uma prática que dispensará grandes considerandos quanto à inverdade do alegado a art.º 57.º da contestação no sentido de que: “Na verdade, o uso da t-shirt, no caso em apreço nunca poderá ser interpretado de forma isolada, face a todos os outros elementos informativos que constam dos próprios Produtos e de todo o material de comunicação associado, usado pela Denunciada” (sic). Dito de outra forma, tal configura uma prática que se encontra em desconformidade com todos os normativos citados supra, bem como com os artigos 9.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e h) e 21.º do Código de Conduta da ARP. Concretamente, mas sem excluir, em franca contradição com o consignado no considerando (18) da Recomendação da Comissão Europeia, de 22 de Setembro de 2006, relativa à eficácia e às propriedades reivindicadas dos protectores solares, se dispõe que: “As reivindicações respeitantes à eficácia dos protetores solares devem ser simples, significativas e baseadas em critérios idênticos, para ajudarem o consumidor a comparar produtos e a escolher o produto certo para uma determinada exposição e um dado tipo de pele” (negrito e sublinhado do Júri) e que, em 11 se refere que, “Nem mesmo os protectores solares muito eficazes e que protegem das radiações UVB e UVA podem garantir protecção completa contra os riscos da radiação UV para a saúde. Nenhum protector solar consegue filtrar toda a radiação ultravioleta (UV).

Além disso, não existem, até agora, provas científicas conclusivas de que a utilização de protectores solares previne o melanoma.

Consequentemente, os protectores solares não devem reivindicar ou dar a impressão de que constituem protecção total contra os riscos decorrentes da sobre-exposição à radiação UV.” (negrito e sublinhado do JE).

Por maioria de razão do que se expôs, a certeza sustentada pela BEIERSDORF no que se refere à impossibilidade de a segunda t-shirt branca ao lado do fator de proteção solar poder ser interpretada pelo destinatário, nos moldes defendidos pela L’OREAL é, veementemente rejeitada pelo Júri porquanto, mais não seja, grande parte da problemática trazida à colação residir no facto de a comunicação não ser possível se não existir um código comum ao emissor e ao recetor“, sendo que este último joga um papel indispensável.

Efetivamente, fabricar uma imagem funcional implica construí-la em conformidade com um reportório conhecido pelo destinatário e segundo as regras de encadeamento normais. É este conhecimento do código que permite fazer surgir o significado. Ora, para além do que se expendeu em matéria de metafunção textual, poderá acrescentar-se que, se outros motivos não existirem, a t-shirt em apreço é em tudo semelhante à que a Direção Geral de Saúde tem usado em campanhas destinadas à proteção contra os raios UV, o que traduz um facto público e notório. Por outro lado, o verbal e o icónico têm também os seus espaços próprios, os quais, por vezes, interagem e se completam e, noutras, se excluem, dado que “não sentem” mútua necessidade. No caso vertente, interagem na associação feita na tampa, em que a t-shirt serve de ilustração de um texto publicitário, reforçando-lhe o sentido; excluem-se, na conjugação entre t-shirt e Fator de Proteção Solar gerando, assim, a susceptibiliade de várias interpretações, o que o legislador quis evitar com a imposição geral de as mensagens de natureza comercial referentes a produtos cosméticos deverem claras, exatas, pertinentes e compreensíveis pelo público-alvo. Dito de outra forma, deverem ser simples, significativas e baseadas em critérios idênticos, para ajudarem o consumidor a comparar produtos e a escolher o certo para uma determinada exposição e um dado tipo de pele.” Cfr, Recomendação da Comissão Europeia, de 22 de Setembro de 2006, relativa à eficácia e às propriedades reivindicadas dos protectores solares).

Com efeito, no caso do claim colocados em crise, ora em análise, não se justifica uma ancoragem, já que não se verifica uma mútua necessidade entre a componente verbal e a componente icónica. Saliente-se que, no entender do Júri, não se estabelece uma homologia de soluções entre o discurso verbal (FPS) e o icónico (t-shirt) mas sim, a total discordância. Isto, caso não se pretenda que a mesma signifique “proteção reforçada da pele”, o que crê o JE.

Por outro lado, a forma na qual se dispõem as qualidades sensoriais de uma imagem fixa, entendida como “tábua rasa” (ao contrário das imagens em movimento), e de como aquelas se relacionam entre si, abarca aspetos tais como o tamanho, a situação, o modelo, o equilíbrio, a figura, o fundo, a proximidade e o fecho, cuja conjugação, no caso a que se reporta o Júri, pode contribuir, pelo menos, para a perceção de que a t-shirt branca associada ao FPS, significa uma proteção reforçada.

De facto, uma das características menos desejáveis de qualquer imagem que se associe à informação do consumidor quanto ao Fator de Proteção Solar de um produto cosmético, é a do seu nível de ambiguidade, quando comparada com o texto, na medida em que, como se tem referido ad nauseam, está em causa a proteção do bem jurídico saúde de adultos, adolescentes e crianças. De onde, neste tocante, o Júri entende que a comunicação comercial da responsabilidade da BEIERSDORF – e da qual consta o claim em apreço – divulgada nos suportes, outdoor, internet, folheto, embalagem e gôndola de ponto de venda constituem uma prática de publicidade enganosa, por desconformidade com o quadro ético-legal que ficou elencado.

3. Decisão

Termos em que, a Segunda Secção do Júri de Ética da Auto-Regulação Publicitária delibera no sentido de que a comunicação comercial da responsabilidade da BEIERSDORF, em apreciação no presente processo – e nos seus vários suportes – se encontra desconforme com o disposto nos artigos 4.º, n.ºs 1 e 2, 5.º, 9.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e h), 12.º e 21.º do Código de Conduta da ARP, bem como nos artigos 11.º do Decreto-Lei n.º 189/2008, de 24 de Setembro, 20.º, n.º 1, do Regulamento n.º 1223/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Novembro de 2009, artigo 1.º do Regulamento (EU) n.º 655/2013 da Comissão, de 10 de Julho de 2013 e ponto 6.1. do respetivo Anexo, bem como dos ponto 11 e 18. da Recomendação da Comissão Europeia, de 22 de Setembro de 2006, pelo que a sua divulgação deverá cessar de imediato e não deverá ser reposta – quer na sua totalidade, quer em termos parciais – caso se mantenham os tipo de ilícito apurados pelo JE.».

A Presidente da Segunda Secção do Júri de Ética da ARP

Auto Regulação6J / 2017 :: L’óreal Portugal vs. Beiersdorf Portuguesa