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5J / 2014 :: Henkel Ibérica Portugal vs. Unilever Jerónimo Martins

5J/2014

Henkel Ibérica Portugal
vs.
Unilever Jerónimo Martins

EXTRACTO DE ACTA

Reunida no vigésimo quarto dia do mês de Abril do ano de dois mil e catorze, a Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP, apreciou o processo nº 5J/2014 tendo deliberado o seguinte:

Processo n.º 5J/2014

1.   Objecto dos autos

1.1.   A HENKEL IBÉRICA PORTUGAL, UNIPESSOAL LDA. (a seguir indiscriminada e abreviadamente designada por «Henkel» ou Requerente), veio, junto do Júri de Ética do ICAP (adiante indiscriminada e abreviadamente designado por Júri ou JE), apresentar queixa contra a UNILEVER, JERÓNIMO MARTINS, Lda. (adiante indiscriminada e abreviadamente designada por ULJM ou Requerida), relativamente a comunicação comercial ao seu produto “SKIP Pequeno & Poderoso” – promovida pela última nos suportes outdoors, expositores nos pontos de venda, gargantilhas apostas no próprio produto e filmes publicitários, por alegada violação dos artigos 7.º, n.º 1, e nº 2 e artigo 10.º, n.º 1 do Código de Conduta, bem como o artigo 7.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 57/2008.

1.2.   Notificada para o efeito, a ULJM apresentou a sua contestação.
Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pelas Partes.

2. Enquadramento e fundamentação ético-legal 

2.1. Síntese da posição das partes
As posições apresentadas pelas partes podem ser sintetizadas como segue:

2.2.1. Queixosa

– Recentemente, a Unilever lançou uma campanha publicitária a ‘Skip’, mais concretamente ao denominado ‘Skip Pequeno & Poderoso’, em que, em suma, alega o seguinte: “O melhor detergente líquido do mercado”, com uma nota de rodapé, de onde consta menção “Estudo Nielsen, janeiro de 2014, 600 utilizadores de detergente líquido”;

– Esta campanha tem vindo a ser veiculada através de vários suportes ou meios, nomeadamente outdoors, expositores nos pontos de venda, gargantilhas apostas no próprio produto e filmes publicitários;

– Sucede que ‘Skip Pequeno & Poderoso’ não é o melhor detergente líquido do mercado. Tal “resulta de relatório técnico elaborado pelo reputado laboratório ‘Eurofins ATS’, especializado em análises a produtos de consumo e que atua no mercado há mais de 30 anos, prestando serviços tanto a empresas como a organizações de consumidores”;

– Ou seja, ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é menos eficiente na remoção de nódoas, e portanto pior, que os seus concorrentes ‘Fairy’ e ‘Ariel Actilift’;

– E ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é tão eficiente na remoção de nódoas como os seus concorrentes ‘Skip Active Clean’, ‘Persil Super Power Gel’, ‘Persil Color Power Gel’ e ‘Persil Uni Gel’;- Concretamente, no que tange a nódoas branqueáveis ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é, pelo menos, pior do que ‘Ariel Actilift’ e ‘Fairy’ e igual a ‘Persil Uni Gel’;

– No que tange a nódoas enzimáticas ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é, pelo menos, pior do que ‘Fairy’, ‘Ariel Actilift’, ‘Persil Super Power Gel’ e ‘Persil Color Power Gel’ e igual a ‘Persil Uni Gel’ e ‘Skip Active Clean’;

– No que tange a nódoas de gordura, pigmentos e cosméticos ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é, pelo menos, pior do que ‘Fairy’, ‘Ariel Actilift’ e ‘Skip Active Clean’;

– A menção “o melhor” reporta-se, evidentemente, ao desempenho do produto, sendo esta a característica principal que o consumidor médio associa a um detergente: o que dele quer é que lave bem, eliminando eficazmente as nódoas;

– A menção “o melhor” não se reporta evidentemente a uma qualquer outra característica do produto em apreço, necessariamente secundária (aceitação que o produto tem junto dos consumidores, apresentação, etc.);

– Por outras palavras, o consumidor médio, quando confrontado com o claim em apreço, a mensagem que retira é que ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é o detergente líquido do mercado que tem melhor desempenho;

– O ‘Skip Pequeno & Poderoso’ não é o melhor detergente líquido do mercado;

– O estudo da ‘Nielsen’ não constitui meio idóneo para sustentar a menção que ‘Skip Pequeno & Poderoso’ é o melhor detergente líquido do mercado; e- A referência ao estudo da ‘Nielsen’ é susceptível de induzir o consumidor em erro, pois o consumidor médio não sabe o que é a ‘Nielsen’ nem a que se dedica e é levado a pensar que o claim assenta numa base científica que não existe.

2.2.2. Denunciada

– A queixa apresentada pela Henkel nos presentes autos incide sobre a campanha publicitária a “Skip Pequeno & Poderoso”, mais concretamente refere-se à publicidade onde consta “O melhor detergente líquido do mercado”;

– Através da sua queixa, pretende a Henkel obter do Júri de Ética do ICAP decisão que determine a: i) suspensão, imediata, de toda essa publicidade, independentemente do respectivo suporte ou meio e ii) a abstenção de difundir novamente a referida publicidade, seja por que via for;

– O Júri de Ética deliberou recentemente sobre uma outra queixa deduzida pela PROCTER & GAMBLE Portugal – Produtos de Consumo, Higiene e Saúde, S.A. (adiante abreviadamente designada por P&G) contra a ULJM, tendo precisamente por objecto a campanha publicitária a “Skip Pequeno & Poderoso”;

– Nesse processo, que correu termos sob o número 3J/2014, a P&G pediu ao ICAP a cessação da campanha publicitária em causa porquanto, na opinião da P&G, a alegação publicitária “o Melhor Detergente Líquido do Mercado” seria ilegítima, por força da violação de um conjunto de disposições do Código de Conduta, do Código da Publicidade e do Decreto-Lei 57/2008, de 26 de Março, as quais, de uma forma geral se podem reconduzir à tomada de posição sobre o carácter verdadeiro ou enganoso da alegação publicitária em causa;- Na contestação apresentada, para onde se remete, a ULJM teve ocasião de defender a sua posição na matéria e a legitimidade do claim publicitário;

– Porém, por decisão do Júri de Ética datada de 28.03.2014, foi ordenada a cessação imediata da referida campanha em todos os seus suportes;

– A ULMJ foi notificada dessa decisão no dia 31.03.2014 e nos dias imediatamente seguintes todos os suportes publicitários foram retirados do mercado;

– Ora, a Henkel deu entrada com a queixa no dia 07.04.2014, data portanto em que a campanha já tinha cessado;

– Do exposto resulta que a campanha objecto da queixa ora em apreciação – a queixa da Henkel – já não existia à data da apresentação da denúncia;

– Noutros termos, a queixa é de objecto inexistente;
O Júri de Ética do ICAP já foi confrontado, noutros processos, com publicidade cuja difusão já cessara à data da apreciação da queixa. Vejam-se os processos 18J/2006, 17J/2006 ou 5J/2008;

– Na maioria das situações, trata-se de apreciar uma possível inutilidade superveniente da lide, uma vez que a cessação da campanha publicitária ocorre já depois de instaurada a queixa;

– No caso em apreço, como vimos, no momento da propositura da queixa já a ULJM retirara a campanha do mercado;

– E fizera-o – e aqui reside o aspecto fulcral desta alegação – em obediência a uma anterior decisão do Júri de ética do ICAP sobre a campanha em questão;

– São, portanto, duas as ordens de razões para se considerar, como veremos, que falta um pressuposto processual para que o Júri de Ética se possa pronunciar sobre o fundo da causa:a)   A campanha foi retirada do mercado (razão de ordem material);b)   O Júri de Ética já pronunciou sobre a legitimidade desta mesma campanha (razão de ordem ética);

– Termos em que se conclui que a inutilidade da lide ou a falta de interesse em agir deve conduzir necessariamente a uma decisão de extinção da instância por falta de um pressuposto processual;

– A queixa apresentada pela Henkel nos presentes autos incide sobre a campanha publicitária a “Skip Pequeno & Poderoso”, mais concretamente refere-se à publicidade onde consta “O melhor detergente líquido do mercado”;

– Esse Júri de Ética deliberou recentemente sobre uma outra queixa deduzida pela PROCTER & GAMBLE Portugal – Produtos de Consumo, Higiene e Saúde, S.A. contra a ULJM, tendo precisamente por objecto a campanha publicitária a “Skip Pequeno & Poderoso”;

– A ULMJ foi notificada dessa decisão no dia 31.03.2014 e nos dias imediatamente seguintes todos os suportes publicitários foram retirados do mercado;

– A Henkel deu entrada com a queixa no dia 07.04.2014, data portanto em que a campanha já tinha cessado;- Resulta do exposto que, no momento da apresentação da queixa, já a ULJM retirara a campanha do mercado e fizera-o – e aqui reside o aspecto fulcral desta alegação – em obediência a uma anterior decisão do Júri de Ética do ICAP sobre a campanha em questão.

2.3. Da inutilidade da lide

Na resposta apresentada, a denunciada suscita a inutilidade ab initio do procedimento, questão esta que deve ser resolvida previamente pelo JE.

Com efeito, está em causa nos presentes autos uma campanha publicitária designada Skip Pequeno & Poderoso”, onde, mais concretamente, se refere uma publicidade onde consta a frase “O melhor detergente líquido do mercado”.

Por intermédio da sua queixa pretende a Henkel obter do Júri de Ética do ICAP decisão que determine a: i) suspensão, imediata, de toda essa publicidade, independentemente do respectivo suporte ou meio e ii) a abstenção de difundir novamente a referida publicidade, seja por que via for.

Ora a verdade é que este mesmo Júri de Ética deliberou recentemente sobre uma outra queixa deduzida pela PROCTER & GAMBLE Portugal – Produtos de Consumo, Higiene e Saúde, S.A contra a ULJM, tendo precisamente por objecto a campanha publicitária a “Skip Pequeno & Poderoso” e, no âmbito desse processo, que correu com o nº 3J/2014, a P&G pediu ao ICAP a cessação da campanha publicitária em causa porquanto, escreveu, a alegação publicitária “o Melhor Detergente Líquido do Mercado” seria ilegítima, por força da violação de um conjunto de disposições do Código de Conduta, do Código da Publicidade e do Decreto-Lei 57/2008, de 26 de Março, as quais, de uma forma geral se podem reconduzir à tomada de posição sobre o carácter verdadeiro ou enganoso da alegação publicitária em causa.

A ULJM, na contestação apresentada, defendeu a sua posição na matéria e a legitimidade do seu claim publicitário mas este Júri, em 28.03.2014, ordenou a cessação imediata da referida campanha em todos os seus suportes.

Desta decisão foi a ULMJ notificada em 31.03.2014 e, na sequência, todos os suportes publicitários foram retirados do mercado.

Apurou este JE que a queixa da Henkel tem a data de 07.04.2014, logo posterior àquela em que a campanha da ULJM tinha cessado, pelo que se conclui que a campanha objecto da queixa ora em apreciação – a queixa da Henkel – já não existia à data da apresentação da denúncia.

Ora, o Júri do ICAP, através das suas duas Secções e da Comissão de Apelo, aprecia as queixas que lhe são submetidas tendo em vista deliberar sobre a conformidade das mensagens publicitárias que lhe estão subjacentes ao Código de Conduta do ICAP.

As deliberações do Júri são vinculativas em relação a todos os membros do ICAP e aos seus representados, bem como a quem tenha submetido a publicidade à apreciação do JE.

O efeito imediato, válido e eficaz de tal deliberação (auto)vinculativa para os membros do ICAP é, findo o prazo de recurso e efectuadas as devidas notificações, a cessação da publicidade que o Júri entendeu ser violadora do Código de Conduta.

Ora, a verdade é que a comunicação comercial objecto dos presentes autos, a exemplo do que já antes acontecera noutros processos (como sejam os processos 18J/2006, 17J/2006 ou 5J/2008), já cessara na realidade, uma vez que, no momento da propositura da queixa, já a ULJM retirara a campanha do mercado, precisamente, em cumprimento de uma anterior decisão deste mesmo JE do ICAP sobre a campanha em questão.

Nestes termos, encontramo-nos perante a ausência de um pressuposto processual para que o Júri de Ética se possa pronunciar sobre o fundo da causa já que a campanha foi retirada do mercado. Mas, também, porque este mesmo Júri já se havia anteriormente pronunciado sobre a legitimidade desta mesma comunicação comercial.

Assim, e sem prejuízo dos direitos que os queixosos e denunciados queiram fazer valer junto dos tribunais, em sede de apreciação publicitária, e num contexto de auto regulação, o JE entende estar-se perante um caso de manifesta inutilidade da lide e de não verificação do pressuposto do interesse em agir.

Neste mesmo sentido foi, aliás, a decisão da Comissão de Apelo do ICAP no âmbito do processo nº 15J/2012, nos seguintes termos: “Mais se entende que, quando a publicidade controvertida deixou já, claramente, de ser praticada por vontade do operador de mercado que a fazia, deixa por via de regra de haver litígio concreto aberto se, pela queixa, o que se pretendia era fazer cessar essa publicidade.” (…) “Nesse pressuposto, é de entender que ocorre inutilidade superveniente da lide.”.

Esta apreciação vai ainda ao encontro da melhor doutrina, nomeadamente com Lebre de Freitas, que refere que “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da proveniência pretendida. Num e noutro caso, a proveniência deixa de interessar – além por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios”, (ver “Código de Processo Civil Anotado”, vol. III, pág. 633. Veja-se, ainda, Lopes do Rego, Comentários, pág. 611. e Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum, pág. 381.)

Esta apreciação do Júri está ainda sustentada pela jurisprudência dominante, como é o caso dos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 3/12/200716/3/2006, 16/02/2006, 27/06/2005, 02/02/2006, 02/06/2005, 15/07/2004, 30/05/2005; e do Supremo Tribunal de Justiça de 06/06/2004 e 06/07/2004.

Termos em que se conclui que a inutilidade da lide ou a falta de interesse em agir deve conduzir necessariamente a uma decisão de extinção da instância por falta de um pressuposto processual, inexistindo, assim, e no nosso entendimento, quaisquer razões que fundamentem uma segunda apreciação desta campanha.

3. Decisão

A Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP delibera, nos termos das regras gerais de processo civil vigentes, que a instância se deve considerar extinta por inutilidade, não se pronunciando este Júri em concreto sobre a publicidade em apreciação no presente processo.».

O Presidente da Primeira Secção do Júri de Ética do ICAP

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